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  DL n.º 1/2020, de 09 de Janeiro
  DIREITO REAL DE HABITAÇÃO DURADOURA(versão actualizada)
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SUMÁRIO
Cria o direito real de habitação duradoura
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Decreto-Lei n.º 1/2020, de 9 de janeiro
O XXI Governo Constitucional reconheceu, no âmbito das suas prioridades políticas, o papel primordial da habitação para a melhoria da qualidade de vida das populações, para a revitalização e competitividade das cidades e para a coesão social e territorial.
A habitação é um direito fundamental constitucionalmente consagrado, a base de uma sociedade estável e coesa e o alicerce a partir do qual os cidadãos constroem as condições que lhes permitem aceder a outros direitos como a educação, a saúde ou o emprego.
As profundas alterações dos modos de vida e das condições socioeconómicas das populações, a combinação de carências conjunturais com necessidades de habitação de natureza estrutural, a mudança de paradigma no acesso ao mercado de habitação precipitada pela crise económica e financeira internacional, e os efeitos colaterais de políticas de habitação anteriores, vieram colocar novos desafios à política de habitação e justificaram a necessidade de lançar uma Nova Geração de Políticas de Habitação (NGPH) que contribuísse para resolver problemas herdados e para dar resposta à nova conjuntura do setor habitacional.
Em paralelo com o agravamento das dificuldades de acesso a uma habitação adequada e com as alterações relativas às necessidades sentidas pelos agregados familiares, designadamente quanto à flexibilidade e à mobilidade habitacional, o perfil do parque habitacional do país em termos de regime de ocupação não tem contribuído para dar resposta aos problemas existentes.
Com efeito, em Portugal foi fortemente privilegiado o regime de habitação própria face ao de arrendamento, por diversas razões, das quais se destacam a escassez de oferta e a existência de disfuncionalidades no mercado de arrendamento, a facilidade de obtenção de crédito hipotecário, a disponibilização de apoios do Estado à compra de habitação e aspetos culturais que valorizam a propriedade.
Em resultado, 73 /prct. dos alojamentos familiares clássicos de residência habitual em Portugal são ocupados pelos proprietários, o endividamento dos agregados familiares para aquisição de habitação assume valores muito elevados, o setor do arrendamento é diminuto e pouco acessível em termos de preços e as famílias encontram-se numa situação pouco favorável à mobilidade, o que reduz as suas opções e dificulta a sua adaptação a alterações nas dinâmicas pessoais, familiares e profissionais.
Adicionalmente, coloca-se na atualidade o novo desafio de conciliar as necessidades em termos de estabilidade e de segurança na ocupação do alojamento, cruciais para o desenvolvimento da vida familiar, com as de flexibilidade e mobilidade, que derivam de uma maior mutabilidade dos percursos de vida das pessoas.
Se em muitos casos o regime de habitação própria se tem mostrado pouco adequado pela sua rigidez, pelo peso do investimento que representa e pelas dificuldades de acesso ao mesmo, por outro lado, o regime de arrendamento nem sempre é conducente à estabilidade e segurança desejáveis.
Estas desadequações afetam, de forma mais acentuada, as faixas etárias mais vulneráveis da população: os mais jovens, com menor capacidade de investimento e maiores necessidades de mobilidade, e os idosos, que já não conseguindo aceder a crédito hipotecário carecem de fortes condições de segurança e de estabilidade habitacional.
Assim, uma política de habitação que combine as duas lógicas está, portanto, melhor preparada para fazer face ao caráter mutável das necessidades de habitação das famílias ao longo do seu ciclo de vida.
Neste contexto, no âmbito da NGPH, reconhece-se a necessidade de inovar ao nível dos instrumentos de política pública em matéria de habitação e de criação de instrumentos mais flexíveis e adaptáveis a diferentes realidades e públicos-alvo, capazes de dar resposta aos desafios da atualidade.
Desse modo, assumem relevância soluções que constituem alternativas à aquisição de habitação própria e ao consequente endividamento das famílias e dão resposta às necessidades dos grupos etários mais vulneráveis, conciliando condições de estabilidade e de segurança da solução habitacional das famílias com condições de flexibilidade e mobilidade.
Nesse quadro, e atenta a adoção do instituto do direito real de habitação para situações em que, não se justificando a aquisição da propriedade, se revelava necessário garantir a segurança da solução habitacional, como nos casos do direito de habitação atribuído pelo Decreto-Lei n.º 502/99, de 19 de dezembro, na sua redação atual, e pela Lei n.º 7/2001, de 11 de maio, na sua redação atual, foi adotada uma solução idêntica para o direito criado pelo presente decreto-lei.
Foi promovida a audição ao Conselho Nacional do Consumo.
O presente decreto-lei foi submetido a consulta pública.
Assim:
Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 198.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte:
  Artigo 1.º
Objeto
O presente decreto-lei cria o direito real de habitação duradoura (DHD).

  Artigo 2.º
Conceito
O DHD faculta a uma ou a mais pessoas singulares o gozo de uma habitação alheia como sua residência permanente por um período vitalício, mediante o pagamento ao respetivo proprietário de uma caução pecuniária e de contrapartidas periódicas.

  Artigo 3.º
Definições
Para efeitos do presente decreto-lei, entende-se por:
a) «Agregado habitacional», o conjunto constituído pelas pessoas que têm a sua residência permanente na mesma habitação e mantêm entre si vínculos familiares, de convivência estável e ou de dependência, bem como as situações determinadas por vínculo contratual que implique residência ou habitação comum;
b) «Habitação», o prédio urbano ou a fração autónoma de prédio urbano, tal como definidos no n.º 2 do artigo 204.º e nos artigos 1414.º e 1415.º do Código Civil, legalmente apto para ser utilizado para fins habitacionais;
c) «Morador», a pessoa ou pessoas do agregado habitacional que constam no contrato como titular ou titulares do DHD de uma determinada habitação;
d) «Obras de conservação ordinária», as obras de reparação de deteriorações na habitação resultantes do envelhecimento dos materiais e ou do seu desgaste pelo uso normal, nestas se incluindo as benfeitorias necessárias que se destinem a evitar a deterioração dos mesmos e a garantir um estado de conservação, no mínimo, médio;
e) «Obras de conservação extraordinária», as obras necessárias à reposição das condições de segurança, salubridade e conforto da habitação por anomalias que não sejam decorrentes do envelhecimento dos materiais e ou do seu desgaste pelo uso normal, incluindo as benfeitorias necessárias que se destinem a evitar a perda ou destruição da habitação;
f) «Proprietário», o titular ou cotitulares do direito de propriedade da habitação;
g) «Residência permanente», a habitação utilizada, de forma habitual e estável, por uma pessoa ou por um agregado habitacional como centro efetivo da sua vida pessoal e social.

  Artigo 4.º
Avaliação prévia
1 - Para efeitos de constituição de um DHD, cabe ao proprietário promover a avaliação prévia do estado de conservação da habitação realizada por arquiteto, engenheiro ou engenheiro técnico inscrito na respetiva ordem profissional, que não se encontre em qualquer situação de incompatibilidade ou de impedimento no âmbito desse processo.
2 - A avaliação referida no número anterior deve assegurar o registo das condições existentes na habitação há menos de 12 meses, devendo ser utilizada para o efeito ficha de avaliação elaborada nos termos da portaria a que se refere o artigo 8.º do Decreto-Lei n.º 266-B/2012, de 31 de dezembro.

  Artigo 5.º
Constituição do direito real de habitação duradoura
1 - O DHD é constituído pelo proprietário de uma habitação a favor de uma ou mais pessoas singulares, que adquirem a qualidade de moradores.
2 - A habitação deve ser entregue pelo proprietário ao morador com um nível de conservação, no mínimo, médio e livre de pessoas, ónus e encargos, incluindo outros direitos ou garantias reais, designadamente a hipoteca.
3 - O contrato é celebrado por escritura pública ou por documento particular no qual as assinaturas das partes são presencialmente reconhecidas.
4 - O DHD está sujeito a inscrição no registo predial, a requerer pelo morador no prazo de 30 dias a contar da data de celebração do contrato.
5 - O contrato de constituição do DHD, além da menção à aplicação do regime do presente decreto-lei, deve conter:
a) O montante da caução prestada e os valores das contrapartidas a que se refere o n.º 1 do artigo 7.º;
b) A declaração do morador a aceitar o estado de conservação da habitação, determinado de acordo com a ficha de avaliação referida no artigo anterior, que consta como documento complementar do contrato;
c) O endereço postal e, se as partes assim o pretenderem, o endereço eletrónico que cada uma delas se compromete a utilizar para efeito de todas as comunicações a realizar no âmbito do DHD, sem prejuízo do disposto no n.º 9.
6 - Após a celebração do contrato, qualquer alteração do endereço de uma das partes deve ser comunicada à contraparte no prazo máximo de 20 dias, sob pena de aquela não poder invocar a falta de receção de comunicações.
7 - No ato de celebração do contrato são pagas pelo morador as quantias relativas à caução e à primeira prestação mensal, esta pelo valor proporcional ao número de dias de vigência do DHD no mês de celebração do contrato, cabendo à entidade que faz o reconhecimento das assinaturas verificar que o montante da caução respeita os limites estabelecidos no n.º 1 do artigo seguinte.
8 - A forma estabelecida no n.º 3 é aplicável ao ato ou ao contrato que determine a aquisição da propriedade pelo morador ou a transferência dos direitos deste para o proprietário, com exceção da resolução.
9 - As comunicações das partes relativas à cessação do contrato, nomeadamente relativas a atos de resolução ou de renúncia, são efetuadas por carta registada com aviso de receção, considerando-se a comunicação recebida com a assinatura do aviso pelo seu destinatário ou com a recusa deste em recebê-la.
10 - No caso das comunicações referidas no número anterior, quando não seja conseguida a respetiva entrega em virtude de omissão ou de ato do seu destinatário, é efetuado novo envio da comunicação por carta registada com aviso de receção, considerando-se esta recebida no 15.º dia a contar da data do registo do envio.

  Artigo 6.º
Caução
1 - Com a constituição do DHD é prestada pelo morador ao proprietário uma caução pecuniária cujo montante é estabelecido, por acordo entre as partes, entre 10 /prct. e 20 /prct. do valor mediano das vendas por m2 de alojamentos familiares, por freguesia, aplicável em função da localização da habitação e da área constante da respetiva caderneta predial, de acordo com a última atualização divulgada pelo Instituto Nacional de Estatística, I. P., (INE, I. P.), sendo considerado o valor da menor unidade territorial para fins estatísticos em que a habitação esteja localizada no caso de indisponibilidade do valor por freguesia.
2 - A caução é prestada por um prazo de 30 anos, sendo o seu valor inicial reduzido em 5 /prct. ao ano a partir do início do 11.º ano e até ao final do 30.º ano de vigência do DHD, por força do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo seguinte.
3 - A caução prestada pelo morador constitui rendimento do proprietário quando e na medida do que dela se pagar nos termos do artigo seguinte.
4 - Quando existam quantias em dívida decorrentes do não cumprimento pelo morador das suas obrigações, o proprietário, em qualquer caso de extinção do contrato, pode deduzi-las do montante da caução a devolver ao morador, devendo, para o efeito, dispor de comprovativo das comunicações enviadas a solicitar o pagamento dos montantes devidos, com a respetiva fundamentação, e cópia dos documentos comprovativos dos mesmos.
5 - A faculdade conferida ao proprietário no número anterior não prejudica o seu direito à resolução do contrato nos termos do artigo 18.º, mas cessa quando haja lugar ao depósito referido no n.º 3 do artigo 21.º

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