Lei n.º 55/2020, de 27 de Agosto LEI DE POLÍTICA CRIMINAL - BIÉNIO 2020-2022(versão actualizada) O diploma ainda não sofreu alterações |
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SUMÁRIO Define os objetivos, prioridades e orientações de política criminal para o biénio de 2020-2022, em cumprimento da Lei n.º 17/2006, de 23 de maio, que aprova a Lei-Quadro da Política Criminal _____________________ |
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Artigo 15.º
Prevenção da reincidência no crime de incêndio florestal |
As forças de segurança e a DGRSP articulam-se no quadro dos programas de prevenção da reincidência para condenados por crimes de incêndio florestal, nomeadamente no âmbito das medidas de vigilância e acompanhamento a observar nos períodos de maior incidência de fogos. |
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Artigo 16.º
Prevenção da reincidência no crime de violência doméstica |
As forças de segurança e a DGRSP articulam-se no quadro dos programas de prevenção da reincidência para condenados por crimes de violência doméstica. |
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Artigo 17.º
Cooperação entre órgãos de polícia criminal |
1 - Os órgãos de polícia criminal cooperam na prevenção e na investigação dos crimes referidos nos artigos 4.º e 5.º, designadamente através da partilha de informações, nos termos da Lei de Organização da Investigação Criminal.
2 - Os responsáveis máximos dos órgãos de polícia criminal promovem ações conjuntas e operações coordenadas destinadas a prevenir a prática dos crimes a que se refere o artigo 4.º
3 - As forças de segurança coordenam, localmente, a realização de operações policiais que incidam sobre zonas limítrofes das respetivas áreas de competência territorial. |
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Artigo 18.º
Equipas especiais e equipas mistas |
1 - O Procurador-Geral da República pode, a título excecional, constituir:
a) Equipas especiais, vocacionadas para investigações altamente complexas, compostas por elementos dos diversos órgãos de polícia criminal e por entidades ou organismos públicos com competências específicas de supervisão, fiscalização ou competências especializadas, ouvidos os respetivos dirigentes máximos;
b) Equipas mistas para investigar crimes violentos e graves de investigação prioritária, compostas por elementos dos diversos órgãos de polícia criminal, ouvidos os respetivos dirigentes máximos.
2 - As equipas referidas no número anterior funcionam na dependência funcional do Ministério Público, sem prejuízo da dependência hierárquica dos seus membros, nos termos legalmente previstos.
3 - O Secretário-Geral do Sistema de Segurança Interna pode, ouvido o Gabinete Coordenador de Segurança, constituir, sob a sua coordenação, equipas mistas, compostas por elementos das diversas forças e serviços de segurança, especialmente vocacionadas para prevenir crimes violentos e graves de prevenção prioritária. |
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Artigo 19.º
Recuperação de ativos |
1 - São prioritárias a identificação, a localização e a apreensão de bens ou produtos relacionados com crimes, a desenvolver pelo Gabinete de Recuperação de Ativos, nos termos previstos na Lei n.º 45/2011, de 24 de junho, e pelo Ministério Público, nos termos legalmente previstos.
2 - As autoridades judiciárias, bem como o Gabinete de Administração de Bens e as demais autoridades administrativas, decidem e/ou executam medidas de gestão de modo a assegurar a rápida afetação a utilidades públicas dos bens apreendidos em processo penal, evitando a sua deterioração e perda de valor, ou a permitir a respetiva venda, sendo o caso. |
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CAPÍTULO IV
Disposições finais
| Artigo 20.º
Fundamentação |
Em cumprimento do disposto no n.º 2 do artigo 5.º da Lei n.º 17/2006, de 23 de maio, a fundamentação das prioridades e orientações da política criminal consta do anexo à presente lei, da qual faz parte integrante. |
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Artigo 21.º
Avaliação da criminalidade associada à corrupção |
O relatório a que se refere o n.º 2 do artigo 14.º da Lei n.º 17/2006, de 23 de maio, inclui uma parte específica relativa aos crimes associados à corrupção, a qual obedece ao disposto no artigo 6.º da Lei n.º 19/2008, de 21 de abril. |
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Artigo 22.º
Entrada em vigor |
A presente lei entra em vigor no dia 1 de setembro de 2020.
Aprovada em 23 de julho de 2020.
O Presidente da Assembleia da República, Eduardo Ferro Rodrigues.
Promulgada em 10 de agosto de 2020.
Publique-se.
O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa.
Referendada em 12 de agosto de 2020.
O Primeiro-Ministro, António Luís Santos da Costa. |
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(a que se refere o artigo 20.º)
Fundamentos das prioridades e orientações da política criminal
A presente lei define os objetivos de política criminal, gerais e específicos, a prosseguir no período da sua vigência - o biénio de 2020-2022 -, fixando prioridades e orientações com vista a, de forma integrada e estruturada, alcançar esses objetivos.
Os objetivos enunciados, cuja fundamentação é exigida pela Lei n.º 17/2006, de 23 de maio, que aprova a Lei-Quadro da Política Criminal, visam, de uma forma geral, prevenir e reprimir a criminalidade, incidindo particularmente sobre aqueles fenómenos que se verificaram com maior prevalência no período anterior ou que produziram maior impacto social atendendo aos bens jurídicos violados ou atingidos, bem como promover a manutenção da descida sustentada dos índices de criminalidade - em particular, da criminalidade grave e violenta -, reforçando a capacidade de intervenção e assegurando a efetividade da resposta do sistema de justiça.
Para além da prevenção e da repressão da criminalidade, os objetivos, prioridades e orientações projetados visam promover a proteção da vítima em geral e da vítima especialmente vulnerável em particular, nomeadamente dos menores, idosos, cidadãos portadores de deficiência e vítimas de violência doméstica, familiar ou em contexto de proximidade.
Procuram, também, estes objetivos, prioridades e orientações garantir o acompanhamento e a assistência a agentes acusados ou condenados pela prática de crimes, designadamente quando haja risco de continuação da atividade criminosa, promovendo a intervenção junto do agressor como forma de prevenção da reincidência. Visa-se, por outro lado, a celeridade processual onde e quando é mais necessária, assegurando-se o direito a uma decisão em prazo razoável em matéria penal, com o consequente efeito de estabilização das expetativas comunitárias na capacidade de ação dos órgãos de polícia criminal e do sistema de justiça.
Assim, como objetivos gerais, a presente lei procura promover a redução e a prevenção de fenómenos criminais com particular incidência e impacto na vida das pessoas, promover o reforço da proteção das vítimas de crimes, prevenir a reincidência e assegurar a recuperação eficaz e sistemática dos ativos provenientes da atividade criminosa, apostando na reposição da situação jurídica anterior, bem como reforçando um mecanismo com contornos particularmente dissuasores.
A seleção dos crimes de prevenção e de investigação prioritárias assentou na informação disponibilizada no Relatório Anual de Segurança Interna (RASI) de 2019, numa leitura concertada com as análises da EUROPOL em matéria de tendências do crime transnacional nas suas distintas dimensões de materialidade e gravidade.
Analisados os instrumentos referidos, verificou-se uma linha de continuidade relativamente às previsões que fundamentaram as definições vertidas na Lei n.º 96/2017, de 23 de agosto. Não se registaram alterações significativas nos fenómenos criminais prevalentes que justificassem uma reorientação estratégica, tendo-se mantido o essencial das opções ali feitas, com as adaptações exigidas pelas modificações do ambiente social suscetíveis de gerar novas necessidades de resposta nos planos preventivo e repressivo, bem como pela gravidade do impacto de determinados fenómenos criminais nos sentimentos de segurança e na perceção que a generalidade dos cidadãos tem da capacidade de ação das instâncias formais de controlo.
Neste quadro, definiu-se um elenco de crimes de prevenção e de investigação prioritária, objetivando-se as prioridades definidas.
Assim:
A persistência de fenómenos de violência em contexto familiar e de proximidade, atento o impacto da mesma e as consequências, por um lado para a vítima, por outro para a sociedade, a médio e a longo prazo, compaginável com a perpetuação de fenómenos de violência, exige uma intervenção ativa e eficaz, quer ao nível da prevenção quer ao nível da repressão.
Também a violência em contexto escolar e desportivo exige políticas ativas idóneas à sua contenção, sobretudo das formas mais radicais, bem como à formação de ambientes mais seguros e à prevenção da revitimização.
O terrorismo, pelo seu potencial de destruição, pela imprevisibilidade das suas formas de manifestação, pela proliferação de episódios na Europa e no mundo com efeitos devastadores, pelo efeito aterrorizador sobre as populações e os Estados, pela sua persistência no tempo, constitui um fenómeno que continua a justificar atenção qualificada nos domínios preventivo e repressivo. A par do combate aos atos terroristas, importa investir esforços na deteção e na repressão do seu financiamento, atos muitas vezes estreitamente associados ao branqueamento de capitais.
Por outro lado, a utilização da Internet como veículo de comunicação e propaganda associada ao terrorismo e aos crimes de ódio exige a adoção de medidas relativas aos atos cometidos através de sistemas informáticos, quer sejam de caráter nacional quer sejam de índole transnacional. Também os atentados contra os sistemas de informação dos Estados, a tendência para o aumento de casos de extorsão, a deslocação de formas de crime tradicional para o ambiente digital, a incidência de crimes contra a liberdade e a autodeterminação sexual praticados através da Internet constituem fatores que apontam no sentido da necessidade de manutenção de esforços na prevenção e na repressão do cibercrime e de formas graves de tráfico que lhe estão associadas. No plano dos números, importa considerar que, em 2019, se registou um aumento de cerca de 66,7 /prct., face ao ano anterior, dos crimes registados de burla informática e nas comunicações. Efetivamente, o ciberespaço constitui uma realidade na qual a comunicação se processa a uma velocidade sem precedentes, criando novos desafios e exigindo métodos e meios de intervenção cada vez mais especializados e dotados de uma eficácia que iguale o ritmo a que os fenómenos ocorrem. A intervenção exigida ao Estado inclui estratégias de prevenção adequadas, mas também uma resposta repressiva eficaz, assumindo a cooperação, quer interinstitucional quer internacional, o papel de elemento estruturante do sucesso da intervenção a efetuar.
O efeito deslegitimador da corrupção e dos crimes conexos, com a consequente erosão da confiança dos cidadãos no sistema democrático e nos agentes que o representam, bem como a sua repercussão sobre a economia e a despesa pública, o impacto das perdas causadas pelas fraudes contra o sistema de saúde, contra o sistema fiscal e contra a segurança social na estrutura das finanças públicas, apontam no sentido da manutenção desses segmentos no registo de prioridade. Estes fenómenos, bem como a criminalidade que lhes está associada, constituem um obstáculo ao normal e desejável funcionamento das instituições, densificando-se como uma ameaça ao Estado de direito democrático e prejudicando gravemente a fluidez das relações entre cidadãos e Administração, convolando-se, necessariamente, num entrave aos desejáveis desenvolvimento e evolução das economias. Trata-se, consequentemente, de uma área na qual a intervenção se mantém como prioritária.
A defesa da floresta como ativo económico e como fator de equilíbrio dos ecossistemas assim como a proteção de pessoas e bens contra incêndios florestais pressupõem, a par de políticas ativas que eliminem ou reduzam as condições facilitadoras dos fogos florestais, a existência e a atualização de planos de prevenção de incêndios de etiologia criminosa, assim como uma reação criminal célere e efetiva. A intervenção direcionada e altamente estruturada, com marcada cooperação interinstitucional, que se desenvolveu no último ano conduziu ao resultado esperado, com uma diminuição significativa dos números relativos ao crime de incêndio florestal. Contudo, atentas a perigosidade e a elevada danosidade deste tipo de ilícito, importará manter a sua prevenção como prioritária, incluindo-o também no leque dos crimes de investigação prioritária.
A atuação de grupos organizados, muitos dos quais com atividade transnacional, a fragilização da confiança e o sentimento de insegurança associados à persistência de números significativos em matéria de assaltos a residências, embora, em relação a estes, tenha havido um ligeiro decréscimo em 2019, bem como a incidência de crimes violentos em ambiente escolar, os riscos de violência associados à disseminação de armas ilegais, a facilidade de divulgação de mensagens e campanhas de ódio, a necessidade de reafirmação do dever geral de respeito pela autoridade do Estado e o recrudescimento de alguns furtos e roubos justificam o essencial das reorientações a que se procedeu.
De acordo com os dados do RASI de 2019, a criminalidade em Portugal apresenta níveis inferiores à média registada na União Europeia. No entanto, persistem fenómenos, como os supramencionados, com maior incidência, que exigem, a bem da preservação da segurança individual e coletiva, uma intervenção com enfoque prioritário, quer ao nível da prevenção quer ao nível da investigação.
Com efeito, durante o ano de 2019, foram registadas mais 2391 participações em sede de criminalidade geral e mais 417 participações relativas à criminalidade violenta e grave, o que corresponde respetivamente a um aumento de 0,7 /prct. e de 3 /prct. face ao ano anterior. Não obstante, Portugal continua a registar baixos índices de criminalidade. Perante números baixos, qualquer oscilação gera variações percentuais acentuadas, sendo que alguns tipos criminais registaram aumento.
Com efeito, a burla informática e nas comunicações registou uma significativa subida de 66,7 /prct. em relação ao ano anterior (9783 participações em 2018 e 16 301 em 2019). No âmbito da criminalidade violenta e grave, registou-se um aumento de 29,8 /prct. das participações por crime de roubo em edifícios comerciais e industriais (326 em 2018 e 423 em 2019) e de 23,8 /prct. por crime de rapto, sequestro e tomada de reféns (273 em 2018 e 338 em 2019), sendo que, no crime de roubo na via pública sem esticão, se registou, também, um ligeiro aumento de 11,8 /prct. nas participações (5296 em 2018 e 5923 em 2019).
A violência doméstica contra cônjuge ou análogos conheceu um significativo aumento de 10,6 /prct. (22 423 casos em 2018 e 24 793 em 2019), o que, conjugado com o número de homicídios de mulheres ocorridos em 2019, torna incontornável a necessidade de reforçar as respostas para prevenir e combater a violência contra as mulheres e a violência doméstica, em todas as suas dimensões, tomando em consideração o previsto na Resolução do Conselho de Ministros n.º 139/2019, de 19 de agosto.
De entre as tipologias que integram a categoria de crimes de violência doméstica, merece destaque a violência doméstica contra o cônjuge ou análogo que corresponde a 84 /prct. de todas as participações por violência doméstica. No que se refere a subidas, todas as tipologias registam aumentos, sendo que os mais significativos são os verificados na violência doméstica entre cônjuges e análogos (22 423 participações em 2018 e 24 793 em 2019) e na violência doméstica contra menores (3573 participações em 2018 e 4123 em 2019).
O crime de violação registou um aumento de 2 /prct. (421 casos em 2018 e 431 casos em 2019).
A delinquência juvenil inverte a tendência de decréscimo que se tem vindo a observar nos anos anteriores com um ligeiro aumento de 5,6 /prct. (1482 participações em 2018 e 1568 em 2019).
No ano de 2019, o número de incêndios florestais e a área ardida diminuíram. Comparando os valores de 2019 com o histórico dos 10 anos anteriores, registaram-se menos 49 /prct. de incêndios florestais e menos 71 /prct. de área ardida.
Releva-se, ainda, que a segurança rodoviária é uma prioridade que exige continuado planeamento, coordenação, empenhamento de meios e capacidade administrativa. De acordo com os dados do RASI de 2019, verificaram-se, face a 2018, mais 3738 acidentes rodoviários (+ 2 /prct.). Os resultados demonstram a existência de mais 2 vítimas mortais (+ 0,2 /prct.).
Mantém-se uma incidência significativa de crimes de tráfico de estupefacientes, continuando Portugal a ser um país de trânsito, mas também de destino final, de vários tipos de substâncias estupefacientes para abastecimento dos circuitos ilícitos internos. Assim, enquanto se registou uma ligeira diminuição face ao ano anterior na apreensão de haxixe (de - 6,1 /prct.), de heroína (de - 48,6 /prct.) e de ecstasy (de - 82,5 /prct.) verificou-se um aumento expressivo da apreensão de cocaína (de 75,2 /prct.). Este tipo de criminalidade continua a identificar-se com estruturas criminosas organizadas, extremamente flexíveis, com circuitos de distribuição já estabelecidos.
Exclui-se do âmbito das prioridades o crime de falsificação, considerando a sua natureza instrumental relativamente a outros crimes a que foi atribuído caráter prioritário, tanto no plano da prevenção como no da repressão (v. g. o terrorismo e o tráfico de pessoas).
Por outro lado, assinala-se a necessidade de envolvimento de estruturas do Estado com funções de inspeção setorial na prevenção de atividades de risco.
Por fim, reitera-se a prioridade da identificação e da apreensão com vista à perda de bens provenientes de atividades criminosas - como mecanismo ativo de dissuasão da prática de crimes geradores de proventos económicos -, em linha com a prevenção e a repressão do branqueamento e com o reforço da capacidade de intervenção do Gabinete de Administração de Bens. |
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