 Imprimir acórdão
 Imprimir acórdão   
			
Processo n.º 761/06
 
 2.ª Secção
 Relator: Conselheiro Mário Torres 
 
  
 
  
 
           Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional,
 
  
 
  
 
                                  1. Relatório
 
                                  Em 26 de Novembro de 2001, A. foi constituído 
 arguido em processo de inquérito contra ele e outros instaurado, tendo prestado 
 termo de identidade e residência, no qual indicou como residência a Rua ……, 
 Damaia, sendo‑lhe, no acto, dado expresso conhecimento da obrigação, entre 
 outras, de não mudar de residência nem dela se ausentar por mais de cinco dias, 
 sem comunicar a nova residência ou lugar onde possa ser encontrado, e de que as 
 posteriores notificações seriam feitas por via postal simples para a morada que 
 indicou, excepto se comunicasse uma outra, através de requerimento entregue ou 
 remetido por via postal registada à secretaria onde os autos se encontrassem a 
 correr termos nesse momento (fls. 519).
 
                                  Findo o inquérito, o Ministério Público deduziu 
 acusação contra B., L.da, C., D. e A., imputando a este último arguido, como 
 co‑autor, e na qualidade de gerente efectivo e representante legal da sociedade 
 arguida, a prática de dois crimes continuados de abuso de confiança fiscal 
 
 (fls. 783 a 799).
 
                                  Por despacho de 15 de Abril de 2004 do Juiz do 
 
 1.º Juízo Criminal de Lisboa foi a acusação recebida e designado o dia 6 de 
 Abril de 2005 para a realização da audiência de julgamento, logo se consignando 
 que, em caso de adiamento, a audiência se realizaria em 8 de Junho de 2005 (fls. 
 
 813).
 
                                  Na audiência realizada naquela primeira data, o 
 arguido A. faltou por motivo de doença, pelo que foi determinado, nos termos do 
 artigo 333.º, n.º 1, do Código de Processo Penal (CPP), que os autos aguardassem 
 a segunda data já designada para julgamento (fls. 929‑930).
 
                                  Em 20 de Abril de 2005, o referido arguido 
 apresentou requerimento do seguinte teor (fls. 972):
 
  
 
                  “A., arguido nos autos à margem referenciados, tendo 
 solicitado o adiamento da audiência de julgamento para a segunda data, a 
 realizar no dia 8 de Junho de 2005, vem pela presente requerer respeitosamente, 
 nos termos do artigo 334.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, que a audiência 
 se realize na sua ausência, em virtude de o arguido possuir residência no 
 estrangeiro.
 
                  Na verdade, o arguido reside actualmente em Espanha, possuindo 
 apenas a morada em Portugal, quer para os efeitos do presente processo, quer 
 quando cá se desloca, onde mantém pessoa habilitada a receber todas as 
 notificações na sua ausência.
 
                  Mais declara que aceita que as audiências se realizem na sua 
 ausência.”
 
  
 
                                  Por despacho judicial de 22 de Abril de 2005 
 
 (fls. 978), foi deferido o precedente requerimento, determinando‑se o 
 julgamento do referido arguido na sua ausência, nos termos do disposto no artigo 
 
 334.º, n.º 2, do CPP.
 
                                  Em 8 de Junho de 2005, procedeu‑se à audiência 
 de julgamento, à qual faltou o mandatário dos arguidos singulares, tendo‑lhes 
 sido nomeada defensora a advogada que já havia sido nomeada defensora da 
 sociedade arguida (fls. 1001‑1003), tendo, em audiência realizada em 20 de Junho 
 de 2005 (acta de fls. 1041), com a presença da referida defensora, sido lida a 
 sentença, que condenou o arguido A., como co‑autor de um crime de abuso de 
 confiança fiscal, na forma continuada, previsto e punido pelos artigos 105.º, 
 n.º 5, do Regime Geral das Infracções Tributárias, aprovado pela Lei n.º 
 
 15/2001, de 5 de Junho (RGIT), e 30.º, n.º 2, e 79.º do Código Penal, na pena de 
 
 12 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 5 anos, 
 condicionada ao pagamento ao Estado das quantias de imposto em causa (fls. 
 
 1013‑1039).
 
                                  Esta sentença foi notificada no próprio acto à 
 defensora dos arguidos (fls. 1041), depositada na secretaria na mesma data (20 
 de Junho de 2005 – fls. 1040), e notificada, por via postal simples com prova de 
 depósito, aos quatro arguidos, através de cartas expedidas em 24 de Junho de 
 
 2005 (fls. 1042 a 1045).
 
                                  Em 23 de Dezembro de 2005, o mandatário do 
 arguido A. apresentou requerimento (fls. 1083), em que, aduzindo ter sido 
 notificado da conta de custas, “de onde deduz com relativa certeza que terá já 
 sido realizado julgamento e proferida sentença”, requer, “uma vez que foi o 
 arguido julgado na sua ausência, nem tendo estado sequer representado pelo seu 
 advogado constituído nos autos”, que “lhe seja notificada pessoalmente, ou 
 extraída cópia que lhe seja entregue, da sentença proferida nos presentes 
 autos”.
 
                                  Este requerimento foi indeferido por despacho 
 judicial de 4 de Janeiro de 2006 (fls. 1086), do seguinte teor:
 
  
 
                  “O arguido A. foi julgado na ausência, a requerimento seu, nos 
 termos do artigo 334.º, n.º 2, do Código de Processo Penal (cf. requerimento de 
 fls. 972 e despacho de fls. 978).
 
                  A sentença proferida nos autos, e já transitada em julgado, foi 
 devidamente notificada ao ilustre defensor oficioso nomeado para o efeito, dada 
 a ausência do ilustre advogado constituído, advogado este regularmente 
 notificado (cf. fls. 929 e 930), e foi regularmente notificada ao arguido (cf. 
 fls. 1050).
 
                  Assim sendo, nada mais há que notificar relativamente à 
 sentença proferida, que, como se disse, transitou em julgado.”
 
  
 
                                  Notificado deste despacho, o referido arguido 
 veio requerer a sua “aclaração”, nos seguintes termos:
 
  
 
 “1. Resulta do douto despacho de V. Ex.a produzido a fls. 1086 que a sentença já 
 transitou em julgado e que foi devidamente notificada ao ilustre defensor 
 oficioso nomeado para o efeito, bem como regularmente notificada ao arguido (cf. 
 fls. 1050).
 
 2. Compulsados os autos verifica-se que a fls. 1050 se encontra uma prova de 
 depósito postal.
 
 3. Não se encontrando em qualquer parte do processo prova da notificação 
 pessoal ao arguido, e não decorre do artigo 334.º do CPP que o mesmo seja 
 dispensável, nem no caso em que o mesmo é julgado na ausência a seu pedido.
 
 4. Por outro lado, consta do artigo 113.º, n.º 9, do CPP que «as notificações 
 do arguido, do assistente e das partes civis podem ser feitas ao respectivo 
 defensor ou advogado. Ressalvam-se as notificações respeitantes à acusação, à 
 decisão instrutória, à designação de dia para julgamento e à sentença ...».
 
 5. Mais consta do disposto no artigo 113.º, n.º 1, alínea a), que as 
 notificações se fazem por contacto pessoal com o notificando e no lugar em que 
 este for encontrado; c) via postal simples, por meio de carta ou aviso, nos 
 casos expressamente previstos.
 
 6. Não é, nem podia ser o caso de notificação da sentença um caso especial, em 
 que se permita a notificação por carta depositada na caixa postal, pois 
 lembre‑se que está em causa uma decisão que determina a privação de liberdade.
 
 7. Requer‑se assim que V. Ex.a esclareça se, quando refere por duas vezes no 
 despacho em crise que a sentença transitou em julgado e que foi regularmente 
 notificada ao arguido, o tribunal tem conhecimento da forma utilizada para essa 
 notificação e se a considera válida.
 
 8. Caso entenda o Tribunal que se encontra praticado com regularidade a 
 notificação ao arguido, então pela presente se arguiu a inconstitucionalidade do 
 despacho em crise, bem como a inconstitucionalidade do acto de notificação da 
 sentença ao arguido, por ofensa da lei fundamental, na sua norma contida no 
 artigo 32.º, n.ºs 1, 3 e 7, da CRP, sem prejuízo de outro enquadramento que se 
 vier a apurar aplicável.”
 
  
 
                                  Esta pretensão foi indeferida por despacho 
 judicial de 16 de Janeiro de 2006 (fls. 1090), onde se consignou:
 
  
 
                  “O arguido A. prestou termo de identidade e residência, a fls. 
 
 519, onde ficou advertido de que «as posteriores notificações serão feitas por 
 via postal simples (…)».
 
                  A sentença dos autos foi notificada ao referido arguido por via 
 postal simples com prova de depósito (cf. fls. 1045 e 1050).
 
                  Como decorre do despacho de fls. 1086, o tribunal considerou e 
 considera que a sentença foi regularmente notificada ao arguido, pelo meio 
 acima aludido.
 
                  Nestes termos, e face ao requerido a fls. 1088 e 1089, se 
 aclara o despacho de fls. 1086.
 
                  Dos despachos e das sentenças podem ser interpostos recursos, e 
 nestes podem suscitar‑se questões de inconstitucionalidade. O que não tem 
 cabimento processual é arguir a inconstitucionalidade nos termos em que é feita 
 na parte final de fls. 1089.
 
                  Assim, e nessa parte, nada há a decidir ou ordenar.”
 
  
 
                                  Do despacho que indeferiu a pretensão de 
 notificação pessoal da sentença interpôs o dito arguido recurso para o Tribunal 
 da Relação de Lisboa, suscitando na respectiva motivação (fls. 1097‑1109), além 
 do mais, a questão da inconstitucionalidade, “por violação do artigo 32.º, nºs 1 
 e 6, da CRP, [d]os artigos 113.º, n.º 9, 334.º, n.º 6, e 373.º, n.º 3, todos do 
 CPP, quando interpretados no sentido de que o arguido que não esteve presente na 
 audiência de julgamento, nem na audiência de leitura de sentença, pudesse ser 
 notificado na pessoa do seu defensor ou por qualquer outro meio que não a 
 notificação pessoal” (conclusão XIX), pelo que “o acto de notificação da 
 sentença ao recorrente, por carta depositada na caixa postal, está ferido de 
 inconstitucionalidade, por ofensa da Lei Fundamental, na sua norma contida no 
 artigo 32.º, n.ºs 1 e 6, da CRP” (conclusão XXIII).
 
                                  Por acórdão de 11 de Julho de 2006 (fls. 1192 a 
 
 1217), o Tribunal da Relação de Lisboa negou provimento ao recurso, por 
 fundamentos assim sintetizados:
 
  
 
                  “6.5 – Em conclusão:
 
                  Nos autos, o arguido estava ciente de que o julgamento ia ser 
 realizado em determinada data.
 
                  Foi o arguido que, exercendo um direito que a lei lhe concede, 
 consentiu que a audiência fosse realizada na sua ausência.
 
                  E fê‑lo cerca de dois meses antes dessa data.
 
                  Sujeitou‑se assim à disciplina processual penal nessa matéria 
 expressamente regulada no artigo 334.º.
 
                  Nem nessa norma, nem do cotejo das demais normas processuais 
 penais resulta a obrigação de se proceder à notificação pessoal da sentença ao 
 recorrente, quando consentiu que o julgamento se realizasse na sua ausência.
 
                  Essa obrigação não está prevista, desde logo porque se torna 
 manifesto que o arguido está bem ciente da fase processual em que o processo se 
 encontra, e afinal mantém todos os direitos de defesa que a lei lhe confere.
 
                  Ao arguido, nessas circunstâncias, mostra‑se óbvio que o 
 processo correrá os termos normais.
 
                  Sabe o arguido que a seguir à realização do julgamento, é 
 proferida sentença.
 
                  O arguido tem defensor constituído ou nomeado pelo Tribunal.
 O arguido prestou TIR, e sabe que qualquer notificação a si dirigida relativa ao 
 processo segue por carta simples para a morada por ele indicada.
 No requerimento por si apresentado a consentir que a audiência fosse realizada 
 na sua ausência, explicitou bem que mantinha essa morada em Portugal, além do 
 mais, em função do TIR.
 
                  Sabia assim que as notificações aí lhe eram dirigidas, não 
 obstante estar a residir no estrangeiro (cuja morada nunca indicou nos autos).
 
                  Essa é aliás uma das consequências da prestação do TIR por si 
 assinado, tal como preceitua o artigo 196.º.
 
                  Afinal, através do defensor (que esteve presente no julgamento 
 e na leitura da sentença, logo dela notificado) e/ou por si próprio, o arguido 
 tem ao seu alcance todos os meios legais que lhe permitem conhecer o teor da 
 sentença que se segue à realização do julgamento.
 
                  Por isso, a notificação operada nos termos contestados, não 
 diminui, por qualquer forma, as garantias de defesa que a lei acautela.
 Em nosso entender, essas considerações são aplicáveis ao caso em que um arguido 
 
 – o recorrente –, está ciente da data designada para julgamento e consente a sua 
 realização na sua ausência, pelo que em nada se mostram beliscados os seus 
 direitos constitucionais e processuais, não se considerando inconstitucionais as 
 normas por ele invocadas, uma vez que foram feitas as diligências que a isso 
 obstaram, e pelo recorrente consentidas.”
 
  
 
                                  É contra este acórdão que vem interposto, pelo 
 mesmo arguido, o presente recurso, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 
 
 70.º da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal 
 Constitucional, aprovada pela Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, e alterada, 
 por último, pela Lei n.º 13‑A/98, de 26 de Fevereiro (LTC), pretendendo ver 
 apreciada a inconstitucionalidade, face ao artigo 32.º, n.ºs 1 e 6, da 
 Constituição da República Portuguesa (CRP), das normas constantes dos artigos 
 
 113.º, n.º 9, 334.º, n.º 6, e 373.º, n.º 3, do CPP [por manifesto lapso, no 
 requerimento de interposição de recurso, mencionou “CPC”], interpretados no 
 sentido de que o arguido que não esteve presente na audiência de julgamento, nem 
 na audiência de leitura da sentença, pudesse considerar‑se da mesma notificado 
 na pessoa do seu defensor ou por qualquer meio que não seja a notificação 
 pessoal.
 
                                  Neste Tribunal, o recorrente apresentou 
 alegações (fls. 1231‑1245), no termo das quais formulou as seguintes conclusões:
 
  
 
                  “I – O douto acórdão de que ora se recorre pronunciou‑se pela 
 não inconstitucionalidade da interpretação das normas constantes dos artigos 
 
 113.º, n.º 9, 334.º, n.º 6, e 373.º, n.º 3, todos do CPP [por lapso, referiu 
 CPC], quando interpretados no sentido de que o arguido que não esteve presente 
 na audiência de julgamento, nem na audiência de leitura de sentença pudesse 
 considerar‑se da mesma notificado na pessoa do seu defensor ou por qualquer meio 
 que não seja a notificação pessoal.
 II – Somente, baseando‑se na convicção de que, com a prestação de TIR, o arguido 
 estabelece um acordo com o Tribunal no sentido de que, a partir dessa data 
 
 «qualquer notificação a si dirigida relativa ao processo, segue por carta 
 simples para a morada por ele indicada».
 III – “Por isso a notificação operada nos termos contestados, não diminui, por 
 qualquer forma, as garantias de defesa que a lei acautela».
 IV – O artigo 373.º, n.º 3, do CPP importa um encurtamento inadmissível das 
 possibilidades de defesa do recorrente, incluindo o recurso, na medida em que 
 não se assegura, de modo efectivo, a possibilidade daquele organizar a sua 
 defesa.
 V – Não decorre do artigo 334.º do CPP que a notificação pessoal da sentença 
 seja dispensável no caso em que o arguido, ora recorrente, é julgado na ausência 
 com base no n.º 2 desse mesmo dispositivo legal.
 VI – O artigo 113.º, n.º 9, do mesmo diploma legal dispõe que as sentenças 
 deverão ser notificadas na pessoa do arguido, sem no entanto fazer referência à 
 modalidade em que essa notificação deverá ser realizada.
 VII – Mais consta do artigo 113.º, n.º 1, alíneas a) e c), do mesmo diploma 
 legal que as notificações se fazem por contacto pessoal com o notificado ou por 
 via postal simples, apenas nos casos expressamente previstos.
 VIII – A notificação da sentença não é uma situação especial em que se permita a 
 notificação por carta depositada na caixa postal, pois está em causa uma decisão 
 que determina a privação da liberdade.
 IX – Ora, o facto de o recorrente ter prestado TIR tal não significa por si só 
 que o mesmo não tenha de ser notificado pessoalmente da sentença, uma vez que 
 foi julgado na ausência, ao abrigo do artigo 334.º, n.º 2, do CPP.
 X – A exigência da notificação pessoal, nestes casos, justifica‑se por razões de 
 segurança e celeridade processuais na comunicação da sentença condenatória e de 
 protecção constitucional do direito de defesa, incluindo o direito ao recurso 
 previsto no artigo 32.º, n.ºs 1 e 6, da CRP.
 XI – Assim, são inconstitucionais, por violação do artigo 32.º, n.ºs 1 e 6, da 
 CRP, os artigos 113.º, n.º 9, 334.º, n.º 6, e 373.º, n.º 3, todos do CPP, quando 
 interpretados no sentido de que o arguido que não esteve presente na audiência 
 de julgamento, nem na audiência de leitura de sentença pudesse considerar‑se da 
 mesma notificado na pessoa do seu defensor ou por qualquer meio que não seja a 
 notificação pessoal.
 XII – Devendo as mencionadas disposições ser interpretadas no sentido de 
 consagrarem a necessidade de a decisão condenatória ser pessoalmente notificada 
 ao arguido ausente, não podendo, enquanto esta notificação não for efectuada, 
 contar o prazo para ser interposto recurso.
 XIII – Pelo que, tem‑se como necessária a notificação pessoal do recorrente, 
 bem como é impossível a notificação da sentença por via postal, em virtude da 
 ausência deste.
 XIV – Face ao exposto, deverá ser declarada a inconstitucionalidade das normas 
 constantes dos artigos 113.º, n.º 6, 334.º, n.º 6, e 373.º, n.º 3, todos do CPP, 
 nos termos supra mencionados.”
 
  
 
                                  O representante do Ministério Público neste 
 Tribunal contra‑alegou, concluindo:
 
  
 
 “1 – Não são inconstitucionais as normas dos artigos 113.º, n.º 9, 334.º, n.º 6, 
 e 373.º, n.º 3, todos do Código de Processo Penal, ao serem interpretadas no 
 sentido de bastar a notificação ao arguido da sentença condenatória, por via 
 postal simples, para a morada que conste do termo de identidade e residência, 
 validamente prestado, quando não esteve presente na audiência de julgamento, 
 sabendo da sua realização, que previamente solicitara que se realizasse na sua 
 ausência, não tendo igualmente estado presente na leitura da sentença, a qual 
 foi devidamente notificado ao seu defensor presente no acto. 
 
 2 – Termos em que não deverá proceder o presente recurso.”
 
  
 
                                  Tudo visto, cumpre apreciar e decidir.
 
  
 
                                  2. Fundamentação
 
                                  Como este Tribunal recordou no Acórdão n.º 
 
 545/2006, desta 2.ª Secção, onde se procedeu a desenvolvida menção da 
 jurisprudência precedente, tendo por objecto a questão da constitucionalidade de 
 normas relativas ao início do prazo para interposição de recurso em processo 
 penal, “o critério seguido nessa jurisprudência tem sido o de que tal prazo só 
 se pode iniciar quando o arguido (assistido pelo seu defensor), actuando com a 
 diligência devida, ficou em condições de ter acesso ao teor, completo e 
 inteligível, da decisão impugnanda, e, nos casos em que pretenda recorrer 
 também da decisão da matéria de facto e tenha havido registo da prova produzida 
 em audiência, a partir do momento em que teve (ou podia ter tido, actuando 
 diligentemente) acesso aos respectivos suportes, consoante o método de registo 
 utilizado (escrita comum, meios estenográficos ou estenotípicos, gravação 
 magnetofónica ou audio‑visual)”.
 
                                  Aplicando este critério ao caso ora em apreço, 
 constata‑se que o arguido – que, através da prestação de termo de identidade e 
 residência, assumira a obrigação de não mudar de residência nem dela se ausentar 
 por mais de cinco dias, sem comunicar a nova residência ou lugar onde pudesse 
 ser encontrado, e ficara ciente de que as posteriores notificações seriam feitas 
 por via postal simples para a morada que indicara, excepto se comunicasse uma 
 outra, através de requerimento entregue ou remetido por via postal registada à 
 secretaria onde os autos se encontrassem a correr termos nesse momento – teve 
 conhecimento da segunda data designada para a audiência de julgamento (tornada 
 operativa por ele ter faltado, por motivo de doença, à data primeiramente 
 fixada) e tomou a iniciativa de requerer que a mesma se processasse na sua 
 ausência, invocando estar a residir no estrangeiro, expressamente referindo no 
 respectivo requerimento que mantinha a residência indicada no termo de 
 identidade e residência, onde “mant[inha] pessoa habilitada a receber todas as 
 notificações na sua ausência”. Neste contexto, o arguido, sabendo, como sabia, 
 da data marcada para a realização do seu julgamento, devia, actuando com a 
 devida diligência, procurar inteirar‑se do que nele ocorrera, o que lhe 
 possibilitaria conhecer a data designada para a leitura da sentença. Por outro 
 lado, o arguido não questiona a efectiva realização da notificação por via 
 postal simples nem invoca que a carta não haja chegada ao destino correcto, 
 onde, como se viu, deixara pessoa habilitada a receber todas as notificações na 
 sua ausência. Isto é: o arguido não questiona que o meio de comunicação 
 utilizado pelo tribunal (via postal simples, com prova de depósito) foi apto a 
 colocar a sentença no campo da sua cognoscibilidade pelo destinatário. O que o 
 arguido sustenta é que, nesta hipótese, seria sempre exigível a notificação 
 pessoal da sentença. Mas não é esse o regime legal considerado aplicável, nem, 
 pelas razões expostas, o mesmo se mostra, no caso, capaz de afectar, de modo 
 intolerável, as garantias de defesa do arguido, constitucionalmente consagradas.
 
                                  Assinale‑se que o presente caso é distinto 
 daqueles sobre que recaíram os Acórdãos n.ºs 87/2003, 312/2005 e 422/2005:
 
                                  – o Acórdão n.º 87/2003 julgou inconstitucional 
 a norma do artigo 411.º, n.º 1, do CPP, na interpretação segundo a qual o prazo 
 para interpor recurso de acórdão de Tribunal da Relação, proferido em 
 conferência, nos termos do artigo 419.º, n.º 4, do CPP, e não em audiência (com 
 prévia convocação, para além de outros intervenientes, do defensor, de acordo 
 com o artigo 421.º, n.º 2, do mesmo Código), se conta a partir do depósito do 
 acórdão na secretaria, e não da respectiva notificação, tendo o Tribunal 
 Constitucional sublinhado que, uma vez que “nem o recorrente nem o seu defensor 
 tinham sequer conhecimento da data de realização da conferência, que não lhes 
 foi comunicada”, não lhes era exigível uma diligência que se traduziria no 
 
 “controlo cego do hipotético dia da tomada de decisão por parte do Tribunal da 
 Relação”; diferentemente, no presente caso, o arguido e respectivo mandatário 
 tinham conhecimento da data marcada para a realização da audiência de julgamento 
 e, actuando com a devida diligência, facilmente teriam conhecimento da data 
 marcada para a leitura da sentença;
 
                                  – o Acórdão n.º 312/2005 interpretou as normas 
 dos artigos 411.º, n.º 1, e 333.º, n.º 5, do CPP no sentido de que o prazo para 
 a interposição de recurso da decisão condenatória de arguido ausente se conta a 
 partir da notificação pessoal e não a partir do depósito na secretaria, mas 
 fê‑lo num caso de ausência a que eram aplicáveis os n.ºs 2, 3 e 5 do artigo 
 
 333.º, que é hipótese distinta da situação ora apreço, que se encontra regulada 
 no n.º 2 do artigo 334.º (audiência na ausência do arguido a requerimento ou com 
 o consentimento deste, por residir no estrangeiro), a que, por expressa exclusão 
 legal (“Fora dos casos previstos nos n.ºs 1 e 2”), não é aplicável o regime do 
 n.º 6 do artigo 334.º, correspondente ao n.º 5 do artigo 333.º, todos do CPP);
 
                                  – o Acórdão n.º 422/2005 julgou 
 inconstitucionais as normas constantes dos artigos 113.º, n.º 9, 411.º, n.º 1, e 
 
 335.º, n.º 5, do CPP, conjugadas com o artigo 56.º, n.º 1, alínea b), do Código 
 Penal, interpretados no sentido de que o prazo de interposição de recurso, pelo 
 condenado, de decisão que revogou a suspensão da execução de pena de prisão se 
 conta da data em que se considera efectivada a sua notificação dessa decisão 
 por via postal simples; mas fê‑lo atribuindo decisiva relevância às 
 circunstâncias de, no caso, já não subsistir o termo de identidade e residência 
 e obrigações conexas e de, tendo a decisão de revogação da suspensão da 
 execução da pena de prisão sido tomada sem prévia audição do condenado, este não 
 dispor de qualquer indicação da data em que iria ser proferida tal decisão, 
 enquanto, no presente caso, o termo de identidade e residência permanecia 
 válido e era facilmente conhecível, pelo arguido, a data da leitura da sentença.
 
                                  O presente caso regista, antes, similitude com 
 a situação versada no Acórdão n.º 378/2003, em que o Tribunal Constitucional não 
 julgou inconstitucional a norma do artigo 373.º, n.º 3, conjugado como o artigo 
 
 113.º, n.º 7 (correspondente ao actual n.º 9), do CPP, ambos na redacção dada 
 pela Lei n.º 59/98, de 25 de Agosto, interpretados no sentido de que o arguido, 
 que estivera presente na audiência de julgamento e fora notificado da data da 
 leitura da sentença, mas faltara a esta sessão de leitura, se considera 
 notificado com a leitura da sentença feita perante o primitivo defensor nomeado 
 ou perante advogado constituído. Como então se salientou, há que ter em conta, 
 por um lado, os deveres funcionais e deontológicos que impendem sobre o defensor 
 do arguido, e, por outro lado, a indiferença revelada pelo arguido, que, ciente 
 da imputação de um facto punível e da data da leitura da sentença, se 
 desinteressou de obter o seu oportuno conhecimento. Tal como nesse caso, também 
 no presente o arguido dispôs de plena oportunidade para ter acesso à decisão 
 condenatória contra si proferida, bastando que diligenciasse contactar, logo de 
 seguida à data em que bem sabia que iria realizar‑se o seu julgamento, quer o 
 seu defensor, quer a própria secretaria judicial, ao que acresce – na situação 
 ora em apreço – que nenhuma dúvida foi por ele suscitada quanto à efectiva 
 recepção, no endereço postal por ele indicado no termo de identidade e 
 residência, da carta de notificação da sentença.
 
                                  Neste contexto, não se pode afirmar que do 
 regime legal aplicado na decisão recorrida tenha resultado efectivo encurtamento 
 das garantias de defesa do arguido, em especial do seu direito de recurso.
 
  
 
                                  3. Decisão
 
                                  Em face do exposto, acordam em:
 
                                  a) Não julgar inconstitucional a norma derivada 
 dos artigos 113.º, n.º 9, 334.º, n.º 6, e 373.º, n.º 3, do Código de Processo 
 Penal, interpretados no sentido de que pode ser efectuada por via postal 
 simples, com prova de depósito, para a morada indicada no termo de identidade e 
 residência prestado pelo arguido, a notificação de sentença condenatória 
 proferida na sequência de audiência de julgamento a que o arguido, ciente da 
 data da sua realização, requerera ser dispensado de comparecer, por residir no 
 estrangeiro, sentença que foi notificada ao defensor do arguido, que esteve 
 presente na audiência de julgamento e na audiência para leitura da sentença; e, 
 consequentemente,
 
                                  b) Negar provimento ao recurso, confirmando o 
 acórdão recorrido, na parte impugnada.
 
                                  Custas pelo recorrente, fixando‑se a taxa de 
 justiça em 20 (vinte) unidades de conta.
 Lisboa, 15 de Fevereiro de 2007.
 Mário José de Araújo Torres
 Benjamim Silva Rodrigues
 Maria Fernanda Palma
 Paulo Mota Pinto
 Rui Manuel Moura Ramos