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Proc. nº 211/00 TC – 1ª Secção Rel. : Cons.º Artur Maurício 
 
  Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional 
 
 1 - G..., com os sinais dos autos, arguido no Pº nº 17/99.6 a correr termos no Tribunal da Relação de Lisboa requereu, em 4/1/200, findo o inquérito e deduzida acusação contra ele, a abertura de instrução, arguindo, do mesmo passo, a nulidade/inconstitucionalidade do inquérito com base em insuficiência de diligências essenciais à descoberta da verdade. 
 Sobre este requerimento recaiu despacho, em 7/3/200, que declarou aberta a instrução requerida pelo arguido, deferindo umas e indeferindo outras das diligências requeridas. No mesmo despacho houve pronúncia sobre a aludida arguição de nulidade/inconstitucionalidade, nos seguintes termos: 
 'O arguido suscita como questões prévias a da nulidade, por insuficiência, do inquérito (artº 120º nº 2 d) do CPP98) e daí a alegada inconstitucionalidade do mesmo (aqui por alegada grave violação das garantias de defesa – cfr. artº 32º nº 1 da CRP), em síntese, com fundamento no indeferimento da acareação entre si e as testemunhas agentes da GNR-BT A... (id. a fls. 9) e L... (id. a fls. 12) e entre estes e também o seu filho, a testemunha H... (id. a fls. 37) – cfr. fls. 42 e 4º a 52º deste seu requerimento. 
 Tais questões serão decididas, se subsistirem, no local próprio, ou seja, na decisão instrutória, como bem explicita a lei – cfr. artº 308º nº 3 do CPP/98.' 
 Deste despacho veio reclamar o arguido, sustentando em síntese que a decisão instrutória não é o local próprio para que o tribunal se pronuncie sobre a nulidade do inquérito, devendo proferir-se, de imediato, despacho sobre aquela arguição. 
 O despacho documentado a fls. 43 indeferiu a reclamação nos seguintes termos: 
 'Insiste o ora reclamante que se decida quanto às questões que no seu requerimento de abertura de instrução designou como questões prévias, da nulidade, por insuficiência, do inquérito (artº 120º nº 2 d) do CPP9) e inconstitucionalidade do inquérito (por alegada violação das garantias de defesa, consignadas no artº 32º nº 1 da CRP). 
 Ora, já no nosso despacho de 7/2/2000, se consignou que tais questões serão decididas se subsistirem, no local próprio, ou seja, na decisão instrutória, como bem explicita a lei – cfr. artº 308º nº 3 do CPP. 
 Ou seja, é manifestamente improcedente a presente reclamação ao pretender que se decidam tais questões fora da ordem que a lei processual impõe 
 – mormente o citado nº 3 do artº 308º do CPP/98. Aliás, bem se compreende que seja na decisão instrutória, a que se reporta o artº 308º, que o juiz de instrução decide as questões prévias e nulidades, apreciando então devidamente a sua repercussão na decisão da causa e, especialmente, que as decida após o debate instrutório, obrigatoriamente oral e contraditório – i.e., após a concretização do princípio do contraditório (cfr. artº 289º nº 1 do CPP98). 
 Assim, pretender (como o reclamente faz) que tais questões sejam desde já decididas, ou seja, ainda no âmbito do despacho liminar, que recebe ou rejeita o requerimento de abertura da instrução, viola, além do mais a letra e o espírito do artº 287º do CPP, onde impera o princípio da celeridade processual, que enforma, aliás, toda a instrução, 
 Indefere-se esta reclamação.' 
 
 Veio, então, o arguido interpor recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do artº 70º nº 1 alínea b) da Lei nº 28/82, da decisão 
 'de 07 de Fevereiro de 2000'. 
 No mesmo requerimento, disse o então recorrente: 
 'O recorrente, por o inquérito padecer de nulidade, porque insuficiente – cfr. artigo 120º nº 2 alínea d) do CPP – e, consequentemente, de inconstitucionalidade, por violação grave das suas garantias de defesa, consagradas no nº 1 do artigo 32º da CRP, procedeu á sua arguição, como questão prévia ao requerimento para abertura da instrução, tendo o Exmo Senhor Juiz Desembargador do Tribunal da Relação de Lisboa, em despacho de 07 de Fevereiro, protelado a respectiva decisão, para o momento da decisão instrutória, com fundamento no disposto no artº 308º nº 3 do CPP. 
 A norma constitucional que se considera violada é a vertida nos nºs 
 1 e 2 do artº 32º da Constituição da República Portuguesa. 
 A questão da inconstitucionalidade foi suscitada nos autos a 4 de Janeiro de 2000 e reiterada em reclamação apresentada a 16 do corrente'. 
 O recurso não foi admitido, conforme despacho documentado a fls. 48, nos seguintes termos: 
 'Fls. 120: o arguido pretende interpor recurso para o T, Const. de uma não decisão sobre uma inconstitucionalidade que alegou. Ora, não é admissível recurso de uma decisão, a de 7/2/2000, que não se pronunciou, antes relegou para a decisão instrutória sobre a (eventual) inconstitucionalidade do inquérito. 
 E tanto assim é que resulta claro do artº 70º nº 1 'a contrario' da Lei nº 28/82, de 15/11 (red. Leis nº 85/89 e 13-A/98) porquanto não foi aplicada a norma que se alega ser inconstitucional, nem se recusou a sua aplicação. 
 Em suma, o que é evidente é que o arguido pretende 'manipular' o processo, produzir dilações inadmissíveis. Trata-se sem dúvida, de incidente anómalo – cfr. aliás nosso despacho a folhas 116. 
 Nestes termos e por violar manifestamente o nº 1 al.b) do artº 70º da Lei nº 28/82, não se admite o recurso para o T. Constitucional. Condena-se o arguido pelo incidente anómalo em 2 (duas) Ucs – artº 84º nº 2 do Cod. Custas Judiciais. Notifique.' 
 Da não admissão do recurso vem agora deduzida reclamação, nos termos do artigo 76º nº 4 da LTC. 
 Começa o reclamante por reafirmar que 'arguiu a nulidade do inquérito, porque insuficiente, nos termos do artigo 120º nº 2 alínea d) do CPP 
 – e, consequentemente, a inconstitucionalidade, por violação grave das suas garantias de defesa e do princípio in dubio pro reo, consagrados no artigo 32º da CRP'. 
 Rebate, depois, o fundamento expresso no despacho que não tomou conhecimento daquela arguição, dizendo, entre o mais que 'a decisão que sobre a nulidade e inconstitucionalidade haveria de recair deveria ser proferida no despacho que declarou a abertura da instrução, sob pena de, a assim não suceder, ficar desprovido de sentido o princípio da economia processual, ou seja, evitar o custo da continuação desnecessária de um processo, já que as diligências mais importantes requeridas em sede de instrução – a inquirição das testemunhas indicadas pelo requerente – não foram deferidas'. 
 Conclui que 'sobre tal arguição, deverá o Tribunal Constitucional tomar conhecimento nesta fase, sob pena de serem praticados actos posteriores que afectam irremediavelmente a defesa do recorrente, designadamente eventual despacho de pronúncia sobre factos insertos na acusação e que não praticou.' 
 Assinala, por fim, que 'a não subida imediata torna o recurso absolutamente inútil, cfr, o disposto no nº 2 do artigo 734º nº 2 do CPC.' 
 O Exmo Magistrado do Ministério Público pronuncia-se no sentido do indeferimento da reclamação. 
 Cumpre decidir. 
 2 - O despacho que não admitiu o recurso fundamentou a sua decisão na não aplicação, no despacho recorrido, da norma arguida de inconstitucionalidade, não se mostrando assim preenchido um dos requisitos do recurso interposto ao abrigo do artigo 70º nº 1 alínea b) da LTC. 
 Que a aplicação da norma, arguida de inconstitucionalidade, na decisão recorrida constitui requisito de admissibilidade do recurso previsto no citado artigo 70º nº 1 alínea b) da LTC, não o questiona o recorrente – ele resulta da própria letra do preceito quando nele se diz caber recurso para o Tribunal Constitucional das decisões dos tribunais 'que apliquem norma cuja inconstitucionalidade...'. 
 A decisão da presente reclamação passa, pois e desde logo, pela resolução da questão de saber se o despacho impugnado fez aplicação da norma cuja constitucionalidade o recorrente pretende ver apreciada por este Tribunal. 
 Para tanto, impõe-se deixar claro que o despacho recorrido é o proferido em 7/2/2000, ou seja, aquele que se pronunciou sobre o requerimento de abertura de instrução e onde simultaneamente se arguia a nulidade/inconstitucionalidade do 'inquérito' realizado. 
 Ora, é incontestável que o despacho recorrido relegou expressamente para a fase da decisão instrutória a decisão sobre tal arguição, a coberto do disposto no artigo 308º nº 3 do CPP. 
 Foi, pois, a norma ínsita naquele preceito legal – e só ela – que fundamentou de direito e constituiu a rato decidendi do despacho recorrido. 
 E não menos incontestável é que não foi, certamente, essa norma a que o recorrente imputou o vício de inconstitucionalidade no requerimento de 
 4/2/2000 e que elegeu como objecto da sua impugnação para o Tribunal Constitucional. 
 Tanto basta para indeferir a presente reclamação. 
 Acresce que nem mesmo se vislumbra, no mesmo requerimento de 
 4/2/2000, a suscitação de uma qualquer questão de inconstitucionalidade normativa. 
 Na verdade, o que o recorrente suscitou foi a nulidade/inconstitucionalidade do 'inquérito', fundamentalmente por aí se não ter procedido a diligências probatórias que o recorrente reputava necessárias ou essenciais para a descoberta da verdade. 
 Ora, para se abrir a via do recurso de constitucionalidade para o Tribunal Constitucional, necessário é que, perante o tribunal recorrido, o recorrente suscite uma questão de constitucionalidade relativa a uma determinada norma (ou uma sua interpretação) de direito infra-constitucional; e não foi isso o que sucedeu. 
 Este, pois, um fundamento alternativo para julgar inadmissível o recurso e, logo, indeferida a reclamação. 
 Resta acrescentar que não compete ao Tribunal Constitucional, nesta ou noutra fase, ajuizar sobre a correcta aplicação do disposto no artigo 308º nº 
 3 do CPP, deixando-se ainda a nota de que a questão não é a de saber se o recurso para o Tribunal Constitucional deve subir imediata ou diferidamente, mas a de decidir se o recurso é ou não admissível – e disse-se já que o não é. 
 
 3 – Decisão: 
 Pelo exposto e em conclusão, decide-se indeferir a reclamação. 
 Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 15 Ucs. Lisboa, 5 de Abril de 2000 Artur Maurício Luís Nunes de Almeida José Manuel Cardoso da Costa