2. Suspensão Provisória do Processo
Este instituto encontra-se consagrado legalmente pelos artºs 281º e 282º do C.P.P., que passaremos a seguir a analisar.
Resulta do disposto no art. 281º do C.P.P. que:
Dispõe, por sua vez, o art. 282º do C.P.P.
A suspensão provisória do processo encontra-se ainda prevista no processo sumário tal como resulta do art. 384º do C.P.P.
Al. a) do nº 1 do art. 281º
Este é o instituto que mais claramente se aproxima do princípio da oportunidade ao fazer intervir para a sua aplicação o juiz de instrução, o Ministério Público, o arguido e o assistente.
Só com a concordância de todos estes sujeitos processuais é possível suspender provisoriamente o processo, constituindo um poder discricionário de cada um deles.
A este respeito, importa desde já referir que jurisprudencialmente se tem entendido que o despacho do juiz de instrução determinante da não concordância com o despacho do Ministério Público que, findo o inquérito, determinou a suspensão provisória do processo, é irrecorrível, por se entender que tal despacho não é uma decisão final e é proferido no âmbito dos poderes discricionários do juiz de instrução.
Neste sentido, referimos os Acórdãos da RL no Processo nº 30355, de 1 de Junho de 1999; no Processo nº 8015, de 26 de Junho de 1990; no Processo nº 76845, de 21 de Dezembro de 1999, todos publicados e podendo ser consultados no site da DGSI (www.dgsi.pt/), ou ainda os Acórdãos da RL no Processo nº 5841/01 da 3ª Secção, de 10 de Outubro de 2001; no Processo nº 5650/2003 da 5ª Secção, de 15 de Julho de 2003, publicados e podendo ser consultados no site da PGD de Lisboa (www.pgdlisboa.pt/).
Importa ainda esclarecer que a lei só refere a concordância do assistente, pelo que, se no momento em que o Ministério Público decide a suspensão provisória do processo não existir assistente constituído nos autos, não há que notificar o ofendido para que ele, querendo, se constitua assistente. – ver neste sentido o Acórdão da RL no Processo nº 2553, de 19 de Maio de 1996 publicado no site da DGSI (www.dgsi.pt/).
Finalmente, e em relação à concordância do arguido impõe-se que o arguido dê o seu consentimento quer à suspensão provisória do processo quer às injunções e regras de condutas que o MP entender ajustadas ao caso concreto, tendo de ter conhecimento prévio das mesmas.
Não basta, pois, uma concordância do arguido, prestada em abstracto, relativamente à suspensão provisória do processo – ver neste sentido o Acórdão da RL nº 18915, de 28 de Abril de 1998 publicado no site da DGSI (www.dgsi.pt/).
Al. b) do nº 1 do art. 281º
O requisito de ausência de antecedentes criminais do arguido, constitui um impedimento legal que, muitas vezes, impossibilita a aplicação da suspensão provisória do processo.
Este requisito, porém, não fará muito sentido, se considerarmos que o facto de o arguido não ser primário é impeditivo de uma suspensão provisória do processo, perante a situação, por exemplo, de o crime que motivou o antecedente criminal do arguido ter uma natureza diferente, ou tutelar um bem jurídico diferente, daquele crime em investigação no inquérito em que se pretende aplicar a suspensão provisória do processo.
Por exemplo, por que motivo não se pode suspender o processo no inquérito em que se investiga um crime de ofensa à integridade física, quando o arguido tem averbado no seu registo criminal um crime de condução sem legal habilitação ou um crime de desobediência?
Numa situação como a descrita, não nos parece que ocorresse qualquer alarme social, que terceiros não fossem ressarcidos ou que as exigências de prevenção não se fizessem sentir no caso concreto, pelo facto de o processo ser suspenso provisoriamente, desde que verificados os demais requisitos e que determinadas injunções e regras de conduta adequadas ao caso concreto fossem aplicadas.
Al c) do nº 1 do art. 281º do CPP
Só é possível suspender provisoriamente o processo se não houver lugar a aplicação de medida de segurança de internamento, tal como a mesma é definida nos artºs 40º e 91º e ss do C.P.
Al. d) do nº 1 do art. 281º do CPP
Quanto ao requisito do carácter diminuto da culpa encontramos uma referência jurisprudencial sobre o mesmo no Acórdão da RL no Processo nº 4713 , de 18 de Outubro de 1995 publicado e podendo ser consultado no site da DGSI (www.dgsi.pt/), com o seguinte sumário:
"I. É ao juiz de instrução criminal que, no uso da
sua competência funcional, cabe verificar e declarar se estão reunidos os
pressupostos de facto e de direito da suspensão provisória do processo,
podendo, para o efeito socorrer-se de elementos fácticos não constantes do
despacho do Ministério Público, propondo aquela medida.
II. Não é de autorizar tal suspensão se o arguido,
visto o condicionalismo indicado nos autos, concorreu para acidente de viação
de que adveio a morte de terceiro, não sendo diminuta a sua culpa."
Veja-se ainda o Acórdão da RL de 26 de Abril de 1989, in CJ Ano XIV, Tomo 2, pág. 170.
Al. e) do nº 1 e nº2 do art. 281º do CPP
Finalmente, o último requisito previsto, e cumulativamente com os demais, é que seja de prever que o cumprimento das injunções e regras de conduta, responda suficientemente às exigências de prevenção que no caso se façam sentir.
As injunções e regras de conduta oponíveis ao arguido estão claramente elencadas nas alíneas a) a h) do nº 2 do art. 281º do CPP, sendo de chamar a atenção, para a al. h) onde se prevê a imposição de qualquer comportamento especialmente exigido pelo caso.
Esta situação permite que o Ministério Público aplique ao arguido qualquer outra injunção ou regra de conduta, além das taxativamente previstas nas alíneas anteriores, que seja especialmente exigida no caso concreto, desde que não representem para o arguido obrigações cujo cumprimento não seja razoavelmente de lhe exigir, nos termos do nº 3 do art. 281º do CPP.
A respeito da al. h) do nº 2 importa referir que a jurisprudência tem entendido que não é válida para efeito da suspensão provisória do processo a injunção de não praticar quaisquer ilícitos de natureza penal no decurso de um certo prazo, pois se estaria a exigir ao arguido um comportamento que se exige para todo o cidadão, não um comportamento especialmente exigido no caso concreto.
Citamos o sumário do Ac. da RL no Processo nº 32553, de 11 de Junho de 1997 publicado na CJ Ano XXII, tomo 3, pág. 155.
"I. A “injunção” consiste na imposição, ao arguido, de um "facere" ou
"non facere", ou seja de uma conduta activa, ou passiva que condicione a sua normal actividade.
II. Não constitui, porém, injunção ou imposição de regra
de conduta, a ordenação ao arguido de um comportamento que era obrigado a
adoptar, ainda que não houvesse essa infracção ou obrigação, como seria a de
não cometer qualquer ilícito penal, durante o decurso de certo prazo."
Neste sentido referimos ainda dois outros Acórdãos da RL no Processo nº 7595, de 7 de Janeiro de 1997 e no Processo nº 79425, de 21 de Abril de 1998, publicados e podendo ser consultados no site da DGSI (www.dgsi.pt/).
Artigo 282º do C.P.P.
Nº 2 do art. 282º
Uma primeira questão se coloca: A suspensão provisória do processo constitui uma das causas de suspensão da prescrição ou de interrupção da prescrição do procedimento criminal?
Cremos tratar-se não de uma causa de interrupção do procedimento, uma vez que tais causas se encontram taxativamente determinadas no art. 121º do C.P., mas sim de um causa de suspensão da prescrição que, não se encontrando descriminada nas várias alíneas do nº 1 do art. 120º do C.P., cabe nos outros casos especialmente previstos na lei, tal como resulta desta disposição legal.
Um desses casos de suspensão é precisamente o prazo de suspensão provisória do processo, previsto no nº 2 do art. 282º do C.P.P.
Agora uma segunda questão: Desde quando se começa a contar tal prazo de suspensão?
Referindo a lei que a prescrição não corre no decurso da suspensão do processo cremos que o início de tal suspensão deverá contar-se a partir da notificação ao arguido dessa suspensão, ou seja do despacho do Ministério Público que determinou a suspensão e do despacho concordante do juiz de instrução.
É o que parece resultar de uma interpretação sistemática com outra das causas de suspensão do procedimento criminal prevista na al. b) do nº 1 do art. 120º do C.P. que determina que a prescrição do procedimento se suspende durante o tempo em que o procedimento criminal estiver pendente a partir da notificação da acusação ou, não tendo esta sido deduzida, a partir da notificação da decisão instrutória que pronunciar o arguido ou do requerimento para aplicação de sanção em processo sumaríssimo.
Quanto ao termo da suspensão a mesma ocorrerá quando for determinado por despacho do Ministério Público o prosseguimento do processo por falta de cumprimento das injunções e regras de conduta pelo arguido.
Nº 3 do art. 282º
Importa ainda considerar que nos termos do nº 3 do art. 282º se o arguido cumprir as injunções e regras de conduta, decorrido o período de suspensão provisória do processo, o Ministério Público determina o arquivamento dos autos de inquérito, pelo que, após tal arquivamento, o ofendido ou queixoso não pode requerer a sua constituição como assistente ou a reabertura do processo uma vez que o mesmo não tem legitimidade para requerer a abertura da instrução – art. 287º, nº 1, al. b) do C.P.P.
Nestes sentido referimos o Acórdão da RL no Processo nº 9347/02 da 3ª Secção, de 22 de Janeiro de 2003, publicado e podendo ser consultado no site da PGD de Lisboa (www.pgdlisboa.pt).