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Processo n.º 914/04                            
 
 .ª Secção
 Relatora: Conselheira Maria Helena Brito
 
  
 
  
 
  
 Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional:
 
  
 
  
 I
 
  
 
  
 
 1.         Nuns autos de expropriação por utilidade pública de parcela 
 necessária à construção da obra VICEG – Via de Cintura Externa da Guarda, em que 
 era expropriante o ICOR – Instituto para a Construção Rodoviária e expropriados 
 A. e mulher, B., interpuseram estes, junto do Tribunal Judicial da Comarca da 
 Guarda, recurso da decisão arbitral que, classificando a parcela expropriada 
 como “solo apto para outros fins” – por ser qualificada, “segundo o PDM, como 
 
 área de salvaguarda estrita RAN/REN” –, lhes fixara a indemnização em 
 
 4.826.000$00. No recurso pediram que lhes fosse atribuída uma indemnização de € 
 
 579.120,00, actualizada nos termos do artigo 24º do Código das Expropriações 
 
 (fls. 60 e seguintes). 
 
  
 
             Na resposta ao recurso (fls. 140 e seguintes), o ICOR – Instituto 
 para a Construção Rodoviária concluiu do seguinte modo:
 
  
 
 “[...]
 
 1ª- A parcela expropriada, embora constituída por solo considerado apto para a 
 construção, nos ternos do art. 25° do CE/99, não pode ser efectivamente 
 utilizado para esse fim em face dos regimes jurídicos da RAN e da REN, em que se 
 inclui, devendo pois isso ser avaliada pelo respectivo valor venal, numa 
 situação normal de mercado (art. 23°, n.° 5, do CE), valor esse que 
 inevitavelmente reflectirá a impossibilidade da sua utilização para a 
 construção, ou seja, deverá corresponder ao que resultar da sua capacidade 
 agrícola;
 
 2ª- Só assim não sucederia, nos termos do n.° 12 do art. 26° do CE, quando, 
 cumulativamente, se verificasse que:
 a) A impossibilidade edificativa resultava da sua classificação em plano 
 municipal de ordenamento do território como zona verde ou de lazer ou da sua 
 destinação para a instalação de infraestruturas e equipamentos públicos;
 b) A última aquisição da parcela tivesse ocorrido antes da entrada em vigor 
 desse plano.
 
 3ª- No caso, não ocorre a «condição» prevista na alínea a) da conclusão 
 anterior, visto que o PDM classifica a parcela como RAN e REN;
 
 4ª- Pelo que na avaliação da parcela dos autos não pode considerar-se qualquer 
 edificabilidade própria, visto estar excluída pela lei e pelo Regulamento do 
 PDM, nem a edificabilidade na faixa envolvente, porque inaplicável.
 
 [...].”
 
  
 
  
 
 2.         Efectuou-se a avaliação legalmente exigida, tendo o laudo dos peritos 
 designados pelo tribunal e pelo expropriante classificado os solos da parcela 
 como “aptos para outros fins, já que não se enquadram em qualquer das alíneas do 
 n.º 2 do artigo 25º do CE99, enquadrando-se, portanto, no n.º 3 do mesmo artigo” 
 e fixado o montante indemnizatório em € 30.162,50 (os peritos designados pelo 
 tribunal) e € 24.130,00 (o perito designado pelo expropriante) (fls. 202 a 207), 
 enquanto o laudo do perito designado pelos expropriados classificou o solo como 
 
 “apto para a construção de acordo com o que dispõe o n.º 2 do art. 25º do C. E. 
 aprovado pela Lei n.º 168/99, de 18 de Setembro” e propôs a indemnização de € 
 
 1.083.632,00 (fls. 183 a 192). 
 
  
 
             A. e mulher deduziram reclamação contra o laudo de peritagem 
 apresentado pelos peritos designados pelo tribunal e pelo expropriante (fls. 221 
 e seguintes).
 
             Na sequência de tal reclamação, foi ordenada a notificação dos 
 peritos designados pelo tribunal e pelo expropriante “para esclarecerem e 
 fundamentarem as suas respostas nos termos requeridos pelos expropriados” (fls. 
 
 231 e 231 v.º). 
 
  
 
             Os peritos prestaram esclarecimentos e juntaram, entre outros 
 documentos, cópia do “Regulamento do Plano Director Municipal da Guarda”, 
 publicado no Diário da República, I Série-B, n.º 166, de 20 de Julho de 1994 
 
 (fls. 241 e seguintes). 
 
  
 
             Foram ainda produzidas alegações: os expropriados concluíram que a 
 parcela expropriada deve ser avaliada como “solo apto para construção” e, 
 procedendo à ampliação do pedido, requereram que o valor do terreno fosse fixado 
 nos termos propostos no laudo do perito por eles designado, ou seja, em € 
 
 1.083.632,00 (fls. 286 e seguintes); o IEP – Instituto das Estradas de Portugal 
 
 (que sucedeu ao ICOR – Instituto para a Construção Rodoviária) sustentou que a 
 justa indemnização a atribuir aos expropriados deve ser fixada nos termos 
 propostos pelos peritos designados pelo tribunal, ou seja, em € 30.162,50 (fls. 
 
 352).
 
  
 
  
 
 3.         Por sentença de 24 de Outubro de 2003, o juiz do Tribunal Judicial da 
 Comarca da Guarda julgou parcialmente procedente o recurso interposto pelos 
 expropriados, fixando a indemnização a atribuir aos expropriados em € 30.162,50, 
 actualizado nos termos do artigo 24º do Código das Expropriações (fls. 354 e 
 seguintes).
 
  
 
             Lê-se na sentença do Tribunal da Guarda, para o que aqui importa 
 considerar:
 
  
 
 “[...]
 
 [...] os expropriados (recorrentes) discordam da decisão arbitral, que 
 classificou a parcela em causa como «solo para outros fins» e fixou a justa 
 indemnização em 4.826.000$00 (Quatro milhões, oitocentos e vinte e seis mil 
 escudos).
 Recorreram para este tribunal, defendendo, no essencial, que o solo da parcela 
 em causa deve ser classificado como solo «apto para construção» nos termos do 
 n.º 2 do artigo 25° do CE e indemnizado de acordo com os critérios estabelecidos 
 no n.º 12 do artigo 26° do mesmo diploma legal.
 A expropriante sustenta a classificação do terreno expropriado como solo «apto 
 para outros fins», alegando tratar-se de terreno integrado em Reserva Agrícola 
 Nacional e Reserva Ecológica Nacional, pelo que não podia, por lei e regulamento 
 
 (Dec-Lei n.° 196/89, de 14 de Junho, Dec-Lei n.° 93/90, de 19 de Março, e PDM – 
 Regulamento, D.R., 1ª n.º 166, de 1994-07-20) nele construir-se, concluindo, 
 pois, tratar-se de solo para outros fins, nos termos do n.° 3 do art. 25° do 
 Código das Expropriações, pelo que a sua avaliação obedeceu aos critérios 
 fixados no n.º 1 e 3 do artigo 27°.
 Independentemente da injustiça que representa ou pode representar para os 
 interessados a inclusão dum terreno em zona de reserva, com a consequente 
 desvalorização em expropriação para construção de vias de comunicação (fim 
 diferente do que presidiu àquela inclusão), cremos que não assiste razão aos 
 recorrentes, que nas suas alegações finais, e para suportar a sua tese, 
 
 «lançaram mão» do Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 267/97, 2ª Secção, 
 publicado no DR II Série, de 21 de Maio de 1997.
 Com efeito, este acórdão julgou inconstitucional a norma do n.° 5 do artigo 24º 
 do Código das Expropriações de 1991, «enquanto interpretada por forma a excluir 
 da classificação de ‘solo apto para a construção’ os solos integrados na RAN, 
 expropriados justamente com a finalidade de neles se edificar para fins 
 diferentes de utilidade pública agrícola».
 Na situação então discutida e decidida, estava em causa uma parcela de terreno, 
 que fazia parte da RAN, mas que dela fora desafectada para o efeito de ser 
 expropriada, tendo-se entendido que não poderia ser avaliada como terreno apto 
 para construção, ainda que dotada de todas as infra-estruturas, sendo a 
 expropriação exactamente destinada à construção de um quartel de bombeiros.
 No julgamento de inconstitucionalidade, então efectuado, teve-se em conta a 
 importantíssima circunstância de a parcela em questão ter sido desafectada da 
 RAN, para o mencionado fim, de tal modo que o direito de edificar não podia 
 deixar de ser considerado no cômputo de indemnização de expropriação.
 Acresce que, por esse motivo, nesse processo, o Tribunal detectou um 
 comportamento da Administração que implicitamente considerou estar próximo da 
 figura do «abuso de direito», isto porque se reconhece ter havido alguma 
 tentativa «de manipulação das regras urbanísticas por parte da Administração», 
 traduzidas na «classificação dolosa» de um terreno como zona verde (ou reservada 
 a uso agrícola), «desvalorizando-o, para mais tarde o adquirir, por 
 expropriação, pagando por ele um valor correspondente ao de solo não apto para 
 construção», quando o que se ia fazer era exactamente construir.
 Ora, esta situação é completamente distinta daquela que estamos a tratar nestes 
 autos, ou também daquela que tratou o acórdão n.º 20/2000 [...], sendo que este 
 
 último concluiu não ser inconstitucional a norma constante do n.º 5 do artigo 
 
 24° do Código das Expropriações de 1991, «interpretada por forma a excluir da 
 classificação de ‘solo apto para a construção’ solos integrados na Reserva 
 Agrícola Nacional expropriados para implantação de vias de comunicação».
 
 [...]
 Em suma, existe uma grande diferença entre os casos que estiveram na origem dos 
 citados acórdãos nos 267/97 e 20/2000, como também existe essa distinção entre a 
 situação descrita no acórdão 267/97, que é invocado pelos expropria[dos], e 
 aquela que está em causa nestes autos, isto porque a declaração de 
 inconstitucionalidade constante do acórdão n.º 267/97 tem um sentido muito 
 preciso e delimitado, que é o de impedir que a Administração, depois de ter 
 integrado um determinado terreno na RAN – integração essa de que resulta uma 
 proibição de construção, mas que não é acompanhada de indemnização, já que tal 
 proibição é uma mera consequência da vinculação situacional da propriedade que 
 incide sobre os solos integrados na RAN, isto é, um simples produto da situação 
 factual destes, da sua inserção na natureza e na paisagem e das suas 
 características intrínsecas –, venha, posteriormente, a desafectá-lo, com o fim 
 de nele construir um equipamento público, pagando pela expropriação um valor 
 correspondente ao de solo não apto para a construção.
 Podemos, por isso, concluir que o que fundou o juízo de inconstitucionalidade da 
 não qualificação do terreno como «solo apto para a construção» para efeitos 
 indemnizatórios não foi a circunstância de o terreno deixar de ter utilização 
 agrícola ou florestal, nem a circunstância de nele se vir a construir uma via de 
 comunicação ou um acesso a um equipamento público, ou, mesmo, de tal acesso 
 dever ser considerado ainda funcionalmente integrado neste equipamento.
 Foi, antes, como, aliás, também se referiu no Acórdão n.º 20/2000, a 
 circunstância de a inexistência de uma muito próxima ou efectiva aptidão 
 edificativa, pressuposta na qualificação do solo como apto para outros fins (que 
 não a construção), ser contrariada pelo próprio destino que o expropriante 
 concretamente lhe dá, ao utilizá-lo para construção.
 E isto é assim porque, caso não se considerasse esta utilização, e se admitisse 
 a indemnização do expropriado como se o solo não fosse apto para construção, 
 estar-se-ia a dar a possibilidade de «manipulação» das regras urbanísticas por 
 parte da Administração.
 
 [...]
 
 É certo que o Código das Expropriações, na sua actual redacção, eliminou a 
 previsão do n.º 5 do art. 24°, supressão essa que, todavia, no nosso entender, 
 não altera a filosofia deste acórdão, já que a inclusão dos terrenos em área RAN 
 ou REN mantém-se e o novo diploma não trouxe alterações a este nível.
 Nem se diga, como o fazem os recorrentes, que o solo aqui em causa terá de ser 
 classificado de «solo apto para construção», dado que reúne todos os requisitos 
 a que alude o artigo 25° n.º 2 do CE.
 Na verdade, consideramos que assim não é, pelos motivos que passaremos também a 
 expor.
 Resultou, efectivamente, provado que a parcela dispõe das seguintes 
 infra-estruturas: estrada pavimentada, rede de abastecimento domiciliário de 
 
 águas, rede de saneamento ligado a uma estação depuradora, rede de distribuição 
 de energia eléctrica e rede telefónica.
 No entanto, não poderá, em nosso entender, ser classificada como «solo apto para 
 construção», pois embora disponha destas infra-estruturas, previstas na alínea 
 a) do n.º 2 do artigo 25º, estas não existem, como é exigido também neste 
 preceito, para servir quaisquer edificações construídas ou a construir, porque, 
 como já referimos, a parcela está situada totalmente em área abrangida pela 
 Reserva Ecológica Nacional (REN) e parcialmente em área abrangida pela Reserva 
 Agrícola Nacional (RAN), o que é só por si um impedimento à construção.
 Ou seja, o recorrente parte do pressuposto de que basta a parcela de terreno ter 
 as infra-estruturas previstas na alínea a) do n.º 2 do art. 25º, para se poder 
 considerar terreno apto para construção, mas no nosso entender é necessário em 
 primeiro lugar averiguar se é possível ou não a construção designadamente se 
 existe algum impedimento à mesma, e só depois verificar se existem as 
 infra-estruturas previstas na alínea a) já referida, ou se, tendo apenas parte 
 das infra-estruturas, integra-se em núcleo urbano existente.
 Quanto a nós, apenas em dois casos pode um terreno integrado na RAN ou na REN 
 ser considerado apto para construção:
 
 1- Se o proprietário do terreno demonstrar que excepcionalmente foi autorizada a 
 construção de edifício na parcela em causa.
 
 2- Se a expropriação da parcela visa a construção de prédios urbanos (neste 
 sentido Ac. da Relação do Porto de 2001/08/28 in www.dgsi.pt).
 Acresce que, ao abrigo das normas constitucionais sobre a justa indemnização por 
 expropriação, temos que considerar que é legitimo estabelecer restrições legais 
 e regulamentares para o reconhecimento da aptidão edificativa de um terreno, sob 
 pena de, não se exigindo uma prévia qualificação do terreno como solo apto para 
 construção, ou, inversamente, se não houvesse que considerar uma proibição legal 
 de construção para tal qualificação, o resultado seria, certamente, ter de 
 reconhecer-se essa aptidão, em termos puramente naturalísticos, a quase todos os 
 terrenos, pois, em teoria, seria, de facto, possível construir em todos os 
 solos, mesmo que incluídos na RAN ou na REN, e mesmo sem observar os respectivos 
 planos municipais de ordenamento de território, ou, até, sem obediência a regras 
 de loteamento ou de construção.
 De qualquer modo, no caso concreto em apreço, o destino a dar ou dado pelo 
 expropriante à parcela expropriada não visa a construção de prédios urbanos, ou 
 seja, não visa efectivar a sua potencialidade construtiva, mas apenas a 
 construção de uma estrada, sendo esta diferença que, como já salientámos, assume 
 enorme relevância e justifica também, mesmo a nível jurisprudencial (maxime da 
 jurisprudência do TC, que já citámos), tratamento diferente a situações que são, 
 de facto, diferentes.
 Assim, parece-nos que nunca se poderia pôr, in casu, a questão da violação do 
 principio da igualdade e da justa indemnização, questão esta que só seria 
 pertinente se a parcela de terreno fosse destinada pela entidade expropriante à 
 edificação.
 Posto isto, diremos que condição essencial para se classificar um solo como 
 
 «solo apto para construção» é que se possa nele legalmente construir 
 designadamente de acordo com o PDM.
 Não concordando com este entendimento, vieram os recorrentes dizer que a 
 eliminação do n.º 5 do art. 24º, com a entrada em vigor do Cód. de Exp. de 99, 
 trouxe consigo duas normas fundamentais a saber: o art. 25º n.º 3, norma 
 semelhante à do art. 24º n.º 4 de 91, que define como solo apto para outros fins 
 o que não se encontra em qualquer das situações previstas no número anterior e o 
 n.º 12 do art. 26°, que preceitua [...].
 A lei veio, neste caso, manter a solução de os terrenos que foram em abstracto 
 classificados como solo apto para construção, mas que não podem em concreto ser 
 utilizados para esse fim, por estarem abrangidos por uma zona verde ou de lazer, 
 ou por estarem destinados à instalação de infra-estruturas e equipamentos 
 públicos pelo plano municipal em vigor, não serem susceptíveis de ser avaliados 
 em função de um potencial construtivo próprio, que desde o início se encontrava 
 excluído pelas normas urbanísticas.
 Assim, de acordo com o n.° 5 do art. 23º, o seu valor corresponde ao preço de 
 venda num mercado a funcionar em situação de normalidade, preço que reflectirá a 
 circunstância objectiva de não poderem ser utilizados na construção, o que 
 equivale a dizer que devem ser avaliados pela sua aptidão agrícola.
 Contudo, e apelando a razões de justiça, que estão ligadas à tutela das 
 legítimas expectativas dos proprietários que adquiriram os terrenos antes d[e o] 
 plano entrar em vigor, a lei determina, excepcionalmente, que, em tais 
 circunstâncias, a respectiva avaliação tenha por base o valor médio das 
 construções existentes, ou que seja possível edificar numa área envolvente cujo 
 perímetro exterior se situe a 300 m do limite da parcela expropriada.
 Acontece que o n.º 12 do art. 26º não abrange a parcela em questão nestes autos, 
 isto porque, de acordo com o PDM, os solos da parcela situam-se totalmente em 
 
 área abrangida pela Reserva Ecológica Nacional (REN) e parcialmente em área 
 abrangida pela Reserva Agrícola Nacional (RAN), o que não é o mesmo que Zona 
 Verde.
 Esta última é uma classificação distinta das primeiras, já que também não se 
 trata de solo de lazer, como não se trata de solo para instalação de 
 infraestruturas e equipamentos públicos por plano municipal de ordenamento do 
 território.
 Deste modo, não podemos fazer uma aplicação directa do n.º 12 do art. 26º ao 
 caso dos autos, e sendo esta uma norma excepcional, não pode, de acordo com as 
 regras de interpretação das normas, ser aplicada por analogia.
 Daí que um terreno integrado na RAN ou na REN ou em ambas, como é o caso, com as 
 inerentes limitações do jus edificandi, não confere ao proprietário qualquer 
 expectativa de edificação (não existe, assim, uma muito próxima ou efectiva 
 potencialidade edificativa) que possa ser avaliada, para efeitos de indemnização 
 por expropriação, como solo apto para construção. Salienta-se, aliás, que, na 
 situação em apreço, o fim da expropriação é, como já vimos, precisamente, uma 
 das formas lícitas de utilização de solos integrados na RAN (artigo 9° n.° 2 
 alínea d) do DL n.° 196/89, de 14 de Junho), o que não revela qualquer aptidão 
 edificativa do solo.
 Impondo o princípio da justa indemnização que as indemnizações devidas por 
 expropriação constituam uma compensação da desigualdade entre os cidadãos 
 
 (perante os encargos públicos) determinada pela expropriação e assegurem uma 
 adequada restauração da lesão patrimonial sofrida pelo expropriado – o que se 
 obtém pelo critério do valor de mercado do bem expropriado – nenhuma destas 
 exigências constitucionais é posta em causa quando o terreno expropriado, 
 integrado numa zona em que, por lei, não é lícita a construção, é avaliado de 
 acordo com a sua aptidão (agrícola) conforme à norma do n.° 1 e 3 do artigo 27° 
 do CE.
 Ora, no caso dos autos, provou-se que a parcela de terreno situa-se em «Área 
 Rural – Área de mato e uso florestal a manter», como também em «Área de 
 salvaguarda estrita», nos termos do PDM do Concelho da Guarda, e também de 
 acordo como o PDM, os solos da parcela situam-se totalmente em área abrangida 
 pela Reserva Ecológica Nacional (REN) e parcialmente em área abrangida pela 
 Reserva Agrícola Nacional (RAN).
 Atento tudo o que deixámos já referido, da análise da situação descrita nos 
 autos e de toda a problemática que envolve a classificação destes solos e a que 
 já aludimos, temos, pois, por assente, que a indemnização a atribuir partirá da 
 classificação deste solo como «apto para outros fins».
 Baseamos esta nossa posição, essencialmente, na circunstância de o expropriado 
 não ser titular, anteriormente à expropriação, de expectativas legítimas 
 relativas à potencialidade edificativa do terreno, já que bem sabia (ou devia 
 saber) que, segundo o Plano Director Municipal, já nele não podia construir.
 Não tendo o proprietário expectativa razoável de ver o terreno desafectado e 
 destinado à construção, não poderia invocar o princípio da «justa indemnização», 
 de modo a ver calculado o montante indemnizatório com base numa potencialidade 
 edificativa dos terrenos que era para ele legalmente inexistente, e com a qual 
 não podia contar.
 Em face da factualidade que apuraram e da localização da parcela, os peritos 
 nomeados pelo tribunal e pela expropriante entenderam também que a parcela seria 
 de classificar como solo «apto para outros fins», já que não se enquadra em 
 qualquer das alíneas do n.º 2 do art. 25º do CE. de 1999, enquadrando-se antes 
 no n.º 3 do mesmo artigo.
 No relatório dos peritos nomeados pelo Tribunal e pelo expropriante, os peritos, 
 socorrendo-se também do teor do auto de vistoria «ad perpetum rei memoriam», bem 
 como da observação dos terrenos envolventes, verificaram que os solos da parcela 
 poderão ter aptidão agrícola em especial para pastoreio directo, tal como foi 
 observado nos terrenos confiantes.
 O valor dos solos para outros fins será calculado tendo em atenção o seu 
 rendimento efectivo ou possível no estado existente à data da declaração de 
 utilidade pública, a natureza do solo e do subsolo, a configuração do terreno e 
 as condições de acesso, as culturas predominantes e o clima da região, os frutos 
 pendentes e outras circunstâncias objectivas susceptíveis de influírem no 
 respectivo cálculo.
 
 [...].”.
 
  
 
 4.         Desta sentença foi interposto recurso de apelação pelos expropriados 
 A. e mulher (fls. 384), que, nas alegações respectivas (fls. 391 e seguintes) 
 formularam, entre outras, as seguintes conclusões:
 
  
 
 “[...]
 
 14ª - É certo e indesmentível que ocorrem todos os índices do art. 25°-1-a) e 2 
 CExp., pelo que não pode negar-se à Parcela a natureza de solo apto para 
 construção.
 
 15ª - E a isso nada obsta o facto de a Parcela, no todo ou em parte, estar 
 incluída na REN ou na RAN ou estar incursa em zona classificada para não 
 construir no PDM.
 
 16ª - Deste modo, pretender-se – como fizeram com acrimónia os Srs. Peritos do 
 Tribunal e da Exp.te – como fez também a douta sentença, que, por força da 
 classificação em zona de RAN/REN no PDM da Guarda da Parcela n.° 23. agora 
 expropriada, deve esta ser classificada como «solo para outros fins», que não o 
 de «para construção», uma de três:
 
 17ª - Ou isso resulta de uma interpretação do art. 25°-3 CExp. 99 manifestamente 
 inconstitucional – até porque equivaleria a atribuir-se-lhe, por si só, uma 
 interpretação equivalente à manutenção da revogada norma do art. 24°-5 do CExp. 
 de 91;
 
 18ª - Ou isso resulta de uma interpretação restritiva do art. 26°-12 CExp. 99, 
 ao não considerar equivalente, ou equiparado a «zona verde e de lazer» a que 
 provém da sua classificação em PDM na área como restrita de RAN/REN, quando a 
 razão de ser da norma é exactamente a mesma, assim sendo feita uma interpretação 
 também inconstitucional daquela norma;
 
 19ª - Ou isso resulta de uma interpretação restritiva do mesmo art. 26°-12 CExp. 
 
 99, ao não admitir que nela se contém a referência a solos (ora expropriados), 
 que, estando incluídos por PDM em zona restrita de RAN/REN, dela tiveram de ser 
 retirados, por natureza e para o fim da expropriação, para a construção de uma 
 infra-estrutura ou equipamento público como é uma estrada, tal como o é a VICEG 
 
 – Via de Cintura Externa da Guarda, assim sendo também feito uma interpretação 
 inconstitucional daquela norma.
 
 20ª - Certo é que em qualquer dos casos referidos nas conclusões 17ª a 19ª 
 ocorreria, como ocorreu, na douta sentença, violação dos princípios do direito 
 de e à propriedade, da justa indemnização, da igualdade, da proporcionalidade, 
 da justiça e da imparcialidade, em violação dos [...] arts. 13°, 62°-1 e 2 e 
 
 266°-1 e 2 CRP.
 Deste modo:
 
 21ª - Sendo indubitável que estamos perante solo apto para construção, todo ele, 
 o seu valor «calcula-se por referência à construção que nele seria possível 
 efectuar se não tivesse sido sujeito a expropriação, num aproveitamento 
 económico normal, de acordo com as leis e os regulamentos em vigor» (CExp. art. 
 
 26°-1).
 
 22ª - Reitera-se, então, que, «sendo necessário expropriar solos classificados 
 como zona verde, de lazer ou para instalação de infra-estruturas e equipamentos 
 públicos por plano municipal de ordenamento do território plenamente eficaz, 
 cuja aquisição seja anterior à sua entrada em vigor, o valor de tais solos será 
 calculado em função do valor médio das construções existentes ou que seja 
 possível edificar nas parcelas situadas numa área envolvente cujo perímetro 
 exterior se situe a 300m do limite da parcela expropriada» (CExp. art. 26°-12).
 
 [...]
 
 26ª - Finalmente, verificando-se que o Laudo do Sr. Perito dos Exp.dos chegou a 
 um valor de indemnização superior àquele que estes tinham peticionado no recurso 
 da Decisão Arbitral, os apelantes procederam nas suas alegações à ampliação do 
 seu pedido, pois que é manifesto que se trata de mero desenvolvimento do pedido 
 primitivo (CPCiv., art. 273°-2) – e é esse o valor que deve ser fixado, ou seja, 
 o de € 1.083.633,00.
 
 27ª - Decidindo diferentemente, a douta sentença violou, salvo o devido 
 respeito, os arts. 25° e 26° (em especial n.° 12) do CExp. de 99 e ainda, 
 designadamente face a interpretações inconstitucionais dos arts. 25°-3 e 26°-12 
 do mesmo Código, os arts. 13°, 62°-1 e 2 e 266°-1 e 2 CRP, nos termos atrás 
 descritos.
 
 [...].”.
 
  
 
  
 
             Nas contra-alegações (fls. 474 e seguintes), sustentou o 
 expropriante que o recurso não merecia provimento.
 
  
 
  
 
 5.         Por acórdão de 15 de Junho de 2004, o Tribunal da Relação de Coimbra 
 negou provimento à apelação, confirmando a sentença recorrida quanto à fixada 
 indemnização de € 30.162,50 (fls. 516 e seguintes). 
 
  
 
             O Tribunal da Relação de Coimbra fundamentou assim a sua decisão:
 
  
 
 “[...]
 
 [...] não é pelo facto de o actual Código da Expropriações não reproduzir a 
 norma do art. 24º n.º 5 do CExp./91, que um terreno inserido na RAN ou REN 
 adquire «aptidão edificativa» e como tal deva ser levada em conta para a «justa 
 indemnização».
 Por isso, apesar de o CExp./99 não conter um preceito similar ao revogado art. 
 
 24º n.º 5 do CExp./91, deve continuar a aplicar-se a tese nele subjacente (cf., 
 neste sentido, Pedro Elias da Costa, Guia das Expropriações por Utilidade 
 Pública, 2ª ed., pág. 284).
 Assim o impõe a unidade do sistema jurídico, face ao regime jurídico da RAN e da 
 REN, e ao princípio geral contido no art. 23º n.º 1 conjugado com a norma do 
 art. 26º n.º 1 do CExp./99, corroborados pela jurisprudência constitucional. 
 Com efeito, segundo o princípio geral plasmado no n.° 1 do art. 23º do CExp./99, 
 a justa indemnização não visa compensar o benefício alcançado pela entidade 
 expropriante, mas ressarcir o prejuízo que para o expropriado advém da 
 expropriação, correspondente ao valor real e corrente do bem de acordo com o seu 
 destino efectivo ou possível numa utilização económica normal à data da 
 publicação da declaração de utilidade pública, tendo em consideração as 
 circunstâncias e condições de facto existentes naquela data» [...].
 E o n.º 1 do art. 26º do CExp./99, prescreve que «O valor do solo apto para a 
 construção calcula-se por referência à construção que nele seria possível 
 efectuar se não tivesse sido sujeito a expropriação, num aproveitamento 
 económico normal, de acordo com as leis e os regulamentos em vigor» [...].
 Acresce que a própria redacção da al. a) do n.° 2 do art. 25° reforça a 
 interpretação defendida, ao exigir que o acesso rodoviário e demais 
 infra-estruturas nela referidas tenham «as características adequadas para servir 
 as edificações nele existentes ou a construir» [...].
 Deste modo, não podem ser classificados como aptos para construção, apesar de 
 reunidos os requisitos do n.º 2 do art. 25º do CExp./99, os solos inseridos na 
 RAN/REN. 
 Isto porque, verificadas estas condições, os proprietários dos respectivos 
 terrenos não poderão ter expectativas legalmente fundadas quanto «à sua muito 
 próxima ou efectiva potencialidade edificativa».
 
 [...]
 A proibição de construir sobre os solos integrados na RAN/REN é, segundo a 
 jurisprudência do Tribunal Constitucional, uma consequência da «vinculação 
 situacional» da propriedade que incide sobre os solos com tais características.
 
 [...]
 Com efeito, a impossibilidade de construir na RAN/REN é determinada por razões 
 de interesse público (reservar para a produção agrícola os terrenos que, para 
 tal, tenham melhor aptidão ou garantir o equilíbrio ecológico e a protecção de 
 ecossistemas fundamentais), encontra justificação constitucional, 
 respectivamente, no artigo 93º da Constituição, que consagra como objectivos da 
 política agrícola o aumento da «produção e a produtividade da agricultura» e a 
 garantia de um «uso e gestão racionais dos solos», e no artigo 66° também da 
 Constituição, que prevê a criação de reservas para «garantir a conservação da 
 natureza». A proibição de construir em terreno integrado na Reserva Agrícola 
 Nacional, imposta pela natureza intrínseca da propriedade, nada mais é, assim, 
 do que «uma manifestação da hipoteca social que onera a propriedade privada do 
 solo» (cfr. Acórdão n.º 329/99, DR II série, de 20 de Julho de 1999).
 Por isso, no caso de expropriação de terrenos integrados na RAN/REN, não há que 
 considerar, para efeitos de cálculo do valor da indemnização, a pagar ao 
 expropriado, qualquer potencialidade edificativa que não existe, nem nasce com a 
 expropriação.
 Não estamos aqui perante as chamadas «expropriações de plano» já que a ineptidão 
 para a edificação é anterior ao plano e assenta na «vinculação social» ou na 
 
 «vinculação situacional» da propriedade sobre aquele terreno (cf. Alves Correia, 
 O Plano Urbanístico e o Princípio da Igualdade, 1998, pág. 517).
 Consideram, no entanto, os Apelantes ser de aplicar aqui a norma do art. 26º n.º 
 
 12 do CExp./99 [...].
 Ao contrário da RAN e da REN, a afectação destes terrenos não revela, por si só, 
 ausência de aptidão edificativa, pois um dos pressupostos da aplicação desta 
 norma é que os solos sejam previamente classificados como aptos para construção, 
 deixando de o ser por força de um posterior plano municipal de ordenamento do 
 território.
 Como sublinha Alves Correia, a razão de ser da norma é evitar as «classificações 
 dolosas do solo ou a manipulação das regras urbanísticas por parte dos planos 
 municipais», pelo que só pode abarcar «aqueles solos que, se não fosse a sua 
 classificação como zona verde ou de lazer» (e, agora, também a sua reserva para 
 a implantação de infra-estruturas e equipamentos públicos) por um plano 
 municipal de ordenamento de território, teriam de ser considerados como solos 
 
 «aptos para construção», atendendo a um conjunto de elementos certos e 
 objectivos, relativos à localização dos próprios terrenos, às suas 
 acessibilidades, ao desenvolvimento urbanístico da zona e à existência de 
 infra-estruturas urbanísticas, que atestam uma aptidão ou uma vocação objectiva 
 para a edificabilidade» (RLJ ano 133, pág. 53 e 54).
 Porém, esta norma não pode ser usada, extensiva ou analogicamente, para atribuir 
 aptidão construtiva a solos inseridos na RAN/REN e a consequente valorização 
 pelos critérios estatuídos no n.º 12 do art. 26º do CExp./99.
 
 É que nos casos em que um plano municipal de ordenamento do território (art. 9° 
 n.º 2 do DL 48/98 de 11/8) classifica certos solos como zona verde ou de lazer 
 ou os insere em espaços-canais (corredores para a instalação de infra-estruturas 
 e equipamentos públicos), o expropriado tinha uma justificada expectativa de ver 
 o terreno desafectado destinado à construção, o que não sucede, pelas razões já 
 expostas, a propósito dos terrenos inseridos na RAN/REN (cf., neste sentido, 
 Pedro Elias da Costa, loc. cit., pág. 286 a 291).
 Também por isso, não cremos que haja uma discriminação negativa que afronte o 
 princípio constitucional da igualdade (maxime no âmbito da relação interna da 
 expropriação), visto serem realidades diferentes. 
 Ora, o princípio da igualdade, nesta vertente, não consente que particulares 
 colocados numa situação idêntica recebam indemnizações quantitativamente 
 diversas ou que sejam fixados critérios distintos de indemnização que tratem 
 alguns expropriados mais favoravelmente que outros, devendo o legislador 
 estabelecer critérios uniformes de cálculo, mas já se observou não são idênticas 
 as situações.
 De resto, a pretensão indemnizatória dos Apelantes, com base na qualificação do 
 terreno expropriado como «solo apto para construção», sem potencialidades 
 edificativas, devido ao impedimento da RAN/REN, é que, salvo o devido respeito, 
 violaria o princípio constitucional da igualdade, conforme a recente 
 jurisprudência do Tribunal Constitucional, proferida no Acórdão n.º 275/04, de 
 
 20/4/04 [...].
 
 [...]
 Em resumo, não obstante as doutas alegações dos apelantes, tal como se concluiu 
 na sentença recorrida, a parcela de terreno expropriada terá que ser 
 classificada, para efeitos do cálculo indemnizatório, como «solo para outros 
 fins» (arts. 25º n.º 3 e 27º do CExp./99).
 
 [...].”
 
  
 
  
 
 6.         A. e mulher vieram então interpor recurso para o Tribunal 
 Constitucional, ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70° da Lei 
 do Tribunal Constitucional, através do requerimento de fls. 555 e seguintes, em 
 que dizem, entre o mais:
 
  
 
 “[...]
 
 5. As normas cuja inconstitucionalidade se pretende que o Venerando Tribunal 
 Constitucional aprecie são:
 a) uma interpretação do art. 25°-3 CExp. 99 manifestamente inconstitucional, 
 equivalente a atribuir-se-lhe o equivalente à manutenção da revogada norma do 
 art. 24°-5 do CExp. de 91;
 b) uma interpretação restritiva do art. 26°-12 CExp. 99, ao não considerar 
 equivalente ou equiparado a «zona verde e de lazer» a que provém da sua 
 classificação em PDM na área como restrita de RAN/REN, quando a razão de ser da 
 norma é exactamente a mesma, assim sendo feita uma interpretação também 
 inconstitucional daquela norma;
 c) uma interpretação restritiva do mesmo art. 26°-12 CExp. 99, ao não admitir 
 que nela se contém a referência a solos (ora expropriados), que, estando 
 incluídos por PDM em zona restrita de RAN/REN, dela tiveram de ser retirados, 
 por natureza e para o fim da expropriação, para a construção de uma 
 infra-estrutura ou equipamento público como é uma estrada, tal como o é a VICEG 
 
 – Via de Cintura Externa da Guarda, assim sendo também feito uma interpretação 
 inconstitucional daquela norma; 
 d) ocorrendo na douta sentença a violação dos princípios do direito de e à 
 propriedade, da justa indemnização, da igualdade, da proporcionalidade, da 
 justiça e da imparcialidade, em violação dos [...] arts. 13°, 62°-1 e 2 e 266°-1 
 e 2 CRP;
 e) e a violação dos arts. 25° e 26° (em especial n.° 12) do CExp. de 99 e ainda, 
 designadamente face a interpretações inconstitucionais dos arts. 25°-3 e 26°-12 
 do mesmo Código, os arts. 13°, 62°-1 e 2 e 266°-1 e 2 CRP.
 
 6. Os princípios constitucionais e as normas considerados violados foram os 
 princípios constitucionais do direito de e à propriedade, da justa indemnização, 
 da igualdade, da proporcionalidade, da justiça e da imparcialidade – com esta 
 indicação se cumprindo o primeiro pressuposto do art. 75°-A-2 da mesma Lei n.º 
 
 28/82.
 
 7. As peças processuais em que os recorrentes oportunamente suscitaram as ditas 
 questões da inconstitucionalidade foram as das suas alegações de 1ª Instância 
 
 (nos termos do art. 64° CExp.) e das suas alegações de apelação da sentença (v. 
 conclusões 8ª a 12ª, 17ª a 20ª e 27ª, cfr. Art. 684° C.P.C.).
 
 [...].”.
 
  
 
  
 
             O recurso foi admitido por despacho de fls. 560.
 
  
 
  
 
 7.         Nas alegações que apresentaram neste Tribunal concluíram os 
 recorrentes A. e mulher (fls. 569 e seguintes):
 
  
 
 “[...]
 
 20ª - Não pode dizer-se que, pela integração do terreno na RAN, o particular não 
 tivesse uma «expectativa razoável» de ver o terreno desafectado e destinado à 
 construção, pelo que não poderia invocar o princípio da «justa indemnização», 
 pois que isso esquece a «expectativa razoável» que, antes da integração do 
 terreno na RAN/REN, o particular tinha em que o seu terreno fosse classificado 
 como «solo apto para construção», porque, dadas as características do solo, face 
 aos requisitos do art. 25°-2 CExp., o seu terreno, na 1ª fase, sempre seria 
 classificado como «solo apto para construção».
 
 21ª - Deste modo, não pode colocar-se a situação do e no terreno somente a 
 partir da sua afectação a solo RAN/REN, desprezando a sua efectiva e primitiva 
 natureza, até porque o particular não tem «culpa» alguma na afectação do solo a 
 RAN/REN, feita por exclusiva e unilateral iniciativa da Administração, a qual 
 foi quem, em 2ª fase, afectou a área a RAN/REN, retirando ao solo a capacidade 
 construtiva, o que significa que, se a retirou, é porque a tinha antes, 
 seguramente em busca, então, do interesse público (o que não está em causa, tal 
 como não o está numa DUP).
 
 22ª - Deste modo também, quando a seguir, na 3ª fase, a Administração procede à 
 desafectação e/ou aplicação para já poder construir (aqui para infra-estrutura, 
 a via de cintura externa da cidade da Guarda), age, mais uma vez, segundo as 
 suas próprias vantagens, certamente, no caso, para bem de outro interesse 
 público, concretizado tanto na construção de uma importante via pública, tanto 
 como na DUP.
 
 23ª - É seguro, porém, que em todas estas fases só o solo se manteve 
 inalterável, ou seja, manteve-se sempre com todos os requisitos do art. 25°-2 
 CExp. para poder, e dever, ser «classificado» como de «solo apto para 
 construção», pelo que a justa expectativa do particular, no caso dos 
 expropriados, foi sempre a mesma, enquanto a Administração se permitia 
 manipulá-la, de acordo com a sua definição do interesse público.
 
 24ª - Admitir, portanto, que o raciocínio sobre a «justa expectativa» do 
 particular tenha ponto de partida numa «fase» intermédia, não permitindo que ele 
 recupere a justa expectativa primitiva, é consentir uma dupla penalização ou 
 sacrifício em função da variação a cada momento do(s) interesse(s) público(s), 
 contra o mais evidente princípio da igualdade.
 
 25ª - Também é indiferente aquilo que resulta do regime específico da RAN, ou da 
 REN, a respeito da possibilidade de construir infra-estrutura viária sobre a 
 
 área classificada, pois que a questão está «a montante» dessa, e é a da efectiva 
 aplicação do solo à construção daquela infra-estrutura, resolução essa da 
 Administração, que restaura a capacidade construtiva sobre o solo, 
 designadamente por força do art. 26°-12 CExp., que precisamente quis evitar 
 situações dúbias e de manifesto prejuízo para os particulares.
 
 26ª - Também não pode dizer-se que subsista uma intolerável desigualdade em 
 relação a todos os «restantes proprietários» de terrenos integrados em RAN/REN 
 que não tenham sido expropriados,
 
 27ª - pois que o que acontece quanto aos «restantes proprietários», é que, pelo 
 menos, nem todos terão passado por todas as fases que os aqui recorrentes, e 
 estes é que não podem ser vítimas disso, ou seja: 
 a) ou os outros terrenos (agora integrados em RAN/REN) nunca possuíram, em 
 antes, todos os requisitos do art. 25°-2 CExp. para que pudessem ser 
 classificados como «solos aptos para construção», o que jamais lhes conferiu 
 qualquer «justa expectativa»;
 b) ou, tendo possuído esses requisitos (1ª fase) e passado à fase da RAN/REN (2ª 
 fase), a Administração nunca passou à 3ª fase, por não ter pretendido, agora, 
 afectar esses terrenos à construção (de infra-estruturas, por exemplo), do que 
 os recorrentes igualmente não têm culpa.
 Em consequência:
 
 28ª - Deste modo, pretender-se, como fez o douto acórdão, que, por força da 
 classificação em zona de RAN/REN no PDM da Guarda da Parcela n.° 18.1. agora 
 expropriada, deve esta ser classificada como «solo para outros fins», que não o 
 de «para construção», uma de três:
 
 29ª - Ou isso resulta de uma interpretação do art. 25°-3 CExp. 99 manifestamente 
 inconstitucional – até porque equivaleria a atribuir-lhe, por si só, uma 
 interpretação equivalente à manutenção da revogada norma do art. 24°-5 do CExp. 
 de 91;
 
 30ª - Ou isso resulta de uma interpretação restritiva do art. 26°-12 CExp. 99, 
 ao não considerar equivalente, ou equiparado a «zona verde e de lazer» a que 
 provém da sua classificação em PDM na área como restrita de RAN/REN, quando a 
 razão de ser da norma é exactamente a mesma, assim sendo feita uma interpretação 
 também inconstitucional daquela norma;
 
 31ª - Ou isso resulta de uma interpretação restritiva do mesmo art. 26°-12 CExp. 
 
 99, ao não admitir que nela se contém a referência a solos (ora expropriados), 
 que, estando incluídos por PDM em zona restrita de RAN/REN, dela tiveram de ser 
 retirados, por natureza e para o fim da expropriação, para a construção de uma 
 infra-estrutura ou equipamento público como é uma estrada, tal como o é a VICEG 
 
 – Via de Cintura Externa da Guarda, assim sendo também feito uma interpretação 
 inconstitucional daquela norma.
 
 32ª - Certo é que em qualquer dos casos referidos ocorreria, como ocorreu, no 
 douto acórdão, violação dos princípios do direito de e à propriedade, da justa 
 indemnização, da igualdade, da proporcionalidade, da justiça e da 
 imparcialidade, em violação dos [...] arts. 13°, 62°-1 e 2 e 266°-1 e 2 CRP.
 Deste modo:
 
 33ª - Sendo indubitável que estamos perante solo apto para construção, todo ele, 
 o seu valor «calcula-se por referência à construção que nele seria possível 
 efectuar se não tivesse sido sujeito a expropriação, num aproveitamento 
 económico normal, de acordo com as leis e os regulamentos em vigor» (CExp. art. 
 
 26°-1).
 
 34ª - E, então, «sendo necessário expropriar solos classificados como zona 
 verde, de lazer ou para instalação de infra-estruturas e equipamentos públicos 
 por plano municipal de ordenamento do território plenamente eficaz, cuja 
 aquisição seja anterior à sua entrada em vigor, o valor de tais solos será 
 calculado em função do valor médio das construções existentes ou que seja 
 possível edificar nas parcelas situadas numa área envolvente cujo perímetro 
 exterior se situe a 300m do limite da parcela expropriada» (CExp. art. 26°-12).
 
 [...].”.
 
  
 
  
 
  
 
 8.         Por sua vez, a EP – Estradas de Portugal, Entidade Pública 
 Empresarial (que resultou da transformação do IEP – Instituto das Estradas de 
 Portugal) formulou as seguintes conclusões (fls. 699 e seguintes):
 
 “1ª - Não viola qualquer norma ou princípio constitucional a interpretação dada 
 ao n.° 2 do art. 25° do Código das Expropriações pela decisão recorrida, no 
 sentido de que a parcela de terreno dos autos não pode ser considerada solo apto 
 para a construção, para efeitos de fixação da indemnização devida ao 
 expropriado, em consequência de, desde momento anterior à declaração de 
 utilidade pública, se encontrar incluída na REN, devidamente delimitada no PDM 
 da Guarda, e, por força do regime legal dessa Reserva, não poder ser utilizada 
 para a construção pelo seu proprietário;
 
 2ª - A desafectação da REN para a implantação da estrada não restitui à parcela 
 expropriada a classificação como terreno de construção;
 
 3ª - Não tem essa parcela valor como solo apto para a construção, pois, nas 
 circunstâncias existentes à data da publicação da declaração de utilidade 
 pública, nenhum comprador medianamente prudente a adquiriria como tal no mercado 
 imobiliário, não podendo ser paga como solo apto para a construção apenas porque 
 sobre ela recaiu a expropriação;
 
 4ª - A interpretação restritiva do n.° 2 do art. 25° do Código das Expropriações 
 pretende garantir a justiça da indemnização, que, sem ela, seria afectada na 
 perspectiva do expropriante, razão por que se conforma totalmente com o n.° 2 do 
 art. 62° da CRP;
 
 5ª - O n.° 12 do art. 26° do Código das Expropriações não visa obstar em geral 
 aos efeitos de uma qualquer classificação dos solos impeditiva da construção, 
 uma vez que não se aplica a todos os imóveis nessas circunstâncias, mas tutelar 
 a expectativa de quem, tendo adquirido um dado prédio que podia ser utilizado 
 para a construção no momento da aquisição e eventualmente pago um preço de 
 compra resultante desse destino, vê essa expectativa ulteriormente frustrada 
 pela entrada em vigor de um plano urbanístico que classifica o terreno como zona 
 verde ou de lazer, ou para a instalação de infra-estruturas ou equipamentos 
 
 [...] públicos;
 
 6ª - O dano correspondente a essa frustração de expectativa, indemnizável nos 
 termos do n.° 12 do art. 26° do Código das Expropriações, não é causado pela 
 expropriação e apenas se concretiza com esta;
 
 7ª - Na medida em que o n.° 12 do art. 26° do Código das Expropriações obsta à 
 concretização do prejuízo decorrente de uma classificação urbanística que 
 valoriza os terrenos envolventes à custa do [...] expropriado, assegura a 
 justiça da indemnização exigida pelo n.° 2 do art. 62° da CRP;
 
 8ª - O n.° 12 do art. 26° do Código das Expropriações tem natureza excepcional 
 em face da regra geral do n.° 1 do art. 23°, reafirmada especificamente, para os 
 solos aptos para a construção, nos n.ºs 1 e segs. do próprio art. 26°;
 
 9ª - A classificação urbanística da parcela expropriada, de acordo com o PDM da 
 Guarda, não é nenhuma das mencionadas no n.° 12 do art. 26° do Código das 
 Expropriações e dela não resulta qualquer vantagem específica para os terrenos 
 envolventes, o mesmo sucedendo com a sua inclusão na REN e na RAN, que antes 
 aproveita em geral à colectividade;
 
 10ª - Existe, assim, uma diferença essencial entre a situação dos terrenos que 
 um plano municipal de ordenamento do território classificou como zona verde ou 
 de lazer, ou para a instalação de infra-estruturas ou equipamentos públicos, e a 
 de terrenos abrangidos pela delimitação da RAN e da REN e pela classificação 
 como «Área Rural – Área de Mato e Uso Florestal a Manter» e como «Área de 
 Salvaguarda Estrita», no PDM da Guarda.
 
 [...].”.
 
  
 
  
 
 9.         A fls. 716 e seguintes, foi ordenada a notificação do despacho em que 
 a relatora admite como plausível o não conhecimento do recurso quanto à norma do 
 artigo 26º, n.º 12, do Código das Expropriações, pelas seguintes razões:
 
  
 
 “[...]
 Tendo o recurso sido interposto ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do 
 artigo 70º da LTC, o Tribunal Constitucional apenas pode dele conhecer se o 
 recorrente tiver suscitado, durante o processo, a inconstitucionalidade das 
 normas que vem submeter à fiscalização do Tribunal (ou de determinada 
 interpretação dessas normas) e se essas normas (ou as normas, com essa 
 interpretação) tiverem sido aplicadas na decisão recorrida, como seu fundamento 
 normativo, não obstante a acusação de inconstitucionalidade que lhes foi feita.
 Ora, afigura-se como plausível que o Tribunal Constitucional venha a proferir 
 uma decisão de não conhecimento do recurso quanto à norma n.º 12 do artigo 26º 
 do Código das Expropriações, aprovado pela Lei n.º 168/99, de 18 de Setembro.
 Na verdade, segundo o entendimento da relatora, a decisão constante do acórdão 
 recorrido quanto à classificação da parcela de terreno expropriada como «solo 
 para outros fins» e quanto à fixação do valor indemnizatório a atribuir aos 
 expropriados assentou exclusivamente nos artigos 25º, n.º 3, e 27º do Código das 
 Expropriações de 1999. Por outras palavras, a decisão recorrida – o acórdão do 
 Tribunal da Relação de Coimbra, de 15 de Junho de 2004 –  não aplicou a norma 
 contida no n.º 12 do artigo 26º do Código das Expropriações. 
 Tendo os expropriados, ora recorrentes, sustentado no processo a aplicabilidade 
 de tal norma (cfr., designadamente, fls. 418 e seguinte e 22ª conclusão das 
 alegações apresentadas no recurso de apelação), o Tribunal da Relação de Coimbra 
 entendeu que a mesma era inaplicável, afirmando expressamente que «esta norma 
 não pode ser usada, extensiva ou analogicamente, para atribuir aptidão 
 construtiva a solos inseridos na RAN/REN e a consequente valorização pelos 
 critérios estatuídos no n.º 12 do art. 26º do CExp./99» (cfr. fls. 546). E o 
 acórdão concluiu, quanto a este ponto: «Em resumo, não obstante as doutas 
 alegações dos apelantes, tal como se concluiu na sentença recorrida, a parcela 
 de terreno expropriada terá que ser classificada, para efeitos do cálculo 
 indemnizatório, como ‘solo para outros fins’ (arts. 25º n.º 3 e 27º do 
 CExp./99)» (cfr. fls. 550).
 Não pode assim, na opinião da relatora, constituir objecto do recurso de 
 fiscalização concreta de constitucionalidade previsto na alínea b) do n.º 1 do 
 artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional a norma contida no artigo 26º, n.º 
 
 12, do Código das Expropriações de 1999 e não pode consequentemente este 
 Tribunal apreciar as dimensões interpretativas enunciadas nas alíneas b) e c) do 
 requerimento através do qual foi interposto o presente recurso.
 
 [...].”. 
 
  
 
  
 
             Os recorrentes responderam através do requerimento de fls. 728 e 
 seguintes, em que concluíram:
 
  
 
 “[...]
 
 4. A simples transcrição integral, ainda com o alerta dos destaques a escuro, 
 são suficientes para verificar que:
 
 * não se trata de uma pura não consideração da norma do artº 26º-12 CExp.;
 
 * não se trata de uma pura desaplicação, ou não aplicação daquela norma;
 
 * trata-se, sim, da decisão de não aplicar essa norma, por força da 
 interpretação que o Tribunal da Relação lhe atribui.
 
 5. Está, pois, em causa, isso sim, uma ou mais interpretações da norma do artº 
 
 26-12 CExp.
 
 6. E é a interpretação, ou são as interpretações, da referida norma que a 
 Relação arreda ao não considerá-la aplicável com a(s) interpretação(ões) que lhe 
 suscita(m) os apelantes, que estes qualificam de inconstitucionais.
 
 7. Estamos, pois, reitera-se, perante matéria que o venerando Tribunal 
 Constitucional deve apreciar na sede correcta em que os Recorrentes a colocam – 
 para além, obviamente, da outra questão de inconstitucionalidade que foi objecto 
 do mesmo actual recurso.
 
 [...].”.
 
  
 
  
 
             Cumpre apreciar e decidir.
 
  
 
  
 II
 
  
 
  
 
 10.       Através do presente recurso, e tendo em conta a delimitação feita no 
 respectivo requerimento de interposição (supra, 6.), os recorrentes pretendem 
 que o Tribunal Constitucional aprecie a conformidade constitucional das 
 seguintes normas: 
 
  
 
 “a) uma interpretação do art. 25°-3 CExp. 99 manifestamente inconstitucional, 
 equivalente a atribuir-se-lhe o equivalente à manutenção da revogada norma do 
 art. 24°-5 do CExp. de 91;
 b) uma interpretação restritiva do art. 26°-12 CExp. 99, ao não considerar 
 equivalente ou equiparado a «zona verde e de lazer» a que provém da sua 
 classificação em PDM na área como restrita de RAN/REN, quando a razão de ser da 
 norma é exactamente a mesma, assim sendo feita uma interpretação também 
 inconstitucional daquela norma;
 c) uma interpretação restritiva do mesmo art. 26°-12 CExp. 99, ao não admitir 
 que nela se contém a referência a solos (ora expropriados), que, estando 
 incluídos por PDM em zona restrita de RAN/REN, dela tiveram de ser retirados, 
 por natureza e para o fim da expropriação, para a construção de uma 
 infra-estrutura ou equipamento público como é uma estrada, tal como o é a VICEG 
 
 – Via de Cintura Externa da Guarda, assim sendo também feito uma interpretação 
 inconstitucional daquela norma.”. 
 
  
 
  
 
             De acordo com a perspectiva dos recorrentes, tais normas violariam 
 
 “os princípios constitucionais do direito de e à propriedade, da justa 
 indemnização, da igualdade, da proporcionalidade, da justiça e da 
 imparcialidade”, consagrados nos artigos 13°, 62°, n.ºs 1 e 2, e 266°, n.ºs 1 e 
 
 2, da Constituição da República Portuguesa.
 
  
 
  
 
 11.       Importa antes de mais delimitar o objecto do recurso.
 
  
 
             Tendo o recurso sido interposto ao abrigo do disposto na alínea b) 
 do n.º 1 do artigo 70º da LTC, o Tribunal Constitucional apenas pode dele 
 conhecer se o recorrente tiver suscitado, durante o processo, a 
 inconstitucionalidade das normas que vem submeter à fiscalização do Tribunal (ou 
 de determinada interpretação dessas normas) e se essas normas (ou as normas, com 
 essa interpretação) tiverem sido aplicadas na decisão recorrida, como seu 
 fundamento normativo, não obstante a acusação de inconstitucionalidade que lhes 
 foi feita.
 
  
 
 11.1.    Ora, como se disse já no despacho da relatora de fls. 716 e seguintes, 
 a decisão recorrida – o acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 15 de 
 Junho de 2004 – não aplicou a norma contida no n.º 12 do artigo 26º do Código 
 das Expropriações, aprovado pela Lei n.º 168/99, de 18 de Setembro. 
 
  
 
             Na verdade, tendo os expropriados, ora recorrentes, sustentado no 
 processo a aplicabilidade de tal norma (cfr., designadamente, fls. 418 e 
 seguinte e 22ª conclusão das alegações apresentadas no recurso de apelação, 
 supra, 4.), o Tribunal da Relação de Coimbra entendeu que a mesma era 
 inaplicável, afirmando expressamente que “esta norma não pode ser usada, 
 extensiva ou analogicamente, para atribuir aptidão construtiva a solos inseridos 
 na RAN/REN e a consequente valorização pelos critérios estatuídos no n.º 12 do 
 art. 26º do CExp./99” (cfr. fls. 546).
 
  
 
             Convém recordar todas as razões que conduziram à decisão do Tribunal 
 da Relação de Coimbra de não aplicar ao caso dos autos a norma do n.º 12 do 
 artigo 26º do Código das Expropriações, tal como constam do acórdão recorrido 
 
 (supra, 5.):
 
  
 
 “[...]
 Consideram, no entanto, os Apelantes ser de aplicar aqui a norma do art. 26º n.º 
 
 12 do CExp./99 [...].
 Ao contrário da RAN e da REN, a afectação destes terrenos não revela, por si só, 
 ausência de aptidão edificativa, pois um dos pressupostos da aplicação desta 
 norma é que os solos sejam previamente classificados como aptos para construção, 
 deixando de o ser por força de um posterior plano municipal de ordenamento do 
 território.
 Como sublinha Alves Correia, a razão de ser da norma é evitar as «classificações 
 dolosas do solo ou a manipulação das regras urbanísticas por parte dos planos 
 municipais», pelo que só pode abarcar «aqueles solos que, se não fosse a sua 
 classificação como zona verde ou de lazer» (e, agora, também a sua reserva para 
 a implantação de infra-estruturas e equipamentos públicos) por um plano 
 municipal de ordenamento de território, teriam de ser considerados como solos 
 
 «aptos para construção», atendendo a um conjunto de elementos certos e 
 objectivos, relativos à localização dos próprios terrenos, às suas 
 acessibilidades, ao desenvolvimento urbanístico da zona e à existência de 
 infra-estruturas urbanísticas, que atestam uma aptidão ou uma vocação objectiva 
 para a edificabilidade» (RLJ ano 133, pág. 53 e 54).
 Porém, esta norma não pode ser usada, extensiva ou analogicamente, para atribuir 
 aptidão construtiva a solos inseridos na RAN/REN e a consequente valorização 
 pelos critérios estatuídos no n.º 12 do art. 26º do CExp./99.
 
 É que nos casos em que um plano municipal de ordenamento do território (art. 9° 
 n.º 2 do DL 48/98 de 11/8) classifica certos solos como zona verde ou de lazer 
 ou os insere em espaços-canais (corredores para a instalação de infra-estruturas 
 e equipamentos públicos), o expropriado tinha uma justificada expectativa de ver 
 o terreno desafectado destinado à construção, o que não sucede, pelas razões já 
 expostas, a propósito dos terrenos inseridos na RAN/REN (cf., neste sentido, 
 Pedro Elias da Costa, loc. cit., pág. 286 a 291).
 Também por isso, não cremos que haja uma discriminação negativa que afronte o 
 princípio constitucional da igualdade (maxime no âmbito da relação interna da 
 expropriação), visto serem realidades diferentes. 
 Ora, o princípio da igualdade, nesta vertente, não consente que particulares 
 colocados numa situação idêntica recebam indemnizações quantitativamente 
 diversas ou que sejam fixados critérios distintos de indemnização que tratem 
 alguns expropriados mais favoravelmente que outros, devendo o legislador 
 estabelecer critérios uniformes de cálculo, mas já se observou não são idênticas 
 as situações.
 De resto, a pretensão indemnizatória dos Apelantes, com base na qualificação do 
 terreno expropriado como «solo apto para construção», sem potencialidades 
 edificativas, devido ao impedimento da RAN/REN, é que, salvo o devido respeito, 
 violaria o princípio constitucional da igualdade, conforme a recente 
 jurisprudência do Tribunal Constitucional, proferida no Acórdão n.º 275/04, de 
 
 20/4/04 [...].
 
 [...]
 Em resumo, não obstante as doutas alegações dos apelantes, tal como se concluiu 
 na sentença recorrida, a parcela de terreno expropriada terá que ser 
 classificada, para efeitos do cálculo indemnizatório, como «solo para outros 
 fins» (arts. 25º n.º 3 e 27º do CExp./99).
 
 [...].”
 
  
 
  
 
             Depois de analisar os pressupostos de aplicação do artigo 26º, n.º 
 
 12, do Código das Expropriações (“que os solos sejam previamente classificados 
 como aptos para construção, deixando de o ser por força de um posterior plano 
 municipal de ordenamento do território”) e a razão de ser do preceito (“evitar 
 as «classificações dolosas do solo ou a manipulação das regras urbanísticas por 
 parte dos planos municipais»”), o Tribunal da Relação de Coimbra decidiu que a 
 mesma norma “não pode ser usada, extensiva ou analogicamente, para atribuir 
 aptidão construtiva a solos inseridos na RAN/REN e a consequente valorização 
 pelos critérios estatuídos no n.º 12 do art. 26º do CExp./99”. Afastando a 
 alegação de “discriminação negativa que afronte o princípio constitucional da 
 igualdade [...], visto serem realidades diferentes”, o Tribunal da Relação 
 concluiu que “a parcela de terreno expropriada terá que ser classificada, para 
 efeitos do cálculo indemnizatório, como «solo para outros fins» (arts. 25º n.º 3 
 e 27º do CExp./99)”, depois de ter verificado que, “de resto, a pretensão 
 indemnizatória dos Apelantes, com base na qualificação do terreno expropriado 
 como «solo apto para construção», sem potencialidades edificativas, devido ao 
 impedimento da RAN/REN, é que, salvo o devido respeito, violaria o princípio 
 constitucional da igualdade, conforme a recente jurisprudência do Tribunal 
 Constitucional, proferida no Acórdão n.º 275/04, de 20/4/04”.
 
  
 
             Face a tudo o que acaba de ser exposto, não pode a norma contida no 
 artigo 26º, n.º 12, do Código das Expropriações de 1999 constituir objecto do 
 recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade interposto com 
 fundamento na alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional 
 e não pode consequentemente este Tribunal apreciar as dimensões interpretativas 
 enunciadas nas alíneas b) e c) do requerimento de interposição do presente 
 recurso. 
 
  
 
 11.2.    Resulta claramente dos autos que as decisões proferidas no presente 
 processo (quer a sentença da 1ª instância quer o acórdão recorrido) assentaram 
 nos artigos 25º, n.º 3, e 27º do Código das Expropriações de 1999: tendo a 
 parcela expropriada sido classificada como “solo para outros fins”, nos termos 
 do artigo 25º, n.º 3, do Código das Expropriações de 1999, o seu valor foi 
 calculado de acordo com o disposto no artigo 27º do mesmo Código.
 
  
 
             Na verdade, afirma-se, a concluir, no acórdão do Tribunal da Relação 
 de Coimbra: “Em resumo, não obstante as doutas alegações dos apelantes, tal como 
 se concluiu na sentença recorrida, a parcela de terreno expropriada terá que ser 
 classificada, para efeitos do cálculo indemnizatório, como «solo para outros 
 fins» (arts. 25º n.º 3 e 27º do CExp./99)” (cfr. fls. 550).
 
  
 
             Assim sendo, só a norma do artigo 25º, n.º 3, do Código das 
 Expropriações de 1999 pode constituir objecto do presente recurso, uma vez que 
 quanto a ela se encontram preenchidos os requisitos previstos na alínea b) do 
 n.º 1 do artigo 7º da Lei do Tribunal Constitucional: foi aplicada, como ratio 
 decidendi, no acórdão recorrido e foi quanto a ela suscitada uma questão de 
 inconstitucionalidade durante o processo.
 
  
 
  
 
 12.       O artigo 25º do Código das Expropriações de 1999 dispõe como segue:
 
  
 
 “Artigo 25º
 Classificação dos solos
 
  
 
 1. Para efeitos do cálculo da indemnização por expropriação, o solo 
 classifica-se em:
 a) Solo apto para a construção;
 b) Solo para outros fins.
 
 2. Considera-se solo apto para a construção:
 a) O que dispõe de acesso rodoviário e de rede de abastecimento de água, de 
 energia eléctrica e de saneamento, com características adequadas para servir as 
 edificações nele existentes ou a construir;
 b) O que apenas dispõe de parte das infra-estruturas referidas na alínea 
 anterior, mas se integra em núcleo urbano existente;
 c) O que está destinado, de acordo com instrumento de gestão territorial, a 
 adquirir as características descritas na alínea a);
 d) O que, não estando abrangido pelo disposto nas alíneas anteriores, possui, 
 todavia, alvará de loteamento ou licença de construção em vigor no momento da 
 declaração de utilidade pública, desde que o processo respectivo se tenha 
 iniciado antes da data da notificação a que se refere o n.º 5 do artigo 10º.
 
 3. Considera-se solo para outros fins o que não se encontra em qualquer das 
 situações previstas no número anterior.”.
 
  
 
             No acórdão recorrido, o Tribunal da Relação de Coimbra entendeu que 
 
 “os solos inseridos na RAN/REN” “não podem ser classificados como aptos para a 
 construção”, devendo antes ser classificados como “solos para outros fins”, 
 fundamentando a sua decisão na consideração de que “os proprietários dos 
 respectivos terrenos não poderão ter expectativas legalmente fundadas quanto «à 
 sua muito próxima ou efectiva potencialidade edificativa»”.
 
  
 
             É este entendimento, reportado à norma do artigo 25º, n.º 3, do 
 Código das Expropriações de 1999, que constitui o objecto do presente recurso, 
 em confronto com “os princípios constitucionais do direito de e à propriedade, 
 da justa indemnização, da igualdade, da proporcionalidade, da justiça e da 
 imparcialidade”, consagrados nos artigos 13°, 62°, n.ºs 1 e 2, e 266°, n.ºs 1 e 
 
 2, da Constituição da República Portuguesa.
 
  
 
  
 
 13.       O Tribunal Constitucional teve já oportunidade de se pronunciar sobre 
 a questão de constitucionalidade que constitui objecto do presente recurso, 
 embora a propósito de norma contida no anterior Código das Expropriações – a 
 norma do artigo 24º, n.º 5, do Código das Expropriações, aprovado pelo 
 Decreto-Lei n.º 438/91, de 9 de Novembro. 
 
  
 
             No acórdão n.º 20/2000 (publicado no Diário da República, II série, 
 n.º 99, de 28 de Abril de 2000, p. 7539 ss), aliás amplamente citado nas 
 decisões proferidas neste processo, o Tribunal Constitucional decidiu “não 
 julgar inconstitucional a norma do n.º 5 do artigo 24º do Código das 
 Expropriações vigente, interpretada por forma a excluir da classificação de 
 
 «solo apto para a construção» solos integrados na Reserva Agrícola Nacional 
 expropriados para implantação de vias de comunicação”.
 
  
 
             Disse então o Tribunal, depois de referir uma decisão de 
 inconstitucionalidade constante de anterior acórdão do Tribunal Constitucional 
 
 (o acórdão n.º 267/97, publicado no Diário da República, II série, nº 117, de 21 
 de Maio de 1997, p. 5861 ss, invocado como precedente pelos recorrentes no 
 presente processo):
 
  
 
 “[...]
 
 12. Deve, pois, concluir-se que o acréscimo de contribuição dos expropriados 
 para a prossecução do interesse público, que, segundo se decidiu no Acórdão 
 citado [o acórdão n.º 267/97], os coloca em situação de desigualdade perante os 
 demais cidadãos, resulta do concurso da expropriação para a finalidade de 
 construção de um prédio urbano, sem indemnização como «solo apto para 
 construção» com a anterior imposição da proibição de construção, pela integração 
 do terreno na RAN.
 Mas tal desigualdade já não se verifica se a expropriação visa prosseguir, não a 
 finalidade cujo afastamento estava subjacente à exclusão da qualificação como 
 
 «solo apto para construção», mas sim uma outra, como a implantação de uma via de 
 comunicação.
 Recorde-se, na verdade, que o proprietário de prédio integrado na RAN não tinha 
 qualquer expectativa de poder vir a valorizar o solo para finalidades 
 edificativas, pois ele próprio não podia construir, nem desafectar o solo da 
 RAN, e a aptidão edificativa não é sequer confirmada pela utilização visada com 
 a expropriação.
 Se a expropriação é justamente para edificação de prédio urbano, então mostra-se 
 que a integração na RAN não poderia excluir a qualificação como «solo apto para 
 construção» para efeitos de indemnização, pois a potencialidade edificativa do 
 prédio é justamente confirmada pela utilização dada pelo expropriante – para 
 mais, se o prédio foi anteriormente desanexado da RAN, como acontecia na 
 situação do Acórdão n.º 267/97.
 Já não será assim, porém, numa situação como a dos presentes autos, em que a 
 expropriação levada a efeito pela Brisa se destina exclusivamente a um sublanço 
 da auto-estrada Famalicão-Guimarães, não se destinando, pois, à edificação de 
 construções urbanas, ainda que de interesse público, em terrenos com presumida e 
 essencial vocação agrícola. Verifica-se, como bem notou o Ministério Público, 
 que a parcela de terreno expropriada não passou a deter, supervenientemente ao 
 acto expropriativo,  qualquer aptidão edificativa, sendo mesmo que a especial 
 afectação de parcela à construção de tal via pública de comunicação se revela 
 também (como a utilização agrícola) incompatível com qualquer vocação 
 edificativa de construções urbanas no terreno expropriado.
 
 13. Já se vê, pois, que não pode considerar-se relevante para conduzir a um 
 juízo de inconstitucionalidade o argumento de que a construção de uma 
 auto-estrada, pela sua imponência, meios e quantidade de materiais empregues, 
 
 área envolvida e impacto ambiental emergente, destrói a utilização agrícola do 
 terreno e altera radicalmente a afectação das áreas envolventes.
 Repete-se que a alteração da destinação agrícola, só por si, não impõe uma 
 indemnização como «solo apto para construção», pois não baseia a existência de 
 uma muito próxima ou efectiva potencialidade edificativa. Da construção da 
 auto-estrada não resulta, na verdade, a potencialidade edificativa de 
 construções urbanas, relevante para a qualificação como «solo apto para 
 construção», como resultaria se a expropriação, com desafectação da RAN, fosse 
 para construção de um prédio urbano.
 Aliás, cumpre notar que a construção de vias de comunicação é justamente uma das 
 finalidades não agrícolas para que podem ser utilizados solos integrados na RAN 
 
 – veja-se o artigo 9º, n.º 2, alínea d), do Decreto-Lei n.º 196/89, de 14 de 
 Junho, onde se prevê que tal utilização não agrícola pode fundar o parecer 
 favorável das comissões regionais da reserva agrícola.
 E, portanto, no presente caso poderá, mesmo, não existir – ao contrário do que 
 acontecia no caso do Acórdão n.º 267/97 – desafectação do terreno da RAN, mas 
 antes um uso não agrícola de solo nesta integrado. Como se nota nas alegações do 
 Ministério Público neste Tribunal, nada impede que terrenos dotados de especial 
 vocação agrícola – que se mantém intocada – sejam atravessados por vias de 
 comunicação. Mas isso não legitima a conclusão de que passaram, sem mais, a ter 
 aptidão edificativa – o atravessamento de um terreno rústico por uma 
 auto-estrada não significa que tal terreno tenha passado a ter qualquer aptidão 
 para a construção pelo particular que dele era proprietário.
 Assim, estando o valor do prédio expropriado limitado em consequência da 
 existência de uma legítima restrição legal ao jus aedificandi, e não tendo o 
 proprietário qualquer expectativa razoável de o ver desafectado e destinado à 
 construção por particulares, não pode invocar-se também o princípio da justa 
 indemnização para pretender ver reflectido no montante indemnizatório arbitrado 
 ao expropriado uma potencialidade edificativa dos terrenos, legalmente 
 inexistente e que não foi confirmada pela finalidade dada aos solos depois da 
 expropriação (que não foi a edificação de construções urbanas, mas sim a 
 construção de uma auto-estrada).
 
 14. Nem se diga que a indemnização a arbitrar ao expropriado não pode em 
 qualquer caso, para ser justa, basear-se em critérios de edificabilidade 
 resultantes de condicionamentos impostos pelo Estado, como é o caso da 
 integração na RAN – ou seja, que não é suficiente indemnizar o proprietário com 
 base na viabilidade de utilização que o terreno tinha até ao momento da 
 expropriação, face aos condicionamentos que o Estado impunha.
 Na verdade, a aptidão para construção é, em variados aspectos, decisivamente 
 moldada (por exemplo, logo na elaboração dos planos de ordenamento do 
 território) por actuações da Administração, o mesmo acontecendo com a integração 
 na RAN. E a consideração da limitação edificativa resultante desta integração 
 ocorre, por exemplo, sempre que um prédio integrado na RAN é expropriado, mesmo 
 sendo mantido dentro desta Reserva, não podendo tal consideração omitir-se para, 
 como é exigido, se dar conta do valor real do imóvel, ligado à sua aptidão 
 edificativa, que não é apenas natural, mas resulta igualmente de 
 condicionamentos jurídicos. O argumento provaria, pois, demais, e logo por isso 
 deve ser rejeitado.
 Da mesma forma, aliás, não pode acolher-se, como fundamento para a imposição de 
 uma indemnização com base na qualificação do terreno como «solo apto para 
 construção», o argumento de que a exploração da mesma auto-estrada é entregue a 
 uma entidade de fins lucrativos cuja alta rentabilidade é notória e publicamente 
 conhecida. A avaliação da potencialidade edificativa do terreno e correspondente 
 qualificação como «solo apto para construção» ou «solo apto para outros fins», 
 são relevantes para efeitos de determinação dos critérios de avaliação do dano 
 sofrido pelo expropriado, e, consequentemente, da justa indemnização, que é 
 constitucionalmente exigida, e não para uma compensação do benefício sofrido 
 pelo expropriante. Como se pode ler agora no artigo 23º, n.º 1, do Código das 
 Expropriações de 1999 (mas já valia anteriormente, para a exigência 
 constitucional de justa indemnização), «a justa  indemnização não visa compensar 
 o benefício alcançado pela entidade expropriante, mas ressarcir o prejuízo que 
 para o expropriado advém da expropriação (...)».
 
 15. Não se vislumbra, aliás, no caso dos autos, qualquer indício de actuação 
 pré-ordenada da Administração, traduzida em manipulação das regras urbanísticas, 
 para desvalorizar artificiosamente um terreno reservado ao uso agrícola e mais 
 tarde o adquirir por um valor degradado, destinando-o então à construção de 
 edificações urbanas de interesse público. Sendo, pois, que também neste aspecto 
 o presente caso se afigura distinto do decidido pelo Acórdão n.º 267/97, onde se 
 notou que a Administração classificou o terreno, «bem ou mal (...) como terreno 
 de utilidade pública agrícola e, por isso, integrou-o na RAN» e que 
 
 «desvalorizado, a Câmara de Chaves adquire-o, pagando por ele um valor 
 correspondente ao de solo não apto para construção (e note-se que a sua 
 apropriação ocorreu apenas a uma semana da publicação da Portaria n.º 380/93, 
 que veio libertar da RAN todo o terreno em que se situava a referida 
 parcela)».
 Antes – repete-se –, destinando-se a expropriação de terreno integrado na RAN 
 exclusivamente à implantação de uma via de comunicação – e não à transformação 
 de prédio até então legalmente «rústico» em «urbano» com edificação de 
 construções urbanas –, a parcela de terreno expropriada não passou a deter 
 supervenientemente ao acto expropriativo aptidão edificativa.
 
 16. Concluindo: não tendo o proprietário dos terrenos integrados na RAN 
 expectativa razoável de os ver desafectados e destinados à construção ou 
 edificação, e não tendo a finalidade da expropriação (construção de uma 
 auto-estrada) confirmado a existência de uma potencialidade edificativa excluída 
 pela qualificação como «solo para outros fins», que não a construção, não são 
 invocáveis os princípios constitucionais da igualdade e da justa indemnização 
 para obrigar à avaliação do montante indemnizatório com base nessa 
 potencialidade edificativa. E, por conseguinte, a norma do n.º 5 do artigo 24º 
 do Código das Expropriações vigente, interpretada com o sentido de excluir da 
 classificação de «solo apto para a construção» solos integrados na RAN 
 expropriados para fins diversos, quer da utilidade pública agrícola, quer da 
 edificação de construções urbanas – como é o caso da construção de vias de 
 comunicação – não é inconstitucional.
 
 [...].”.
 
  
 
  
 
             O mesmo entendimento quanto à não inconstitucionalidade da norma 
 contida no n.º 5 do artigo 24º do Código das Expropriações de 1991 fundamentou a 
 decisão proferida pelo Tribunal Constitucional em diversos acórdãos posteriores, 
 de que se citam como mais significativos os acórdãos n.ºs 219/2001 (Diário da 
 República, II série, n.º 155, de 6 de Julho de 2001, p.11248 ss), 243/2001 
 
 (Diário da República, II série, n.º 153, de 3 de Julho de 2001, p. 11119 ss), 
 
 172/2002 (Diário da República, II série, n.º 127, de 3 de Junho de 2002, p. 
 
 10488 ss), e ainda os acórdãos n.ºs 247/2000, 346/2003, 347/2003 e 425/2003, 
 todos disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt.
 
 14.       A fundamentação constante dos acórdãos mencionados é inteiramente 
 transponível para a discussão do problema de constitucionalidade suscitado no 
 presente recurso. 
 
  
 
             Tendo-se dado como provado nos autos que a parcela de terreno a 
 expropriar se situa em “Área Rural – Área de mato e uso florestal a manter”, 
 como também em “Área de salvaguarda estrita”, nos termos do PDM do Concelho da 
 Guarda (totalmente em área abrangida pela Reserva Ecológica Nacional (REN) e 
 parcialmente em área abrangida pela Reserva Agrícola Nacional (RAN)), não tinham 
 os proprietários qualquer expectativa de valorização do solo para finalidades 
 edificativas, uma vez que eles próprios não podiam construir nem desafectar o 
 solo da zona de reserva em que se encontrava. Aliás, a aptidão edificativa não é 
 sequer confirmada pela utilização visada com a expropriação em litígio – a 
 construção de uma via de comunicação.
 
  
 
             Um terreno integrado na RAN ou na REN, ou em ambas, como é o caso, 
 com as inerentes limitações do jus edificandi, não confere aos proprietários 
 qualquer expectativa de edificação que possa ser avaliada, para efeitos de 
 indemnização por expropriação, como solo apto para construção, porque não existe 
 
 “uma muito próxima ou efectiva potencialidade edificativa”.
 
  
 
             Estando o valor do terreno expropriado limitado em consequência da 
 existência de uma legítima restrição legal ao jus aedificandi, e não tendo os 
 proprietários qualquer expectativa razoável de ver o terreno desafectado e 
 destinado à construção por particulares, não pode invocar-se o princípio da 
 justa indemnização para pretender ver reflectido no montante indemnizatório 
 arbitrado aos expropriados uma potencialidade edificativa dos terrenos, 
 legalmente inexistente e que não foi confirmada pela finalidade dada aos solos 
 depois da expropriação (que, repete-se, não foi a edificação de construções 
 urbanas, mas sim a construção de uma via de comunicação).
 
  
 
             Pelos fundamentos, mais amplos, utilizados nos acórdãos antes 
 referidos, para os quais se remete, conclui-se que a norma impugnada nestes 
 autos não viola “os princípios constitucionais do direito de e à propriedade, da 
 justa indemnização, da igualdade, da proporcionalidade, da justiça e da 
 imparcialidade” invocados pelos recorrentes.
 
  
 
  
 III
 
  
 
  
 
 15.       Nestes termos, e pelos fundamentos expostos, o Tribunal Constitucional 
 decide:
 
  
 
             a)         Não tomar conhecimento do objecto do recurso quanto à 
 norma do n.º 12 do artigo 26º do Código das Expropriações, aprovado pela Lei n.º 
 
 168/99, de 18 de Setembro;
 
  
 
             b)         Não julgar inconstitucional a norma do n.º 3 do artigo 
 
 25º do Código das Expropriações, aprovado pela Lei n.º 168/99, de 18 de 
 Setembro, interpretada com o sentido de excluir da classificação de “solo apto 
 para a construção” solos integrados na Reserva Agrícola Nacional ou na Reserva 
 Ecológica Nacional expropriados para implantação de vias de comunicação;
 
  
 
             c)         Consequentemente, negar provimento ao recurso, nesta 
 parte, confirmando o acórdão recorrido no que respeita a questão de 
 constitucionalidade.
 
  
 
             Custas pelos recorrentes, fixando-se a taxa de justiça em vinte 
 unidades de conta.
 
  
 
  
 Lisboa, 14 de Julho de 2005
 
  
 Maria Helena Brito
 Carlos Pamplona de Oliveira
 Maria João Antunes
 Rui Manuel Moura Ramos (vencido quanto à alínea a) da decisão nos termos da 
 declaração de voto junta)
 Artur Maurício (vencido quanto à alínea a) da decisão nos termos da declaração 
 que junto)
 
  
 
  
 Declaração de voto
 
  
 
       
 Não acompanhei a decisão que fez vencimento na medida em que esta exclui do 
 objecto do recurso de constitucionalidade a norma do nº 12 do artigo 26º do 
 Código das Expropriações de 1999. Fundou-se o Tribunal para assim decidir na 
 circunstância de o tribunal recorrido, após ter analisado os pressupostos de 
 aplicação desta norma e a sua razão de ser, ter entendido que aquela disposição 
 não sustentava a pretensão dos requerentes. E de ter ademais acrescentado que o 
 reconhecimento de uma tal pretensão, reclamada pelo entendimento dos 
 requerentes, é que seria inconstitucional. Ora tanto basta, a meu ver, para não 
 poder deixar de concluir-se que foi com base numa dimensão normativa que o 
 tribunal recorrido considerou o sentido mais correcto do artigo 26º, nº 12 do 
 Código das Expropriações (entendimento este que não cabe ao Tribunal 
 Constitucional apreciar) que aquele órgão jurisdicional excluiu a consequência 
 jurídica pretendida pelos requerentes (a valorização dos solos decorrente dos 
 critérios constantes daquele preceito). Ao ter pois mobilizado aquela dimensão 
 normativa para através dela dar por improcedente a pretensão dos requerentes, o 
 tribunal recorrido não está a fazer outra coisa que a aplicá-la, ainda que para 
 concluir pela insubsistência do pedido. Ora, como o resultado da aplicação de 
 uma norma não é de molde a excluir a realidade dessa aplicação in concreto, não 
 podemos deixar de concluir que o tribunal recorrido aplicou de facto as 
 dimensões normativas questionadas pelos requerentes (e que estes reconduzem ao 
 referido artigo 26º, nº 12) para com base nelas excluir o resultado jurídico por 
 estes pretendido.
 Daí que não possamos acompanhar o acórdão quando este conclui que a decisão 
 recorrida “não aplicou a norma contida no nº 12 do artigo 26º do Código das 
 Expropriações”. Pelo contrário, a evidência de uma tal aplicação resulta ainda 
 do facto de, a ser considerada inconstitucional a dimensão acolhida na decisão 
 atacada, que conduz à exclusão da consequência jurídica do artigo 26º, nº 12, 
 por alegada falta de preenchimento da sua hipótese legal, tal teria óbvios 
 efeitos na decisão sindicada, que deixaria de se poder basear, como 
 presentemente sucede, para inviabilizar a pretensão dos requerentes, na 
 insusceptibilidade de fundamentar naquela disposição a valorização, pelos 
 critérios nela estatuídos, de solos inseridos na RAN/REN.
 Dissentindo assim da decisão expressa na alínea a), tomaríamos conhecimento do 
 recurso também quanto à norma aí mencionada, na qual porém não vemos traços de 
 desconformidade constitucional, como resulta do Acórdão nº 145/05, que 
 subscrevemos, e da declaração de voto que apusemos ao Acórdão nº 114/05.   
 Rui Manuel Moura Ramos
 
  
 
  
 
  
 Declaração de Voto
 
  
 Entendo que o fundamento jurídico assenta, positivamente, no disposto nos 
 artigos 25º n.º 3 e 27º do CExp99; mas, também, pugnando os recorrentes pela 
 subsunção do caso ao disposto no artigo 26 n.º 12 do mesmo Código, numa 
 determinada interpretação deste preceito que o tornaria insusceptível de 
 abranger a situação sub judicio – aplicável aos casos de solos previamente 
 classificados como aptos para construção que o deixam de ser por força de 
 posterior plano de ordenamento do território, ele não poderia ser usado 
 extensiva ou analogicamente para atribuir aptidão construtiva a solo inserido na 
 RAN/REN.
 Independentemente da justeza desta pronúncia, no estrito plano do direito 
 infraconstitucional, a verdade é que os recorrentes questionaram a 
 constitucionalidade de tal interpretação e ela não deixa de ser, agora em termos 
 negativos, fundamento do decidido.
 Conexionado o pressuposto constante do artigo 70º  n.º 1 alínea b) da LTC – 
 aplicação da norma questionada em termos de constitucionalidade  como ratio 
 decidendi da decisão recorrida – com a instrumentalidade do recurso de 
 constitucionalidade em fiscalização concreta, inequívoco é que um eventual juízo 
 de inconstitucionalidade sobre a aludida interpretação teria incidência no 
 julgado, não podendo, ao menos, repetir-se a concreta fundamentação que conduziu 
 ao afastamento da situação em causa do âmbito de aplicação do artigo 26º n.º 12 
 do CExp99.
 Deveria, pois, ser conhecida a questão de constitucionalidade suscitada pelos 
 recorrentes relativamente à interpretação dada àquele preceito.
 
  
 Artur Maurício