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  DL n.º 433/82, de 27 de Outubro
    ILÍCITO DE MERA ORDENAÇÃO SOCIAL

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     - 3ª versão (DL n.º 356/89, de 17/10)
     - 2ª versão (Declaração de 06/01)
     - 1ª versão (DL n.º 433/82, de 27/10)
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SUMÁRIO
Institui o ilícito de mera ordenação social e respectivo processo
_____________________

1. Após a publicação do Decreto-Lei n.º 411-A/79, de 1 de Outubro, o regime das contra-ordenações, introduzido pelo Decreto-Lei n.º 232/79, de 24 de Julho, ficou desprovido de qualquer eficácia directa e própria.
As transformações entretanto operadas tanto no plano da realidade político-social e económica como no ordenamento jurídico português vieram tornar mais instante a necessidade de reafirmar a vigência do direito de ordenação social, introduzindo, do mesmo passo, algumas alterações.
São conhecidas as necessidades de índole político-criminal a que este específico ramo do direito procura dar resposta. Elas foram, aliás, apresentadas com algum desenvolvimento no relatório que precedia o Decreto-Lei n.º 232/79 em termos que conservam plenamente a sua pertinência. Resumidamente, o aparecimento do direito das contra-ordenações ficou a dever-se ao pendor crescentemente intervencionista do Estado contemporâneo, que vem progressivamente alargando a sua acção conformadora aos domínios da economia, saúde, educação, cultura, equilíbrios ecológicos, etc. Tal característica, comum à generalidade dos Estados das modernas sociedades técnicas, ganha entre nós uma acentuação particular por força das profundas e conhecidas transformações dos últimos anos, que encontraram eco na Lei Fundamental de 1976. A necessidade de dar consistência prática às injunções normativas decorrentes deste novo e crescente intervencionismo do Estado, convertendo-as em regras efectivas de conduta, postula naturalmente o recurso a um quadro específico de sanções. Só que tal não pode fazer-se, como unanimemente reconhecem os cultores mais qualificados das ciências criminológicas e penais, alargando a intervenção do direito criminal. Isto significaria, para além de uma manifesta degradação do direito penal, com a consequente e irreparável perda da sua força de persuasão e prevenção, a impossibilidade de mobilizar preferencialmente os recursos disponíveis para as tarefas da prevenção e repressão da criminalidade mais grave. Ora é esta que de forma mais drástica põe em causa a segurança dos cidadãos, a integridade das suas vidas e bens e, de um modo geral, a sua qualidade de vida.
2. No mesmo sentido, ou seja, no da urgência de conferir efectividade ao direito de ordenação social, distinto e autónomo do direito penal, apontam as transformações operadas ou em vias de concretização no ordenamento jurídico português, a começar pelas transformações do quadro jurídico-constitucional.
Por um lado, com a revisão constitucional aprovada pela Assembleia da República o direito das contra-ordenações virá a receber expresso reconhecimento constitucional (cf. v. g. os textos aprovados para os novos artigos 168.º, n.º 1, alínea d), e 282.º, n.º 3). Por outro lado, o texto aprovado para o artigo 18.º, n.º 2, consagra expressamente o princípio em nome do qual a doutrina penal vem sustentando o princípio da subsidiariedade do direito criminal. Segundo ele, o direito criminal deve apenas ser utilizado como a ultima ratio da política criminal, destinado a punir as ofensas intoleráveis aos valores ou interesses fundamentais à conveniência humana, não sendo lícito recorrer a ele para sancionar infracções de não comprovada dignidade penal.
Também o novo Código Penal, ao optar por uma política equilibrada da descriminalização, deixa aberto um vasto campo ao direito de ordenação social naquelas áreas em que as condutas, apesar de socialmente intoleráveis, não atingem a dignidade penal. Mas são, sobretudo, as necessárias reformas em domínios como as práticas restritivas da concorrência, as infracções contra a economia nacional e o ambiente, bem como a protecção dos consumidores, que tornam o regime das contra-ordenações verdadeiramente imprescindível.
Só ele, com efeito, viabilizará uma política criminal racional, permitindo diferenciar entre os tipos de infracções e os respectivos arsenais de reacções.
3. Para atingir estes objectivos, importava introduzir algumas alterações no regime geral das contra-ordenações. Tratava-se, fundamentalmente, de colmatar uma importante lacuna, estabelecendo as normas necessárias à regulamentação substantiva e processual do concurso de crime e contra-ordenação, bem como das vicissitudes processuais impostas pela alteração da qualificação, no decurso do processo, de uma infracção como crime ou contra-ordenação.
Para além disso e das alterações introduzidas quanto às autoridades competentes para aplicar em primeira instância as coimas (retirando-se tal competência aos secretários das câmaras municipais), manteve-se, no essencial, inalterada a lei das contra-ordenações. Apesar de se tratar de um diploma de enquadramento, manifesta-se a vontade de progressivamente se caminhar no sentido de constituir efectivamente um ilícito de mera ordenação social.
Manteve-se, outrossim, a fidelidade à ideia de fundo que preside à distinção entre crime e contra-ordenação. Uma distinção que não esquece que aquelas duas categorias de ilícito tendem a extremar-se, quer pela natureza dos respectivos bens jurídicos quer pela desigual ressonância ética. Mas uma distinção que terá, em última instância, de ser jurídico-pragmática e, por isso, também necessariamente formal.
Assim, usando da faculdade conferida pela Lei n.º 24/82, de 23 de Agosto, o Governo decreta, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 201.º da Constituição, o seguinte:
I PARTE
Da contra-ordenação e da coima em geral
CAPÍTULO I
Âmbito de vigência
  Artigo 1.º
(Definição)
1 - Constitui contra-ordenação todo o facto ilícito e censurável que preencha um tipo legal no qual se comine uma coima.
2 - A lei determinará os casos em que uma contra-ordenação pode ser imputada independentemente do carácter censurável do facto.

  Artigo 2.º
(Princípio da legalidade)
Só será punido como contra-ordenação o facto descrito e declarado passível de coima por lei anterior ao momento da sua prática.

  Artigo 3.º
(Aplicação no tempo)
1 - A coima é determinada pela lei vigente no momento da prática do facto ou do preenchimento dos pressupostos de que depende.
2 - Se a lei vigente ao tempo da prática do facto for posteriormente modificada, aplicar-se-á a lei mais favorável ao arguido, salvo se já tiver transitado em julgado a decisão da autoridade administrativa ou do tribunal.
3 - O disposto no número anterior não se aplica às leis temporárias, salvo se estas determinarem o contrário.
4 - O regime previsto nos números anteriores aplica-se, com as devidas adaptações, aos efeitos das contra-ordenações.

  Artigo 4.º
(Aplicação no espaço)
A presente lei é aplicável:
a) A factos praticados em território português, seja qual for a nacionalidade do agente;
b) A factos praticados a bordo de navios ou aeronaves portuguesas, salvo tratado ou convenção internacional em contrário.

  Artigo 5.º
(Momento da prática do tacto)
O facto considera-se praticado no momento em que o agente actuou ou, no caso de omissão, deveria ter actuado, independentemente do momento em que o resultado típico se tenha produzido.

  Artigo 6.º
(Lugar da prática do facto)
O facto considera-se praticado no lugar em que, total ou parcialmente e sob qualquer forma de comparticipação, o agente actuou ou, no caso de omissão, devia ter actuado, bem como naquele em que o resultado típico se tenha produzido.

CAPÍTULO II
Da contra-ordenação
  Artigo 7.º
(Da responsabilidade das pessoas colectivas ou equiparada)
1 - As coimas podem aplicar-se tanto às pessoas singulares como às pessoas colectivas, bem como às associações sem personalidade jurídica.
2 - As pessoas colectivas ou equiparadas serão responsáveis pelas contra-ordenações praticadas pelos seus órgãos no exercício das suas funções.

  Artigo 8.º
(Dolo e negligência)
1 - Só é punível o facto praticado com dolo ou, nos casos especialmente previstos na lei, com negligência.
2 - O erro sobre elementos do tipo, sobre a proibição, ou sobre um estado de coisas que, a existir, afastaria a ilicitude do facto ou a culpa do agente, exclui o dolo.
3 - Fica ressalvada a punibilidade da negligência nos termos gerais.

  Artigo 9.º
(Erro sobre a ilicitude)
1 - Age sem culpa quem actua sem consciência da ilicitude do facto, se o erro lhe não for censurável.
2 - Se o erro lhe for censurável, a coima poderá ser atenuada.

  Artigo 10.º
(Inimputabilidade em razão da idade)
Para os efeitos desta lei, consideram-se inimputáveis os menores de 16 anos.

  Artigo 11.º
(Inimputabilidade em razão de anomalia psíquica)
1 - É inimputável quem, por força de uma anomalia psíquica, é incapaz, no momento da prática do facto, de avaliar a ilicitude deste ou de se determinar de acordo com essa avaliação.
2 - Pode ser declarado inimputável quem, por força de uma anomalia psíquica grave não acidental e cujos efeitos não domina, sem que por isso possa ser censurado, tem no momento da prática do facto a capacidade para avaliar a ilicitude deste ou para se determinar de acordo com essa avaliação sensivelmente diminuída.
3 - A imputabilidade não é excluída quando a anomalia psíquica tiver sido provocada pelo próprio agente com intenção de cometer o facto.

  Artigo 12.º
(Tentativa)
1 - Há tentativa quando o agente pratica actos de execução de uma contra-ordenação que decidiu cometer sem que esta chegue a consumar-se.
2 - São actos de execução:
a) Os que preenchem um elemento constitutivo de um tipo de contra-ordenação;
b) Os que são idóneos a produzir o resultado típico;
c) Os que, segundo a experiência comum e salvo circunstâncias imprevisíveis, são de natureza a fazer esperar que se lhes sigam actos das espécies indicadas nas alíneas anteriores.

  Artigo 13.º
(Punibilidade da tentativa)
A tentativa só pode ser punida quando a lei expressamente o determinar.

  Artigo 14.º
(Desistência)
1 - A tentativa não é punível quando o agente voluntariamente desiste de prosseguir na execução da contra-ordenação, ou impede a consumação, ou, não obstante a consumação, impede a verificação do resultado não compreendido no tipo da contra-ordenação.
2 - Quando a consumação ou a verificação do resultado são impedidas por facto independente da conduta do desistente, a tentativa não é punível se este se esforça por evitar uma ou outra.

  Artigo 15.º
(Desistência em caso de comparticipação)
Em caso de comparticipação, não é punível a tentativa daquele que voluntariamente impede a consumação ou a verificação do resultado, nem daquele que se esforça seriamente por impedir uma ou outra, ainda que os comparticipantes prossigam na execução da contra-ordenação ou a consumem.

  Artigo 16.º
(Comparticipação)
1 - Se vários agentes comparticipam no facto, qualquer deles incorre em responsabilidade por contra-ordenação mesmo que a ilicitude ou o grau de ilicitude do facto dependam de certas qualidades ou relações especiais do agente e estas só existam num dos comparticipantes.
2 - Cada comparticipante é punido segundo a sua culpa, independentemente da punição ou do grau de culpa dos outros comparticipantes.
3 - Se a lei determinar que um facto em princípio qualificado como contra-ordenação deve ser considerado como crime devido a certas qualidades ou relações especiais do agente, só se aplicará a lei penal ao comparticipante ou comparticipantes que detenham essas qualidades ou relações especiais.

CAPÍTULO III
Da coima e das sanções acessórias
  Artigo 17.º
(Montante da coima)
1 - Se o contrário não resultar da lei, o montante mínimo da coima será de 200$00 e o máximo de 200000$00.
2 - Se a lei, relativamente ao montante máximo, não distinguir o comportamento doloso do negligente, este só poderá ser sancionado até metade do montante máximo da coima prevista.
3 - As coimas aplicadas às pessoas colectivas poderão elevar-se até aos montantes máximos de:
a) 3000000$00 em caso de dolo;
b) 1500000$00 em caso de negligência.

  Artigo 18.º
(Determinação da medida da coima)
1 - A determinação da medida da coima far-se-á em função da gravidade da contra-ordenação, da culpa e da situação económica do agente.
2 - Sem prejuízo dos limites máximos fixados no artigo anterior, a coima deverá, sempre que possível, exceder o benefício económico que o agente retirou da prática da contra-ordenação.

  Artigo 19.º
(Concurso de contra-ordenação)
1 - Se o mesmo facto violar várias leis pelas quais deve ser punido como contra-ordenação, ou uma daquelas leis várias vezes, aplicar-se-á uma única coima.
2 - Se forem violadas várias leis, aplicar-se-á a lei que comine a coima mais elevada, podendo, todavia, ser aplicadas as sanções acessórias previstas na outra lei.

  Artigo 20.º
(Concurso de infracções)
Se o mesmo facto constituir simultaneamente crime e contra-ordenação, será o agente sempre punido a título de crime, sem prejuízo da aplicação das sanções acessórias previstas para a contra-ordenação.

  Artigo 21.º
(Sanções acessórias)
1 - Nos casos em que a lei o determine poderá decidir-se como sanção acessória de uma contra-ordenação a apreensão de objectos.
2 - A apreensão só será permitida quando:
a) Ao tempo da decisão os objectos pertençam ao agente;
b) Representem um perigo para a comunidade ou para a prática de um crime ou de outra contra-ordenação;
c) Tendo sido alienados ou onerados a terceiro, este conhecesse, ou devesse razoavelmente conhecer, as circunstâncias determinantes da possibilidade da sua apreensão.
3 - A lei poderá também, simultaneamente com a coima, determinar, entre outras, as seguintes sanções acessórias:
a) Interdição de exercer uma profissão ou uma actividade;
b) Privação do direito a subsídio outorgado por entidades ou serviços públicos;
c) Privação do direito de participar em feiras ou mercados.
4 - As sanções referidas no número anterior terão a duração máxima de 2 anos, contados a partir da decisão condenatória definitiva.
5 - A lei poderá ainda determinar os casos em que deva dar-se publicidade à punição por contra-ordenação.

  Artigo 22.º
(Princípio da subsidiariedade da apreensão)
1 - Não haverá lugar à apreensão fora dos casos previstos na alínea b) do n.º 2 do artigo anterior quando ela seja manifestamente desproporcionada à gravidade da contra-ordenação e da culpa do agente ou do terceiro.
2 - A apreensão será suspensa sempre que as suas finalidades possam ser devidamente prosseguidas através de medidas menos gravosas para as pessoas atingidas.
3 - Quando for possível, a apreensão será limitada a parte dos objectos.

  Artigo 23.º
(Apreensão do valor)
1 - Quando o agente frustre dolosamente, por qualquer meio, a apreensão de objecto que lhe pertencia no momento da prática do facto, pode ser ordenada a apreensão de uma quantia em dinheiro nunca superior ao valor do objecto.
2 - O disposto no número anterior aplica-se correspondentemente quando o agente tiver impossibilitado apenas parcialmente a apreensão.
3 - Aplica-se o mesmo regime aos casos em que a apreensão só se tenha tomado total ou parcialmente inexequível depois de a apreensão ter sido decidida.

  Artigo 24.º
(Efeitos de apreensão)
1 - O trânsito em julgado da decisão de apreensão determina a transferência da propriedade para o Estado ou para a entidade pública que a lei determinar.
2 - Serão nulos os negócios jurídicos de alienação dos objectos posteriores ao trânsito em julgado da decisão de apreensão.

  Artigo 25.º
(Apreensão independente de coima)
1 - Se, por qualquer motivo, não puder haver procedimento contra uma pessoa ou contra ela não puder ser aplicada uma coima, poderá a apreensão dos objectos ou do valor substitutivo ser ordenada desde que se verifiquem os pressupostos da apreensão total ou parcial.
2 - O disposto no número anterior aplicar-se-á também nos casos em que a autoridade competente para o procedimento dele desista ou o juiz mande arquivar o processo.

  Artigo 26.º
(Indemnização)
1 - Quando a apreensão referida na alínea b) do n.º 2 do artigo 21.º recair sobre objectos pertencentes a terceiro, este terá direito a indemnização segundo as normas da lei civil, salvo se os tiver adquirido de má fé.
2 - A obrigação de indemnização compete ao Estado ou à entidade pública para a qual tenha sido transferida a propriedade dos objectos apreendidos.

CAPÍTULO IV
Prescrição
  Artigo 27.º
(Prescrição do procedimento)
1 - O procedimento por contra-ordenação extingue-se por efeito da prescrição logo que sobre a prática da contra-ordenação hajam decorrido os seguintes prazos:
a) 2 anos, quando se trate de contra-ordenações a que seja aplicável uma coima superior a 100000$00;
b) 1 ano, nos restantes casos.

  Artigo 28.º
(Interrupção da prescrição)
1 - A prescrição do procedimento por contra-ordenação interrompe-se:
a) Com a comunicação ao arguido dos despachos, decisões ou medidas contra ele tomados ou com qualquer notificação;
b) Com a realização de quaisquer diligências de prova, designadamente exames e buscas, ou com o pedido de auxílio às autoridades policiais ou a qualquer autoridade administrativa;
c) Com quaisquer declarações que o arguido tenha proferido no exercício do direito de audição.
2 - Nos casos de concurso de infracções, a interrupção da prescrição do procedimento criminal determina a interrupção da prescrição do procedimento por contra-ordenação.

  Artigo 29.º
(Prescrição da coima)
1 - As coimas prescrevem nos prazos seguintes:
a) 4 anos, no caso de uma coima superior a 100000$00;
b) 3 anos, nos restantes casos.
2 - O prazo conta-se a partir do trânsito em julgado da decisão condenatória.

  Artigo 30.º
(Suspensão da prescrição da coima)
A prescrição da coima suspende-se durante o tempo em que:
a) Por força da lei a execução não pode começar ou não pode continuar a ter lugar;
b) A execução foi interrompida;
c) Foram concedidas facilidades de pagamento.

  Artigo 31.º
(Prescrição das sanções acessórias)
Aplica-se às sanções acessórias o regime previsto nos artigos anteriores para a prescrição da coima.

CAPÍTULO V
Do direito subsidiário
  Artigo 32.º
(Do direito subsidiário)
Em tudo o que não for contrário à presente lei aplicar-se-ão subsidiariamente, no que respeita à fixação do regime substantivo das contra-ordenações, as normas do Código Penal.

II PARTE
Do processo de contra-ordenação
CAPÍTULO I
Da competência
  Artigo 33.º
(Regra da competência das autoridades administrativas)
O processamento das contra-ordenações e a aplicação das coimas competem às autoridades administrativas, ressalvadas as particularidades previstas no presente decreto-lei.

  Artigo 34.º
(Competência em razão da matéria)
1 - A competência em razão da matéria pertencerá às autoridades determinadas pela lei que prevê e sanciona as contra-ordenações.
2 - No silêncio da lei serão competentes os serviços designados pelo membro do Governo responsável pela tutela dos interesses que a contra-ordenação visa defender ou promover.

  Artigo 35.º
(Competência territorial)
1 - É territorialmente competente a autoridade administrativa concelhia em cuja circunscrição:
a) A infracção foi praticada ou descoberta;
b) O arguido tem a sua residência ao tempo do início ou durante qualquer fase do processo.
2 - Se a infracção for cometida a bordo de navio ou avião português, fora do âmbito de eficácia espacial desta lei, será competente a autoridade em cuja circunscrição se situe o porto ou aeroporto que primeiro for escalado depois do cometimento da infracção.

  Artigo 36.º
(Competência por conexão)
1 - Em caso de concurso de contra-ordenações será competente a autoridade a quem, segundo os preceitos anteriores, incumba processar qualquer das contra-ordenações.
2 - O disposto no número anterior aplica-se também aos casos em que um mesmo facto torna várias pessoas passíveis de sofrerem uma coima.

  Artigo 37.º
(Conflitos de competência)
1 - Se das disposições anteriores resultar a competência cumulativa de várias autoridades, o conflito será resolvido a favor da autoridade que, por ordem de prioridades:
a) Tiver primeiro ouvido o arguido pela prática da contra-ordenação;
b) Tiver primeiro requerido a sua audição pelas autoridades policiais;
c) Tiver primeiro recebido das autoridades policiais os autos de que conste a audição do arguido.
2 - As autoridades competentes poderão, todavia, por razões de economia, celeridade ou eficácia processuais, acordar em atribuir a competência a autoridade diversa da que resultaria da aplicação do n.º 1.

  Artigo 38.º
(Competência do Ministério Público e das entidades competentes para instrução criminal)
1 - Quando se verifique concurso de crime e contra-ordenação, ou quando, pelo mesmo facto, uma pessoa deva responder a título de crime e outra a título de contra-ordenação, o processamento da contra-ordenação caberá à autoridade competente para a instrução criminal.
2 - Quando se verificarem os pressupostos do número anterior e assim o justificarem razões de economia processual ou relativas à prova, poderá a autoridade competente para a instrução criminal chamar a si o processo da contra-ordenação se ainda não tiver havido lugar à aplicação da coima.
3 - Quando, nos casos previstos nos n.os 1 e 2, o Ministério Público arquivar o processo criminal mas entender que subsiste a responsabilidade pela contra-ordenação, remeterá o processo à autoridade administrativa competente.
4 - A decisão do Ministério Público sobre se um facto deve ou não ser processado como crime vincula as autoridades administrativas.

  Artigo 39.º
(Competência do tribunal)
Nos casos referidos nos n.os 1 e 2 do artigo anterior a aplicação da coima caberá ao juiz competente para o julgamento do crime.

  Artigo 40.º
(Envio do processo ao Ministério Público)
1 - A autoridade administrativa competente remeterá o processo ao Ministério Público sempre que considere que a infracção constitui um crime.
2 - Se o agente do Ministério Público considerar que não há lugar para a responsabilidade criminal, devolverá o processo à mesma autoridade.

CAPÍTULO II
Princípios e disposições gerais
  Artigo 41.º
(Direito subsidiário)
1 - Sempre que o contrário não resulte deste diploma, são aplicáveis, devidamente adaptados, os preceitos reguladores do processo criminal.
2 - No processo de aplicação da coima, as autoridades administrativas competentes gozam dos mesmos direitos e estão submetidas aos mesmos deveres das entidades competentes para instrução criminal, sempre que o contrário não resulte desta lei.

  Artigo 42.º
(Meios de coacção)
1 - Não é permitida a prisão preventiva, a intromissão na correspondência ou nos meios de telecomunicação nem a utilização de provas que impliquem a violação do segredo profissional.
2 - As provas que colidam com a reserva da vida privada, bem como os exames corporais e a prova de sangue, só serão admissíveis mediante o consentimento de quem de direito.

  Artigo 43.º
(Princípio da legalidade)
O processo das contra-ordenações obedecerá ao princípio da legalidade.

  Artigo 44.º
(Testemunhas)
As testemunhas não serão ajuramentadas.

  Artigo 45.º
(Exame dos autos)
1 - Se o processo couber às autoridades competentes para a instrução criminal, poderão as autoridades administrativas normalmente competentes examinar os autos, bem como os objectos apreendidos.
2 - Os autos serão, a seu pedido, enviados para exame às autoridades administrativas.

  Artigo 46.º
(Comunicação de decisões)
1 - Todas as decisões, despachos e demais medidas tomadas pelas autoridades administrativas serão comunicadas às pessoas a quem se dirigem.
2 - Tratando-se de medida que admita impugnação sujeita a prazo, a comunicação revestirá a forma de notificação, que deverá conter os esclarecimentos necessários sobre admissibilidade, prazo e forma de impugnação.

  Artigo 47.º
(Da notificação)
1 - A notificação será dirigida ao arguido e comunicada ao seu representante legal, quando este exista.
2 - A notificação será dirigida ao defensor escolhido cuja procuração conste do processo ou ao defensor nomeado.
3 - No caso referido no número anterior, o arguido será informado através de uma cópia da decisão ou despacho.
4 - Se a notificação tiver de ser feita a várias pessoas, o prazo da impugnação só começa a correr depois de notificada a última pessoa.

CAPÍTULO III
Da aplicação da coima pelas autoridades administrativas
  Artigo 48.º
(Da polícia e dos agentes de fiscalização)
1 - As autoridades policiais e fiscalizadoras deverão tomar conta de todos os eventos ou circunstâncias susceptíveis de implicar responsabilidade por contra-ordenação e tomar as medidas necessárias para impedir o desaparecimento de provas.
2 - Na medida em que o contrário não resulte desta lei, as autoridades policiais têm direitos e deveres equivalentes aos que têm em matéria criminal.
3 - As autoridades policiais e agentes de fiscalização remeterão imediatamente às autoridades administrativas a participação e as provas recolhidas.

  Artigo 49.º
(Identificação pelas autoridades administrativas e policiais)
1 - As autoridades administrativas competentes e as autoridades policiais podem exigir ao autor de uma contra-ordenação a respectiva identificação.
2 - Se esta não for imediatamente possível, em caso de flagrante delito podem as autoridades policiais deter o indivíduo pelo tempo necessário à identificação.
3 - Esta deve processar-se no mais curto espaço do tempo, não podendo nunca a detenção exceder 24 horas.

  Artigo 50.º
(Direito de audição do arguido)
Não será permitida a aplicação de uma coima sem antes se ter assegurado ao arguido a possibilidade de se pronunciar sobre o caso.

  Artigo 51.º
(Processo de advertência)
1 - Em caso de contra-ordenação ligeira poderão as autoridades administrativas competentes decidir-se por uma advertência acompanhada da exigência do pagamento de uma soma pecuniária nunca superior a 500$00.
2 - Este processo só terá lugar quando o arguido, informado do direito de o recusar, com ele se conformar e se dispuser a pagar a respectiva soma pecuniária imediatamente ou no prazo de 5 dias.
3 - Nos casos referidos nos n.os 1 e 2 não pode o facto voltar a ser apreciado e sancionado como contra-ordenação.

  Artigo 52.º
(Deveres das testemunhas e peritos)
1 - As testemunhas e os peritos são obrigados a obedecer às autoridades administrativas quando forem solicitados a comparecer e a pronunciar-se sobre a matéria do processo.
2 - Em caso de recusa injustificada, poderão as autoridades administrativas aplicar sanções pecuniárias até 10000$00 e exigir a reparação dos danos causados com a sua recusa.

  Artigo 53.º
(Do defensor)
1 - O arguido da prática de uma contra-ordenação tem o direito de se fazer acompanhar de advogado, escolhido em qualquer fase do processo.
2 - As autoridades administrativas nomearão defensor oficioso sempre que qualquer deficiência do arguido ou a gravidade da infracção e da sanção o justifiquem.

  Artigo 54.º
(Da iniciativa e da instrução)
1 - O processo iniciar-se-á oficiosamente, mediante participação das autoridades policiais ou fiscalizadoras ou ainda mediante denúncia particular.
2 - A autoridade administrativa procederá à sua investigação e instrução, finda a qual arquivará o processo ou aplicará uma coima.
3 - As autoridades administrativas poderão confiar a investigação e instrução, no todo ou em parte, às autoridades policiais, bem como solicitar o auxílio de outras autoridades ou serviços públicos.

  Artigo 55.º
(Recurso das medidas das autoridades administrativas)
1 - As decisões, despachos e demais medidas tomadas pelas autoridades administrativas no decurso do processo são susceptíveis de impugnação judicial por parte do arguido ou da pessoa contra as quais se dirigem.
2 - O disposto no número anterior não se aplica às medidas que se destinem apenas a preparar a decisão final de arquivamento ou aplicação da coima, não colidindo com os direitos ou interesses das pessoas.
3 - É competente para decidir do recurso o tribunal previsto no artigo 61.º que decidirá em última instância.

  Artigo 56.º
(Processo realizado pelas autoridades competentes para a instrução criminal)
1 - Quando o processo é realizado pelas autoridades competentes para a instrução criminal, as autoridades administrativas são obrigadas a dar-lhes toda a colaboração, assistindo-lhes, em geral, os direitos e deveres das autoridades policiais em relação ao processo criminal.
2 - Sempre que a acusação diga respeito à contra-ordenação, esta será igualmente comunicada às autoridades.
3 - As mesmas autoridades serão ouvidas pelo Ministério Público se este arquivar o processo.

  Artigo 57.º
(Extensão da acusação à contra-ordenação)
Quando, nos casos previstos no artigo 38.º o Ministério Público acusar pelo crime, a acusação abrangerá também a contra-ordenação.

  Artigo 58.º
(Decisão de aplicação da coima)
1 - A decisão que aplica a coima deve conter:
a) A identificação dos arguidos e dos eventuais comparticipantes;
b) A descrição do facto imputado e das provas obtidas, bem como a indicação das normas segundo as quais se pune;
c) A coima e as sanções acessórias.
2 - Da decisão deve ainda constar a informação de que:
a) A condenação transita em julgado e se torna exequível se não for judicialmente impugnada nos termos do artigo 59.º
b) Em caso de impugnação judicial, o tribunal pode decidir mediante audiência ou, caso o arguido e o Ministério Público não se oponham, mediante simples despacho;
c) Não vigora a proibição da reformatio in peius.
3 - A decisão conterá ainda:
a) A ordem de pagamento da coima no prazo máximo de 2 semanas após o trânsito em julgado;
b) A indicação de que em caso de impossibilidade de pagamento tempestivo deve comunicar o facto por escrito à autoridade que aplicou a coima.

CAPÍTULO IV
Recurso e processo judiciais
  Artigo 59.º
(Forma e prazo)
1 - A decisão da autoridade administrativa que aplica uma coima é susceptível de impugnação judicial.
2 - O recurso de impugnação poderá ser interposto pelo arguido ou pelo seu defensor.
3 - O recurso será feito por escrito e apresentado à autoridade administrativa que aplicou a coima, no prazo de 5 dias após o seu conhecimento pelo arguido, devendo constar de alegações sumárias e conclusões.

  Artigo 60.º
(Renúncia ao recurso)
A todo o tempo, durante o prazo previsto no artigo anterior, poderão os recorrentes renunciar ao recurso.

  Artigo 61.º
(Tribunal competente)
1 - É competente para conhecer do recurso o juiz de direito da comarca em cuja área tem a sua sede a autoridade que aplicou a coima.
2 - O juiz decide singularmente.

  Artigo 62.º
(Envio dos autos ao Ministério Público)
1 - Recebido o recurso, e no prazo de 48 horas, deve a autoridade administrativa enviar os autos ao Ministério Público, que os tornará presentes ao juiz, valendo este acto como acusação.
2 - Até ao envio dos autos, pode a autoridade administrativa revogar a decisão de aplicação da coima.

  Artigo 63.º
(Não aceitação do recurso)
1 - O juiz rejeitará, por meio de despacho, o recurso feito fora do prazo ou sem respeito pelas exigências de forma.
2 - Deste despacho há recurso, que sobe imediatamente.

  Artigo 64.º
(Decisão por despacho judicial)
1 - O juiz decidirá do caso mediante audiência de julgamento ou através de simples despacho.
2 - O juiz decidirá por despacho quando não considere necessária a audiência de julgamento e o arguido ou o Ministério Público não se oponham a este processo.
3 - O despacho pode ordenar o arquivamento do processo, absolver o arguido ou manter ou alterar a condenação.
4 - Em caso de manutenção ou alteração da condenação deverá o juiz fundamentar sumariamente a sua decisão, tanto no que concerne aos factos como ao direito aplicado e às circunstâncias que determinaram a medida da sanção.
5 - Em caso de absolvição deverá o juiz indicar por que não considera provados os factos ou por que não constituem uma contra-ordenação.

  Artigo 65.º
(Marcação da audiência)
1 - Ao aceitar o recurso, e fora dos casos referidos no artigo anterior, o juiz marcará a audiência.
2 - A todo o tempo, e até à comunicação da decisão judicial ao arguido, poderá o Ministério Público, com o acordo do arguido, retirar a acusação.

  Artigo 66.º
(Direito aplicável)
Salvo disposição em contrário deste diploma, a audiência em 1.ª instância obedecerá às normas do Código de Processo Penal relativas ao processo de transgressões, não havendo, todavia, lugar à redução da prova a escrito.

  Artigo 67.º
(Participação do arguido na audiência)
1 - O arguido não é obrigado a comparecer à audiência, salvo se o juiz considerar a sua presença como necessária ao esclarecimento dos factos.
2 - Nos casos em que o juiz não ordenou a presença do arguido este poderá fazer-se representar por advogado com procuração escrita.
3 - O tribunal pode solicitar a audição do arguido por outro tribunal, devendo a realização desta diligência ser comunicada ao Ministério Público e ao defensor e sendo o respectivo auto lido na audiência.

  Artigo 68.º
(Ausência do arguido)
1 - Nos casos em que a presença do arguido não foi ordenada pelo tribunal e este não comparece nem se faz representar por advogado, tomar-se-ão em conta as suas declarações que tenham sido colhidas no processo ou registar-se-á que ele nunca se pronunciou sobre a matéria dos autos, não obstante lhe ter sido concedida a oportunidade para o fazer, e julgar-se-á.
2 - Se o arguido, cuja presença foi ordenada, não comparece nem justifica a sua ausência, poderá o juiz:
a) Rejeitar o recurso, desde que a isso não se oponha o Ministério Público;
b) Decidir nos termos previstos no número anterior;
c) Aplicar ao arguido uma sanção pecuniária nunca inferior a 200$00 nem superior a 30000$00.
3 - As decisões do juiz referidas nos n.os 1 e 2 não admitem recurso.

  Artigo 69.º
(Participação do Ministério Público)
1 - O Ministério Público não é obrigado a estar presente na audiência de julgamento.
2 - Se o juiz considerar conveniente a presença do Ministério Público, deverá comunicar-lho.
3 - Se o Ministério Público não toma parte na audiência, não se torna necessário o seu consentimento para a retirada do recurso nos termos do artigo 71.º

  Artigo 70.º
(Participação das autoridades administrativas)
1 - O tribunal concederá às autoridades administrativas a oportunidade de trazerem à audiência os elementos que reputem convenientes para uma correcta decisão do caso, podendo um representante daquelas autoridades participar na audiência.
2 - O mesmo regime se aplicará aos casos em que, nos termos do artigo 64.º, n.º 3, o juiz decidir arquivar o processo.
3 - Em conformidade com o disposto no n.º 1, o juiz comunicará às autoridades administrativas a data da audiência, salvo se considerar que os seus conhecimentos específicos são dispensáveis.
4 - Em qualquer caso, o tribunal comunicará sempre às mesmas autoridades a sentença, bem como as demais decisões finais.

  Artigo 71.º
(Retirada da acusação e do recurso)
1 - Tanto a acusação como o recurso podem ser retirados até à sentença em 1.ª instância ou até ser proferido o despacho previsto no artigo 64.º
2 - Depois do início da audiência de julgamento a acusação só poderá ser retirada mediante o acordo do arguido, só podendo o recurso ser retirado mediante o acordo do Ministério Público.
3 - Antes de retirar a acusação deverá o Ministério Público ouvir as autoridades administrativas competentes, salvo se entender que tal não é indispensável para uma adequada decisão.

  Artigo 72.º
(Prova)
1 - Compete ao juiz promover oficiosamente a prova de todos os factos que considere relevantes para uma decisão correcta.
2 - Compete igualmente ao juiz o direito de determinar o âmbito da prova a produzir, recusando a aceitação de meios de prova que julgue desnecessários à formação da sua convicção.

  Artigo 73.º
(Decisões judiciais que admitem recurso)
1 - Pode recorrer-se para a relação da sentença ou do despacho judicial proferidos nos termos do artigo 64.º quando:
a) For aplicada ao arguido uma coima superior a 50000$00;
b) A condenação do arguido abranger sanções acessórias, salvo se estas consistirem em prestações pecuniárias inferiores a 50000$00;
c) O arguido for absolvido ou o processo for arquivado em casos em que a autoridade administrativa tenha aplicado uma coima superior a 50000$00 ou em que tal coima tenha sido reclamada pelo Ministério Público;
d) A impugnação judicial for rejeitada;
e) O tribunal decidir através de despacho não obstante o recorrente se ter oposto a tal.
2 - Para além dos casos enunciados no número anterior, poderá a relação, a requerimento do arguido ou do Ministério Público, aceitar o recurso da sentença quando tal se afigure manifestamente necessário à melhoria da aplicação do direito ou à promoção da uniformidade da jurisprudência.
3 - Se a sentença ou o despacho recorrido são relativos a várias infracções ou a vários arguidos e se apenas quanto a alguma das infracções ou a algum dos arguidos se verificam os pressupostos necessários, o recurso subirá com esses limites.

  Artigo 74.º
(Regime do recurso)
1 - O recurso deverá ser interposto no prazo de 5 dias a partir da sentença ou do despacho ou da sua notificação ao arguido, caso a decisão tenha ocorrido na sua ausência.
2 - Nos casos previstos no n.º 2 do artigo 73.º, o requerimento deve seguir junto ao recurso, antecedendo-o.
3 - Nestes casos, a decisão sobre o requerimento constitui questão prévia, que será resolvida por despacho não fundamentado do tribunal, equivalendo o seu indeferimento à retirada do recurso.
4 - O recurso seguirá a tramitação do recurso em processo penal, tendo em conta as especialidades que resultam deste diploma.

  Artigo 75.º
(Âmbito e efeitos do recurso)
1 - Se o contrário não resultar deste diploma, a 2.ª instância apenas conhecerá da matéria de direito, não cabendo recurso das suas decisões.
2 - A decisão do recurso poderá:
a) Alterar a decisão do tribunal recorrido sem qualquer vinculação aos termos e ao sentido da decisão recorrida;
b) Anulá-la e devolver o processo ao tribunal recorrido.

CAPÍTULO V
Processo de contra-ordenação e processo criminal
  Artigo 76.º
(Conversão em processo criminal)
1 - O tribunal não está vinculado à apreciação do facto como contra-ordenação, podendo, oficiosamente ou a requerimento do Ministério Público, converter o processo em processo criminal.
2 - A conversão do processo determinará a interrupção da instância e a instauração de inquérito preliminar ou instrução preparatória, consoante os casos, aproveitando-se, na medida do possível, as provas já produzidas.

  Artigo 77.º
(Conhecimento da contra-ordenação no processo criminal)
1 - O tribunal poderá apreciar como contra-ordenação uma infracção que foi acusada como crime.
2 - Se o tribunal só aceitar a acusação a título de contra-ordenação, o processo passará a obedecer aos preceitos desta lei.

  Artigo 78.º
(Processo relativo a crimes e contra-ordenações)
1 - Se o mesmo processo versar sobre crimes e contra-ordenações, havendo infracções que devam apenas considerar-se como contra-ordenações, aplicar-se-ão, quanto a elas, os artigos 42.º a 45.º, 50.º e 70.º, n.os 1, alíneas a), b) e c), e 2.
2 - Quando, nos casos previstos no número anterior, se interpuser simultaneamente recurso em relação a contra-ordenação e a crime, os recursos subirão juntos.
3 - O recurso subirá nos termos do Código de Processo Penal, não se aplicando o disposto no artigo 66.º nem dependendo o recurso relativo à contra-ordenação dos pressupostos do artigo 73.º

CAPÍTULO VI
Caso julgado e revisão
  Artigo 79.º
(Alcance do caso julgado)
1 - O trânsito em julgado da decisão da autoridade administrativa ou da decisão judicial sobre o facto como contra-ordenação ou como crime preclude a possibilidade de novo conhecimento de tal facto como contra-ordenação.
2 - O trânsito em julgado de sentença judicial ou de despacho, nos termos do artigo 74.º, sobre o facto como contra-ordenação preclude igualmente o seu novo conhecimento como crime.

  Artigo 80.º
(Admissibilidade da revisão)
1 - A revisão das decisões proferidas em matéria contra-ordenacional e transitadas em julgado obedecerá ao disposto nos artigos 673.º e seguintes do Código de Processo Penal, sempre que o contrário não resulte da presente lei.
2 - A revisão do processo a favor do arguido, com base em novos factos ou em novos meios de prova não será admissível quando:
a) O arguido apenas foi condenado em coima inferior a 5000$00 ou, tendo havido lugar a sanção acessória, esta é de natureza patrimonial e não excede aquele limite;
b) Já decorreram 2 anos após o trânsito em julgado da decisão a rever.
3 - A revisão contra o arguido só será admissível, quando vise a sua condenação pela prática de um crime.

  Artigo 81.º
(Regime do processo de revisão)
1 - A revisão de decisão da autoridade administrativa será da competência do tribunal de comarca competente para a impugnação judicial.
2 - Em tais casos, e quer a revisão tenha sido requerida pelo arguido quer a autoridade administrativa tenha tido conhecimento de circunstâncias que tornem possível a revisão, deverá a autoridade administrativa remeter os autos ao representante do Ministério Público junto do tribunal competente.
3 - Nos demais casos, a revisão será da competência da relação, aplicando-se, com as necessárias adaptações, o disposto no artigo 676.º do Código de Processo Penal.

  Artigo 82.º
(Caducidade da aplicação da coima por efeito de decisão no processo criminal)
1 - A decisão da autoridade administrativa que aplicou uma coima caduca quando o arguido venha a ser condenado em processo criminal pelo mesmo facto.
2 - O mesmo efeito terá a decisão final do processo criminal que, não consistindo numa condenação, seja incompatível com a aplicação da coima.
3 - As importâncias pecuniárias que tiverem sido pagas a título de coima serão, por ordem de prioridades, levadas à conta da multa, dos efeitos das penas que impliquem um pagamento em dinheiro e, por último, das custas processuais.
4 - Da sentença ou das demais decisões do processo criminal referidas nos n.os 1 e 2 deverá constar a referência aos efeitos previstos nos n.os 1, 2 e 3.

CAPÍTULO VII
Processos especiais
  Artigo 83.º
(Processo de apreensão)
1 - Quando a autoridade administrativa decidir, no processo de aplicação de coima, apreender qualquer objecto, a mesma autoridade será competente para:
a) Decidir da participação no processo das pessoas interessadas;
b) Decidir da necessidade de defensor oficioso e nomeá-lo;
c) Decidir sobre a indemnização.
2 - A autoridade administrativa deverá em tais casos notificar às pessoas cuja participação processual ordenou a decisão de que consta a ordem de apreensão.
3 - A partir da notificação, aquelas pessoas passam a considerar-se como participantes processuais, gozando de posição processual igual à do arguido, se o contrário não resultar deste diploma.

  Artigo 84.º
(Processo autónomo de apreensão)
1 - Nos casos de apreensão autónoma deverá a respectiva decisão da autoridade administrativa obedecer ao regime previsto no artigo 58.º, n.os 1, 2, alínea a), e 3, devidamente adaptado.
2 - A competência para decidir da apreensão rege-se pelos critérios que fixam a competência para a aplicação de uma coima, sendo, além disso, competente a autoridade em cuja área se encontram os objectos a apreender.

  Artigo 85.º
(Impugnação judicial da apreensão)
A impugnação judicial da apreensão obedecerá ao regime da impugnação da decisão de aplicação de uma coima, não sendo, contudo, admissível recurso da decisão do tribunal de comarca quando o valor dos objectos apreendidos não exceda 50000$00

  Artigo 86.º
(Processo extraordinário de impugnação)
1 - A requerimento do interessado, será admissível a impugnação extraordinária da decisão de apreensão, após o seu trânsito em julgado, quando o requerente sustente que:
a) Ao tempo do trânsito em julgado da decisão era titular de um direito sobre o objecto, que foi atingido ou extinto pela apreensão;
b) Não pôde, sem que tal se possa imputar a culpa sua, participar no processo que antecedeu a respectiva decisão, ou dele ter conhecimento.
2 - O requerimento deverá ser apresentado perante a autoridade administrativa que decidiu a apreensão no prazo de 15 dias após o conhecimento do trânsito em julgado e nunca mais de 1 ano depois deste trânsito.
3 - A decisão será da competência do tribunal da comarca em cuja área tem a sua sede a autoridade que ordenou a apreensão, aplicando-se o disposto no artigo 62.º
4 - Antes da decisão, poderá o tribunal, com a concordância do representante do Ministério Público, revogar a ordem de apreensão sempre que se afigure que os custos do processo possam ser claramente desproporcionados.
5 - Da decisão do tribunal cabe recurso para a relação, segundo os termos da presente lei, quando o valor do objecto exceda 50000$00.

  Artigo 87.º
(Processo relativo a pessoas colectivas ou equiparadas)
1 - As pessoas colectivas ou associações serão representadas no processo por quem legal ou estatutariamente as deva representar.
2 - Nos processos a que se refere o número anterior será também competente para a aplicação da coima a autoridade administrativa em cuja área a pessoa colectiva ou a associação tem a sua sede.

CAPÍTULO VIII
Da execução
  Artigo 88.º
(Pagamento da coima)
1 - O trânsito em julgado da decisão de aplicação da coima torna a decisão exequível, não podendo contudo promover-se a execução antes de decorridas duas semanas sobre o trânsito em julgado.
2 - O pagamento deverá ser feito durante aquelas 2 semanas, na Caixa Geral de Depósitos, contra recibo, cujo duplicado será entregue à autoridade administrativa ou tribunal que tiver proferido a decisão que torna exigível o pagamento da coima.
3 - Em caso de pagamento parcial, e salvo indicação em contrário do arguido, o pagamento será, por ordem de prioridades, levado à conta da coima, das sanções acessórias e, por último, das custas.
4 - Sempre que a situação económica o justifique, poderá a autoridade administrativa ou o tribunal autorizar o pagamento da coima dentro de prazo que não exceda um ano.
5 - Poderá ainda a autoridade administrativa ou o tribunal autorizar o pagamento em prestações, não podendo a última delas ir além dos dois anos subsequentes ao trânsito em julgado; a falta de pagamento de uma implica o vencimento de todas as prestações.
6 - Dentro dos limites referidos nos n.os 4 e 5 e quando motivos supervenientes o justifiquem, os prazos e os planos de pagamento inicialmente estabelecidos podem ser alterados.

  Artigo 89.º
(Da execução)
1 - O não pagamento em conformidade com o disposto no artigo anterior dará lugar à execução, que será promovida, perante o tribunal competente, segundo o artigo 61.º, salvo quando a decisão que dá lugar à execução tiver sido proferida pela relação, caso em que a execução poderá também promover-se perante o tribunal da comarca do domicílio do executado.
2 - A execução será promovida pelo representante do Ministério Público junto do tribunal competente e obedecerá aos termos da execução por custas, aplicando-se, devidamente adaptado, o disposto no artigo 640.º do Código de Processo Penal.
3 - Quando a execução tiver por base uma decisão da autoridade administrativa, esta remeterá os autos ao representante do Ministério Público competente para promover a execução.
4 - O disposto neste artigo aplica-se, com as devidas adaptações, à sanção pecuniária prevista no artigo 52.º, n.º 2, bem como às sanções acessórias que obriguem ao pagamento de uma importância pecuniária.

  Artigo 90.º
(Extinção e suspensão da execução)
1 - A execução da coima extingue-se com a morte do arguido.
2 - Deve suspender-se a execução quando, após o trânsito em julgado da decisão da autoridade administrativa que aplicou a coima, foi dada acusação em processo criminal pelo mesmo facto.
3 - O tribunal da execução deverá, oficiosamente ou a requerimento do Ministério Público ou do arguido, tomar as decisões a que se refere o artigo 82.º quando elas não tiverem sido tomadas no processo criminal de acordo com o n.º 4 daquele artigo.

  Artigo 91.º
(Tramitação)
1 - O tribunal perante o qual se promove a execução será competente para decidir sobre todos os incidentes e questões suscitados na execução, nomeadamente:
a) A admissibilidade da execução;
b) As decisões tomadas pelas autoridades administrativas em matéria de facilidades de pagamento;
c) A suspensão da execução segundo o artigo 90.º
2 - Admite-se, todavia, recurso para a relação nos seguintes casos:
a) Admissibilidade de execução de coima aplicada por via judicial;
b) Nos casos referidos na alínea b) do número anterior, quando as decisões forem da competência do tribunal da comarca.
3 - As decisões referidas nos n.os 1 e 2 serão tomadas sem necessidade de audiência oral, assegurando-se ao arguido ou ao Ministério Público a possibilidade de justificarem, por requerimento escrito, as suas pretensões.

CAPÍTULO IX
Das custas
  Artigo 92.º
(Princípios gerais)
1 - Se o contrário não resultar desta lei, as custas em processo de contra-ordenação regular-se-ão pelo disposto nos artigos 171.º e seguintes do Código das Custas Judiciais.
2 - As decisões das autoridades administrativas que decidam sobre a matéria do processo deverão fixar o montante das custas e determinar quem as deve suportar.
3 - As custas abrangem, nos termos normais, o imposto de justiça, os honorários dos defensores oficiosos, os emolumentos a pagar aos peritos e os demais encargos resultantes do processo.

  Artigo 93.º
(Do imposto de justiça)
1 - O processo de contra-ordenação que corre perante as autoridades administrativas não dará lugar ao pagamento de imposto de justiça.
2 - Está também isenta de imposto de justiça a impugnação judicial de qualquer decisão das autoridades administrativas.
3 - Darão lugar ao pagamento de imposto de justiça todas as decisões judiciais desfavoráveis ao arguido.
4 - O imposto de justiça não será inferior a 100$00 nem superior a 50000$00, devendo o seu montante ser fixado em razão da situação económica do infractor, bem como da complexidade do processo.
5 - O seguimento de qualquer recurso para o tribunal da relação dependerá do pagamento de imposto de justiça, que será de 200$00 e deverá ser liquidado até 48 horas após a apresentação do recurso.

  Artigo 94.º
(Das custas)
1 - Os honorários dos defensores oficiosos e os emolumentos devidos aos peritos obedecerão às tabelas do Código das Custas Judiciais.
2 - As custas deverão, entre outras, cobrir as despesas efectuadas com:
a) O transporte dos defensores e peritos;
b) As comunicações telefónicas, telegráficas ou postais, nomeadamente as que se relacionam com as notificações;
c) O transporte de bens apreendidos;
d) A indemnização das testemunhas.
3 - As custas serão suportadas pelo arguido em caso de aplicação de uma coima pela autoridade administrativa, de desistência ou rejeição da impugnação judicial ou dos recursos, de despacho ou sentença condenatória.
4 - Nos demais casos, as custas serão suportadas pelo erário público.

  Artigo 95.º
(Impugnação das custas)
1 - O arguido poderá, nos termos normais, impugnar a decisão da autoriade administrativa relativa às custas, devendo a impugnação ser apresentada no prazo de 48 horas a partir do conhecimento da decisão a impugnar.
2 - Da decisão do tribunal da comarca só há recurso para a relação quando o montante exceda a alçada daquele tribunal.

CAPÍTULO X
Disposição final
  Artigo 96.º
(Revogação)
Fica revogado o Decreto-Lei n.º 232/79, de 24 de Julho.

Visto e aprovado em Conselho de Ministros, 26 de Agosto de 1982. - Diogo Pinto de Freitas do Amaral - José Manuel Meneres Sampaio Pimentel.
Promulgado em 18 de Outubro de 1982.
Publique-se.
O Presidente da República, ANTÓNIO RAMALHO EANES.

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