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Trabalho e cível

Trabalho: do que se trata e em que é que o Ministério Público o pode ajudar?

 

O legislador constitucional conferiu expressamente ao Ministério Público competência para “(...) representar o Estado e defender os interesses que a lei determinar, bem como,(…) para participar na execução da política criminal definida pelos órgãos de soberania, exercer a acção penal orientada pelo princípio da legalidade e defender a legalidade democrática”.

Na sequência, o Estatuto do Ministério Público confere-lhe especial competência para “Exercer o patrocínio oficioso dos trabalhadores e seus famílias na defesa dos seus direitos de carácter social;”

Esta competência é depois conformada por outros diplomas legais na área do Direito do Trabalho, designadamente de natureza processual. 
Na área do Direito do Trabalho, deve destacar-se a importância do apoio efectivo do Ministério Publico na resolução dos litígios de natureza contratual, privilegiando as soluções consensuais, no que se evita ao recurso à acção litigiosa, pela procura de uma solução amigável, realista e célere do diferendo.
Em matéria de acidentes de trabalho, esta resolução consensual decorre formalmente na fase conciliatória do processo por acidentes de trabalho, incluindo os que respeitam à morte do trabalhador.
Não sendo possível a resolução consensual, cabe ao Ministério Público o patrocínio dos sinistrados e dos portadores de doença profissional e dos seus familiares nos processos emergentes de acidente de trabalho e nos processos emergentes de doença profissional. Também cabe ao Ministério Público requerer a actualização das pensões dos sinistrados. Esta intervenção do Ministério Público é gratuita para o trabalhador 
No que respeita aos litígios decorrentes da relação de trabalho subordinado, o Ministério Público pode patrocinar os trabalhadores que o solicitem e que não tenham recorrido ao patrocínio do advogado da associação sindical que o represente, ou que não tenham pedido apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono. O patrocínio do Ministério Público é gratuito para o trabalhador.
O Ministério Público na área laboral faz atendimento ao público, recebendo os trabalhadores ou familiares, o que em regra precede a sua intervenção processual.
O Ministério Público tem também intervenção nos processos de contra-ordenação, por via do que se asseguram melhores níveis de organização nas empresas e melhores condições de higiene e saúde no trabalho.

Para além destas funções específicas, cabem-lhe as demais, de defesa da legalidade de da representação do Estado.
Perguntas frequentes sobre o tema laboral...
1. Posso ser atendido pelo Ministério Público por causa de uma questão laboral?

Pode. O Ministério Público está representado em todos os tribunais e tem organizado um serviço de atendimento ao público. No que respeita às questões laborais, existem tribunais especializados, que são os tribunais do trabalho, onde o Ministério Público está representado e faz atendimento. Excepcionalmente, onde não exista Tribunal do Trabalho, a competência cabe ao tribunal de competência genérica, onde o Ministério Público também faz atendimento.
O atendimento tem primordialmente em vista prestar informação jurídica e a avaliar os pedidos de patrocínio dos trabalhadores.
Nesta página, pode encontrar as moradas e contactos dos serviços do Ministério Público.
Também pode encontrar informação sobre contactos dos tribunais na página da DGAJ.

2. O que devo levar comigo aquando do atendimento por causa de uma questão relativa ao contrato de trabalho?

Leve documento de identificação (Bilhete de Identidade, Cartão de Cidadão, Passaporte), cartão de contribuinte e da Segurança Social.
Leve informação e documentação que permitam ao Ministério Público conhecer o caso e agir.
Assim, tratando-se de assunto relativo à relação de trabalho subordinado, tente levar, quando existam, o contrato de trabalho, os recibos de retribuição, as comunicações escritas do empregador - de despedimento, de extinção do posto de trabalho, de caducidade do contrato a termo, de abandono -, cópia de cheques emitidos pelo empregador ou documentos de  transferências bancárias ou depósitos, folha de descontos para a Segurança Social, cópia de declaração para o Fundo de Desemprego,  cópias de cartas do trabalhador para o empregador e deste para o trabalhador, qualquer documento assinado pela entidade patronal, cópia da última declaração de IRS.
Havendo, deve levar identificação de testemunhas (nome e contacto) que saibam quando começou a trabalhar, o que fazia, quanto ganhava, e ou que tenham presenciado a situação relevante (por exemplo, o despedimento verbal) e ou que tenham sido seus colegas de trabalho.

Quanto a informação, tente reconstituir a que respeita ao dia em que começou a trabalhar (mesmo ”à experiência”), as datas em que realmente assinou o contrato, o dia em que deixou de trabalhar, o local onde trabalhava, que categoria profissional tinha, que tarefas é que executava (o que é que fazia exactamente), qual o horário que fazia (incluindo dias da semana e pausas para almoço), quanto ganhava (incluindo o vencimento base, subsídio de alimentação, subsídio de turno, outros subsídios e a título de quê), qual a causa da cessação da relação laboral, se houve interrupções da relação laboral (férias, períodos de baixa), o que entende que a entidade patronal lhe ficou a dever a título de vencimentos, férias não gozadas, subsídio de férias e de Natal não pagos, horas extraordinárias, montante de indemnização que tenha já recebido da entidade patronal. Tente saber se a relação de trabalho com a entidade patronal se regula ou não por instrumento de regulação colectiva de trabalho e na afirmativa, qual.

3. Pode o sinistrado participar a ocorrência de um acidente de trabalho ao Tribunal do Trabalho?

Pode, essencialmente pelas razões seguintes:
1º O empregador não ter seguro de acidentes de trabalho ou não fazer a participação do acidente à seguradora;
2º O seguro não cobre a totalidade da retribuição do sinistrado;
3º A seguradora considera que não se trata de um acidente de trabalho;
4º O sinistrado discorda da alta sem incapacidade atribuída pela seguradora.

    O sinistrado pode usar, para o efeito, a participação anexa. – Formulário de acidente trabalho.

4. O trabalhador e o sinistrado têm direito de opção pelo Tribunal do Trabalho competente?

Têm. Na acção emergente de contrato de trabalho, o trabalhador pode instaurar a acção no Tribunal da área do seu domicílio, ou do domicílio ou sede do empregador, ou local da prestação do trabalho.

Na acção emergente de acidente de trabalho, o sinistrado, ou os seus familiares beneficiários legais em caso de acidente mortal, podem participar o acidente no Tribunal do domicílio do sinistrado ou dos beneficiários ou do local onde ocorreu o acidente.
Insolvência de pessoas singulares - uma nova oportunidade...
1. Processo de insolvência - exoneração do passivo restante
No actual contexto económico, é cada vez maior o número de pessoas que, por terem ficado sem emprego ou por se encontrarem sobreendividadas, não conseguem pagar as suas dívidas.
Essa situação económica asfixiante, com o passar do tempo, vai aumentando e agravando. Com efeito, não raras vezes, verifica-se que, na impossibilidade de cumprir os compromissos assumidos, são contraídos novos empréstimos - facilmente concedidos a juros altíssimos – que se destinam unicamente a fazer face ao pagamento dos juros de empréstimos já contraídos. Desta situação resulta que as dívidas são cada vez maiores, sendo cada vez menor a possibilidade de lhes fazer face, até que surge a altura em que se aufere mensalmente um montante inferior àquele que se está obrigado a pagar e, por essa razão, totalmente impossibilitado de honrar os créditos acumulados.
Perante esse facto poder-se-á assumir três posições possíveis:
1) Deixar de pagar as dívidas, o que abre aos credores o recurso a tribunal para pedir o seu pagamento coercivo. Desse modo, são instauradas acções e execuções contra o devedor e, no âmbito desta, penhorados bens (designadamente a casa, o mobiliário, o vencimento, o carro, depósitos bancários) que são vendidos, destinando-se o produto da venda ao pagamento dos credores;   
2) Chegar a acordo com os credores a fim de, designadamente, alargar os prazos de pagamento e/ou unificando dívidas.
Todavia, apesar do estabelecimento de um novo acordo com os credores ser sempre preferível, existem situações em que este não se mostra possível nem viável.
Nesse caso, a lei consagra um regime que permite, a quem se encontra em situação de incumprimento, tomar a iniciativa não se limitando a aguardar que os credores recorram ao tribunal para que este proceda à penhora e à venda dos bens.
3) Trata-se do processo de insolvência no âmbito do qual é facultada às pessoas singulares (não titulares de empresas) a possibilidade de se libertarem de algumas das suas dívidas, assim lhes permitindo a sua reabilitação económica através de um mecanismo, denominado exoneração do passivo restante.
Apesar desta faculdade já se encontrar legalmente prevista desde 2004, o certo é que a maioria dos cidadãos ainda desconhece que através do processo judicial de insolvência podem liquidar, faseadamente, as suas dívidas durante 5 anos, findos os quais, se cumprirem, ficam exonerados (desobrigados) do pagamento das dívidas que ainda persistam e que não foram pagas.
Essa possibilidade, de ser desobrigado de proceder ao pagamento das dívidas que restam, apenas pode ser alcançada através do recurso ao processo judicial de insolvência – não existe outro modo de esta faculdade ser exercida. Por esta razão, alerta-se para a publicidade de inúmeras empresas que, on-line, anunciam este resultado sem recurso ao processo de insolvência e que, contas feitas, mais não fazem do que conceder esperança vã a devedores economicamente asfixiados.
Apesar de o Ministério Público não dispor de legitimidade para representar os cidadãos nesta matéria, afigura-se existe interesse público em dar a conhecer, em traços gerais, de forma deliberadamente simplificada, as principais características do processo de insolvência e, no seu âmbito, a exoneração do passivo restante.
2. Quem pode ser declarado insolvente?
Pode ser declarado insolvente qualquer pessoa - singular ou colectiva.
Deste modo, não é necessário ser-se comerciante para ser declarado insolvente - qualquer pessoa singular (não titular de uma empresa) pode sê-lo.
3. Quando é que o devedor, pessoa singular, se encontra em situação de insolvência?
A pessoa singular (que não seja titular de uma empresa) considera-se em situação de insolvência quando se encontra impossibilitada de cumprir as suas obrigações vencidas, ou seja, quando, por falta de meios financeiros, deixa de pagar, em tempo, as dívidas que contraiu.
No entanto, para que uma pessoa singular se possa apresentar à insolvência não é necessário que, por impossibilidade financeira, já tenha deixado de proceder ao pagamento das suas dívidas: pode apresentar-se à insolvência quem se encontra na iminência de não conseguir pagar, em tempo, as suas dívidas. Isto é, a partir do momento em que a pessoa se encontra numa situação financeira que, objectivamente, lhe permite concluir que não vai conseguir continuar a pagar o que deve (apesar de ainda não ter deixado de cumprir as suas obrigações) pode apresentar-se, desde logo, à insolvência. A iminência de insolvência é, para este efeito, equiparada à insolvência.
4. Quem pode requerer a declaração de insolvência?
Pode requerer a declaração de insolvência:
- O devedor;
- Quem for legalmente responsável pelas dívidas do devedor;
- Qualquer credor;
- O Ministério Público mas apenas em representação das entidades cujos interesses lhe estão legalmente confiados (v.g., Estado). Nesta matéria, a lei não confere ao Ministério Público legitimidade para representar os cidadãos em geral.
5. Existe algum prazo dentro do qual o devedor singular se deve apresentar á insolvência?
Apesar de sobre o devedor singular, ao contrário do que acontece em relação às pessoas colectivas, não impender o dever de se apresentar à insolvência, deve fazê-lo no prazo de seis meses contados da data em que deixou de pagar as suas dívidas, porque só desse modo lhe é facultada a possibilidade de beneficiar da exoneração do passivo restante.
6. Qual o tribunal competente para a declaração de insolvência das pessoas singulares?
O tribunal competente para a declaração de insolvência das pessoas singulares é os juízes cíveis localizados na área do domicílio do devedor, (ou do domicilio do autor da herança à data da morte), ou os do lugar onde o devedor tenha o centro dos seus principais interesses.

Assim, em Lisboa são competentes para conhecer do pedido de insolvência das pessoas singulares, os Juízes Cíveis que se encontram instalados no Palácio da Justiça.
7. Para requerer a declaração de insolvência é necessário ser representado por advogado?
Sim, é obrigatória a constituição de advogado.
Todavia, atendendo a que não disporá de meios financeiros que permitam contratar um advogado, poderá, sem custos, requerer, junto da Segurança Social ou nas Lojas do Cidadão, que lhe seja concedido apoio judiciário, na modalidade de nomeação de patrono oficioso (de advogado) e isenção do pagamento de custas. No site da Segurança Social existe um simulador electrónico que permite verificar se está ou não em condições de beneficiar de apoio judiciário. No mesmo site encontram-se também disponíveis formulários de pedidos de apoio judiciário que podem ser preenchidos, manual ou informaticamente, e entregues, presencialmente ou enviados pelo correio, acompanhados dos documentos ali indicados.

8. Como se inicia o processo de insolvência?
O processo de insolvência, que tem carácter urgente, inicia-se com um requerimento escrito, denominado petição inicial, que tem de ser feito por advogado. Aí deverá, além do mais, ser especificada (e juntos todos documentos necessários) a concreta situação financeira – identificação de todos os credores e dos débitos (montantes e datas de vencimento), identificação de todos os devedores e respectivos créditos, encargos com que se encontra onerado, o rendimento disponível e todos os bens que possui – ou seja, devem ser descritos especificadamente todos os factos que permitam concluir que o rendimento do devedor, já o impossibilitou de honrar os compromissos financeiros que assumiu ou que se encontra na iminência de os incumprir. Deverão, igualmente, ser identificados os cinco maiores credores e, sendo casado, terá se ser identificado o cônjuge e indicado o regime de bens do casamento.
Também na petição inicial poderá desde logo indicar-se a pessoa que se pretende que seja designada como Administrador da Insolvência (sendo certo que este apenas pode ser um dos que constam das listas oficiais).  

Importa, no entanto, assinalar que, caso o devedor pretenda a exoneração do passivo restante (ver infra) terá, desde logo, de o requerer na petição inicial.
9. Consequências da aceitação do pedido de insolvência.
A aceitação pelo juiz do pedido de insolvência, formulado pelo devedor tem, entre outras, as seguintes consequências:
- Declaração imediata da insolvência do devedor;
- Apreensão de todos os bens penhoráveis do devedor;
- Suspensão das execuções em que tenham sido penhorados bens apreendidos no processo de insolvência e impossibilidade de instauração de execuções relativas a esses mesmos bens.
Assim, se contra o devedor tiver sido instaurada uma execução na qual tenha sido penhorada, v.g., a sua casa de habitação, a declaração da insolvência impede o prosseguimento dessa execução e, consequentemente, a venda dessa residência.

10. Em que consiste a exoneração do passivo restante?
Trata-se de faculdade que a lei concede aos devedores singulares de, uma vez verificadas determinadas condições, os desobrigar de pagar as dívidas que não puderem ser pagas no processo de insolvência, ou nos cinco anos posteriores ao encerramento deste processo. Através deste mecanismo legal, atribui-se aos devedores singulares a possibilidade de se libertarem de parte das suas dívidas, de modo a que lhes seja possível alcançar a reabilitação económica e a faculdade de recomeçarem, sem dívidas, uma nova vida económico-financeira.
Deste modo, a finalidade da exoneração do passivo restante é de dar uma nova oportunidade ou um fresh start à pessoa singular insolvente.
Para tanto, o devedor deverá apresentar-se à insolvência e durante um período de cinco anos – chamado período de cessão – fica obrigado a proceder ao pagamento das dívidas que não tenham sido integralmente pagas no âmbito do processo. Durante esse período de cinco anos o devedor fica, além do mais, obrigado a entregar o seu rendimento disponível e uma entidade nomeada pelo tribunal – denominada fiduciário – que utilizará esse dinheiro para efectuar pagamentos aos credores. Findos esses cincos anos, se o devedor tiver cumprido os deveres que lhe foram impostos, o juiz profere uma decisão - despacho de exoneração – em que liberta o devedor da obrigação de pagar as dívidas que ainda restem (com excepção de algumas – ver infra).
11. Como devo proceder para que seja concedida a exoneração do passivo restante?
A exoneração do passivo restante apenas pode ser concedida no âmbito do processo de insolvência (ver supra) e tem de ser requerida logo no requerimento inicial mediante o qual o devedor se apresenta à insolvência, sendo certo que, para que seja possível beneficiar desta faculdade, terá de se apresentar à insolvência no prazo máximo de seis meses após ter deixado de proceder ao pagamento das dívidas. Assim, no mencionado requerimento inicial de apresentação à insolvência, o devedor deve formular dois pedidos: a declaração de insolvência e a exoneração do passivo restante. Para que o pedido de exoneração do passivo restante possa vir a ser concedido, deve, logo na petição inicial, fazer-se constar que se mostram verificados todos os requisitos de que a lei faz depender a possibilidade de concessão desse benefício e ainda a disponibilidade do devedor para cumprir todas as obrigações que sobre si vão impender.
12. Quais são os requisitos mínimos que têm de se mostrar verificados para que o pedido de exoneração do passivo restante não seja, desde logo, rejeitado?
O pedido de exoneração do passivo restante será, desde logo, rejeitado pelo juiz se ocorrer algumas das situações seguintes: - Se o pedido de insolvência não tiver sido efectuado no prazo de seis meses contados da data em que se deixou de solver as dívidas; - Se o devedor, intencionalmente, tiver fornecido por escrito, nos três anos anteriores à data de início do processo de insolvência, informações falsas ou incompletas sobre a sua situação económica, pretendendo com isso obter crédito ou subsídio de instituições públicas ou com o objectivo de evitar proceder a pagamentos devidos a essas instituições; - Se o devedor já tiver beneficiado da exoneração do passivo restante nos dez anos anteriores à data do inicio do processo de insolvência; - Se o devedor não se tiver apresentado à insolvência nos seis meses seguintes à verificação da situação de insolvência, com prejuízo para os credores, e sabendo, ou não podendo ignorar sem culpa, que não existia qualquer perspectiva séria de melhoria da sua situação económica; - Se existir no processo, ou for fornecida pelos credores, elementos com base nos quais se possa concluir, com probabilidade, a existência de culpa do devedor na criação ou agravamento da situação de insolvência (sendo que este requisito contém especificidades que deverão ser esclarecidas por um profissional do foro); - Se o devedor tiver sido condenado pelos crimes de insolvência dolosa ou negligente, frustração de créditos ou favorecimento de credores nos dez anos anteriores à data da entrada em juízo do pedido de declaração de insolvência ou posteriormente a esta data; - Se o devedor, no decurso do processo de insolvência, tiver, intencionalmente, violado os deveres de informação, apresentação e colaboração que sobre ele impendem.
13. Após a apresentação do pedido de insolvência em que é requerida a exoneração do passivo, o que se segue?
Apresentado o pedido na petição inicial, este é submetido à apreciação dos credores e do administrador da insolvência, não consubstanciando, contudo, a oposição dos credores motivo para o rejeitar (estes tenderão sempre a rejeitá-lo uma vez que poderá vir a determinar o não pagamento de parte dos seus créditos). Finda essa assembleia de credores, cabe ao juiz tomar posição sobre o pedido apreciando-o, verificando não só se se mostram preenchidos os requisitos de que a lei faz depender a respectiva aceitação (ver supra), mas também avaliando, face aos elementos disponíveis e ao comportamento anterior do devedor, se é expectável que este venha a cumprir as exigências que lhe vão ser impostas. O juiz aceita o pedido caso conclua que o devedor teve um comportamento anterior pautado pela transparência, licitude, honestidade e boa-fé e que, nessa medida, “merece” a oportunidade de lhe ser concedido um período experimental findo o qual poderá ser desobrigado de proceder ao pagamento da dívida restante; de contrário, convida o requerente a aperfeiçoa-lo ou rejeita-o liminarmente. Assim, caso o juiz não rejeite liminarmente o pedido, profere um despacho inicial onde estabelece as condições que vão vigorar durante os cinco anos subsequentes ao encerramento do processo de insolvência – denominado período de cessão – e determina que o devedor tem de ceder todo o seu rendimento disponível ao fiduciário (entidade escolhida pelo tribunal de entre as inscritas na lista oficial dos administradores de insolvência).
14. O devedor, aceite o pedido de exoneração do passivo restante, tem de entregar ao fiduciário tudo o que aufere?
Não. O devedor está obrigado a ceder ao fiduciário todos os rendimentos que lhe advenham a qualquer título, com exclusão:
- De alguns dos créditos anteriormente cedidos ou dados em penhor; e
- Do que seja razoavelmente necessário para:
 - O sustento minimamente digno do devedor e do seu agregado familiar; não devendo exceder, salvo decisão fundamentada do juiz em contrário, três vezes o salário mínimo nacional;
- O exercício pelo devedor da sua actividade profissional;
- Outras despesas ressalvadas pelo juiz no despacho inicial ou em momento posterior, a requerimento do devedor.
O juiz fixa, no despacho inicial, o montante que o insolvente pode dispor e que, consequentemente, se encontra excluído da cessão ao fiduciário.
No entanto, o devedor pode, desde logo na petição inicial, em que se apresenta á insolvência e onde requer a exoneração do passivo restante, indicar o montante mínimo que considera necessário à sua sobrevivência e que, consequentemente, considera que deverá ser excluído da cessão ao fiduciário.
15. Durante os cinco anos da cessão, quais são as obrigações que impendem sobre o insolvente?
Durante o período de cinco anos da cessão, o devedor fica obrigado a:
- Não ocultar ou dissimular quaisquer rendimentos que aufira, por qualquer título, e a informar o tribunal e o fiduciário sobre os seus rendimentos e património na forma e no prazo em que isso lhe seja requisitado;
- Exercer uma função remunerada, não a abandonando sem motivo legítimo, e a procurar diligentemente tal profissão quando desempregado, não recusando desrazoavelmente algum emprego para que seja apto;
- Entregar imediatamente ao fiduciário, quando por si recebida, a parte dos seus rendimentos objecto de cessão;
- Informar o tribunal e o fiduciário de qualquer mudança de domicílio ou de condições de emprego, no prazo de dez dias após a respectiva ocorrência, bem como, quando solicitado e dentro de igual prazo, sobre as diligências realizadas para a obtenção de emprego;
- Não fazer quaisquer pagamentos aos credores da insolvência a não ser através do fiduciário e a não criar qualquer vantagem especial para algum desses credores.
16. O fiduciário está obrigado a seguir alguma ordem no pagamento aos credores?
Sim. Os credores devem reclamar os seus créditos no processo de insolvência e estes são, por decisão do juiz, ordenados de acordo com um conjunto de regras definidas na lei (que distingue entre créditos garantidos, privilegiados, comuns e subordinados), e são pagos por essa ordem.
17. O que acontece no final dos cinco anos de duração da cessão?
Após o período de cinco anos de duração da cessão, se o devedor tiver cumprido todos os seus deveres, o juiz, após prévia audição do devedor, do fiduciário e dos credores da insolvência, profere uma decisão - despacho de exoneração – em que decide sobre a concessão ou não da exoneração do passivo restante do devedor. Isto é, decide se esses créditos são extintos e, consequentemente, se o devedor fica desobrigado de pagar as dívidas que ainda subsistam no final daqueles cinco anos. Essas dívidas que podem ser abrangidas pela exoneração do passivo restante não são apenas aquelas que os credores reclamaram no processo de insolvência, mas outras, ainda que não tenham sido reclamadas no processo.
No entanto, o devedor não fica desobrigado de pagar todas as dívidas que restem, porque a exoneração não abrange:
- Os créditos por alimentos;
- As indemnizações por factos ilícitos e dolosos – cujo pagamento tenha sido reclamado na insolvência;
- Os créditos por multas, coimas e outras sanções pecuniárias por crimes ou contra-ordenações; e
- Os créditos tributários.
18. A decisão de exoneração do passivo restante pode ser revogada?
Sim, a decisão de exoneração do passivo restante pode ser revogada em dois momentos:
- Antes mesmo de terminar o período de cinco anos da cessão, o juiz pode declarar a cessação antecipada do procedimento de exoneração;
- No ano seguinte após ter proferido a decisão final a conceder a exoneração, o juiz pode revogá-la.
Essa revogação, em ambas as situações, pode ocorrer se o devedor:
- Tiver, intencionalmente, fornecido por escrito, nos três anos anteriores
à data de início do processo de insolvência, informações falsas ou incompletas sobre a sua situação económica, pretendendo com isso obter crédito ou subsídio de instituições públicas ou com o objectivo de evitar proceder a pagamentos devidos a essas instituições;
- Já tiver beneficiado da exoneração do passivo restante nos dez anos anteriores à data do início do processo de insolvência;
- Não se tiver apresentado à insolvência nos seis meses seguintes à verificação da situação de insolvência, com prejuízo para os credores, e sabendo, ou não podendo ignorar sem culpa, que não existia qualquer perspectiva séria de melhoria da sua situação económica;
- Se existir no processo, ou for fornecida pelos credores, elementos com base nos quais se possa concluir, com probabilidade, a existência de culpa do devedor na criação ou agravamento da situação de insolvência (sendo que este requisito contém especificidades que deverão ser esclarecidas por um profissional do foro);
- Se o devedor tiver sido condenado pelos crimes de insolvência dolosa ou negligente, frustração de créditos ou favorecimento de credores nos dez anos anteriores à data da entrada em juízo do pedido de declaração de insolvência ou posteriormente a esta data;
- Se o devedor, no decurso do processo de insolvência, tiver, intencionalmente, violado os deveres de informação, apresentação e colaboração que sobre ele impendem.
E ainda se o devedor tiver, durante o período da cessão, violado intencionalmente as suas obrigações e com isso prejudicado a satisfação dos credores.
19. O que acontece se decisão de exoneração do passivo restante for revogada?
A revogação da exoneração importa a reconstituição de todos os créditos extintos. Ou seja: os créditos renascem e os credores voltam a poder executar o património do devedor.
20. Estas decisões são publicitadas?
Sim, o despacho inicial de exoneração (ver supra), o que declara a cessação antecipada do procedimento de exoneração (ver supra) e o de revogação da exoneração (ver supra) são averbados ao assento de nascimento.

Bibliografia: Processo de insolvência” – Luís M. Martins, 2010, 2ª Edição, Almedina


Actualizado a 30.MAI.11 por E.M.

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