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Processo n.º 809/04
 
 2.ª Secção
 Relator:– Conselheiro Paulo Mota Pinto
 
  
 
  
 Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:
 
  
 I. Relatório
 
 1.Em 22 de Abril de 2004 A. deduziu oposição, na secretaria judicial de injunção 
 do Porto, nos autos de injunção movida por B., S.A.. Porém, tal oposição não foi 
 admitida com fundamento em extemporaneidade.
 Reagiu a requerida apresentando reclamação em que, além do mais, suscitou a 
 inconstitucionalidade do “artigo 25.º, n.º 4, da Lei n.º 30-E/2000, de 20 de 
 Dezembro, na interpretação de que compete ao requerente do apoio judiciário 
 informar o Tribunal do pedido de apoio judiciário formulado para efeitos de 
 interrupção de prazo em curso”. Por despacho de 12 de Maio de 2004 tal 
 reclamação foi indeferida porque “a providência de injunção foi devolvida à 
 requerente no dia 18/12/04” (ou seja, cerca de dois meses antes da apresentação 
 da oposição da ré) com a competente fórmula executória.
 
 2.Intentou então a requerida recurso para o Tribunal Constitucional, que foi 
 admitido, e no qual apresentou alegações que encerravam com as seguintes 
 conclusões:
 
 1.ª A recorrente foi notificada em 23 de Janeiro de 2004, para no prazo de 15 
 dias pagar ou deduzir oposição ao pedido contra ela formulado, através de uma 
 providência de injunção.
 
 2-ª Em 30 de Janeiro de 2004, a recorrente entregou nos Serviços de Segurança 
 Social requerimento a solicitar o pedido de apoio judiciário.
 
 3.ª A recorrente não tinha sido informada nos Serviços de Segurança Social onde 
 se dirigiu para formular o pedido de apoio judiciário e também não constava nem 
 do impresso que preencheu nos Serviços da Segurança Social nem da notificação 
 recebida da Secretaria-Geral de Injunção do Porto, de que devia juntar aos autos 
 documento comprovativo da apresentação do pedido de apoio judiciário para se 
 interromper o prazo que estava em curso. 
 
 4.ª Por carta datada de 29 de Março de 2004, foi a recorrente informada da 
 advogada que lhe tinha sido nomeada e também por carta datada desse mesmo dia 
 foi a advogada informada de que tinha sido nomeada patrona oficiosa à 
 recorrente, com a advertência de que com aquela notificação, se reiniciava o 
 prazo judicial que estava em curso. 
 
 5.ª Em 22 de Abril de 2004, foi entregue na Secretaria-geral de Injunção o 
 requerimento de oposição à injunção. 
 
 6.ª A sua junção foi considerada manifestamente extemporânea e o requerimento de 
 oposição foi devolvido à recorrente. 
 
 7.ª A recorrente reclamou desse despacho, no entanto, não obstante os argumentos 
 apresentados, uma vez que a providência de injunção tinha sido devolvida à 
 recorrida B., S.A. no dia 18 de Fevereiro de 2004, foi a reclamação, sem mais, 
 indeferida. 
 
 8.ª O artigo 25.º, n.º 4, da Lei n.º 30-E/2000, de 20 de Dezembro, na 
 interpretação de que compete ao requerente do apoio judiciário, informar o 
 Tribunal do pedido de apoio formulado para efeitos de interrupção de prazo em 
 curso, é inconstitucional por violação do artigo 20.º da Constituição da 
 República Portuguesa.”
 Cumpre apreciar e decidir.
 II. Fundamentos
 
 3.A questão a apreciar nos presentes autos é a da constitucionalidade do artigo 
 
 25.º, n.º 4, da Lei n.º 30-E/2000, de 20 de Dezembro, na interpretação de que 
 compete ao requerente do apoio judiciário informar o tribunal do pedido de apoio 
 judiciário formulado.
 
 É apenas este problema de constitucionalidade normativa que compete a este 
 Tribunal apreciar, e já não as questões de apurar, quer se sobre os serviços da 
 segurança social recaia, ou não, o dever de informar a recorrente daquele seu 
 
 ónus de comunicar ao tribunal o pedido de apoio judiciário formulado, quer como 
 haveria tal dever de ser cumprido (por exemplo, mediante indicação nesse sentido 
 constante do formulário a preencher para pedir o apoio judiciário), quer, ainda, 
 se, no caso concreto, a recorrente foi, ou não, efectivamente informada de que 
 sobre ela recaia esse ónus.
 Na apreciação da constitucionalidade da norma em causa terá, pois, de 
 abstrair-se da existência, ou não, de um tal dever específico de informação e do 
 seu cumprimento (e da forma necessária para tal cumprimento) no caso concreto.
 De todo o modo, pode notar-se que, no formulário preenchido pela recorrente, 
 imediatamente antes da assinatura, se encontra a seguinte afirmação impressa: 
 
 “Declaro que tomei conhecimento de que devo entregar cópia do presente 
 requerimento no tribunal onde decorre a acção, no prazo que me foi fixado na 
 citação/notificação” (fls. 36 dos autos).
 
 4.Ora, questão semelhante à que está em causa no presente recurso – repete-se, 
 apenas a da conformidade com a Constituição da norma do artigo 25.º, n.º 4, da 
 Lei n.º 30-E/2000, de 20 de Dezembro, na interpretação indicada – foi já 
 apreciada por este Tribunal.
 Assim, sobre a norma impugnada (e embora a propósito da não suspensão da 
 instância em processo de execução sumária) escreveu-se no acórdão n.º 98/2004 
 
 (publicado em Acórdãos do Tribunal Constitucional, 58.º vol., pp. 487-492):
 
 «3 – Dispõe o artigo 25.º, n.º 4, da Lei n.º 30-E/2000:
 
 “Quando o pedido de apoio judiciário é apresentado na pendência de acção 
 judicial e o requerente pretende a nomeação de patrono, o prazo que estiver em 
 curso interrompe-se com a junção aos autos do documento comprovativo da 
 apresentação do requerimento com que é promovido o procedimento administrativo.”
 Foi esta disposição que o acórdão recorrido interpretou no sentido de que 
 compete ao interessado, requerente do apoio judiciário para nomeação de patrono, 
 a junção aos autos do documento comprovativo de apresentação do requerimento de 
 apoio judiciário, para efeitos de interrupção do prazo em curso.
 Estando fora dos poderes de cognição deste Tribunal sindicar o acerto de uma tal 
 interpretação no estrito plano do direito infraconstitucional, a questão a 
 decidir, no presente recurso, é tão só a de saber se a norma ínsita no citado 
 preceito da Lei n.º 30-E/2000, com aquela interpretação, ofende a Constituição, 
 maxime o disposto no artigo 20.º, n.º 1, da CRP.
 E a resposta – adiante-se já – é negativa.
 O instituto do apoio judiciário visa obstar a que, por insuficiência económica, 
 seja denegada justiça aos cidadãos que pretendem fazer valer os seus direitos 
 nos tribunais, decorrendo, assim, a sua criação do imperativo constitucional 
 plasmado no artigo 20.º, n.º 1, da Constituição.
 Não basta, obviamente, para cumprir tal imperativo, a mera existência do 
 referido instituto no nosso ordenamento; impõe-se que a sua modelação seja 
 adequada à defesa dos direitos, ao acesso à Justiça, por parte daqueles que 
 carecem dos meios económicos suficientes para suportar os encargos que são 
 inerentes à instauração e desenvolvimento de um processo judicial, 
 designadamente custas e honorários forenses.
 Nesta conformidade, há-de a lei estabelecer, designadamente, medidas que, no 
 plano da tramitação processual (se o pedido é formulado na pendência de um 
 processo), acautelem a defesa dos direitos do requerente do apoio, em particular 
 no que concerne aos prazos em curso.
 Tais medidas impõem-se tanto mais quanto o pedido de apoio visa a nomeação de 
 patrono, uma vez que, desacompanhada de mandatário forense, a parte não dispõe 
 de meios para, no processo, defender (ou defender adequadamente) os seus 
 direitos.
 
 É, aliás, essa a razão do disposto no artigo 25.º, n.º 4, da Lei n.º 30-E/2000, 
 ao determinar, nos casos de pedido de nomeação de patrono, na pendência de acção 
 judicial, a interrupção dos prazos em curso com a junção aos autos do documento 
 comprovativo do requerimento de apoio judiciário naquela modalidade.
 A exigência de documentação do pedido compreende-se uma vez que, no regime 
 instituído pela Lei n.º 30-E/2000, os procedimentos tendentes à concessão do 
 apoio, em processos cíveis, correm nos serviços de segurança social (artigo 
 
 21.º); e seria inaceitável e comprometedor da segurança jurídica a indefinição 
 do decurso dos prazos processuais que resultaria, fatalmente, da falta dessa 
 documentação – que assim se impõe –, tendo em conta o efeito interruptivo dos 
 prazos, decorrente da apresentação do pedido.
 Mas, sendo assim, a questão de constitucionalidade está em saber se pôr a cargo 
 do requerente da nomeação de patrono o acto de dar a conhecer e documentar no 
 processo a apresentação do pedido, para efeitos de interrupção do prazo em 
 curso, constitui um ónus que compromete (ou compromete desproporcionadamente) o 
 direito de acesso à justiça por parte dos cidadãos economicamente carenciados.
 Sem dúvida que se poderia congeminar outro sistema, fazendo, p. ex.., recair 
 sobre os serviços de segurança social o dever de darem a conhecer, de imediato, 
 nos pertinentes processos judiciais os pedidos de nomeação de patrono. Mas, 
 independentemente da praticabilidade dessa ou de outras alternativas, a questão 
 
 – repete-se – é a de saber se o regime, tal como o acórdão recorrido o 
 interpretou, ofende a Constituição.
 Ora, não se considera gravoso para o requerente, em termos de lesar o seu 
 direito de aceder à Justiça, exigir que ele documente nos autos a apresentação 
 do requerimento de apoio judiciário nos serviços de segurança social, no prazo 
 judicial em curso, para que este se interrompa.
 Trata-se, com efeito, de uma diligência que não exige quaisquer conhecimentos 
 jurídicos e que, portanto, a parte pode praticar por si só, com o mínimo de 
 diligência a que, como interessada, não fica desobrigada pelo facto de se 
 encontrar numa situação de carência económica.
 Note-se, aliás – o que não é despiciendo – que, no modelo de impresso aprovado, 
 em que o requerente inscreve o seu pedido, consta uma declaração, a subscrever 
 pelo interessado, no sentido de que tomou conhecimento de que deve apresentar 
 cópia do requerimento no tribunal onde decorre a acção, no prazo que foi fixado 
 na citação/notificação. Com o que nem sequer pode legitimamente invocar o 
 desconhecimento daquela obrigação.
 A protecção constitucionalmente garantida pelo artigo 20.º, n.º 1, da CRP aos 
 cidadãos que carecem de meios económicos para custear os encargos inerentes à 
 defesa jurisdicional dos seus direitos não é, pois, afectada pela norma contida 
 no artigo 24.º, n.º 5, da Lei n.º 30-E/2000, na interpretação dada pelo acórdão 
 recorrido.»
 Esta decisão, cuja fundamentação em parte se transcreveu, foi reiterada no 
 acórdão n.º 285/2005 (disponível em www.tribunalconstitucional.pt), onde se 
 acrescentou:
 
 «Não se trata – como se assinalou no Acórdão n.º 98/2004 – de apurar se a 
 interpretação normativa reputada inconstitucional é a mais correcta ao nível do 
 direito ordinário ou se a solução legislativa em causa (mantida, aliás, no n.º 4 
 do artigo 24.º da Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho, que substituiu a Lei n.º 
 
 30‑E/2000) é a mais adequada, designadamente face à possibilidade de se 
 instituir a obrigação de comunicação oficiosa por parte dos serviços de 
 Segurança Social ao tribunal identificado como aquele onde pende a causa para 
 que se solicita a nomeação de patrono da apresentação do requerimento de 
 concessão de apoio judiciário (recorde‑se que os artigos 26.º, n.º 4, da Lei n.º 
 
 30‑E/2000 e 25.º, n.º 4, da Lei n.º 34/2004 impõem aos serviços da Segurança 
 Social o envio mensal de relação dos pedidos de protecção jurídica tacitamente 
 deferidos a diversas entidades, entre elas, “se o pedido envolver a nomeação de 
 patrono e se o requerimento tiver sido apresentado na pendência de acção 
 judicial, ao tribunal em que esta se encontra pendente”), assim obviando ao 
 inconveniente de manter durante um período indefinido de tempo o tribunal da 
 causa no desconhecimento da apresentação do pedido de nomeação de patrono, com 
 todos os riscos de insegurança jurídica e de desenvolvimento de actividade 
 judicial inútil que daí derivam.»
 
 É esta a jurisprudência, no sentido da inexistência de inconstitucionalidade na 
 norma impugnada, que ora se reitera, conduzindo a uma decisão de não provimento 
 do presente recurso.
 III. Decisão
 Pelos fundamentos expostos, o Tribunal Constitucional decide:
 
  
 a)   Não julgar inconstitucional o artigo 25.º, n.º 4, da Lei n.º 30-E/2000, de 
 
 20 de Dezembro, na interpretação de que compete ao requerente do apoio 
 judiciário informar o tribunal do pedido de apoio judiciário formulado;
 b)   Consequentemente, negar provimento ao presente recurso e condenar a 
 recorrente em custas, com 20 (           vinte) unidades de conta de taxa de 
 justiça.
 Lisboa, 18 de Janeiro de 2006
 Paulo Mota Pinto
 Benjamim Rodrigues
 Mário José de Araújo Torres
 Maria Fernanda Palma
 Rui Manuel Moura Ramos