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Proc. nº 349/95
 
 1ª Secção
 Rel.: Consª. Maria Fernanda Palma
 
  
 
  
 
  
 Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:
 
  
 I
 Relatório
 
  
 
                1. No processo sumário instaurado contra A. pela prática de um 
 crime previsto e punido nos termos do artigo 2º, nº 1, do Decreto-Lei nº 124/90, 
 de 14 de Abril, o juiz a quem o arguido foi apresentado proferiu, em 28 de 
 Dezembro de 1994, despacho no qual, por considerar que a disposição 
 incriminadora se encontrava revogada pelo diploma que havia aprovado o Código da 
 Estrada (Decreto-Lei nº 114/94, de 3 de Maio), declarou a incompetência 
 funcional do tribunal e ordenou a remessa dos autos, após trânsito, à autoridade 
 administrativa competente, determinando a restituição do arguido à liberdade.
 
  
 
                2. Desse despacho interpôs o Ministério Público recurso para o 
 Tribunal da Relação de Lisboa, sustentando que os artigos 1º e 2º do Decreto-Lei 
 nº 124/90, de 14 de Abril, se encontravam em vigor.
 
                Na resposta à motivação apresentada, o recorrido apoiou a posição 
 assumida pelo Juiz de Pequena Instância Criminal de Lisboa, acrescentando que, a 
 serem acolhidos os argumentos do recorrente 'estar‑se‑ia na presença de uma 
 inequívoca violação do princípio constitucional da legalidade consagrado no 
 artigo 29º da CRP'.
 
  
 
                3. O Tribunal da Relação de Lisboa, pelo acórdão proferido em 15 
 de Março de 1995, concedeu provimento ao recurso, revogando o despacho recorrido 
 e determinando a sua substituição por outro que ordenasse o normal 
 prosseguimento dos autos pelo crime noticiado.
 
  
 
                4. Deste acórdão interpôs o arguido recurso para o Tribunal 
 Constitucional. Porém, tal recurso não foi admitido pelo Tribunal da Relação de 
 Lisboa por se entender que o recorrente não pretendia que o Tribunal 
 Constitucional apreciasse a conformidade constitucional de determinada norma, 
 mas sim a dos argumentos trazidos à lide pelo Ministério Público.
 
  
 
                5. Foi na sequência deste despacho do relator que foi apresentada 
 a presente reclamação. No Tribunal Constitucional, o Ministério Público 
 pronunciou‑se no sentido da sua improcedência, por não ter sido suscitada 
 durante o processo qualquer questão de inconstitucionalidade de normas.
 
  
 
                6. Corridos os vistos legais, cumpre decidir.
 
  
 II
 Fundamentação
 
  
 
                7. De acordo com o artigo 280º, nº 1, alínea b), da Constituição, 
 cabe recurso para o Tribunal Constitucional das decisões dos tribunais que 
 apliquem normas cuja inconstitucio-nalidade haja sido suscitada durante o 
 processo.
 
                Trata-se, portanto, de um controlo normativo. Objecto da 
 apreciação pelo Tribunal Constitucional são, forçosamente, normas jurídicas, não 
 sendo sindicável a conformidade constitucional das decisões judiciais enquanto 
 tais. Daí que o artigo 75º-A da Lei do Tribunal Constitucional imponha ao 
 recorrente que indique a norma cuja inconstitucionalidade pretende que o 
 Tribunal aprecie.
 
  
 
                8. Ora, no caso dos autos, o recorrente não só não indicou tal 
 norma no requerimento de interposição de recurso, como nunca o fez no decurso da 
 sua intervenção processual.
 
  
 
  
 
                O eventual vício que invoca refere-se à própria decisão e não a 
 qualquer norma que a mesma tenha aplicado. Na realidade, a argumentação de que, 
 a ter havido revogação pelo artigo 87º do Código da Estrada do artigo 2º, nº 1, 
 do Decreto-Lei nº 124/90, se violaria o princípio da legalidade, só põe em causa 
 uma interpretação do âmbito da norma do Código da Estrada contrária, 
 alegadamente, à vontade do legislador (isto é, a vontade de revogar a legislação 
 anterior). Na medida em que a eventual punição se basearia em normas já 
 revogadas, a decisão recorrida violaria o princípio da legalidade, por não se 
 fundamentar em lei prévia vigente.
 
  
 
                9. Assim, o que está em causa não é uma específica dimensão 
 normativa do preceito do Código da Estrada, mas a determinação do seu âmbito de 
 aplicação, de acordo com a sua ratio. Essa tarefa corresponde apenas à subsunção 
 jurídica do caso, não havendo nenhum sentido específico da norma confrontável 
 com a Constituição. Na verdade, o próprio reclamante reconhece que o âmbito do 
 artigo 87º do Código da Estrada poderia ser mais restrito do que aquele que lhe 
 atribui, se houvesse legislação transitória, sem que por esse facto fosse 
 violada a Constituição.
 
                A discussão sobre o âmbito de aplicação da norma (num contexto de 
 sucessão de leis) não envolve, deste modo, qualquer específica questão de 
 constitucionalidade, mas apenas um problema de averiguação da intenção 
 normativa, objectivamente considerada, e de subsunção.
 
  
 
                10. Não tendo suscitado, até este momento, a 
 inconstitucionalidade de qualquer norma, o ora recorrente não o pode fazer nas 
 alegações de recurso, de acordo com o entendimento pacífico deste Tribunal (cf., 
 a título exemplificativo, o Acórdão nº 155/95 publicado no D.R., II Série, de 20 
 de Junho de 1995).
 
                A questão só é suscitada tempestivamente quando o tribunal 
 recorrido sobre ela se pode pronunciar, o que não ocorre quando é colocada, pela 
 primeira vez, nas alegações de recurso que, por força da lei (artigo 79º da Lei 
 nº 28/82, de 15 de Novembro), são apresentadas no próprio Tribunal 
 Constitucional. É este um entendimento funcional, e não meramente formal, que 
 deve ser atribuído ao referido pressuposto processual.
 
  
 
  
 III
 Decisão
 
  
 
                11. Assim sendo, conclui-se que não estão preenchidos os 
 pressupostos do recurso de constitucionalidade, razão pela qual se indefere a 
 presente reclamação.
 
  
 
                Custas pelo recorrente, com taxa de justiça que se fixa  em 5 
 unidades de conta.
 
  
 
                Lisboa, 5 de Dezembro de 1995
 
  
 
                             Maria Fernanda Palma
 Maria da Assunção Esteves
 Alberto Tavares da Costa
 Vítor Nunes de Almeida
 Armindo Ribeiro Mendes
 Antero Alves Monteiro Dinis
 José Manuel Cardoso da Costa