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  DL n.º 321-B/90, de 15 de Outubro
    

  Versão desactualizada - redacção: Lei n.º 6/2001, de 11 de Maio!  
    Contém as seguintes alterações:     Ver versões do diploma:
   - Lei n.º 6/2001, de 11/05
   - DL n.º 329-B/2000, de 22/12
   - DL n.º 64-A/2000, de 22/04
   - Lei n.º 135/99, de 28/08
   - DL n.º 257/95, de 30/09
   - DL n.º 163/95, de 13/07
   - Lei n.º 13/94, de 11/05
   - DL n.º 278/93, de 10/08
   - Declaração de 30/11 de 1990
- 12ª "versão" - revogado (Lei n.º 6/2006, de 27/02)
     - 11ª versão (Lei n.º 7/2001, de 11/05)
     - 10ª versão (Lei n.º 6/2001, de 11/05)
     - 9ª versão (DL n.º 329-B/2000, de 22/12)
     - 8ª versão (DL n.º 64-A/2000, de 22/04)
     - 7ª versão (Lei n.º 135/99, de 28/08)
     - 6ª versão (DL n.º 257/95, de 30/09)
     - 5ª versão (DL n.º 163/95, de 13/07)
     - 4ª versão (Lei n.º 13/94, de 11/05)
     - 3ª versão (DL n.º 278/93, de 10/08)
     - 2ª versão (Declaração de 30/11 de 1990)
     - 1ª versão (DL n.º 321-B/90, de 15/10)
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SUMÁRIO
Aprova o Regime do Arrendamento Urbano

- [Este diploma foi expressamente revogado pelo(a) Lei n.º 6/2006, de 27/02!]
_____________________

1. O arrendamento urbano apresenta, na sua evolução recente, uma sequência marcada pela prolixidade legislativa.
Codificando regras presentes já no Corpus Iuris Civilis e nas Ordenações do Reino, o Código Civil de Seabra, de 1867, firmou um regime claro e liberal: o arrendamento, como modalidade de locação, era um contrato temporário com um prazo supletivo de seis meses (artigo 1623.º); chegado ao seu termo, «presume-se renovado o contrato, se o arrendatário se não tiver despedido, ou o senhorio o não despedir no tempo e pela forma costumados na terra» (artigo 1624.º); a renda era livremente fixada pelas partes (artigo 1603.º); o senhorio podia despedir o arrendatário antes do prazo, quando as rendas não fossem pagas ou fosse dado ao prédio uso diverso do devido (artigo 1607.º), e estava obrigado a obras, sob pena de perdas e danos ou de o arrendatário se lhe substituir, mandando fazê-las por conta do senhorio (artigo 1611.º). Por morte do senhorio ou do arrendatário, o contrato continuava nos sucessores: a sua natureza temporária prevenia quaisquer problemas nessa manutenção (artigo 1612.º).
A frequência e o dinamismo das situações jurídicas do arrendamento levaram o Código de Processo Civil de 1876 a regular, com alguma minúcia, a cessação do respectivo contrato. O tribunal foi chamado a intervir com frequência; assim, do seu artigo 498.º, «o senhorio a quem não convier a continuação do arrendamento além do prazo estipulado ou além daquele por que a lei o presume feito despedirá o arrendatário, fazendo-o citar para efectuar o despejo no fim do arrendamento». Uma lei de 21 de Maio de 1896 desenvolveu aspectos processuais em jogo nas acções de despejo, permitindo o seu diferimento em caso de doença do arrendatário ou de alguém da sua família (artigo 10.º, § único); ela vigoraria até ser revogada pelo Decreto de 30 de Agosto de 1907, que substituiu, também, os artigos competentes do Código de Processo Civil de 1876 e introduziu disposições substantivas. De notar a penalização dos arrendatários por crime de desobediência quando, não acatando a decisão judicial do despejo, obrigassem a passar à fase executiva (artigos 5.º e 7.º).
2. As tensões acumuladas por uma urbanização em crescimento rápido, a que se terá somado a vontade política de conseguir efeitos imediatos junto das populações, vieram provocar, após a proclamação da República, intervenções legislativas crescentes.
Assim, o Decreto de 11 de Novembro de 1910, percursor na matéria, veio fixar preceitos fiscais estritos no domínio do arrendamento urbano; para além disso, congelou as rendas pelo prazo de um ano (artigo 9.º), alongou a antecedência requerida para a oposição à renovação (artigo 12.º) e conferiu indemnizações ao arrendatário comercial, quando ele houvesse aumentado o valor do prédio e cessasse o arrendamento (artigo 33.º). Seguiram-se vários diplomas menores. Pouco depois, a situação já era suficientemente complexa para o Governo Provisório, por Portaria de 23 de Janeiro de 1911, publicada a 24, nomear uma comissão constituída por representantes dos proprietários de Lisboa e Porto - entre os quais João Catanho de Menezes -, por representantes dos inquilinos dessas duas cidades, por um advogado, um contador e pelo chefe de repartição do Ministério da Justiça - o Prof. Doutor José Maria Vilhena Barbosa de Magalhães - para «codificar todas as disposições em vigor sobre arrendamentos de prédios urbanos». Esta comissão, com relevo para os dois nomes citados, desenvolveu importante trabalho que, mercê da instabilidade política, só viria à luz em 1919, através do Decreto n.º 5411, de 17 de Abril desse mesmo ano.

3. A Grande Guerra de 1914-1918 constituiria, no entanto, o motor fundamental das intervenções legislativas no arrendamento. Logo em 23 de Novembro de 1914, o Decreto n.º 1079 congelava as rendas nos contratos existentes e nos novos contratos, com a excepção das de montante elevado (artigos 1.º e 2.º); ficava, assim, torneado o despejo por conveniência do senhorio já que o novo contrato deveria manter a renda anterior; o senhorio era obrigado a arrendar os prédios devolutos (artigo 3.º), prevendo-se ainda que este regime de excepção vigorasse enquanto subsistisse a crise que o motivara (artigo 6.º). O esquema em causa foi mantido, com modificações, pela Lei n.º 828, de 28 de Setembro de 1917, a qual veio declarar «expressamente proibido aos senhorios ou sublocadores [...] intentarem acções de despejo que se fundem em não convir-lhes a continuação do arrendamento, seja qual for o quantitativo das rendas» (artigo 2.º, n.º 5); previa-se ainda que tal lei se aplicasse «somente enquanto durar o estado de guerra e até seis meses depois de assinado o tratado de paz» (artigo 9.º).
Menos de um ano volvido, o Decreto n.º 4499, de 27 de Junho de 1918, regulou a matéria do arrendamento urbano, tentando pôr fim à multiplicidade de diplomas existentes na matéria. Manteve o congelamento das rendas (artigo 45.º) e a proibição dos despejos por conveniência do senhorio (artigo 46.º), mas agora até um ano depois de assinado o tratado de paz, segundo os dois citados artigos.
4. No fim da Guerra, foi publicado o importante Decreto n.º 5411, de 17 de Abril de 1919. Este diploma, elaborado na sequência do trabalho e dos esforços de Catanho de Menezes e de Barbosa de Magalhães, acima referidos, intentou reunir «toda a legislação referente ao arrendamento de prédios rústicos e urbanos». O condensar de múltiplas fontes existentes nesse domínio em 120 artigos permitiu dar um tratamento coerente à matéria, suprimindo lacunas e contradições. Além disso, separaram-se com clareza as disposições normais das de emergência que, motivadas pela crise de 1914-1918, apenas deveriam vigorar transitoriamente. Nestas últimas incluem-se o congelamento das rendas nos contratos existentes e nos futuros, salvo quando superiores a certo montante, elevado para a época (artigo 106.º), a proibição dos despejos por conveniência (artigo 107.º) e o dever de arrendar (artigo 108.º). Marcando bem a ideia de transitoriedade, ficava «o Governo autorizado a revogar as disposições dos precedentes artigos deste capítulo quando entender que não subsistem as circunstâncias de carácter económico e financeiro que motivaram o Decreto n.º 1079, de 23 de Novembro de 1914».
O Decreto n.º 5411 foi criticado pelas confusas relações que veio estabelecer com o Código Civil. A instabilidade económica e social subsequente promoveu novas alterações ao arrendamento, numa cifra que chegou a ultrapassar a centena. Não obstante, ele foi conservado como referência, dando ao arrendamento um mínimo de unidade institucional e científica.
5. A moeda portuguesa conheceu, na época, uma desvalorização acentuada. Esse factor, aliado ao bloqueamento das rendas, em breve conduziu a desequilíbrios de superação cada vez mais delicada. A Lei n.º 1368, de 21 de Setembro de 1922, procedendo a remodelações tributárias, veio permitir, implicitamente, a subida das rendas até ao rendimento líquido correspondente ao rendimento colectável inscrito na matriz (artigo 25.º, § 3.º). Foi um primeiro sinal, ainda que sem significado prático: os comentadores logo observaram que, dada a desactualização das matrizes, poucas seriam as actualizações. Aprofundando essa via, o Decreto n.º 9118, de 10 de Setembro de 1923, permitiu elevações de rendas até ao limite da multiplicação do rendimento matricial por certos coeficientes, variáveis consoante a data do arrendamento e a sua finalidade (artigo 7.º). As restrições mantinham-se, mercê da desactualização das matrizes; como eram contornadas com recurso à estipulação de rendas em moeda estrangeira, ainda que convertível em escudos, o Decreto n.º 9496, de 14 de Março de 1924, veio impor uma fixação completa em moeda nacional.
A Lei n.º 1662, de 4 de Setembro de 1924, pretendeu significar uma certa abertura; manteve restrições no domínio dos despejos (artigo 5.º) e facultou actualizações de rendas na base, também, de valores matriciais (artigo 10.º); ela própria considerou estas regras como transitórias, prescrevendo o termo da sua vigência para o dia 30 de Dezembro de 1925. Mas logo este prazo seria prorrogado: até 31 de Dezembro de 1926, pelo Decreto n.º 10774, de 19 de Maio de 1925, até 31 de Dezembro de 1927, pelo Decreto n.º 12617, de 6 de Novembro de 1926, e indefinidamente pelo Decreto n.º 14630, de 28 de Novembro de 1927.
Uma nova tentativa de resolução do problema das rendas foi efectuada pelo Decreto n.º 15289, de 30 de Março de 1928. Previram-se, aí, esquemas complexos de actualizações com base no valor matricial (artigo 27.º). As rendas dos prédios que vagassem eram libertadas (artigo 29.º), bem como as relativas a arrendatários com outra habitação ou que subaproveitassem o local (artigo 30.º) ou a proprietários de prédios construídos sem subsídios depois da entrada em vigor do diploma (artigo 54.º). Os contratos no regime de liberdade de renda podiam, ainda, cessar no seu termo, por conveniência do senhorio, nos moldes gerais (artigo 54.º, § 1.º). Estas regras foram suspensas, contudo, ainda que em parte, pelo Decreto n.º 15315, de 4 de Abril de 1928, enquanto o Decreto n.º 22661, de 13 de Junho de 1933, dispôs que as restrições relativas a rendas e a despejos só pudessem ser invocadas pelos arrendatários em relação à habitação onde tivessem residência permanente (artigo 5.º).
A concluir esta fase, assinale-se o Código de Processo Civil de 1939, que inseriu a acção de despejo entre os processos especiais nele regulados (artigos 970.º a 998.º), ainda que integrando matéria que, como o depósito das rendas, nada, com ela, tinha a ver.
A Lei n.º 1918, de 3 de Abril de 1940, da natureza fiscal, facultou avaliações de locais onde houvesse estabelecimentos comerciais, permitindo nova renda em consonância com o valor actualizado (artigo 4.º).
6. A grande reforma subsequente no domínio do arrendamento ficou a dever-se à Lei n.º 2030, de 22 de Junho de 1948.
Este diploma veio tratar de assuntos variados, com relevo para a expropriação por utilidade pública e para o direito de superfície. Na sua parte V - artigos 36.º e seguintes - versou o contrato de arrendamento urbano, numa série de preceitos que transitariam, depois, para o Código de 1966. Devem ser sublinhadas as disposições referentes à caducidade (artigos 41.º e seguintes) e à transmissão por divórcio e por morte do arrendatário (artigos 44.º e seguintes). A regra da renovação automática foi, contudo, conservada, por força do direito anterior. No tocante à actualização das rendas, foi esta admitida, fora de Lisboa e do Porto, até ao duodécimo do rendimento ilíquido inscrito na matriz, de modo escalonado (artigo 47.º, n.º 1); admitia-se, ainda, a avaliação fiscal para corrigir tal rendimento, na base da qual poderia haver novas actualizações (artigo 47.º, n.º 2). Nas duas principais cidades do País, as rendas ficaram, pois, congeladas. Os arrendamentos comerciais, a sublocação, o direito de preferência, as acções de despejo e o depósito de rendas eram, ainda, objecto de várias disposições.
A Lei n.º 2088, de 3 de Junho de 1957, em parte ainda vigente, veio regular a denúncia do contrato para a realização de obras que permitam aumentar o número de arrendatários, num esquema mantido pelo Código Civil, então em preparação.
Num outro plano, a Lei n.º 2114, de 15 de Junho de 1962, veio regular o arrendamento rural.
7. A unidade científica e sistemática da locação, incluindo as modalidades diversas de arrendamento, só voltou a ser reconstituída pelo Código Civil de 1966. Procurando respeitar muitas das especificidades preexistentes, o Código Civil conseguiu, não obstante, limar arestas e traçar um quadro claro para um instituto que, em pouco mais de meio século, terá provocado para cima de 300 intervenções legislativas. A liberdade de fixação das rendas manteve-se para o primeiro ou para novos arrendamentos. A denúncia por iniciativa do senhorio era, porém, muito restringida, conferindo aos arrendamentos urbanos uma natureza não temporária (artigo 1095.º). A actualização das rendas, dada a depreciação monetária, tornava-se, assim, questão candente: o Código Civil facultava-a, permitindo fazer corresponder o seu montante ao duodécimo do rendimento inscrito na matriz (artigo 1104.º), actualizável ao cabo de cinco anos por avaliação fiscal (artigo 1105.º): era, pois, o esquema da Lei n.º 2030. O Decreto-Lei n.º 47334, de 25 de Novembro de 1966, que aprovou o Código Civil, manteve, porém, a suspensão das avaliações fiscais prescritas em 1948 para Lisboa e para o Porto (artigo 10.º). Esta solução, encontrada na época por puros pruridos políticos, veio ampliar o problema, sem precedentes na agitada história do arrendamento urbano português, criado pela Lei n.º 2030. Nas vésperas da Revolução de 1974, havia numerosas rendas, em Lisboa e no Porto, que não eram actualizadas desde o imediato pós-guerra. Ora, como foi afirmado em 1966 pelo então Ministro da Justiça, em comunicação à Assembleia Nacional, o artigo 10.º do diploma preambular do Código Civil devia ser meramente transitório, por «o benefício concedido aos antigos inquilinos de Lisboa e do Porto estar no fundo a ser pago, com larga soma de juros, pelos novos arrendatários, de quem os proprietários exigem (até certo ponto justificadamente, dada a estagnação forçada do contrato) rendas que são excessivas para o padrão médio das remunerações do trabalho». Acresce ainda, continuou ele, que «da inalterabilidade das rendas, no mercado em permanente evolução, há-de resultar por força a progressiva deterioração de uma parcela não despicienda do património imobiliário nacional, fenómeno a que os poderes públicos não devem assistir impassíveis».
8. A evolução do arrendamento urbano que acompanhou e seguiu a Revolução de 1974-1975 retomou muitos dos caminhos trilhados durante a Guerra de 1914-1918 sem deles retirar as devidas lições. De certo modo, a situação foi mais grave, porquanto assente numa situação deteriorada já desde 1948.
O Decreto-Lei n.º 217/74, de 27 de Maio, congelou por 30 dias as rendas dos prédios urbanos (artigo 9.º). De seguida, o Decreto-Lei n.º 445/74, de 12 de Setembro, pretendendo resolver o problema da habitação do País, alargou a todos os concelhos a suspensão das avaliações fiscais para actualização das rendas, antes confinada a Lisboa e ao Porto (artigo 1.º), suspendeu o direito de demolição (artigo 2.º), estabeleceu um dever de arrendar (artigo 5.º) e fixou rendas máximas para o arrendamento de prédios antigos (artigo 15.º); a inobservância desta e de outras regras era penalmente reprimida (artigo 25.º). O Decreto-Lei n.º 155/75, de 25 de Março, suspendeu as denúncias do arrendamento feitas com base na ampliação do prédio ou na necessidade do local arrendado para casa própria do senhorio (artigo 1.º).
O Decreto-Lei n.º 198-A/75, de 14 de Abril, permitiu a legalização das ocupações de fogos levadas a efeito para fins habitacionais mediante contratos de arrendamento compulsivamente celebrados (artigos 1.º e 7.º); note-se que este diploma, que levou mais longe do que nunca o pendor expropriativo de certas medidas de protecção aos arrendatários, visou, na época, travar o fenómeno incontrolável das ocupações.
Seguiram-se numerosos outros diplomas, com relevo para o Decreto-Lei n.º 232/75, de 16 de Maio, que adoptou medidas relativas a casas sobreocupadas na região do Porto, o Decreto-Lei n.º 539/75, de 27 de Setembro, que pretendeu facilitar o realojamento das famílias prejudicadas por demolições, o Decreto-Lei n.º 188/76, de 12 de Março, que estabeleceu medidas respeitantes à prova do contrato de arrendamento para habitação, o Decreto-Lei n.º 366/76, de 15 de Maio, que introduziu alterações processuais na acção de despejo e visou instalar os locatários que não pagassem rendas por razões conjunturais, e o Decreto-Lei n.º 420/76, de 28 de Maio, que concedeu um direito de preferência aos conviventes com o arrendatário, em relação aos novos arrendamentos, mas que chegou a ser entendido pela jurisprudência como conferindo a tais conviventes um direito a novo arrendamento, mesmo quando o senhorio necessitasse do local para habitação própria.
Deve, ainda, sublinhar-se que a matéria dos arrendamentos rurais foi retirada do Código Civil pelo Decreto-Lei n.º 201/75, de 15 de Abril, que aprovou o novo regime. Esse diploma foi substituído pela Lei n.º 76/77, de 29 de Setembro, à qual, por seu turno, sucedeu o Decreto-Lei n.º 365/88, de 25 de Outubro, que procurou codificar a vasta legislação entretanto promulgada nesse domínio.
9. A difícil reconstrução da disciplina dos arrendamentos urbanos foi iniciada já sob o domínio da normalização constitucional. O Decreto-Lei n.º 583/76, de 22 de Junho, veio fazer cessar a suspensão das acções de despejo por denúncia para habitação própria do senhorio quando este fosse retornado das ex-colónias, emigrante, reformado, aposentado ou trabalhador que deixasse de beneficiar de habitação concedida pela entidade patronal. O Decreto-Lei n.º 293/77, de 20 de Julho, concedeu uma série de medidas de protecção aos réus em acções de despejo - incluindo moratórias na desocupação do prédio e a própria caducidade do direito de resolução pelo senhorio - e, como que em contrapartida, revogou o Decreto-Lei n.º 155/75, de 25 de Março, que suspendia os despejos por denúncia. O Decreto-Lei n.º 294/77, também de 20 de Julho, procurou, novamente, solucionar a questão das ocupações de prédios. A Lei n.º 63/77, de 25 de Agosto, correspondente à ideia de primazia da habitação própria, conferiu aos arrendatários habitacionais um direito de preferência na aquisição de habitação própria. A Lei n.º 55/79, de 15 de Setembro, veio restringir a denúncia para habitação própria do senhorio.
A questão das rendas foi abordada, com muitas cautelas, pelo Decreto-Lei n.º 148/81, de 4 de Junho: permitiram-se, aí, para o futuro, arrendamentos de renda livre, ilimitada mas sem actualização e de renda condicionada, limitada a 7% do duodécimo do valor do fogo, mas actualizável (artigos 1.º e 2.º); o valor dos fogos era definitivamente desanexado das matrizes totalmente desactualizadas (artigo 4.º) e as rendas actualizadas segundo um coeficiente anual a aprovar pelo Governo (artigo 7.º); manteve-se, por fim, a suspensão das avaliações fiscais para actualização de rendas, mas revogou-se o Decreto-Lei n.º 445/74, de 12 de Setembro (artigos 14.º e 15.º).
O problema do direito ao novo arrendamento a favor de pessoas que convivessem com o arrendatário, criado por certa interpretação do Decreto-Lei n.º 420/76, de 28 de Maio, foi regulado pelo Decreto-Lei n.º 328/81, de 4 de Dezembro, que, embora reconhecendo-o, firmou, contudo, várias restrições (artigos 3.º e 4.º).
O Decreto-Lei n.º 330/81, de 4 de Dezembro, veio permitir a actualização anual das rendas comerciais, de acordo com coeficientes de actualização aprovados pelo Governo (artigo 2.º) e permitindo-se ainda uma avaliação fiscal extraordinária para ajustamento das rendas praticadas à data da aplicação do regime anual (artigo 4.º); este diploma foi precedido por um outro - o Decreto-Lei n.º 329/81, de 4 de Dezembro, que pretendeu restringir a afectação comercial dos prédios. A actualização das rendas comerciais, incluindo a avaliação extraordinária, foi objecto de regulação aperfeiçoada, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 436/83, de 19 de Dezembro. Carecido da competente autorização legislativa, este diploma veio, contudo, a ser declarado inconstitucional pelo Tribunal Constitucional no Acórdão n.º 77/88, de 12 de Abril, na maioria das suas disposições, repristinando-se, assim, o Decreto-Lei n.º 330/81, de 4 de Dezembro, com várias excepções. No domínio do arrendamento para habitação já existente, foram facultadas actualizações de rendas em virtude de certas obras, nos termos dos Decretos-Leis n.os 294/82, de 27 de Julho, e 449/83, de 26 de Dezembro.
10. Assim se chega à Lei n.º 46/85, de 20 de Setembro. Este diploma aperfeiçoou a ideia de contratos celebrados no regime de renda livre e no de renda condicionada, tal como vinham já do Decreto-Lei n.º 148/81, de 4 de Junho. Para evitar, porém, novos desfasamentos e uma subida incontrolável das rendas exigidas às pessoas que chegassem, de novo, ao mercado do arrendamento, proclamou o princípio da actualização anual de todas as rendas, de acordo com os coeficientes a aprovar pelo Governo (artigo 6.º). Ao mesmo tempo, permitiu-se a correcção extraordinária das rendas fixadas antes de 1980, segundo coeficientes que variavam de acordo com a condição do prédio e a data da última actualização (artigo 11.º), com escalonamento dos aumentos daí resultantes (artigo 12.º). Foi, ainda, regulado o tema das obras de conservação e beneficiação, as quais podem, em certos casos, reflectir-se nas rendas (artigos 16.º e seguintes). Para compensar os aumentos de rendas, foi instituído o subsídio de renda para os arrendatários de baixo rendimento (artigos 22.º e seguintes). Vários outros temas, como o direito a novo arrendamento a favor do convivente com o senhorio (artigos 28.º e 29.º) ou a celebração de contratos de duração limitada (artigos 31.º e seguintes), em conjunto com disposições fiscais e penais, foram, ainda, incluídos na Lei n.º 46/85.
Em regulamentação da Lei n.º 46/85 foi publicado o Decreto-Lei n.º 13/86, de 23 de Janeiro, relativo a arrendamentos em renda condicionada, mas que introduziu várias regras gerais sobre o arrendamento urbano, e o Decreto-Lei n.º 68/86, de 27 de Março, sobre subsídios de renda.
Apesar de tratada em termos apocalípticos, a Lei n.º 46/85 foi aplicada sem dificuldades sociais. A convicção generalizada da injustiça das rendas antigas e a disponibilidade dos subsídios de renda terão sido decisivos. Importa ainda registar que os pedidos de subsídio ficaram muito aquém do previsto: embora percentualmente elevadas, as correcções extraordinárias das rendas incidiram sobre bases tão baixas que não tiveram reflexos nos rendimentos dos arrendatários, mesmo quando diminutos.
11. A Constituição de 1976, no seu artigo 65.º, considera a habitação como um direito que assiste a todos os portugueses.
Em consequência cabe ao Governo criar todas as condições, tomar as medidas, utilizar todas as políticas, programas e meios que permitam que aquele preceito constitucional se torne uma realidade concreta.
Não há política de habitação eficaz sem a participação plena e articulada de todas as componentes do mercado.
Da sua congregação resultará um maior número de alternativas no acesso à habitação, uma maior e mais diversificada oferta, uma maior capacidade para a satisfação das necessidades existentes, uma diminuição das tensões económicas e sociais, um maior e mais sustentado equilíbrio e estabilização do mercado, uma participação mais activa de todos os agentes económicos e uma maior propensão à tão necessária poupança.
Há que reconhecer que a política de habitação, após 1974, apesar de todos os benefícios políticos emergentes da Lei n.º 46/85, de 20 de Setembro, continua limitada, condicionada e circunscrita ao mercado de aquisição de casa própria, com todas as suas consequências políticas, económicas e sociais.
Assim, para a satisfação de uma necessidade básica constitucionalmente reconhecida, ao povo português não é, praticamente, dada qualquer alternativa credível senão a aquisição de casa própria.
Há que reconhecer que o mercado de arrendamento continua relativamente paralisado, não tendo correspondido às expectativas nele depositadas pela Lei n.º 46/85, de 20 de Setembro.
Apesar da evolução que essa lei representa, mantêm-se, no actual regime jurídico do arrendamento urbano, condições que o limitam e tornam pouco atractivo, condicionando a sua adequada e objectiva participação na política de habitação.
Em consequência, alguns pontos requerem reforma. Não se tratando, embora, de aspectos nucleares, eles podem alterar aspectos estruturais do arrendamento urbano, facilitando a dinamização do mercado da habitação. É hoje inquestionável que nenhum Estado consegue, só por si, fazê-lo.
Entre eles conta-se a possibilidade de, para o futuro, serem celebrados contratos de duração limitada, restituindo ao arrendamento a sua fixação temporária essencial. A degradação do parque habitacional e, em geral, da construção urbana, constitui problema a não ignorar. Há que continuar a incentivar as obras necessárias e fiscalizar o estado dos prédios bastando, num como noutro desses dois pontos, aperfeiçoar normas já existentes e, designadamente, as que conferem os necessários poderes às autarquias locais.
Entretanto, está em preparação um novo Código de Processo Civil. Os correspondentes trabalhos, de grande complexidade, levaram já à pública apresentação de um primeiro anteprojecto, que prevê a recondução da acção de despejo ao processo comum. Essa orientação obriga a dar guarida, neste diploma sobre o arrendamento, a vários preceitos substantivos a ele respeitantes e que, por contingência histórica, se encontravam na lei do processo: assim sucede, nomeadamente, com as regras referentes ao depósito das rendas e com vários preceitos respeitantes à cessação do arrendamento. Algumas especificidades processuais úteis para a dinamização do mercado de arrendamento e que correspondem a necessidades reais e à tradição do País são conservadas, ainda que a título intercalar e até que um novo Código de Processo Civil fixe, em definitivo, os termos do processo comum; assim sucede com o despejo incidental por não pagamento de rendas na pendência de acção de despejo, única forma de evitar que alguém possa, gratuitamente, desfrutar de imóveis, durante o longo período que pode levar à conclusão de um despejo e numa situação que já não seria reparada por nenhuma condenação em indemnização ou em rendas vencidas, sempre que o despejado não tivesse bens bastantes; e assim sucede, também, com o mandado de despejo, meio útil para acelerar a fase executiva da competente acção, tanto mais que a lei prevê vários esquemas para diferir a desocupação dos imóveis, em caso de necessidade.
Paralelamente, uma adequada política fiscal pode constituir um incentivo importante para a dinamização do mercado do arrendamento.
Em Portugal, por vezes, tem havido a tendência para abordar a problemática do arrendamento como se de uma luta de interesses se tratasse entre proprietários e inquilinos, quando, de facto, se está perante uma situação totalmente inversa.
Não há interesses antagónicos, antes pelo contrário: trata-se, para todos os efeitos, de procurar a sua saudável conjugação, em benefício da sociedade e do País.
Cabe ao Governo, quando necessário e as circunstâncias o exijam, encontrar o equilíbrio socialmente justo, sem defender qualquer das partes, mas por forma a garantir as melhores condições para o cumprimento de um preceito constitucional - o direito à habitação.
Tudo isto é visado pela presente reforma; mas de modo integrado.
12. O direito é um todo. Os diversos institutos jurídicos apresentam, para além disso, a particular unidade de sentido que lhes confere uma identidade própria. O pensamento sistemático dos nossos dias mostra que normas jurídicas aparentemente idênticas ganham sentidos diferentes consoante a sua inserção no conjunto.
Ao procurar reunir num único diploma, elaborado em consonância com os ditames da ciência do direito, diversas soluções esparsas ao sabor de contingências ocorridas em décadas de evolução tumultuosa, o legislador deparou com lacunas, desarmonias, duplicações, contradições e mesmo inconstitucionalidades que antes tinham passado despercebidas ou apenas parcialmente haviam sido referenciadas. Há que corrigi-las.
Nessa tarefa codificadora, teve-se sempre a preocupação de valorar os textos anteriores perante a jurisprudência dos tribunais de Portugal: o verdadeiro direito surge apenas na decisão concreta em cujo decurso, tantas vezes, se manifestam as deficiências de diplomas julgados perfeitos.
Nesta linha e na medida do possível foram mantidos os textos anteriores quando, sobre eles, houvesse já uma concretização jurisprudencial que importasse conservar.
A opção sistemática essencial pressuposta pelo presente diploma é simples: o regime geral da locação, expurgado de algumas alterações que lhe foram introduzidas com vista, apenas, ao arrendamento urbano, mantém-se no Código Civil; a matéria do arrendamento urbano - tal como há muito sucedeu com o arrendamento rural - sai desse diploma, constituindo uma lei civil autónoma; a vasta produção existente é codificada, reunindo-se a esse núcleo, de modo a colmatar lacunas, evitar contradições e prevenir desarmonias. Ficam ressalvados temas que, por razões técnicas ou pela sua mutabilidade, como os subsídios de renda, encontrem melhor sede em diplomas avulsos ou aqueles que, por transitórias, como os relativos a actualizações extraordinárias, fiquem bem situados no diploma preambular.
Assim:
No uso da autorização legislativa concedida pelo artigo 1.º da Lei n.º 42/90, de 10 de Agosto, e nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 201.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte:
  Artigo 1.º
Aprovação
É aprovado o Regime do Arrendamento Urbano, que faz parte do presente decreto-lei.

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