 Imprimir acórdão
 Imprimir acórdão   
			
Processo n.º 425/05
 
 2.ª Secção
 Relator: Conselheiro Mário Torres
 
  
 
  
 
  
 
                         Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal 
 Constitucional,
 
  
 
  
 
                         1. A., vem reclamar para a conferência, ao abrigo do 
 disposto no n.º 3 do artigo 78.º-A da Lei de Organização, Funcionamento e 
 Processo do Tribunal Constitucional, aprovada pela Lei n.º 28/82, de 15 de 
 Novembro, e alterada, por último, pela Lei n.º 13-A/98, de 26 de Fevereiro 
 
 (LTC), da decisão sumária do relator, de 17 de Junho de 2005, que decidira, no 
 uso da faculdade conferida pelo n.º 1 do mesmo preceito, não conhecer do 
 objecto do presente recurso.
 
  
 
                         1.1. A decisão sumária reclamada é do seguinte teor:
 
  
 
             “1. A., interpôs recurso para o Tribunal Constitucional – ao abrigo 
 do artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei de Organização, Funcionamento e 
 Processo do Tribunal Constitucional, aprovada pela Lei n.º 28/82, de 15 de 
 Novembro, e alterada, por último, pela Lei n.º 13-A/98, de 26 de Fevereiro 
 
 (LTC) – contra o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (STA), de 13 de 
 Abril de 2005, que negou provimento a recurso jurisdicional do acórdão do 
 Tribunal Central Administrativo Sul, de 14 de Outubro de 2003, que, por seu 
 turno, negara provimento a recurso contencioso deduzido contra o despacho do 
 Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, de 16 de Janeiro de 2002, que 
 manteve decisão proferida no procedimento de revisão da matéria tributável, 
 solicitado pela recorrente, relativo às liquidações de IRC referente aos 
 exercícios dos anos de 1995, 1996 e 1997.
 
             Nos termos do requerimento de interposição de recurso, a recorrente 
 pretende que o Tribunal Constitucional aprecie a inconstitucionalidade, por 
 violação dos artigos 103.º, n.ºs 2 e 3, 112.º, n.ºs 5 e 6, 204.º e 266.º da 
 Constituição da República Portuguesa (CRP), da interpretação, imputada ao 
 acórdão recorrido, dos artigos 91.º, n.º 4, 93.º, n.º 1, e 94.º da Lei Geral 
 Tributária, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 398/98, de 17 de Dezembro, «segundo a 
 qual o n.º 4 do artigo 91.º da Lei Geral Tributária não entrou em vigor na data 
 expressamente assinalada nos artigos 3.º e 6.º do referido Decreto-Lei que a 
 aprovou, mas só após a publicação do Aviso n.º 11 545/2000, de 25 de Julho de 
 
 2000».
 
             O recurso foi admitido pelo Conselheiro Relator do STA, decisão que, 
 como é sabido, não vincula o Tribunal Constitucional (artigo 76.º, n.º 3, da 
 LTC).
 
             E, de facto, entende-se que o presente recurso é inadmissível, o que 
 possibilita a prolação, ao abrigo do n.º 1 do artigo 78.º-A da LTC, de decisão 
 sumária de não conhecimento do respectivo objecto.
 
  
 
             2. A admissibilidade de recurso interposto ao abrigo da alínea b) do 
 n.º 1 do artigo 70.º da LTC – como é o presente – depende da verificação 
 cumulativa dos requisitos de o recorrente haver suscitado a questão de 
 inconstitucionalidade «de modo processualmente adequado perante o tribunal que 
 proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer» 
 
 (artigo 72.º, n.º 2, da LTC), e de a decisão recorrida haver aplicado, como 
 ratio decidendi, a norma (ou interpretação normativa) arguida de 
 inconstitucional.
 
             Por outro lado, no sistema português de fiscalização de 
 constitucionalidade, só podem ser objecto de controlo pelo Tribunal 
 Constitucional questões de inconstitucionalidade de normas (ou de interpretações 
 normativas), e já não questões de inconstitucionalidade de decisões judiciais ou 
 administrativas, em si mesmas consideradas.
 
             No presente caso, nas alegações do recurso interposto para o STA 
 
 (fls. 83 a 88) – peça processual onde a recorrente deveria ter suscitado a 
 questão de inconstitucionalidade – nenhuma questão de inconstitucionalidade 
 normativa é suscitada, designadamente a que foi identificada no requerimento de 
 interposição de recurso para o Tribunal Constitucional. Na verdade, o que nessa 
 peça a recorrente sustenta é que “a realização da reunião dos peritos nas 
 condições supra assinaladas [isto é, sem a prévia nomeação de um perito 
 independente, por ainda não terem sido elaboradas as respectivas listas 
 distritais, que só viriam a ser publicadas com o Aviso n.º 11 545/2000, em 25 
 de Julho de 2000], com expressa oposição do perito que representava a 
 recorrente nesse procedimento de revisão, viola, ainda [para além de configurar 
 um abuso de direito, na modalidade do venire contra factum proprium – artigo 
 
 334.º do Código Civil], o disposto no artigo 21.º do CPA, ex vi artigo 2.º, 
 alínea c), da LGT, e os artigos 91.º, n.º 2, e 92.º, n.º 1, da LGT» (conclusão 
 G), e que «ao perfilhar entendimento diverso, a decisão recorrida violou, além 
 dos citados normativos, ainda os princípios da legalidade, igualdade, 
 proporcionalidade e justiça, consagrados nos artigos 266.º da Constituição, 8.º 
 e 55.º da LGT e 3.º do CPA, pelo que deve ser revogada» (conclusão H). Isto é: o 
 que a recorrente suscita é a ilegalidade do procedimento administrativo adoptado 
 pela Administração Tributária, e a violação, directamente imputada à decisão 
 judicial recorrida, de princípios com consagração simultaneamente constitucional 
 e legal.
 
             Nenhuma questão de inconstitucionalidade normativa (isto é, nenhuma 
 questão de violação da Constituição por parte de normas jurídicas ou de 
 interpretações normativas adequadamente identificadas) tendo sido suscitada 
 pela recorrente, nem consequentemente apreciada pelo acórdão ora recorrido, o 
 presente recurso é manifestamente inadmissível.”
 
  
 
                         1.2. A reclamação apresentada pela recorrente contra a 
 decisão sumária do relator desenvolve a seguinte fundamentação:
 
  
 
             “Quando a questão da inconstitucionalidade, seja por aplicação de 
 norma declarada inconstitucional, seja, como no caso em apreço, por 
 interpretação normativa alegadamente inconstitucional, só surgiu na própria 
 decisão final recorrida e com a fundamentação dessa decisão, deve 
 reconhecer-se, salvo o devido respeito, que as partes estiveram, até então, 
 impedidas de suscitar a questão da inconstitucionalidade em causa.
 
             Nessas circunstâncias, só na fase de recurso, isto é, só no próprio 
 requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional e nos 
 termos do artigo 70.º, n.° 1, alínea b), da LTC, pode e deve ser suscitada essa 
 questão.
 
             Esta é, salvaguardado o devido respeito por diversa opinião, a 
 situação presente, pois que, no processo aqui em causa, a recorrente não dispôs 
 de outra oportunidade processual para levantar a questão de 
 inconstitucionalidade senão no requerimento de interposição de recurso, dado 
 que só no Acórdão recorrido, e não antes, foram interpretados os artigos 91.º, 
 n.º 4, 93.º, n.º 1, e 94.º da Lei Geral Tributária no sentido de que a primeira 
 das citadas normas – onde se prevê o direito de os contribuintes requererem a 
 nomeação de perito independente no procedimento de revisão da matéria 
 tributável – não entrou em vigor na data prevista nos artigos 3.° e 6.° do 
 Decreto-Lei n.° 398/98, de 17 de Dezembro, que aprovou a Lei Geral Tributária, 
 mas só após a publicação do Aviso n.° 11 545/2000, de 25 de Julho de 2000.
 
             Com efeito, essa interpretação é inédita no processo, razão pela 
 qual a questão da inconstitucionalidade dessa interpretação normativa não podia 
 ter sido suscitada pela recorrente nas alegações de recurso formuladas junto do 
 Supremo Tribunal Administrativo.
 
             Até à prolação do Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo 
 objecto de recurso, a vigência do n.° 4 do artigo 91.° da LGT e do direito à 
 nomeação de perito independente por parte dos contribuintes desde 1 de Janeiro 
 de 1999 – data da entrada em vigor da Lei Geral Tributária – não havia sido 
 posta em causa.
 
             Assim sendo, se só na fase de recurso foi possível suscitar a 
 questão da inconstitucionalidade identificada no requerimento de interposição de 
 recurso, por estar impedida de o fazer em momento processual anterior, deve 
 considerar-se, à semelhança do decidido em anteriores situações similares à 
 presente, que, para efeitos da verificação dos requisitos de admissibilidade do 
 recurso interposto ao abrigo da alínea b) do n.° 1 do artigo 70.° da LTC, a 
 questão da inconstitucionalidade foi suscitada pela recorrente durante o 
 processo – cfr. Acórdãos do Tribunal Constitucional n.ºs 461/91 – 2.ª Secção 
 
 (Proc. n.º 38/91), 291/92 – 1.ª Secção (Proc. n.º 98/92) e 136/85 – 2.ª Secção 
 
 (Proc. n.º 167/84), disponíveis no site www.dgsi.pt/atco1.nsf.
 
             Pelas razões expostas, deveria, a nosso ver, ter sido ordenado o 
 prosseguimento do recurso, decisão que, com a devida vénia, se requer.”
 
  
 
                         1.3. Notificado da apresentação desta reclamação, o 
 recorrido Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais apresentou a seguinte 
 resposta:
 
  
 
             “I – Pretende a reclamante que o recurso por ela interposto para o 
 TC e liminarmente rejeitado por Decisão Sumária seja admitido pela Conferência 
 com o fundamento de que a interpretação «inconstitucional» do n.º 4 do artigo 
 
 91.° da LGT só havia sido feita no douto Acórdão do STA, de 13 de Abril de 2005, 
 proferido no proc. n.º 368/04-30.
 
             Não tem, todavia, a reclamante razão, como abaixo mais de espaço 
 deixaremos demonstrado.
 
             II – O douto acórdão recorrido não faz qualquer interpretação do n.º 
 
 4 do artigo 91.º da LGT. Limita-se a, relativamente a ele, dizer que «Tal 
 segmento normativo não pôde, todavia, entrar em vigor em 1 de Janeiro de 1999 – 
 cf. artigo 6.° do Decreto-Lei n.º 398/98, de 17 de Dezembro – por carecido de 
 regulamentação» e, um pouco mais abaixo, «à data da reunião de peritos, em 10 
 de Março de 2000, ainda não estava em vigor o dito n.º 4 do artigo 91.° da LGT 
 
 – intervenção do perito independente».
 
             Ora, a afirmação de que uma norma não está em vigor por carência de 
 regulamentação não é ainda uma operação de interpretação da norma, mas uma 
 simples constatação de facto. Na verdade, se uma norma carece de regulamentação 
 para poder ser aplicada, enquanto a necessária regulamentação não for 
 publicada, não pode ser eficaz. Será uma norma válida mas não eficaz, dado que 
 para ser eficaz carece de regulamentação.
 
             III – Aliás, que sentido interpretativo, fixado à norma pelo douto 
 acórdão recorrido, deveria ser apreciado pelo TC e a final declarado 
 inconstitucional? Nenhum! O douto Acórdão recorrido limita-se a dizer que a 
 norma carecia de regulamentação e que, ao tempo da reunião de peritos em causa, 
 ainda não estava em vigor. Ora esta a afirmação não é a de qualquer sentido 
 interpretativo da norma. É prévio a qualquer sentido interpretativo.”
 
  
 
                         Tudo visto, cumpre apreciar e decidir.
 
  
 
                         2. Como resulta do teor da reclamação apresentada, a 
 reclamante não contesta o fundamento invocado na decisão sumária: não ter 
 suscitado, nas alegações de recurso para o STA, nenhuma questão de 
 inconstitucionalidade normativa, mas antes “a ilegalidade do procedimento 
 administrativo adoptado pela Administração Tributária, e a violação, 
 directamente imputada à decisão judicial recorrida, de princípios com 
 consagração simultaneamente constitucional e legal”.
 
                         O que a reclamante sustenta é que, no presente caso, não 
 teve oportunidade processual de suscitar, perante o tribunal recorrido, a 
 questão de inconstitucionalidade que pretende ver apreciada pelo Tribunal 
 Constitucional, “dado que só no Acórdão recorrido, e não antes, foram 
 interpretados os artigos 91.º, n.º 4, 93.º, n.º 1, e 94.º da Lei Geral 
 Tributária no sentido de que a primeira das citadas normas – onde se prevê o 
 direito de os contribuintes requererem a nomeação de perito independente no 
 procedimento de revisão da matéria tributável – não entrou em vigor na data 
 prevista nos artigos 3.° e 6.° do Decreto-Lei n.° 398/98, de 17 de Dezembro, 
 que aprovou a Lei Geral Tributária, mas só após a publicação do Aviso n.° 11 
 
 545/2000, de 25 de Julho de 2000”. Sendo “essa interpretação (...) inédita no 
 processo”, deve considerar-se atempada a suscitação da questão apenas no 
 requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional.
 
                         Não é, porém, assim.
 
                         A questão da não vigência (ou da inexequibilidade) do 
 artigo 91.º, n.º 4, da Lei Geral Tributária, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 
 
 398/98, de 17 de Dezembro (LGT) – preceito que, no âmbito do procedimento de 
 revisão da matéria colectável, confere ao sujeito passivo e à administração 
 tributária a faculdade de requererem a nomeação de perito independente, perito 
 que, nos termos do artigo 93.º, é sorteado entre as personalidades constantes de 
 listas distritais, organizadas pela Comissão Nacional de Revisão, nos termos do 
 artigo 94.º, todos da LGT –, enquanto não foram publicadas as respectivas 
 listas, é questão que vem suscitada já desde o procedimento administrativo, que 
 originou a impugnação contenciosa de que emergiu o presente recurso. Foi esse o 
 fundamento invocado pelo Serviço de Apoio às Comissões de Revisão da Direcção de 
 Finanças do Porto para a não nomeação de perito independente, entendimento 
 mantido na decisão sobre o pedido de revisão proferida pelo Director de Finanças 
 do Porto e confirmado pelo despacho do Secretário de Estado dos Assuntos 
 Fiscais, que negou provimento ao recurso hierárquico interposto daquela 
 decisão, como a recorrente refere na petição do recurso contencioso (cf. fls. 3 
 e 4 e processo instrutor).
 
                         No acórdão do Tribunal Central Administrativo, de 25 de 
 Maio de 2004, que negou provimento ao recurso contencioso, expendeu-se o 
 seguinte:
 
  
 
             “2.2. O procedimento de revisão da matéria colectável – diz n.º 1 do 
 artigo 92.º da Lei Geral Tributária – assenta num debate contraditório entre o 
 perito indicado pelo contribuinte e o perito da Administração Tributária, com a 
 participação do perito independente quando o houver, e visa o estabelecimento de 
 um acordo, nos termos da lei, quanto ao valor da matéria tributável a 
 considerar para efeitos de liquidação.
 
             O n.º 1 do artigo 93.º da mesma Lei Geral Tributária estabelece que 
 o perito independente é sorteado entre as personalidades constantes de listas 
 distritais, que serão organizadas pela Comissão Nacional, nos termos do artigo 
 
 94.º.
 
             Por sua vez, este artigo 94.º, no seu n.º 1, fala que compete à 
 Comissão Nacional de Revisão a elaboração trienal das listas distritais de 
 peritos independentes a que se refere o artigo anterior (para além de 
 contribuir para a uniformidade dos critérios técnicos utilizados na 
 determinação da matéria colectável por métodos indirectos).
 
             O n.º 3 deste artigo 94.º da Lei Geral Tributária anuncia, de sua 
 banda, que «a Comissão Nacional é constituída por representantes da 
 Direcção-Geral de Impostos, da Direcção-Geral das Alfândegas e dos Impostos 
 Especiais sobre o Consumo e da Inspecção-Geral de Finanças e por cinco 
 especialistas de reconhecido mérito que não façam parte nem tenham feito da 
 Administração Tributária nos últimos cinco anos, a nomear por despacho do 
 Ministro das Finanças, ouvido o Conselho Nacional de Fiscalidade e desde que a 
 maioria dos representantes dos contribuintes e de entidades e organizações que 
 representem categorias de interesses económicos sociais e culturais que o 
 integrem se pronuncie favoravelmente».
 
             A referida Comissão Nacional, no entanto, jamais viria a ser nomeada 
 na vigência do Código de Processo Tributário, pelo que, no âmbito deste 
 diploma, não seria ainda viabilizada a intervenção do perito independente no 
 procedimento de revisão da matéria tributável.
 
             Com efeito, essa Comissão Nacional de Revisão viria a ser nomeada 
 pelo despacho n.º 5624/99 do Ministro das Finanças, publicado no Diário da 
 República, II Série, de 19 de Março de 1999.
 
             Sendo certo que só pelo Diário da República, de 29 de Junho de 2000 
 
 (II Série, n.º 170, Aviso n.º 11 545/2000), é que foram publicadas as listas 
 distritais das personalidades, aludidas no n.º 1 do artigo 93.º da Lei Geral 
 Tributária, dentre as quais pudesse ser sorteado o perito independente referido 
 no n.º 1 do artigo 92.º da mesma Lei Geral Tributária.
 
             2.3. No caso sub judicio, a informação do entendimento, manifestado 
 no despacho do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, de 28 de Julho de 
 
 1999, de que era por falta de listas distritais de peritos independentes, a que 
 se refere o artigo 94.º da Lei Geral Tributária, que não seria nomeado perito 
 independente no caso, já a ora recorrente a tinha desde a data de 28 de 
 Fevereiro de 2000 (altura em que assinou o aviso de recepção do ofício que lhe 
 deu a conhecer tal entendimento), e só em 29 de Outubro de 2002 é que vem 
 interpor o presente recurso contencioso – cf. o processo administrativo apenso, 
 e o carimbo de entrada aposto na petição inicial.
 
             E o que é facto seguro é que «através do ofício n.º 3165, de 24 de 
 Fevereiro de 2000, do Serviço de Apoio às Comissões de Revisão da Direcção de 
 Finanças do Porto, foi comunicado à recorrente que a reunião dos peritos teria 
 lugar no dia 10 de Março de 2000, e que para apreciação do pedido de revisão 
 
 “não foi nomeado perito independente, de harmonia com o decidido por despacho de 
 SESEAF, de 28 de Julho de 1999, por falta de listas distritais de peritos 
 independentes a que se refere o artigo 94.º da Lei Geral Tributária”» – cf. a 
 própria petição inicial.
 
             Ora, é manifesto que, à data (de 10 de Março de 2000) da reunião de 
 peritos em foco, não podia estar presente o perito independente requestado, por 
 uma absoluta e, por isso, irremovível impossibilidade material de isso 
 acontecer.
 
             Com efeito, a essa data (10 de Março de 2000), a competente Comissão 
 ainda não tinha sequer publicitado (o que só veio a acontecer no Diário da 
 República, de 29 de Junho de 2000) as listas distritais das individualidades, 
 aludidas no n.º 1 do artigo 93.º da Lei Geral Tributária, dentre as quais podia 
 ser sorteado o porfiado perito independente.
 
             E, do nosso ponto de vista, não faz sentido falar-se em violação de 
 uma lei, enquanto não estiverem cumpridas todas as condições da exequibilidade 
 desta.
 
             Seguramente que não viola a lei quem não tem condições de a cumprir. 
 
 É o que acontece à Administração Tributária neste caso.
 
             Estamos, deste modo, a concluir – e em resposta ao thema decidendum 
 
 – que no caso não houve preterição de formalidade legal, por não ter havido, no 
 procedimento de revisão da matéria colectável, a participação do perito 
 independente, a que alude o n.º 1 do artigo 92.º da Lei Geral Tributária.
 
             2.4. Do exposto podemos extrair, entre outras, as seguintes 
 proposições, que se alinham em súmula:
 
             I. A publicação das listas distritais das personalidades, aludidas 
 no n.º 1 do artigo 93.º da Lei Geral Tributária, para sorteio do perito 
 independente referido no n.º 1 do artigo 92.º da mesma Lei Geral Tributária, só 
 ocorreu através do Diário da República do dia 29 de Junho de 2000 (II Série, n.º 
 
 170, Aviso n.º 11 545/2000).
 
             II. Só a partir desta data é que pode exigir-se da Administração 
 Tributária que proceda, sob pena de violação de lei, à nomeação do perito 
 independente no procedimento de revisão da matéria colectável.”
 
  
 
                         Resultando inequivocamente da fundamentação desse 
 acórdão que se entendera que, à data da convocação da reunião de peritos, não 
 estavam preenchidas as “condições de exequibilidade” da lei, no que respeita à 
 faculdade de pedir a nomeação de perito independente – entendimento este que, 
 como se referiu, já fora sustentado pela Administração Tributária no decurso do 
 procedimento administrativo –, estava a ora reclamante em condições de, nas 
 alegações do recurso que interpôs para o Supremo Tribunal Administrativo, 
 suscitar, de modo processualmente adequado, a questão de inconstitucionalidade 
 normativa que agora pretende ver apreciada, o que, como se viu, não fez.
 
                         O acórdão ora recorrido negou provimento ao recurso 
 jurisdicional com a seguinte fundamentação:
 
  
 
 “A LGT erigiu – artigos 91.º e seguintes – um novo procedimento para revisão da 
 matéria colectável fixada por métodos indirectos.
 E, conforme ao seu n.° 4, podia o sujeito passivo requerer a nomeação de um 
 perito independente, no pedido referido no n.° 1.
 Tal segmento normativo não pôde, todavia, entrar em vigor em 1 de Janeiro de 
 
 1999 – cf. artigo 6.° do Decreto-Lei n.° 398/98, de 17 de Dezembro –, por 
 carecido de regulamentação.
 Na verdade, dispunha o artigo 93.°, n.° 1, que o perito independente era 
 sorteado entre as personalidades constantes das listas distritais, a serem 
 organizadas pela Comissão Nacional, nos termos do artigo 94.°, que refere, além 
 do mais, a sua constituição, competências e funcionamento, que vieram a ser 
 objecto da Portaria n.° 640/99, de 12 de Agosto.
 Por sua vez, a lista dos peritos independentes foi publicada no Diário da 
 República, II Série, de 25 de Julho de 2000 – Aviso n.° 11 545/00.
 Pelo que, nos autos, à data da reunião de peritos, em 10 de Março de 2000, ainda 
 não estava em vigor o dito n.° 4 do artigo 91.° da LGT – intervenção do perito 
 independente:.
 
             Tese diversa – a da recorrente – levaria, em linha recta, à 
 caducidade dos impostos pelo mero decurso do prazo – por impossibilidade de 
 aplicação da lei, se vigente, o que não é admissível.
 
             Não impedindo, por outro lado, a vigência dos demais segmentos 
 normativos daquele artigo 91°.
 
             Como refere Antunes Varela, in Revista de Legislação e de 
 Jurisprudência, ano 127.º, p. 330, a necessidade de regulamentação de algum 
 segmento normativo não significa, de modo algum, «que toda a lei nova fique num 
 regime de stand by, que a sua validade ou eficácia fiquem dependentes da 
 publicação dos preceitos inferiores que lhe servirão de complemento, a não ser 
 quanto àquelas normas que careçam realmente de órgãos de execução própria».”
 
  
 
                         Como resulta da mera leitura destas passagens, a 
 interpretação normativa nela acolhida nada tem de inesperado, contrariamente ao 
 que sustenta a reclamante, antes se limitou a reiterar o entendimento desde 
 sempre sustentado pela Administração Tributária e acolhido no acórdão do 
 Tribunal Central Administrativo então recorrido.
 
                         Improcede, assim, o fundamento invocado na reclamação.
 
  
 
                         3. Em face do exposto, acordam em indeferir a presente 
 reclamação.
 
                         Custas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 
 
 20 (vinte) unidades de conta.
 
  
 Lisboa, 8 de Julho de 2005
 Mário José de Araújo Torres 
 Paulo Mota Pinto
 Rui Manuel Moura Ramos