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  DL n.º 69/2023, de 21 de Agosto
  REGIME JURÍDICO DA QUALIDADE DA ÁGUA DESTINADA AO CONSUMO HUMANO(versão actualizada)
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SUMÁRIO
Estabelece o regime jurídico da qualidade da água destinada ao consumo humano, transpondo diversas diretivas
_____________________

Decreto-Lei n.º 69/2023, de 21 de agosto
A qualidade da água destinada ao consumo humano tem vindo a apresentar, nas últimas décadas, uma evolução muito significativa em Portugal. Esta evolução resulta, não só, do quadro legislativo que, desde os anos 90, assegura a transposição das diretivas europeias relativas à qualidade da água para consumo humano, mas também do modelo de regulação da qualidade da água que tem vindo a ser aperfeiçoado e que tem permitido a melhoria contínua do controlo dos valores paramétricos da água fornecida aos consumidores, bem como a deteção e correção de situações que comportem risco para a saúde humana.
Na sequência da conclusão da iniciativa de cidadania europeia sobre o direito à água («iniciativa Right2Water»), a Comissão lançou uma consulta pública à escala da União Europeia e realizou uma avaliação da adequação e da eficácia da Diretiva n.º 98/83/CE. Esse exercício tornou evidente a necessidade de introduzir melhorias, em particular nos domínios da definição da lista de valores paramétricos baseados na qualidade da informação a prestar aos consumidores, bem como no âmbito das disparidades existentes entre sistemas de aprovação de materiais e produtos que entram em contacto com a água destinada ao consumo humano e das consequências que têm sobre a saúde humana e, bem assim, a necessidade de promover a consciencialização para as perdas de água decorrentes do subinvestimento na manutenção e renovação das infraestruturas.
Por outro lado, a iniciativa Right2Water identificou que parte da população, em particular os grupos mais marginalizados, não tinham acesso a água destinada ao consumo humano, sendo a garantia desse acesso um compromisso assumido no âmbito do Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 6 da Agenda 2030 das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável. Foi neste contexto que foi adotada a Diretiva (UE) n.º 2020/2184, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de dezembro de 2020 [Diretiva (UE) n.º 2020/2184], que ora se transpõe, a qual, mantendo o objetivo de proteger a saúde humana de qualquer contaminação da água destinada ao consumo humano, assegurando a sua salubridade e limpeza, vem preconizar a melhoria do acesso à água destinada ao consumo humano para todos na União Europeia. Para o efeito, estabelece um conjunto de requisitos mínimos a que está sujeita a água destinada ao consumo humano, impondo aos Estados-Membros a adoção de todas as medidas necessárias para garantir que a água destinada ao consumo humano não contém quaisquer microrganismos e parasitas, nem substâncias que, em quantidades ou concentrações, em determinadas circunstâncias, constituam um perigo potencial para a saúde humana, e que essa água satisfaz os referidos requisitos mínimos.
No que concerne à lista de valores paramétricos, destaca-se a introdução de novos parâmetros como a Legionella, outros subprodutos da desinfeção, como os ácidos haloacéticos ou o desregulador endócrino bisfenol A, aos quais são acrescentados outros compostos na lista de vigilância a publicar pela Comissão Europeia e, ainda, as substâncias perfluoroalquiladas (PFAS). Na revisão da lista de valores paramétricos salienta-se, igualmente, a definição de valores paramétricos mais restritivos para o crómio ou para o chumbo, embora com a previsão de períodos de transição que permitem a adoção de medidas corretivas para garantir a observância dos mesmos.
Relativamente à implementação da abordagem de avaliação e gestão do risco, prevê-se que a mesma deve ser completa, abrangendo toda a cadeia de abastecimento, desde a bacia de drenagem, a captação, o tratamento da água, o armazenamento e a distribuição, até ao ponto de conformidade. Assim, a avaliação e gestão do risco passa a incidir sobre os três componentes principais da cadeia de abastecimento: as bacias de drenagem dos pontos de captação de água destinada ao consumo humano, os sistemas de abastecimento públicos e os sistemas de distribuição predial, com particular incidência nas instalações prioritárias.
Prevê-se, ainda, que as avaliações do risco sejam periodicamente revistas, nomeadamente em resposta a ameaças decorrentes de fenómenos meteorológicos extremos relacionados com o clima, de alterações conhecidas das atividades humanas na zona de captação ou em resposta a incidentes relacionados com a origem da água, devendo, igualmente, ser assegurado um intercâmbio permanente de informações entre as autoridades competentes e as entidades gestoras dos sistemas de abastecimento de água.
A existência de diferentes sistemas de aprovação dos materiais e produtos em contacto com a água destinada ao consumo humano no espaço da União Europeia é outro dos aspetos a que iniciativa Right2Water confere especial relevo. Assim, a referida diretiva estabelece requisitos mínimos aplicáveis aos produtos que entram em contacto com a água destinada ao consumo humano, com o intuito de alcançar um nível de proteção da saúde humana idêntico para todos os europeus e um melhor funcionamento do mercado interno. Neste enquadramento, o presente decreto-lei estabelece um conjunto de princípios e requisitos que decorrem da referida diretiva, relacionados com o processo de seleção dos produtos a utilizar no tratamento da água e dos materiais a aplicar nas infraestruturas novas ou naquelas que sejam objeto de manutenção ou renovação, a fim de garantir que não comprometem a saúde humana direta ou indiretamente, não afetam negativamente a cor, o cheiro ou o sabor da água, não promovem o crescimento microbiano na água ou não causam a migração de contaminantes para a água a níveis mais elevados do que o necessário, tendo em conta o fim a que se destinam.
Estes princípios e requisitos devem ser desenvolvidos pela Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos (ERSAR) através da aprovação, sob a forma de regulamento, de um sistema de aprovação nacional para os produtos em contacto com a água, quer sejam substâncias e produtos químicos utilizados no tratamento da água ou materiais existentes nas instalações, desde a captação, o tratamento, a rede de adução, a rede de distribuição e no sistema de distribuição predial até à torneira do utilizador ou ao ponto de utilização de água destinada ao consumo humano.
Quanto à melhoria das condições de acesso à água para consumo humano, que constitui uma condição essencial para cumprir os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, assume particular relevância a identificação de todos os que não têm acesso ou têm acesso limitado, designadamente os grupos mais vulneráveis e marginalizados, e a adoção de medidas que mitiguem as razões que impedem ou dificultam este acesso.
Importa, ainda, sublinhar que, tendo em vista tornar os utilizadores mais conscientes das consequências do consumo de água, a Diretiva (UE) n.º 2020/2184, em linha com o 7.º Programa Geral de Ação da União para 2020 em matéria de ambiente, veio reforçar o direito de acesso à informação sobre a qualidade da água, tornando obrigatória a disponibilização desta informação online, de forma fácil e personalizável, podendo ser solicitado o acesso a esta e outras informações por outros meios, mediante pedido devidamente justificado.
Neste contexto, o presente decreto-lei procede à alteração do Decreto-Lei n.º 194/94, de 20 de agosto, na sua redação atual, que estabelece o regime jurídico dos serviços municipais de abastecimento público de água, de saneamento de águas residuais e de gestão de resíduos urbanos, e do Decreto-Lei n.º 114/2014, de 21 de junho, na sua redação atual, que consagra a obrigação da faturação detalhada relativamente aos serviços públicos de abastecimento público de água, de saneamento de águas residuais e de gestão de resíduos urbanos, prevendo a obrigação de divulgação no sítio na Internet das entidades gestoras de informação sobre, designadamente, métodos de produção de água, incluindo informações gerais sobre as formas de tratamento e desinfeção da água utilizada, informações relevantes sobre a avaliação do risco e a gestão do risco do sistema de abastecimento e recomendações sobre possíveis formas de reduzir o consumo de água e evitar riscos para a saúde devido a águas estagnadas.
Faz-se notar que estas obrigações passam a ser impostas, igualmente, às entidades gestoras dos serviços de abastecimento de água de titularidade estatal, através da alteração ao Decreto-Lei n.º 92/2013, de 11 de julho, na sua redação atual, que define o regime de exploração e gestão dos sistemas multimunicipais de captação, tratamento e distribuição de água para consumo público, de recolha, tratamento e rejeição de efluentes e de recolha e tratamento de resíduos sólidos.
Por fim, importa referir que, sendo inegável que o indicador água segura tem tido uma evolução assinalável, não pode ser descurada a necessidade crescente de utilização mais racional dos recursos hídricos e de manutenção e renovação das infraestruturas, pelo que a avaliação das perdas de água nos sistemas de abastecimento se revela essencial. O processo de avaliação das perdas de água já se encontra em curso em Portugal desde o início do século xxi, com a implementação do sistema de avaliação da qualidade do serviço pela ERSAR mas, no atual quadro legal europeu, esta avaliação torna-se obrigatória, bem como a comunicação à Comissão Europeia dos resultados da avaliação efetuada e do plano de ação para a redução de perdas.
Foram ouvidos os órgãos de governo próprio das Regiões Autónomas, a Associação Nacional de Municípios Portugueses e a Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos.
Assim:
Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 198.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte:

CAPÍTULO I
Disposições gerais
  Artigo 1.º
Objeto
1 - O presente decreto-lei estabelece o regime jurídico da qualidade da água destinada ao consumo humano, transpondo para a ordem jurídica nacional:
a) A Diretiva n.º 2013/51/EURATOM, do Conselho, de 22 de outubro de 2013, que estabelece requisitos para a proteção da saúde do público em geral no que diz respeito às substâncias radioativas presentes na água destinada ao consumo humano;
b) A Diretiva (UE) n.º 2020/2184, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de dezembro de 2020, relativa à qualidade da água destinada ao consumo humano (Diretiva (UE) n.º 2020/2184).
2 - O presente decreto-lei procede, ainda:
a) À terceira alteração ao Decreto-Lei n.º 194/2009, de 20 de agosto, alterado pelo Decreto-Lei n.º 92/2010, de 26 de julho, e pela Lei n.º 12/2014, de 6 de março, que estabelece o regime jurídico dos serviços municipais de abastecimento público de água, de saneamento de águas residuais e de gestão de resíduos urbanos;
b) À terceira alteração ao Decreto-Lei n.º 92/2013, de 11 de julho, alterado pelos Decretos-Leis n.os 72/2016, de 4 de novembro, e 16/2021, de 24 de fevereiro, que define o regime de exploração e gestão dos sistemas multimunicipais de captação, tratamento e distribuição de água para consumo público, de recolha, tratamento e rejeição de efluentes e de recolha e tratamento de resíduos sólidos;
c) À segunda alteração ao Decreto-Lei n.º 114/2014, de 21 de junho, alterado pela Lei n.º 41/2018, de 8 de agosto, que estabelece os procedimentos necessários à implementação do sistema de faturação detalhada relativamente aos serviços públicos de abastecimento público de água, de saneamento de águas residuais e de gestão de resíduos urbanos.

  Artigo 2.º
Âmbito de aplicação
1 - O presente decreto-lei aplica-se às águas destinadas ao consumo humano, com exceção das:
a) Águas minerais naturais, abrangidas pelo regime jurídico decorrente da Lei n.º 54/2015, de 22 de junho;
b) Águas de nascente abrangidas pelo Decreto-Lei n.º 156/98, de 6 de junho, na sua redação atual, exceto no que se refere aos valores estabelecidos nas partes B e C do anexo i ao presente decreto-lei e do qual faz parte integrante, para os parâmetros fixados pela entidade licenciadora;
c) Águas que são produtos medicinais, na aceção da alínea kk) do n.º 1 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 176/2006, de 30 de agosto, na sua redação atual;
d) Águas que se destinam exclusivamente a fins para os quais a autoridade de saúde tenha determinado que a qualidade da água não tem qualquer influência, direta ou indireta, na saúde dos consumidores;
e) Água destinada ao consumo humano fornecida no âmbito de sistemas de abastecimento particular que sirvam menos de 50 pessoas ou que sejam objeto de consumos inferiores a 10 m3 por dia, em média, com exceção da água fornecida no âmbito de uma atividade pública ou privada de natureza comercial, industrial ou de serviços.
2 - Nos casos previstos na alínea e) do número anterior:
a) As entidades licenciadoras informam a respetiva autoridade de saúde dos licenciamentos concedidos;
b) A autoridade de saúde deve informar a população afetada da exclusão do âmbito do presente decreto-lei, bem como das medidas necessárias para proteger a saúde humana dos efeitos nocivos resultantes de qualquer contaminação da água para consumo humano;
c) Sempre que for identificado um perigo potencial para a saúde humana causado pela qualidade da água, a autoridade de saúde presta o aconselhamento adequado à população servida.

  Artigo 3.º
Definições
Para efeitos do disposto no presente decreto-lei, entende-se por:
a) «Água destinada ao consumo humano», toda a água:
i) No seu estado original, ou após tratamento, destinada a ser bebida, a cozinhar, à preparação de alimentos, à higiene pessoal ou a outros fins domésticos, quer em lugares públicos, quer em lugares privados, independentemente da sua origem e de ser ou não fornecida a partir de uma rede de distribuição, fornecida a partir de uma cisterna fixa ou móvel, em garrafas ou outros recipientes, com ou sem fins comerciais, incluindo águas de nascente;
ii) Utilizada em empresa do setor alimentar para o fabrico, a transformação, a conservação ou a comercialização de produtos, ou substâncias, destinados ao consumo humano, bem como a utilizada na limpeza de superfícies, objetos e materiais que podem estar em contacto com os alimentos, exceto quando a utilização dessa água não afeta a salubridade do género alimentício na sua forma acabada;
b) «Acreditação», declaração na aceção do n.º 10 do artigo 2.º do Regulamento CE n.º 765/2008, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 9 de julho de 2008;
c) «Avaliação do risco», o processo de recolha e análise de dados, de caracterização das condições do sistema com vista à identificação de perigos e de eventos perigosos, efetuado de modo sistemático ao longo de toda a cadeia de abastecimento, desde a bacia de drenagem, a captação, o tratamento e o armazenamento até à distribuição da água no ponto de verificação de conformidade que permite concluir quais são os riscos significativos para a segurança da água para consumo humano;
d) «Bacia de drenagem do ponto de captação», as águas superficiais ou subterrâneas que drenam para o ponto de captação de água;
e) «Composição», a composição química de um metal, esmaltes, cerâmica ou outro material inorgânico;
f) «Controlo», o conjunto de ações de avaliação da qualidade da água realizadas com caráter regular pelas entidades gestoras, com vista à manutenção da sua qualidade, em conformidade com as normas estabelecidas legalmente;
g) «Dose indicativa ou 'DI'», a dose efetiva comprometida para um ano da ingestão de todos os radionuclídeos cuja presença tiver sido detetada num abastecimento de água destinada ao consumo humano, tanto de origem natural como artificial, excluindo o trítio, o potássio-40, o radão e os produtos de vida curta da desintegração do radão;
h) «Entidade gestora de sistema de abastecimento particular», a entidade responsável pela exploração e gestão de sistemas de abastecimento de água destinada ao consumo humano para fins privativos;
i) «Entidade gestora de sistema de abastecimento público», a entidade responsável pela exploração e gestão de um sistema de água para consumo humano, através de redes fixas ou de outros meios de fornecimento de água, no âmbito das atribuições de serviço público;
j) «Entidade gestora de sistema de abastecimento público em alta», a entidade responsável por um sistema destinado, no todo ou em parte, ao represamento, à captação, à elevação, ao tratamento, ao armazenamento e à adução de água destinada ao fornecimento de água a outras entidades gestoras;
k) «Entidade gestora de sistema de abastecimento público em baixa», a entidade responsável por um sistema destinado, no todo ou em parte, ao armazenamento, à elevação e à distribuição de água para consumo público aos sistemas prediais, aos quais liga através de ramais de ligação;
l) «Evento perigoso», um evento que introduz perigos no sistema de abastecimento de água destinada ao consumo humano ou que não consegue eliminar esses perigos do sistema;
m) «Instalações prioritárias», instalações não residenciais de grande dimensão com muitos utilizadores potencialmente expostos aos riscos associados à água para consumo humano;
n) «Operador de uma empresa do setor alimentar», um operador de uma empresa do setor alimentar na aceção do n.º 3 do artigo 3.º do Regulamento (CE) n.º 178/2002, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 28 de janeiro de 2002;
o) «Organismo de avaliação da conformidade», o organismo que efetua atividades de avaliação da conformidade, nomeadamente de calibração, de ensaio, de certificação e de inspeção;
p) «Organismo Nacional de Acreditação» um organismo nacional na aceção do n.º 11 do artigo 2.º
do Regulamento CE n.º 765/2008, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 9 de julho de 2008;
q) «Parâmetros indicadores», os parâmetros cujo valor paramétrico deve ser considerado como valor guia, nos termos do presente decreto-lei;
r) «Perigo», um agente biológico, químico, físico ou radiológico presente na água, ou outro aspeto do estado da água, suscetível de ser prejudicial para a saúde humana;
s) «Ponto de verificação de conformidade», o ponto de amostragem onde é efetuada a colheita de amostra de água para verificação da sua conformidade, nos termos definidos no presente decreto-lei;
t) «Ponto de entrega», o local físico ou o conjunto de locais físicos onde é feita a entrega de água para consumo humano por uma entidade gestora a outra entidade gestora, caracterizado por uma uniformidade da qualidade de água;
u) «População servida», o número de habitantes ligados a um sistema de abastecimento, no âmbito de uma zona de abastecimento;
v) «Rede de distribuição», o conjunto de tubagens e acessórios instalados para a distribuição da água para consumo humano desde os reservatórios, ou captações ou estações de tratamento de água, até à entrada nos sistemas de distribuição prediais;
w) «Risco», uma combinação da probabilidade de que ocorra um evento perigoso com a gravidade das consequências, se o perigo e o evento perigoso ocorrerem na cadeia de abastecimento de água destinada ao consumo humano, desde a bacia de drenagem, a captação, o tratamento e o armazenamento até à distribuição da água no ponto de verificação de conformidade;
x) «Sistema de abastecimento», o conjunto de equipamentos e infraestruturas que englobam a captação, o tratamento, a adução, o armazenamento e a distribuição da água para consumo humano até ao ponto de verificação de conformidade;
y) «Sistema de distribuição predial», o conjunto de canalizações, acessórios e aparelhos instalados entre as torneiras que, por regra, são utilizados no abastecimento de água destinada ao consumo humano e o ramal de ligação;
z) «Substância inicializadora», uma substância intencionalmente adicionada para a produção de materiais orgânicos ou aditivos para materiais cimentícios;
aa) «Substância radioativa», qualquer substância que contenha um ou mais radionuclídeos, cuja atividade ou concentração não possa ser menosprezada do ponto de vista da proteção da saúde humana contra as radiações;
bb) «Utilizador», qualquer pessoa singular ou coletiva, pública ou privada, a quem seja assegurado de forma contínua o serviço de abastecimento de água, podendo ser classificada como:
i) «Utilizador municipal», município ou entidade gestora do respetivo serviço municipal, que presta o serviço de abastecimento de água a terceiros;
ii) «Utilizador final» ou «cliente», utilizador doméstico ou não doméstico, que não presta o serviço de abastecimento de água a terceiros;
cc) «Valor paramétrico para substâncias radioativas», o valor de substâncias radioativas em água destinada ao consumo humano acima do qual se deve verificar se a presença destas substâncias representa um risco para a saúde humana que imponha agir, e, se necessário, tomar as medidas de correção adequadas a fim de elevar a qualidade da água para um nível consentâneo com os requisitos de proteção da saúde humana, em termos de proteção contra as radiações;
dd) «Vigilância sanitária», o conjunto de ações desenvolvidas pelos serviços competentes da área da saúde, sob a coordenação e responsabilidade das autoridades de saúde, com vista à avaliação do risco para a saúde humana da qualidade da água destinada ao consumo humano e à prevenção de riscos para a saúde decorrentes da sua utilização;
ee) «Zona de abastecimento», a área geográfica servida por um sistema de abastecimento na qual a água proveniente de uma ou mais origens pode ser considerada uniforme.

  Artigo 4.º
Objetivos e princípios
1 - O presente decreto-lei visa proteger a saúde humana dos efeitos nocivos resultantes da contaminação da água destinada ao consumo humano, assegurando a salubridade, a limpeza e a melhoria do acesso à água destinada ao consumo humano.
2 - A aplicação do presente decreto-lei por parte das entidades gestoras deve basear-se no princípio da precaução e não pode provocar, direta ou indiretamente, qualquer deterioração da atual qualidade da água destinada ao consumo humano, nem qualquer aumento da poluição das águas utilizadas para a produção de água destinada ao consumo humano.

  Artigo 5.º
Autoridades competentes
1 - A Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos (ERSAR) é a autoridade competente para a coordenação da aplicação do presente decreto-lei.
2 - A Agência Portuguesa do Ambiente, I. P. (APA, I. P.), é, na qualidade de autoridade nacional da água, a entidade competente para garantir a prossecução da política nacional da água e assegurar, a nível nacional, a gestão sustentável dos recursos hídricos.
3 - A autoridade de saúde é a entidade competente para assegurar, de forma regular e periódica, a vigilância sanitária da qualidade da água para consumo humano, designadamente a que é vendida em garrafas ou noutros recipientes ou é fornecida pelas entidades gestoras, bem como as demais funções previstas no presente decreto-lei.
4 - As funções da autoridade de saúde a que se refere o número anterior são exercidas:
a) No caso dos sistemas municipais ou particulares, pela autoridade de saúde com competências no âmbito do município envolvido;
b) No caso dos sistemas multimunicipais ou intermunicipais que abranjam mais de um agrupamento de centros de saúde (ACES) ou unidades locais de saúde (ULS), pelo delegado de saúde regional ou o seu representante designado, em articulação com autoridades de saúde dos ACES ou dos ULS envolvidos;
c) No caso dos sistemas multimunicipais ou intermunicipais que abranjam mais de uma região de saúde, pelos delegados de saúde regionais com competências nos municípios envolvidos;
d) No caso das intervenções e derrogações a que se referem os artigos 27.º a 29.º, pelo delegado de saúde regional onde se localiza o sistema de abastecimento ou caso esteja em causa mais de uma região, pela autoridade de saúde nacional, em articulação com os delegados de saúde regionais.

  Artigo 6.º
Normas da qualidade
1 - A água destinada ao consumo humano deve respeitar os valores paramétricos constantes do anexo i ao presente decreto-lei.
2 - Os valores paramétricos estabelecidos na parte C e D do anexo i ao presente decreto-lei são estabelecidos unicamente para efeitos de monitorização e para garantir o cumprimento das obrigações estabelecidas nos artigos 23.º, 24.º e 26.º
3 - Quando a proteção da saúde humana assim o exija, a autoridade de saúde fixa os valores aplicáveis a outros parâmetros não incluídos no anexo i ao presente decreto-lei, cujos valores paramétricos devem respeitar o disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo seguinte.

  Artigo 7.º
Obrigações gerais das entidades responsáveis
1 - As entidades responsáveis pela aplicação do presente decreto-lei devem adotar as medidas necessárias para garantir que a água destinada ao consumo humano é salubre, limpa e desejavelmente equilibrada.
2 - Para efeitos do número anterior, as entidades responsáveis pela aplicação do presente decreto-lei devem assegurar o cumprimento cumulativo dos seguintes requisitos:
a) A água não contenha microrganismos, parasitas ou quaisquer substâncias em quantidades ou concentração que possam constituir um perigo potencial para a saúde humana;
b) A água cumpra os requisitos mínimos fixados nas partes A, B, e E do anexo i ao presente decreto-lei;
c) A água não seja agressiva nem incrustante ao longo do sistema de abastecimento;
d) Sejam adotadas as medidas necessárias para o cumprimento do disposto nos artigos 6.º a 26.º e nos artigos 33.º a 35.º
3 - As entidades gestoras de sistemas de abastecimento público em baixa devem tendencialmente disponibilizar, por rede fixa ou outros meios, incluindo fontanários que sejam origem única, água própria para consumo humano devidamente controlada, em qualidade e em quantidade que satisfaça as necessidades básicas da população servida na sua área geográfica de influência.
4 - As entidades gestoras de sistemas de abastecimento público devem fazer a avaliação dos níveis de perdas de água e do potencial de melhoria na redução de perdas de água, utilizando o método a definir pela ERSAR, tendo em conta os aspetos relevantes nos domínios da saúde pública, ambientais, técnicos e económicos.
5 - A informação necessária à avaliação referida do número anterior é reportada pelas entidades gestoras de sistemas de abastecimento público, no Módulo da Qualidade de Serviço do Portal ERSAR, no âmbito do ciclo anual da avaliação da qualidade do serviço.

  Artigo 8.º
Tratamento da água destinada ao consumo humano
1 - As entidades gestoras asseguram obrigatoriamente um adequado tratamento da água destinada ao consumo humano, para efeitos do cumprimento do disposto no artigo 6.º e no n.º 1 do artigo anterior.
2 - A água distribuída deve ser submetida a um processo de desinfeção, com exceção das situações em que as entidades gestoras são dispensadas pela autoridade de saúde do cumprimento desta obrigação mediante a demonstração, através do seu histórico analítico, da inexistência de incumprimentos aos valores paramétricos dos parâmetros microbiológicos sem recurso à desinfeção.
3 - Compete às entidades gestoras assegurar a eficácia da desinfeção e garantir, sem comprometer a desinfeção, que a contaminação por subprodutos da desinfeção na água é mantida a um nível tão baixo quanto possível e não põe em causa a sua qualidade para consumo humano.


CAPÍTULO II
Avaliação e gestão do risco
  Artigo 9.º
Abordagem baseada no risco para a segurança da água
1 - O abastecimento, o tratamento e a distribuição da água para consumo humano são sujeitos a uma abordagem baseada no risco, que abrange toda a cadeia de abastecimento desde a bacia de drenagem, a captação, o tratamento, a adução e o armazenamento até à distribuição da água no ponto de verificação de conformidade a que se refere o artigo 17.º
2 - A abordagem baseada no risco deve incluir os seguintes elementos:
a) A avaliação do risco e a gestão do risco das bacias de drenagem dos pontos de captação de água destinada ao consumo humano, nos termos previstos nos artigos 10.º e 11.º;
b) A avaliação do risco e a gestão do risco de cada sistema de abastecimento de água que inclua a captação, o tratamento, a adução, o armazenamento e a distribuição da água destinada ao consumo humano no ponto de abastecimento, efetuados pelas entidades gestoras, nos termos dos artigos 12.º e 13.º;
c) A avaliação do risco dos sistemas de distribuição predial, nos termos dos artigos 14.º e 15.º
3 - As avaliações do risco são revistas com uma periodicidade mínima de seis anos, sem prejuízo de a revisão justificada pela ocorrência de alterações relevantes.
4 - A aplicação da abordagem baseada no risco considera os condicionalismos especiais resultantes de circunstâncias geográficas, como o distanciamento ou a acessibilidade limitada da zona de abastecimento de água, desde que não se comprometa a qualidade da água destinada ao consumo humano e a saúde dos consumidores.
5 - Sem prejuízo do disposto no n.º 3 e no artigo 52.º, as entidades responsáveis pela implementação da avaliação do risco devem adotar, logo que possível, depois de identificados e avaliados riscos nas bacias de drenagem ou nos sistemas de abastecimento e de distribuição predial, as medidas destinadas a mitigar esses riscos.

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