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  Lei n.º 35/2023, de 21 de Julho
  LEI DA SAÚDE MENTAL(versão actualizada)
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SUMÁRIO
Aprova a Lei da Saúde Mental, altera legislação conexa, o Código Penal, o Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade e o Código Civil e revoga a Lei n.º 36/98, de 24 de julho
_____________________

CAPÍTULO II
Política de saúde mental
  Artigo 3.º
Definição da política de saúde mental
1 - Cabe ao Governo, através do Ministério da Saúde, definir a política de saúde mental e promover a respetiva execução, acompanhamento, avaliação e fiscalização, assim como coordenar a sua ação com a dos serviços e organismos públicos das áreas governativas com intervenção direta ou indireta na área da saúde mental.
2 - A política de saúde mental tem âmbito nacional e é transversal, dinâmica e evolutiva, adaptando-se ao progresso do conhecimento científico e às necessidades, contextos e recursos disponíveis a nível nacional, regional e local, visando a obtenção de ganhos em saúde.

  Artigo 4.º
Fundamentos da política de saúde mental
1 - Sem prejuízo do disposto na Lei de Bases da Saúde, aprovada em anexo à Lei n.º 95/2019, de 4 de setembro, são fundamentos da política de saúde mental:
a) A prestação de cuidados de saúde mental centrados na pessoa, reconhecendo a sua individualidade e subjetividade, necessidades específicas e nível de autonomia;
b) A prestação de cuidados de saúde mental no ambiente menos restritivo possível, devendo o internamento hospitalar ter lugar como medida de último recurso;
c) A prestação de cuidados de saúde mental assegurada por equipas multidisciplinares habilitadas a responder, de forma integrada e coordenada, às diferentes necessidades de cuidado das pessoas;
d) O acesso de todas as pessoas, em condições de igualdade e de não discriminação, a cuidados de saúde mental de qualidade e no tempo considerado clinicamente aceitável;
e) A existência de serviços de saúde mental coordenados, abrangentes e integrados de forma a assegurar a proximidade e a continuidade de cuidados;
f) A garantia da equidade na distribuição de recursos afetos à saúde mental e na utilização de serviços de saúde mental e a adoção de medidas de diferenciação positiva.
2 - A abordagem de saúde pública para a saúde mental assegura a sua promoção e o bem-estar da pessoa, os cuidados de saúde, a residência e o emprego, em paralelo com a prevenção das doenças e o seu tratamento em todas as fases da vida.

  Artigo 5.º
Objetivos da política de saúde mental
São objetivos da política de saúde mental:
a) Promover a titularidade efetiva dos direitos fundamentais das pessoas com necessidade de cuidados de saúde mental e combater o estigma face à doença mental;
b) Melhorar a saúde mental das populações, nomeadamente através da implementação efetiva e sustentável de medidas que contribuam para a promoção da saúde mental, para a prevenção e tratamento das doenças mentais e para a reabilitação e inclusão das pessoas com necessidade de cuidados de saúde mental;
c) Concluir a transição para a prestação de cuidados de saúde mental na comunidade, tendo em vista melhorar a qualidade desses cuidados e garantir a proteção dos direitos nos serviços e entidades com intervenção na área da saúde mental;
d) Assegurar a integração da saúde mental nas políticas públicas e garantir uma cooperação efetiva entre as áreas governativas com intervenção direta ou indireta na área da saúde mental;
e) Garantir a participação efetiva das pessoas com necessidade de cuidados de saúde mental e respetivos familiares na definição das políticas e planos de saúde mental, bem como no seu acompanhamento e avaliação;
f) Fortalecer o conhecimento baseado na evidência científica e promover a implementação de boas práticas em saúde mental.

  Artigo 6.º
Serviços de saúde mental
Os princípios gerais e as regras da organização e funcionamento dos serviços de saúde mental são definidos em diploma próprio, considerando-se, para efeitos da presente lei, serviços locais ou regionais de saúde mental os serviços que assim sejam qualificados nesse diploma.


CAPÍTULO III
Direitos e deveres das pessoas com necessidade de cuidados de saúde mental
SECÇÃO I
Direitos e deveres
  Artigo 7.º
Direitos e deveres em geral
1 - Sem prejuízo do previsto na Lei de Bases da Saúde, as pessoas com necessidade de cuidados de saúde mental têm o direito de:
a) Aceder a cuidados de saúde integrais e integrados de qualidade, desde a prevenção à reabilitação, que incluam respostas aos vários problemas de saúde da pessoa, adequadas ao seu enquadramento familiar e social;
b) Escolher livremente a entidade prestadora dos cuidados de saúde, tendo em vista o tratamento de proximidade indispensável à continuidade do plano integrado de cuidados, na medida dos recursos existentes;
c) Decidir, livre e esclarecidamente, a todo o momento, na medida da sua capacidade, sobre os cuidados de saúde que lhe são propostos, salvo nos casos previstos na presente lei;
d) Ver respeitadas a sua vontade e preferências, expressas no momento ou antecipadamente, sob a forma de diretivas antecipadas de vontade ou através de procurador de cuidados de saúde ou de mandatário com vista a acompanhamento, salvo nos casos previstos na presente lei;
e) Decidir, livre e esclarecidamente, a todo o momento, na medida da sua capacidade, sobre a sua participação em investigação e ensaios ou estudos clínicos ou atividades de formação, nos termos da lei;
f) Ver promovida a sua capacitação e autonomia, nos vários quadrantes da sua vida, no respeito pelas suas vontade, preferências, independência e privacidade;
g) Usufruir de condições de habitabilidade, higiene, alimentação, permanência a céu aberto, segurança, respeito e privacidade em unidades de internamento dos serviços locais ou regionais de saúde mental, estabelecimentos de internamento ou estruturas residenciais;
h) Comunicar com o exterior, através de quaisquer meios, e receber visitas de familiares, amigos, acompanhantes, procuradores de cuidados de saúde e mandatários com vista a acompanhamento, quando se encontrem em unidades de internamento dos serviços locais ou regionais de saúde mental, estabelecimentos de internamento ou estruturas residenciais;
i) Votar, ressalvadas as incapacidades previstas na lei;
j) Não ser sujeitas a medidas privativas ou restritivas da liberdade de duração ilimitada ou indefinida.
2 - As pessoas com necessidade de cuidados de saúde mental a quem seja aplicada pena, medida de segurança ou medida de coação mantêm a titularidade dos direitos previstos no número anterior.
3 - Sem prejuízo do previsto na Lei de Bases da Saúde, as pessoas com necessidade de cuidados de saúde mental têm o dever de:
a) Colaborar com os profissionais de saúde em todos os aspetos relevantes para a melhoria do seu estado de saúde mental;
b) Observar as regras sobre organização, funcionamento e utilização dos serviços de saúde mental e demais entidades prestadoras de cuidados de saúde mental a que recorram.

  Artigo 8.º
Direitos e deveres em especial
1 - Sem prejuízo do previsto na Lei de Bases da Saúde, as pessoas com necessidade de cuidados de saúde mental têm direito a não ser submetidas a:
a) Medidas coercivas, incluindo isolamento e meios de contenção físicos ou químicos, exceto nos termos previstos na presente lei;
b) Eletroconvulsivoterapia ou a estimulação magnética transcraniana sem o seu consentimento escrito, exceto nos termos previstos na presente lei;
c) Intervenções psicocirúrgicas sem o seu consentimento escrito e parecer escrito favorável de dois psiquiatras e de um neurocirurgião designados pela Coordenação Nacional das Políticas de Saúde Mental.
2 - As pessoas com necessidade de cuidados de saúde mental a quem seja aplicada pena, medida de segurança ou medida de coação mantêm a titularidade dos direitos previstos no número anterior.
3 - Em processo de tratamento involuntário, o requerido tem, em especial, o direito de:
a) Ser informado dos direitos que lhe assistem;
b) Participar em todos os atos processuais que diretamente lhe digam respeito, presencialmente ou por meio de equipamento tecnológico, podendo ser ouvido por teleconferência a partir da unidade de internamento do serviço local ou regional de saúde mental onde se encontre;
c) Ser ouvido pelo juiz sempre que possa ser tomada uma decisão que o afete pessoalmente;
d) Ser assistido por defensor ou mandatário constituído em todos os atos processuais em que participar e ainda nos atos processuais que diretamente lhe digam respeito e em que não esteja presente;
e) Oferecer provas e requerer as diligências que se lhe afigurem necessárias;
f) Ser acompanhado por intérprete idóneo, por si escolhido ou nomeado, sempre que não conhecer ou não dominar a língua portuguesa;
g) Ser acompanhado por intérprete idóneo de língua gestual, leitura labial ou expressão escrita, por si escolhido ou nomeado, quando seja surdo ou deficiente auditivo;
h) Responder por escrito a perguntas formuladas oralmente ou ser acompanhado por intérprete idóneo, por si escolhido ou nomeado, quando seja mudo;
i) Indicar pessoa de confiança, para os efeitos previstos no n.º 4 do artigo seguinte.
4 - A pessoa em tratamento involuntário tem, em especial, o direito de:
a) Ser informada e, sempre que necessário, esclarecida sobre os direitos que lhe assistem;
b) Ser esclarecida sobre os motivos do tratamento involuntário;
c) Participar, na medida da sua capacidade, na elaboração e execução do respetivo plano de cuidados e ser ativamente envolvida nas decisões sobre o desenvolvimento do processo terapêutico;
d) Ser assistida por defensor ou mandatário constituído, podendo comunicar em privado com este;
e) Participar em todos os atos processuais que diretamente lhe digam respeito, presencialmente ou por meio de equipamento tecnológico, podendo ser ouvida por teleconferência a partir da unidade de internamento do serviço local ou regional de saúde mental onde se encontre;
f) Recorrer da decisão de tratamento involuntário e da que o mantenha;
g) Requerer a revisão da decisão de tratamento involuntário;
h) Comunicar com a comissão prevista no artigo 38.º
5 - A pessoa em tratamento involuntário tem o especial dever de se submeter aos tratamentos medicamente prescritos, sem prejuízo do disposto na alínea c) do n.º 1 e na alínea c) do número anterior.

  Artigo 9.º
Exercício dos direitos
1 - No exercício dos seus direitos, o maior acompanhado é apoiado ou representado nos termos definidos na decisão judicial de acompanhamento.
2 - No exercício dos seus direitos, o maior não acompanhado sem capacidade para consentir é representado por procurador de cuidados de saúde e apoiado ou representado por mandatário com vista a acompanhamento, nos termos previstos na procuração de cuidados de saúde ou no mandato com vista a acompanhamento.
3 - No exercício dos seus direitos, o maior de 16 anos sem capacidade para consentir é representado por quem exerça as responsabilidades parentais, a tutela ou pela pessoa a quem tenha sido confiado.
4 - As pessoas com necessidade de cuidados de saúde mental têm o direito de indicar pessoa de confiança que as apoie, nomeadamente no exercício dos direitos de reclamação, de apresentação de sugestões e de recurso e revisão da decisão de tratamento involuntário.
5 - A pessoa de confiança é identificada:
a) No processo clínico, nos casos em que exista acesso à informação de saúde;
b) No processo de tratamento involuntário, em auto lavrado para o efeito.
6 - A pessoa de confiança pode, para os efeitos previstos no n.º 4, aceder à informação de saúde e ao processo de tratamento involuntário.


SECÇÃO II
Casos especiais
  Artigo 10.º
Diretivas antecipadas de vontade e procurador de cuidados de saúde
1 - As diretivas antecipadas de vontade e a nomeação de procurador de cuidados de saúde, em matéria de cuidados de saúde mental, obedecem ao disposto na lei.
2 - Podem constar do documento de diretivas antecipadas de vontade disposições que expressem a vontade clara e inequívoca do outorgante em matéria de cuidados de saúde mental, nomeadamente no que diz respeito a:
a) Tratamento em internamento;
b) Medidas coercivas, incluindo isolamento e meios de contenção físicos ou químicos;
c) Eletroconvulsivoterapia ou estimulação magnética transcraniana;
d) Medicação psicotrópica.
3 - Se for essa a opção do outorgante, é anexado ao documento referido no número anterior parecer médico que ateste a sua capacidade para dar consentimento consciente, livre e esclarecido, sendo este parecer obrigatório caso a diretiva antecipada de vontade conste de documento escrito assinado perante funcionário do Registo Nacional do Testamento Vital.
4 - As diretivas antecipadas de vontade em matéria de cuidados de saúde mental não são observadas quando se verifique que da sua observância resultaria perigo para bens jurídicos pessoais ou patrimoniais de terceiros, nos termos da presente lei.

  Artigo 11.º
Medidas coercivas
1 - Na prestação de cuidados de saúde mental, as medidas coercivas, incluindo isolamento e meios de contenção físicos ou químicos, só podem ser usadas na medida do estritamente necessário para prevenir ofensa grave e iminente ao corpo ou à saúde da pessoa carecida desses cuidados ou de terceiro.
2 - As medidas coercivas só podem ser utilizadas como último recurso e por um período limitado à sua estrita necessidade.
3 - O recurso a medidas coercivas deve ser específico e expressamente prescrito por um médico ou levado imediatamente ao seu conhecimento para apreciação e aprovação, em caso de urgência ou de perigo na demora.
4 - É imediata e obrigatoriamente inscrita no processo clínico a informação sobre a natureza das medidas coercivas utilizadas, os fundamentos da sua utilização e a duração das mesmas.
5 - As medidas coercivas são aplicadas por quem esteja treinado para o efeito e implicam uma monitorização clínica contínua, registada no processo clínico com intervalos regulares, de modo a salvaguardar a segurança da pessoa.

  Artigo 12.º
Eletroconvulsivoterapia e estimulação magnética transcraniana
1 - Em tratamento involuntário, judicialmente decidido nos termos do artigo 23.º, apenas pode haver recurso a eletroconvulsivoterapia ou a estimulação magnética transcraniana quando estas técnicas sejam medicamente prescritas, se revelem a melhor alternativa terapêutica e a prescrição seja confirmada por dois médicos psiquiatras além do médico prescritor.
2 - É imediata e obrigatoriamente inscrita no processo clínico a informação sobre o uso das técnicas mencionadas no número anterior e os respetivos fundamentos.


SECÇÃO III
Gestão do património
  Artigo 13.º
Gestão do património
1 - Quando uma pessoa, sem para tal estar autorizada, assumir a gestão do património de quem tem necessidade de cuidados de saúde mental, que se encontre nas circunstâncias previstas no artigo 138.º do Código Civil e não lhe tenha sido decretada medida de acompanhamento que abranja este âmbito, aplica-se, com as necessárias adaptações, o regime da gestão de negócios.
2 - O gestor de negócios dá conhecimento ao Ministério Público da assunção da gestão, logo que seja possível, considerando-se desta forma cumprido o dever previsto na alínea b) do artigo 465.º do Código Civil.
3 - Incumprimento do dever estabelecido no número anterior por gestor de negócios que seja proprietário, gestor ou funcionário de entidade que administre ou preste cuidados ao dono do negócio determina a inversão do ónus da prova da culpa, para efeitos do artigo 466.º do Código Civil.
4 - Sem prejuízo do disposto no n.º 2, quando o Ministério Público tiver conhecimento da gestão, pode requerer ao gestor que o informe acerca da mesma, bem como do estado e condição do dono do negócio e dos respetivos bens.
5 - Para efeitos das alíneas c) e d) do artigo 465.º do Código Civil, as contas e restantes informações devem ser prestadas ao Ministério Público.

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