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Processo n.º 445/04
 
 2.ª Secção
 Relator: Conselheiro Mário Torres
 
  
 
  
 
  
 
                Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional,
 
  
 
  
 
                1. Relatório
 
                A. foi pessoalmente notificado, no acto de autuação, em 17 de 
 Abril de 2002, da contra‑ordenação que lhe era imputada (conduzir veículo 
 automóvel à velocidade de 98 km/h, sendo a velocidade máxima permitida no local 
 de 50 km/h), tendo‑lhe sido entregue, nesse acto, o triplicado do auto de 
 contra‑ordenação, do qual constava, nomeadamente, o facto constitutivo da 
 contra‑ordenação, a legislação infringida, as sanções aplicáveis, o prazo 
 concedido e o local para a apresentação da defesa e a possibilidade de 
 pagamento voluntário da coima pelo mínimo, bem como o prazo e o local para o 
 efeito e as consequências do não pagamento, tudo de acordo com o estatuído no 
 artigo 155.º do Código da Estrada, aprovado pelo Decreto‑Lei n.º 114/94, de 3 de 
 Maio, com as alterações introduzidas pelos Decretos‑Leis n.º 2/98, de 3 de 
 Janeiro, e n.º 265‑A/2001, de 28 de Setembro.
 
                Não foi apresentada defesa.
 
                Por decisão da Direcção Regional de Viação do Algarve, de 10 de 
 Outubro de 2002, foi-lhe aplicada a coima de € 180 e a sanção acessória de 
 inibição de conduzir pelo período de 60 dias, pela prática de uma 
 contra‑ordenação prevista e punida pelas disposições conjugadas dos artigos 
 
 27.º, n.ºs 1 e 3, 139.º e 146.º, alínea b), do Código da Estrada.
 
                Esta decisão foi notificada ao arguido por carta postal simples, 
 expedida para o domicílio indicado quer no registo individual do condutor 
 
 (previsto no n.º 8 do artigo 122.º do Código da Estrada) quer no auto de 
 contra‑ordenação (… Faro), tendo o distribuidor do serviço postal lavrado e 
 assinado, em 11 de Dezembro de 2002, a seguinte declaração: “No dia 11 de 
 Dezembro de 2002 depositei no receptáculo local domiciliário da morada acima 
 descrita [… Faro] a notificação‑citação a ela referente”.
 
                Em 25 de Agosto de 2003, o arguido remeteu para a Direcção 
 Regional de Viação do Algarve, endereçada ao Juiz de Direito do Tribunal 
 Judicial da Comarca de Tavira, impugnação judicial da decisão administrativa, 
 mas esta foi rejeitada, por extemporaneidade, por despacho judicial de 31 de 
 Outubro de 2003, com a seguinte fundamentação:
 
  
 
    “O recurso de impugnação da decisão da autoridade administrativa deve ser 
 interposto no prazo de vinte dias após o seu conhecimento pelo arguido (artigo 
 
 59.º, n.º 3, do Decreto‑Lei n.º 433/82, na redacção introduzida pelo 
 Decreto‑Lei n.º 244/95, de14 de Setembro).
 
    Tendo o arguido sido notificado da decisão da autoridade administrativa em 16 
 de Dezembro de 2002 (cf. fls. 11 dos autos) e apresentado o seu recurso em 25 de 
 Agosto de 2003, verifica‑se que o mesmo é manifestamente extemporâneo.
 
    Assim, e nos termos do artigo 63.º, n.º 1, do citado Decreto‑Lei n.º 244/95, 
 de 14 de Setembro, rejeita‑se o recurso interposto pelo arguido.”
 
    
 
                Deste despacho interpôs o arguido recurso para o Tribunal da 
 Relação de Évora, em que, para além de outra questão (falta de fundamentação da 
 condenação em custas), impugnou a decisão de rejeição da impugnação judicial, 
 por extemporaneidade, com base em argumentos sintetizados nas seguintes 
 conclusões da respectiva motivação:
 
  
 
    “2 – Porque o Tribunal a quo faz prevalecer um regime processual geral 
 
 (Decreto‑Lei n.º 433/82) sobre um regime processual especial (artigo 150.º, n.º 
 
 1, do Código da Estrada) viola o princípio de que uma norma geral não prevalece 
 sobre uma norma especial. Ou melhor, um regime geral não pode prevalecer sobre 
 um regime específico.
 
    3 – Porque manifesta o Tribunal a quo entendimento diferente de que apenas e 
 só se, por qualquer motivo, a carta prevista no n.º 3 do artigo 156.º do Código 
 da Estrada (carta registada) for devolvida à entidade remetente, a notificação 
 
 é reenviada ao notificando, para o seu domicílio ou sede, através de carta 
 simples, viola frontalmente o disposto no artigo 156.º, n.º 4, do Código da 
 Estrada.
 
    4 – Ainda que nos presentes autos existisse um comprovativo de que havia sido 
 devolvida à entidade administrativa uma carta registada, que manifestamente não 
 existe, entender‑se como válida uma notificação feita por carta simples não é 
 mais que interpretar deficientemente o princípio constitucional da proibição de 
 indefesa consagrado no artigo 20.º da CRP. Logo,
 
    5 – Também deve ser desaplicada a norma que considere válida uma notificação 
 feita por correio simples, em observância também do princípio constitucional da 
 efectividade dos direitos fundamentais, ínsito, v. g., no artigo 18.º, n.º 1, da 
 CRP.”
 
                O Tribunal da Relação de Évora, por acórdão de 16 de Março de 
 
 2004, embora considerando incorrecto o entendimento perfilhado no despacho 
 agravado, acabou por negar provimento ao recurso por reputar que a 
 irregularidade cometida se sanara por falta de oportuna arguição. Expendeu‑se 
 nesse aresto:
 
  
 
    “Para rejeitar, por extemporâneo, o recurso de impugnação da decisão 
 condenatória da autoridade administrativa, considerou o tribunal a quo, com o 
 aplauso do Ministério Público junto da 1.ª instância, que o arguido foi 
 validamente notificado da decisão condenatória da autoridade administrativa, em 
 
 16 de Dezembro de 2002, 5.º dia posterior à data do depósito da respectiva carta 
 simples no receptáculo postal domiciliário da morada do arguido, indicada pelo 
 distribuidor do serviço postal, entendimento este contra o qual se insurge o 
 recorrente.
 
    Antecipando a resposta à questão suscitada, dir‑se‑á que o entendimento 
 perfilhado pelo tribunal recorrido não pode ser acolhido.
 
    É que o Código da Estrada estabelece um regime próprio de notificações que – 
 por completo (além de inovador), no concernente quer às modalidades de 
 notificação quer às formalidades a observar pelo funcionário instrutor e pelo 
 distribuidor do serviço postal, quer, finalmente, às cominações legais 
 aplicáveis relativamente a cada um dos procedimentos nele previstos, presumindo 
 feita a notificação no 3.º ou no 5.º dia útil posterior à data da expedição da 
 carta, consoante se trate de carta registada ou carta simples – afasta a 
 aplicação subsidiária do regime das notificações em processo penal, previsto 
 nomeadamente no artigo 113.º do CPP, ao processo contra‑ordenacional por 
 infracção rodoviária, o que não foi tido em consideração pelo tribunal 
 recorrido.
 
    Com efeito, estatui o artigo 156.º do CE:
 
  
 
    «1 – As notificações efectuam‑se:
 
    a) Por contacto pessoal com o notificando no lugar em que for encontrado;
 
    b) Mediante carta registada expedida para o domicílio ou sede do notificando;
 
    c) Mediante carta simples expedida para o domicílio ou sede do notificando.
 
    2 – A notificação por contacto pessoal deve ser efectuada sempre que 
 possível no acto de autuação, podendo ainda ser utilizada quando o notificando 
 for encontrado pela entidade competente.
 
    3 – Se não for possível, no acto de autuação, proceder nos termos do número 
 anterior ou se estiver em causa qualquer outro acto a notificação pode ser 
 efectuada através de carta registada expedida para o domicílio ou sede do 
 notificando.
 
    4 – Se, por qualquer motivo, a carta prevista no número anterior for 
 devolvida à entidade remetente, a notificação é reenviada ao notificando, para 
 o seu domicílio ou sede, através de carta simples.
 
    5 – Para efeitos do disposto nos n.ºs 3 e 4 considera‑se domicílio do 
 notificando:
 
    a) O que consta do registo a que se refere o n.º 8 do artigo 122.º, no caso 
 previsto no n.º 1 do artigo 134.º;
 
    b) O do proprietário, do adquirente com reserva de propriedade, do 
 usufrutuário, do locatário em regime de locação financeira, do locatário por 
 prazo superior a um ano, ou o de quem, em virtude de facto sujeito a registo, 
 tiver a posse do veículo, no caso previsto no n.º 2 do artigo 134.º e no n.º 1 
 do artigo 152.º
 
    6 – A notificação nos termos do n.º 3 considera‑se efectuada no 3.º dia útil 
 posterior ao do envio, devendo a cominação aplicável constar do acto de 
 notificação.
 
    7 – No caso previsto no n.º 4, o funcionário da entidade competente lavra 
 uma cota no processo com a indicação da data da expedição da carta e do 
 domicílio para o qual foi enviada, considerando‑se a notificação efectuada no 
 
 5.º dia posterior à data indicada, cominação que deverá constar do acto de 
 notificação.
 
    8 – Quando a infracção for da responsabilidade do proprietário, do adquirente 
 com reserva de propriedade, do usufrutuário, do locatário em regime de locação 
 financeira, do locatário por prazo superior a um ano, ou de quem, em virtude de 
 facto sujeito a registo, tiver a posse do veículo, a notificação, no acto de 
 autuação, pode fazer‑se na pessoa do condutor.
 
    9 – Se o notificando se recusar a receber ou a assinar a notificação, o 
 funcionário certifica a recusa, considerando‑se efectuada a notificação.»
 
  
 
    Contrariamente ao regime do CPP ([artigo 113.º,] n.ºs 1, alínea c), e 6), a 
 notificação mediante carta simples (modalidade utilizada, in casu, na 
 notificação do arguido), surge no domínio do CE como uma modalidade sucessiva, 
 e não alternativa, de notificação, apenas podendo ser usada no caso de se ter 
 frustrado a notificação pessoal ou através de carta registada e, nesta última 
 hipótese, caso esta tenha sido, por isso, devolvida à entidade remetente.
 
    É o que claramente flúi do normativo do n.º 4 do artigo 156.º («se, por 
 qualquer motivo, a carta prevista no número anterior for devolvida à entidade 
 remetente ...») e o evidencia o proémio do Decreto‑Lei n.° 265‑A/2001, de 28 de 
 Setembro (que introduziu a actual redacção daquele artigo), que, de resto, se 
 limita a reproduzir o excerto que, a propósito, já constava do exórdio do 
 Decreto‑Lei n.º 165/2001, de 22 de Maio: «Procedeu‑se também à simplificação 
 do regime das notificações, contemplando‑se a notificação através de carta 
 simples enviada para o domicílio do infractor, no caso de não ter sido possível 
 proceder à notificação pessoal ou por carta registada».
 
    Assim, tendo‑se lançado mão da notificação através de carta simples sem que 
 tivesse sido previamente tentada, sem êxito, a notificação mediante carta 
 registada (expedida para o domicílio do arguido) – pressuposto, como se referiu, 
 da notificação por via postal simples – há que concluir que não foram observadas 
 as normas a que obedecem as notificações em processo de contra‑ordenação por 
 infracção ao Código da Estrada [Sobre a questão, cf. o Parecer n.º 19/2001, de 
 
 22 de Novembro de 2001, do Conselho Consultivo da Procuradoria‑Geral da 
 República, publicado no Diário da República, II Série, de 8 de Fevereiro de 
 
 2002].
 
    O emprego da notificação por carta simples, sem que se verificasse o 
 respectivo pressuposto, não constitui nulidade, seja insanável, seja dependente 
 de arguição, já que não faz parte dos respectivos catálogos constantes dos 
 artigos 119.° e 120.º do CPP, respectivamente, nem como tais são cominadas 
 noutras disposições legais, sendo certo que em matéria de nulidades vigora o 
 princípio da legalidade acolhido no citado artigo 118.º, n.º 1, do CPP, cuja 
 norma não consente a sua extensão analógica.
 
    A notificação do arguido, mediante carta simples, constitui irregularidade 
 submetida ao regime do artigo 123.º, n.º 1, do CPP, devendo, pois, ter sido 
 arguida nos três dias seguintes a contar daquele em que foi notificado através 
 daquela carta.
 
    Arguida apenas em 25 de Agosto de 2003, já há muito estava sanada tal 
 irregularidade.
 
    Efectivamente, nos termos do n.º 7 do mencionado artigo 156.º, a 
 notificação mediante carta simples considera‑se efectuada no 5.° dia posterior 
 
 à data da expedição da carta indicada na cota lavrada no processo pelo 
 funcionário da entidade competente. Compulsado o processo, dele não consta 
 qualquer cota indicando a data de expedição da carta, constando, porém, da ficha 
 de fls. 26 que o arguido foi notificado da decisão em 2 de Dezembro de 2002, 
 data essa que terá sido a da expedição da carta. Na dúvida e porque mais 
 favorável ao arguido – até porque a declaração do distribuidor do serviço postal 
 representa uma garantia acrescida de que recebeu a carta – há que considerar 
 que o arguido foi notificado da decisão condenatória da autoridade 
 administrativa em 16 de Dezembro de 2002, 5.º dia posterior à data do depósito 
 da carta no receptáculo postal domiciliário da morada do arguido, data essa 
 indicada pelo distribuidor do serviço postal, conforme declaração por este 
 lavrada.
 
    Sustenta, porém, o recorrente que «entender‑se como válida uma notificação 
 feita por carta simples, não é mais que interpretar deficientemente o princípio 
 constitucional da proibição de indefesa consagrado no artigo 20.º da CRP. Logo, 
 
 [...] também deve ser desaplicada a norma que considere válida uma notificação 
 feita por correio simples, em observância também do princípio constitucional da 
 efectividade dos direitos fundamentais, ínsito, v. g., no artigo 18.°, n.º 1, da 
 CRP.»
 
    Salvo o devido respeito, causa alguma estranheza a argumentação pelo 
 recorrente aduzida.
 
    Na verdade, não refere o despacho recorrido qual a norma ou normas jurídicas 
 em que se louva para considerar válida a notificação do arguido da decisão 
 condenatória da autoridade administrativa. Pressupondo que «o Tribunal a quo 
 faz prevalecer um regime processual geral (Decreto‑Lei n.º 433/82) sobre um 
 regime processual especial (artigo 150.º, n.º 1, do Código da Estrada)», 
 argumenta o recorrente que aquele tribunal «viola o princípio de que uma norma 
 geral não prevalece sobre uma norma especial. Ou melhor, um regime geral não 
 pode prevalecer sobre um regime específico». Censura o tribunal recorrido 
 porque não perfilhou o entendimento «de que apenas e só se, por qualquer motivo, 
 a carta prevista no n.º 3 do artigo 156.º do CE (carta registada) for devolvida 
 
 à entidade remetente, a notificação é reenviada ao notificando, para o seu 
 domicílio ou sede, através de carta simples»; e porque não seguiu tal 
 entendimento, sustenta o recorrente que o tribunal a quo «viola frontalmente o 
 disposto no artigo 156.º, n.º 4, do Código da Estrada». Enfim, depois de se 
 insurgir contra o despacho recorrido porque «faz letra morta da disposição legal 
 contida no artigo 156.º, n.º 4, primeira parte, do Código da Estrada, ex vi 
 artigo 150.º, n.º 1, do mesmo diploma legal», depois de pugnar pela aplicação do 
 regime especial das notificações previsto naquele artigo 156.° e de se esforçar 
 por demonstrar que «é válida a notificação por carta simples, desde que exista 
 uma carta registada devolvida», acaba por concluir que «ainda que nos presentes 
 autos existisse um comprovativo de que havia sido devolvida à entidade 
 administrativa uma carta registada, [...] entender‑se como válida uma 
 notificação feita por carta simples não é mais que interpretar deficientemente o 
 princípio constitucional da proibição de indefesa consagrado no artigo 20.º da 
 CRP. Logo, [...] também deve ser desaplicada a norma que considere válida uma 
 notificação feita por correio simples, em observância também do princípio 
 constitucional da efectividade dos direitos fundamentais, ínsito, v. g., no 
 artigo 18.º, n.º 1, da CRP.»
 
     Centra o arguido o ataque às notificações por via postal simples ancorado 
 no princípio da proibição da «indefesa» e em jurisprudência do Tribunal 
 Constitucional, que versa sobre casos que o próprio recorrente reconhece não 
 serem idênticos ao caso vertente.
 
    O princípio da proibição da «indefesa», que se inscreve no princípio mais 
 vasto do acesso ao direito e aos tribunais, a que o artigo 20.° da Lei 
 Fundamental confere dignidade constitucional, «consiste na privação ou 
 limitação do direito de defesa do particular perante os órgãos judiciais, junto 
 dos quais se discutem questões que lhes dizem respeito. A violação do direito à 
 tutela judicial efectiva, sob o ponto de vista da limitação do direito de 
 defesa, verificar‑se‑á sobretudo quando a não observância das normas 
 processuais ou de princípios gerais de processo acarreta a impossibilidade de o 
 particular exercer o seu direito de alegar, daí resultando prejuízos efectivos 
 para os seus interesses.» [Gomes Canotilho/Vital Moreira, Constituição da 
 República Portuguesa Anotada, 3.ª edição, Coimbra, 1993,  pp. 163 e 164].
 
    Também a chamada deste princípio à colação não prima pela pertinência.
 
    É que, como se referiu, o arguido foi pessoalmente notificado da 
 contra‑ordenação que lhe é imputada no auto de contra‑ordenação, em 17 de Abril 
 de 2002, ou seja, no acto de autuação, tendo‑lhe sido entregue, no acto da 
 notificação, o triplicado do mesmo auto, do qual consta, nomeadamente, o facto 
 constitutivo da contra‑ordenação, a legislação infringida, as sanções 
 aplicáveis, o prazo concedido e o local para a apresentação da defesa e, 
 finalmente, a possibilidade de pagamento voluntário da coima pelo mínimo, bem 
 como o prazo e o local para o efeito e as consequências do não pagamento.
 
    Teve, pois, o arguido ensejo de se defender. Não foi por impedimento, 
 compressão ou cerceamento do seu inquestionável direito de defesa que o arguido 
 não apresentou defesa.
 
    Por outro lado, o arguido – irregularmente, é certo – foi notificado da 
 decisão condenatória da autoridade. Não pode alegar que não teve conhecimento 
 de tal decisão, sendo certo que, como se disse, a mencionada declaração lavrada 
 pelo distribuidor do serviço postal representa uma garantia acrescida (pois que 
 não exigida pelo artigo 156.º, que estabelece a presunção de que a carta foi 
 recebida no 5.º dia posterior ao da sua expedição) de que recebeu a carta. E se 
 tivesse arguido atempadamente a irregularidade da sua notificação poderia 
 recorrer da decisão que a desatendesse.
 
    Também aqui o seu direito de defesa não sofreu qualquer intolerável 
 compressão.
 
    Improcede, pois, a suscitada questão das inconstitucionalidades.”
 
  
 
                É deste acórdão que vem interposto, pelo arguido, o presente 
 recurso, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei de 
 Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional 
 
 (aprovada pela Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, e alterada, por último, pela 
 Lei n.º 13‑A/98, de 26 de Fevereiro – LTC), tendo, a convite do relator, 
 identificado a norma cuja inconstitucionalidade pretendia ver apreciada como 
 sendo a constante do artigo 156.º do Código da Estrada, quando interpretada no 
 sentido de que a não observância das regras aí contidas não viola o princípio 
 constitucional da proibição da indefesa, constituindo mera irregularidade 
 submetida ao regime do artigo 123.º, n.º 1, do CPP.
 
                O recorrente apresentou alegações, onde consignou:
 
  
 
    “1 – O cerne da questão suscitada nos presentes autos prende‑se com a 
 constitucionalidade do corpo da norma legal prevista no artigo 156.º do Código 
 da Estrada (Regras sobre as formas de notificações), quando interpretada no 
 sentido de que a não observância das regras aí contidas não viola o princípio 
 constitucional da proibição da indefesa;
 
    2 – É que, como muito bem considerou a Veneranda Relação de Évora, no douto 
 Acórdão aqui recorrido, considera‑se o seguinte:
 
    a) O Tribunal de 1.ª Instância considerou que o recorrente foi validamente 
 notificado da decisão condenatória da autoridade administrativa. Entendimento 
 esse que não podia ser acolhido (…);
 
    b) O regime estabelecido no Código da Estrada afasta a aplicação 
 subsidiária do regime das notificações em processo penal, o que não foi tido 
 em consideração pelo tribunal de 1.ª Instância (…);
 
    c) Considera ainda que a modalidade de notificação (carta simples) 
 utilizada para com o recorrente não é uma modalidade alternativa, mas sim 
 sucessiva (…);
 
    d) Então, vem um dos busílis da questão. O emprego de forma de notificação 
 diferente da prevista na lei (no CE) constitui mera irregularidade submetida ao 
 regime do artigo 123.º, n.º 1, do CPP (…). Ora,
 
    3 – É exactamente esta última interpretação vertida no douto Acórdão ora 
 recorrido que é de todo violadora do princípio constitucional da proibição de 
 indefesa. Pois que, se é certo que aquando da notificação do auto de 
 contra‑ordenação foi dada cabal possibilidade de o recorrente se defender 
 
 «administrativamente», não é menos certo que, ao não ter sido notificado, nos 
 termos da lei, de uma decisão administrativa, se viu mesmo impedido de se 
 defender judicialmente (as decisões administrativas, in casu, a que lhe aplicou 
 uma sanção acessória de inibição de conduzir por 2 meses, impugnam‑se para os 
 Tribunais Judiciais). Assim,
 
    4 – Ao considerar a Veneranda Relação de Évora no Acórdão (…), ora levado à 
 superior fiscalização constitucional sucessiva concreta, que o arguido teve 
 oportunidade de se defender (por via dos direitos comunicados validamente no 
 auto de contra‑ordenação), omite que essa defesa se refere a uma defesa por 
 impugnação administrativa. Pois que,
 
    5 – Do que se queixou exactamente o recorrente no recurso que interpôs para a 
 Relação de Évora foi a impossibilidade de impugnar judicialmente uma decisão 
 administrativa. E, neste aspecto, considera mesmo que se viu impedido de 
 concretizar o direito fundamental de defesa judicial (pois que não foi mesmo 
 notificado da decisão administrativa em causa), consagrado nos n.ºs 9 e 10 do 
 artigo 32.º da nossa Grundnorm.
 
    6 – Por outro lado, ao considerar válida, porque não impugnada, uma 
 notificação que não obedece à lei ordinária (regime específico constante do 
 artigo 156.º do Código da Estrada), está a violar o disposto no artigo 268.º, 
 n.º 3, da CRP – Os actos administrativos estão sujeitos a notificação aos 
 interessados, na forma prevista na lei. Sic.
 
    7 – Quanto à mera irregularidade, sanada porque não impugnada (omissão de 
 formalidade da notificação da decisão administrativa), nem se diga que a mesma 
 foi sanada porque não foi impugnada no prazo a que alude o artigo 123.º, n.º 1, 
 do CPP. Pois que, tal como reconhece a Veneranda Relação de Évora, não existiu 
 no processo administrativo qualquer cota afixada por funcionário da autoridade 
 administrativa onde constasse a data da expedição da notificação por carta 
 simples. Logo, como se contariam os 5 dias a que alude o artigo 156.º, n.º 7, do 
 CE, para se dizer que o recorrente não arguiu em tempo a irregularidade da 
 notificação?! Não se pode contar um prazo que esteja dependente da existência 
 de uma cota lavrada no processo, logo que não se sabe onde começa ou acaba tal 
 prazo (o previsto no artigo 123.º, n.º 1, do CPP). Mais uma vez se verifica 
 violação do princípio constitucional da proibição de indefesa.
 
    8 – Desde a decisão proferida em 1.ª Instância, que não apreciou o recurso 
 interposto de uma decisão administrativa, até ao Acórdão aqui recorrido, não 
 foi tido em atenção que, de facto, não se pode interpretar a lei ordinária de 
 modo a restringir um direito fundamental, como é o direito ao recurso. Ainda que 
 se procure, como se procurou, dar cobertura legal a um acto administrativo 
 clara e ilegalmente proferido sem observância de uma formalidade legal, como foi 
 a relativa à notificação do mesmo. Ainda que se diga que a «cobertura legal», 
 se faz por via de se estar perante uma «mera irregularidade». A ser assim, tal 
 entendimento doutamente explanado pela Veneranda Relação de Évora viola o 
 disposto no artigo 204.º da CRP, pois que atribui um valor superior à norma 
 contida em lei ordinária (artigo 123.º do CPP), relativamente a norma 
 constitucional (artigo 268.º, n.º 3).
 
    9 – O que também não pode ser perdido de vista é que entender‑se como válida 
 uma notificação efectuada por correio simples (tal como previsto no artigo 
 
 156.º, n.º 4, do CE), onde se comunicam sanções, restrições de direitos e 
 comunicam direitos (especialmente ao recurso aos tribunais), não assegura de 
 modo nenhum a garantia de que o cidadão destinatário de tal comunicação a 
 recebe e conhece os direitos e deveres nela consignados. Logo, devia mesmo ser 
 considerada inconstitucional tal norma, por ser demasiado incerta quanto à 
 recepção da mesma, sob pena de sistematicamente se poder coarctar um direito 
 inalienável num Estado de Direito, como é o direito ao recurso aos tribunais 
 judiciais para impugnar decisões administrativas, tal como se encontra ínsito 
 no artigo 32.º, n.ºs 1, 9 e 10, da CRP.
 
    10 – Acresce ainda que, nem o Tribunal Judicial da Comarca de Tavira, nem 
 sequer a Veneranda Relação de Évora, puseram em crise que o recorrente tivesse 
 tido efectivamente conhecimento do acto administrativo que impugnou 
 judicialmente, via fax (recebido em 22 de Agosto de 2003 – cujo documento consta 
 dos autos). Esse, sim, é um momento que inequivocamente se pode considerar como 
 certo para que o recorrente tivesse tido efectivo conhecimento do acto que 
 impugnou. Ninguém colocou em causa tal «momento». A não ser assim, 
 
    11 – Preteriu‑se a certeza, em favor de uma notificação presumida, da 
 incerteza. O que contraria todo o ordenamento jurídico‑penal (especialmente o 
 que vigora adjectivamente em qualquer direito sancionatório).
 
    12 – Presumindo‑se que um cidadão tomou conhecimento de uma decisão de um 
 
 órgão administrativo, será o mesmo que lhe assegurar um efectivo direito ao 
 recurso judicial?! Ainda por cima quando se reconhece que essa própria 
 presunção é materialmente ilegal, porque não conforme com o «tal» artigo 156.º 
 do Código da Estrada.
 
    13 – Por um lado, não se pode considerar que uma notificação é ilegal para, 
 por outro lado, atribuir‑lhe efeitos na esfera jurídica do destinatário. 
 Especialmente ao ponto de nem sequer lhe ser dada oportunidade de se defender 
 judicialmente de uma decisão administrativa, que pelo menos é ilegal por efeito 
 da prescrição.
 
    14 – Em suma, o que jamais pode acontecer é considerar‑se (tal como o fez 
 doutamente a Veneranda Relação de Évora) que uma entidade administrativa 
 efectivamente não efectuou uma notificação na forma prevista na lei (logo, de 
 forma ilegal), e, ao mesmo tempo, decidir‑se que esse mesmo acto, apesar de 
 desconforme à lei, produza efeitos nefastos para o cidadão ora recorrente. Que 
 na prática se consubstanciaram em impedir que fosse apreciada judicialmente uma 
 pretensão de um cidadão.
 
    15 – Quer dizer, na prática reconhece‑se que uma autoridade administrativa 
 pratica um acto manifestamente ilegal, e, ao mesmo tempo, considera‑se que o 
 cidadão recorrente é que tem que sofrer as consequências da preterição de uma 
 formalidade legal. Salvo o devido respeito por diferente opinião, não pode ser!
 
    16 – Num Estado de Direito, como se apregoa ser o nosso, não pode ser o 
 cidadão a «pagar» os «descuidos» da Administração Pública (especialmente no que 
 
 à preterição de formalidades essenciais das notificações diz respeito), in casu, 
 da DGV.”
 
  
 
                O representante do Ministério Público neste Tribunal 
 Constitucional apresentou contra‑alegações, concluindo:
 
    
 
    “1 – Face ao teor do acórdão proferido pela Relação, o recorrente é «parte 
 vencedora» relativamente à questão da prevalência do regime de notificações 
 previsto no artigo 156.° do Código da Estrada, envolvendo a «dupla» notificação 
 ao arguido das decisões sancionatórias, mediante tentativa de notificação por 
 carta registada com aviso de recepção e – frustrando‑se esta – mediante 
 depósito de carta simples no receptáculo postal do respectivo domicílio.
 
    2 – Não viola o princípio constitucional da proibição da indefesa a 
 interpretação normativa do artigo 123.°, n.º 1, do Código de Processo Penal, 
 segundo a qual recai sobre o destinatário de notificação postal «irregular» o 
 
 ónus de, no prazo aí previsto, arguir tal irregularidade, só ulteriormente tendo 
 cabimento a eventual via recursória.
 
    3 – Termos em que deverá improceder o presente recurso.”
 
  
 
                Tudo visto, cumpre apreciar e decidir.
 
  
 
                2. Fundamentação
 
                2.1. Cumpre, antes de mais, delimitar com precisão o objecto do 
 presente recurso, já que o discurso desenvolvido pelo recorrente, ao longo dos 
 autos, a este respeito, nem sempre surge dotado de inequivocidade. Na verdade, a 
 argumentação principal do recorrente foi, desde o início, centrada na 
 ilegalidade da notificação por via postal simples sem prévia tentativa de 
 notificação por via postal registada, o que representava a preterição do regime 
 especial de notificação estabelecido no artigo 156.º do Código da Estrada e a 
 indevida aplicação do regime geral de notificação vigente no regime geral das 
 contra‑ordenações, que consentiria, em determinadas circunstâncias, a 
 utilização imediata da notificação por via postal simples, sem necessidade de 
 prévia tentativa frustrada de notificação por via postal registada. Só como 
 argumentação de segunda linha, aliás não apresentada em termos peremptórios, mas 
 antes hipotéticos e dubitativos, é que surge a impugnação da admissibilidade 
 constitucional da figura da notificação por via postal simples, em si mesma 
 considerada. Perante o convite do relator para identificar com precisão qual a 
 norma ou interpretação normativa cuja constitucionalidade pretendia ver 
 apreciada pelo Tribunal Constitucional, o recorrente respondeu, à cabeça, que “a 
 grande questão suscitada nos presentes autos prende‑se com a 
 constitucionalidade da norma legal prevista no artigo 156.º do Código da 
 Estrada (…), quando interpretada no sentido de que a não observância das regras 
 aí contidas não viola o princípio constitucional da proibição da indefesa” 
 
 (sublinhado acrescentado); isto é, a inconstitucionalidade radicaria, não no uso 
 da notificação por via postal simples, em si mesmo considerada, pois tal 
 modalidade de notificação está prevista entre as regras desse artigo 156.º, mas 
 na não observância da regra, constante do seu n.º 4, de que, antes de se 
 recorrer à notificação por via postal simples, há que tentar a notificação por 
 via postal registada. Só no n.º 9 dessa sua resposta é que o recorrente refere, 
 adminucularmente, que “o que também não pode ser perdido de vista é que 
 entender‑se como válida uma notificação efectuada por correio simples (…) não 
 assegura de modo nenhum a garantia de que o cidadão destinatário de tal 
 comunicação a recebe e conhece os direitos e deveres nela consignados”, pelo que 
 
 “devia mesmo ser considerada inconstitucional tal norma, por ser demasiado 
 incerta quanto à recepção da mesma, sob pena de sistematicamente se poder 
 ressarcir [sic] um direito inalienável num Estado de direito, como é o direito 
 ao recurso aos tribunais judiciais para impugnar decisões administrativas, tal 
 como se encontra ínsito no artigo 32.º, n.ºs 1, 9 e 10, da CRP” (sublinhado 
 acrescentado).
 
                De qualquer forma, tratando‑se de recurso interposto ao abrigo da 
 alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, o objecto do recurso não pode 
 ultrapassar a questão da inconstitucionalidade da interpretação normativa 
 aplicada no acórdão recorrido como sua ratio decidendi, a saber: o entendimento 
 de que o uso da notificação mediante carta simples sem prévia tentativa da 
 notificação mediante carta registada, nos termos do artigo 156.º, n.ºs 4 e 7, do 
 Código da Estrada (aprovado pelo Decreto‑Lei n.º 114/94, de 3 de Maio, com as 
 alterações introduzidas pelos Decretos‑Leis n.º 2/98, de 3 de Janeiro, e n.º 
 
 265‑A/2001, de 28 de Setembro), constitui irregularidade prevista no artigo 
 
 123.º, n.º 1, do Código de Processo Penal (CPP), que se sana se não for arguida 
 no prazo aí cominado. O Tribunal da Relação de Évora considerou que, no caso, o 
 recorrente não arguíra tal irregularidade, juízo este cuja correcção escapa ao 
 controlo de constitucionalidade normativa que, no caso, incumbe ao Tribunal 
 Constitucional.
 
  
 
                2.2. Pode desde já adiantar‑se que não se considera que a 
 dimensão normativa aplicada na decisão recorrida haja violado as normas e 
 princípios constitucionais invocados pelo recorrente.
 
                Como se assinala na contra‑alegação do Ministério Público, a 
 situação ora em causa é substancialmente diferente da que tem sido suscitada a 
 propósito da constitucionalidade do regime da citação por carta simples, cuja 
 generalização no âmbito do processo civil foi operada pelo Decreto‑Lei n.º 
 
 183/2000, de 10 de Agosto (e já, em larga medida, derrogada pelo Decreto‑Lei n.º 
 
 38/2003, de 8 de Março), quer porque não se trata aqui de, pela primeira vez, 
 dar conhecimento ao réu da pendência contra ele de certo processo, já que o auto 
 de autuação que originou o processo contra‑ordenacional lhe foi, na hora, 
 pessoalmente notificado, quer porque não se suscitam agora as delicadas questões 
 ligadas ao estabelecimento generalizado de “presunções de domicílio”, tendo a 
 carta simples sido remetida e depositada no efectivo domicílio do recorrente, 
 constante do registo do condutor (previsto no n.º 8 do artigo 122.º do Código da 
 Estrada) e confirmado no auto de contra‑ordenação.
 
                Por outro lado, apesar de dos autos constar uma ficha (a fls. 26) 
 da qual se podia deduzir que a carta simples fora expedida em 2 de Dezembro de 
 
 2002, o facto de ter sido omitido o lançamento da cota no processo com indicação 
 da data da expedição da carta, exigida pelo n.º 7 do artigo 156.º do Código da 
 Estrada, levou as instâncias a não aplicar a regra, constante desse preceito, de 
 que a notificação se considera efectuada no 5.º dia posterior à data indicada 
 nessa cota, optando pelo entendimento – mais favorável para o recorrente – de 
 reportar o início deste prazo à data indicada pelo distribuidor do serviço 
 postal como a do depósito da carta (11 de Dezembro de 2002) e, por isso, 
 consideraram a notificação efectuada em 16 (e não em 7) de Dezembro de 2002.
 
                Neste contexto, não se vislumbra como o regime do artigo 123.º, 
 n.º 1, do CPP, ao impor ao arguido o ónus de invocar a irregularidade da 
 notificação nos três dias subsequentes àquele em que tiver sido notificado para 
 qualquer termo do processo ou àquele em que tiver intervindo em qualquer acto 
 nele praticado, afronta qualquer princípio constitucional, designadamente o 
 da proibição da indefesa.
 
                Também não ocorre violação do artigo 268.º, n.º 3, da 
 Constituição da República Portuguesa (CRP), que estabelece o dever de 
 notificação dos actos administrativos aos respectivos interessados “na forma 
 prevista na lei”, já que nesta remissão para a lei se compreende a definição 
 não apenas dos modos de efectivar as notificações, mas também do regime das 
 irregularidades que venham a ser, nesse âmbito, cometidas. Assim, salvo 
 desrazoabilidade intolerável, pode o legislador, após definir as modalidades de 
 notificação admissíveis e os respectivos conteúdos, diferenciar as 
 consequências de eventuais falhas, que podem ir desde a inexistência à mera 
 irregularidade, passando pela nulidade e pela anulabilidade [da conjugação do 
 artigo 68.º do Código do Procedimento Administrativo com o artigo 60.º do Código 
 de Processo nos Tribunais Administrativos resulta que só quando a notificação 
 não dê a conhecer o sentido da decisão é que o acto se considera inoponível ao 
 interessado; se omitir a indicação do autor, da data ou dos fundamentos da 
 decisão, pode o interessado requerer o suprimento da omissão, com interrupção 
 do prazo de impugnação; se, porém, faltarem outras indicações, como, por 
 exemplo, a do órgão competente para apreciar a impugnação do acto e o prazo para 
 esse efeito, tal constituirá mera irregularidade, sem qualquer repercussão nas 
 reacções impugnatórias cabíveis]. Ora, pelas razões já expendidas, o regime 
 instituído, tal como foi entendido pelo acórdão recorrido, não afecta 
 intoleravelmente o direito de impugnação das decisões administrativas. Motivo 
 pelo qual também não ocorre violação do disposto no n.º 10 do artigo 32.º da 
 CRP, que assegura ao arguido, nos processos de contra‑ordenação, os direitos de 
 audiência e defesa, surgindo como incompreensível a invocação, feita pelo 
 recorrente, do n.º 9 do mesmo preceito constitucional, que proíbe a subtracção 
 de uma causa ao tribunal cuja competência esteja fixada em lei anterior 
 
 (princípio do juiz natural).
 
                Não implicando o critério normativo acolhido no acórdão recorrido 
 qualquer limitação relevante do direito de defesa do recorrente, o presente 
 recurso tem de improceder.
 
  
 
                3. Decisão
 
                Em face do exposto, acordam em:
 
                a) Não julgar inconstitucional a interpretação normativa segundo 
 a qual o uso da notificação mediante carta simples sem prévia tentativa da 
 notificação mediante carta registada, nos termos do artigo 156.º, n.ºs 4 e 7, 
 do Código da Estrada (aprovado pelo Decreto‑Lei n.º 114/94, de 3 de Maio, com 
 as alterações introduzidas pelos Decretos‑Leis n.º 2/98, de 3 de Janeiro, e n.º 
 
 265‑A/2001, de 28 de Setembro), constitui irregularidade prevista no artigo 
 
 123.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, que se sana se não for arguida no 
 prazo aí cominado; e, consequentemente,
 
                b) Negar provimento ao recurso, confirmando a decisão recorrida, 
 na parte impugnada.
 
                Custas pelo recorrente, fixando‑se a taxa de justiça em 20 
 
 (vinte) unidades de conta.
 Lisboa, 8 de Março de 2006.
 Mário José de Araújo Torres 
 Maria Fernanda Palma
 Paulo Mota Pinto
 Benjamim Silva Rodrigues
 Rui Manuel Moura Ramos