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    Sumários do STJ (Boletim) -
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ACSTJ de 20-06-2002
 Tráfico de estupefacientes Branqueamento de capitais Conversão, transferência ou dissimulação de bens ou produtos Concurso de infracções Atenuação especial da pena Jovem delinquente Medida da p
I - O autor do crime de tráfico pode cometer, em concurso efectivo com este, o crime de branqueamento de capitais, pois, os bens jurídicos tutelados por ambos os ilícitos são efectivamente distintos.
II - A criminalização do tráfico de estupefacientes visa, em primeiro lugar, tutelar a saúde pública da comunidade e, reflexamente, ou, melhor dizendo, em paralelo, a saúde (física e psíquica) de todos e de cada um dos membros da comunidade.
III - O crime de branqueamento de capitais visa, para além do mais, tutelar a 'saúde' do circuito financeiro, económico e jurídico dessa comunidade, assim o visando resguardar de 'contaminações' derivadas do afluxo, à respectiva corrente, de bens de origem criminosa que aí procuram a sua legitimação. Tais bens tenderiam a ser posteriormente reinvestidos, gerando novos meios de fortuna que fortaleceriam as entidades criminosas de que provêm os bens branqueados, e são, em simultâneo, susceptíveis de colocar em risco o próprio princípio da livre concorrência.
IV - Tendo em atenção a natureza do bem jurídico tutelado pelo crime em apreço, entende-se que a simples introdução do capital em questão no circuito bancário e/ou financeiro, é já susceptível de integral a prática do crime de branqueamento.
V - Na realidade, tais fundos irão ser utilizados pelas entidades financeiras junto das quais o agente do crime-base os deposita, sendo direccionada para as mais diversas actividades económicas, gerando rendimentos que o agente do crime-base irá receber, maxime sob a forma de juros, correspondentes à remuneração do capital, assim aumentando o seu poder económico.
VI - Uma das ideias base de toda a legislação anti-branqueamento é a de preservar a economia legítima de contaminações por fundos de origem criminosa, contaminação essa que começa, desde logo, pelo simples aumento da massa monetária que uma operação tão simples com a acima referida desde logo potenciaria.
VII - À ideia de não exigibilidade de outra conduta por parte do agente que pratica o crime base, cuja actuação corresponderia, assim, a uma conduta posterior não punível, deve antes ser contraposta a noção de reforço de censurabilidade da conduta do agente de tal ilícito que sabe que, além da punição pelo tráfico (com a consequente perda dos bens pelo mesmo gerados, através do regime dos arts. 35.º e 38.º do DL n.º 15/93, de 22-01), será também punido por qualquer actividade relacionada com o aproveitamento que eventualmente pretenda fazer desses bens ou meios de riqueza, desde o momento em que, por qualquer forma, os introduza no circuito bancário, financeiro e/ou económico, pois então encontrar-se-á também incurso na prática, em concurso efectivo com aquele crime-base, de um crime de previsão do art. 23.º do citado diploma legal.
VIII - A posição ora sufragada quanto ao apontado concurso efectivo de crimes é a que melhor se coaduna com a definição legal de concurso acolhida no art. 30.º, n.º 1, do CP.
IX - Posição contrária deixaria o sistema indefeso perante a colocação nos circuitos económico-financeiros de dinheiro sujo, desde que tal feito lograsse a autoria singular do autor do crime-base, o que constituiria um rombo de vulto na sua estrutura, que, assim seria permissiva para com o usufruto das vantagens do branqueamento que, afinal, constituem o centro das preocupações legais.
X - Parece difícil conceber e sustentar, com base nos princípios gerais referidos, e da própria finalidade essencial de aplicação das penas, 'a protecção de bens jurídicos' - artigo 40.º, n.º 1, do CP - a tese algo artificiosa, não suficientemente demonstrada, segundo a qual, 'uma vez consumada a lesão do bem jurídico tutelado pelo crime precedente, surge em seu lugar o bem jurídico que é a realização da justiça'.
XI - Para que seja em concreto atenuada especialmente a pena nos termos do art. 4.º do DL n.º 401/82, de 23-09, é necessário que, sem prejuízo das exigências de prevenção geral, se possa concluir por um juízo de prognose positiva quanto ao efeito que a atenuação especial da pena pode ter para a reinserção social do arguido.
XII - A pena concreta há-de ter na culpa do arguido o seu limite que não poderá ultrapassar e, por outro lado, não deverá ficar aquém do necessário para satisfação de exigências de prevenção, sendo dentro dessas fronteiras que, tendo em conta ainda as demais circunstâncias favoráveis e desfavoráveis ao arguido, se terá de encontrar a pena tida como adequada e justa.
Proc. n.º 472/02 - 5.ª Secção Pereira Madeira (relator) ** Simas Santos Abranches Martins
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