Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
Actualidade | Jurisprudência | Legislação pesquisa:


    Jurisprudência da Relação Criminal
Assunto    Área   Frase
Processo   Sec.                     Ver todos
 - ACRL de 12-02-2019   Contra-ordenação ambiental muito grave.
Contra-ordenação ambiental muito grave, p. e p. pelo art. 9.°/2 e 67.°/1, ai. d), ambos do Decreto-Lei n.° 178/2006; art. 23.° do Decreto-Lei n.° 178/2006 de 05.09 (incumprimento do dever de licenciamento da actividade de gestão de resíduos); armazenamento dos resíduos; prescrição do procedimento contra-ordenacional; licenciamento administrativo para a recolha e armazenamento de resíduos classificáveis; recolha e armazenamento dos resíduos (incluindo papel e papelão, acumuladores de chumbo (baterias, que constituem depósitos de minério) e veículo em fim de vida, ainda com óleos no seu interior; Não admissibilidade de recolha e armazenamento nas instalações de resíduos discriminados em Factos Provados 3.)
Proc. 172/18.8T8LNH.L1 5ª Secção
Desembargadores:  Agostinho Torres - João Carrola - -
Sumário elaborado por Susana Leandro
_______
Recurso contraordenacional 5ª Secção penal
Relator: Agostinho Torres
Proc.° NUIPC 172/18.8T8LNH
Tribunal recorrido:Juízo de Competência Genérica da L...
Recorrente (s): Arguida LIE..., Lda.
Sumário: contra-ordenação ambiental muito grave, p. e p. pelo art. 9.°/2 e 67.°/1, ai. d),
ambos do Decreto-Lei n.° 178/2006; art. 23.° do Decreto-Lei n.° 178/2006 de 05.09 (incumprimento do dever de licenciamento da actividade de gestão de resíduos); armazenamento dos resíduos; prescrição do procedimento contra-ordenacional; licenciamento administrativo para a recolha e armazenamento de resíduos classificáveis; recolha e armazenamento dos resíduos (incluindo papel e papelão, acumuladores de chumbo (baterias, que constituem depósitos de minério) e veículo em fim de vida, ainda com óleos no seu interior; Não admissibilidade de recolha e armazenamento nas instalações de resíduos discriminados em Factos Provados 3.)
ACORDAM EM CONFERÊNCIA OS JUÍZES NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA — 5ª SECÇÃO (PENAL)
I-RELATÓRIO
1.1- No Proc. n° 172/18.8T8LNH (Recurso de Contraordenação), pendente no Juízo de Competência Genérica da L..., por sentença de 22.06.2018, foi decidido:
I. RELATÓRIO
1.1. LIE..., Lda., sociedade comercial por quotas com o NIPC ..., com sede social em Rua …, L..., foi condenada por decisão de fls. 114-125 proferida por IGA… (de ora avante, IGA...) pela prática de:
- (1) uma contra-ordenação ambiental muito grave, p. e p. pelo art. 9.°/2 e 67.°/1, al. d), ambos do Decreto-Lei n.° 178/2006 de 05.09 e, quanto a moldura sancionatória, art. 22.°/4, al. b) da Lei n.° 50/2006 de 29.08, tudo por violação da arguida ao disposto no art. 23.° do Decreto-Lei n.° 178/2006 de 05.09 (incumprimento do dever de licenciamento da actividade de gestão de resíduos);
Na COIMA de € 24.000,00 (VINTE E QUATRO MIL EUROS).
1.2. Inconformada, a arguida apresentou recurso da sobredita decisão administrativa, dando início à fase judicial do presente processo de contra-ordenação, tendo apresentado as respectivas alegações sustentando nas respectivas conclusões, que cerceiam o thema decidenduum da presente fase jurisdicional, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (cfr. art. 59.°/3 do RGCO e Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 24.06.2004 no Proc. 5651/2004-9 e Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 03.03.1999 no Proc. 022579, ambos in ww.dgsi.pt. SIMAS SANTOS e LEAL HENRIQUES, Recursos em Processo Penal, 5. Edição, 2002, p. 93 e GERMANO MARQUES DA SILVA, Curso de Processo Penal, Vol. III, pp. 350-351), em síntese, o seguinte:
A arguida não cometeu a contra-ordenação que lhe vem imputada, já que apenas procedeu ao armazenamento dos resíduos constantes do auto de notícia, não efectuando a sua gestão;
A actividade sem licenciamento é imputável a IGA..., que não respondeu oportunamente aos e-mails remetidos pela arguida e que os apagou sem os ler;
Com a sua conduta, IGA... gerou na arguida a convicção razoável de que a actividade que empreendia na data dos factos, com respeito aos resíduos, não necessitava de licenciamento, fazendo-a incorrer em erro;
Não existem factos objectivamente imputáveis à arguida e de gravidade que justificassem a condenação por IGA... e a administração não quantificou qualquer benefício económico pela prática da infracção;
Justifica-se a atenuação especial da coima por a coima ser desproporcional, face ao delito praticado;
1.3. Foi realizada audiência de discussão e julgamento, com a produção das provas requeridas por recorrente e Ministério Público e as demais que o tribunal entendeu necessárias para a decisão final sobre o objecto do recurso.
II. SANEAMENTO

2.1. Em alegações finais, a arguida colocou a questão da prescrição do procedimento contra-ordenacional, razão por que, por tributo ao princípio do exaurimento do thema decidenduum, procederemos à sua apreciação.
2.2. A infracção imputada à arguida tem data de consumação (veremos adiante sobre o conceito subjacente à infracção, sobre gestão de resíduos) em 15.01.2013, considerando que não se colocam quaisquer outros factos subsumíveis ao tipo que tivessem sido praticados depois dessa data.
Ora, o art. 67.°/1, al. d) do Decreto-Lei n.° 178/2006 de 05.09 tipifica o delito imputado à recorrente como contra-ordenação ambiental muito grave, impondo a aplicabilidade da LQCA (Lei n.° 50/2006 de 29.08). Por seu lado, o art. 40.°/1 deste diploma impõe um prazo de cinco anos para prescrição do procedimento contra-ordenacional (abrogando o disposto no art. 27.° do RGCO) que se viu interrompido aquando da notificação de LIE..., Lda. para o exercício de audição prévia por IGA..., em 25.11.2013 (cfr. fls. 28-29), ex vi art. 28.°/1, al. a) do RGCO (art. 40.°/1, parte final, da LQCA).
O prazo de prescrição, assim sendo, viu-se diferido para 15.07.2020, mas ficou também suspenso em 07.05.2018, com a notificação à recorrente do despacho que admitiu o recurso judicial por ela interposto (cfr. fls. 165 e 168) (cfr. art. 27.°-A/1, al. c) do RGCO).
Em face do exposto, dúvidas não existem que o prazo de prescrição do procedimento por contra-ordenação ambiental muito grave não se esgotou ainda.
(• • •)
III. FUNDAMENTAÇÃO
1. 3.1. Factos Provados
No dia 15.01.2013, pelas 14h30, foi realizada uma acção de inspecção ao estabelecimento denominado LIE..., Lda., sito em Rua …, L..., pertencente e explorado pela sociedade LIE..., Lda., ora arguida;
2. O estabelecimento estava em funcionamento, dedicando-se à actividade de transporte, recepção, triagem, armazenagem c expedição de resíduos não-perigosos num armazém com área coberta de 660m2;
3. Em data não concretamente apurada anterior a 15.01.2013, a arguida recebeu no estabelecimento supra referido e armazenou no interior do mesmo resíduos de papel e cartão (código LER 15.01.01), de acumuladores de chumbo (código LER 16.06.01) e um veículo em fim de vida, contendo óleo de motor c de travões (código LER 16.01.04);
4. A arguida não gozava de licenciamento administrativo para a recolha e armazenamento de resíduos classificáveis com os códigos LER 15.01.01, 16.06.01 e 16.01.04, designadamente os descritos em Factos Provados 3.);
5. A arguida não agiu com a diligência necessária para conhecer e cumprir as obrigações legais inerentes ao exercício da actividade lucrativa por si prosseguida e de que era capaz, em desrespeito daquilo a que estava obrigada;
6. A Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional de Lisboa e Vale do Tejo remeteu em 31.08.2012 a LIE..., Lda. os documentos juntos a fls. 59-63, pelos quais informou a arguida que o processo de licenciamento impunha o preenchimento da ficha que anexou e devolução no prazo de vinte dias, ficando sujeito a pagamento de taxa de licenciamento;
7. LIE..., Lda. dispõe de um estabelecimento para a sua actividade, recebeu de capital social realizado pelos sócios € 70.000,00, dispõe de activos no valor de E 156.430,62, que inclui propriedades de investimento na cifra de 52.923,93 e instrumentos financeiros de € 25.083,77, mas apresenta capitais próprios na cifra de € (140.766,93); o passivo (€ 297.197,55), porém, decorre pelo valor de € 163.897,56 de suprimentos de sócios;
8. LIE..., Lda. declarou um volume de rendimentos operacionais em 2016 de € 59.182,70, encargos operacionais de € 156.887,24, reverteu perdas de € 7.196,97, e teve um resultado líquido de impostos de € (106.000,81);
9. Não há notícia que a recorrente tenha sido antes condenada por prática de contra-ordenação ou de crime;
3.2. Factos Não-Provados
Com interesse para a decisão da causa, os seguintes FACTOS NÃO ficaram PROVADOS:
A. A arguida praticou quaisquer outros actos de gestão de resíduos que não os indicados em Factos Provados 3.);
B. A arguida requereu uma reunião junto de IGA... para efeitos de obter todos os esclarecimentos acerca de legislação e obtenção de alvará para desmantelamento e abate de veículos em fim de vida, por telefone, por escrito e pessoalmente;
C. A arguida remeteu a IGA... em 03.04.2012 um e-mail que foi recepcionado nessa mesma data e reiterou o pedido em 19.04.2012, que foi recepcionado nessa mesma data;
D. Depois do referido em Factos Provados 6.), a arguida e os técnicos por si contratados tentaram por diversas vezes e por diversos meios obter resposta de IGA... para completar os elementos solicitados em conformidade, sem sucesso;
E. A 07.02.2013, a arguida solicitou novas informações a IGA... acerca do procedimento para obter licenciamento para a gestão de resíduos com outros códigos LER, para além do que já dispunha;
F. A solicitação referida no item anterior foi efectuada por e-mail e foi apagado sem ser lido pelos funcionários do IGA… em 13.02.2013, razão por que a arguida reiterou o pedido em 06.03.2013;
G. A arguida só veio a saber que não poderia armazenar resíduos congéneres aos discriminados em Factos Provados 3.) depois da inspecção e apenas actuou nos termos constantes da matéria provada devido à actuação de IGA...;
3.3. Motivação
3.3.1. Atendendo ao objecto do recurso definido pelas conclusões, ficou inserido no objecto temático dos autos a reapreciação da matéria de facto. Estriba a decisão do Tribunal quanto aos Factos Provados, acima enunciada, a articulação de todos os meios de prova apresentados em Audiência de Discussão e Julgamento de que resultou valor probatório, devidamente articulados com as regras de experiência comum e que permitiram, no seu conjunto, ao Tribunal alcançar as conclusões que infra melhor se fundamentam (arts. 125.°, 127.° e 355.°, a contrario, do CPP).
Quanto aos Factos Não-Provados, a decisão assenta na circunstância de nenhuma prova com valor persuasivo ter sido produzida que admitisse haver-se os mesmos por objectivamente adquiridos no processo.
3.3.2. No que possui de essencial, a decisão de facto quanto à matéria contra-ordenacional (Itens 1.) a 5.)) assenta nos elementos obtidos durante a inspecção e no vestíbulo da decisão administrativa, auto de notícia e documentos anexos, incluindo reproduções fotográficas, alvará de licenciamento para gestão de alguns resíduos (fls. 13-16) e guia de resíduos de papelão (fls. 17) juntos a fls. 8-17, devidamente articulados com os testemunhos dos dois inspectores IGA… que realizaram a acção de fiscalização, VC... e LL....
Deste acervo de prova resultou, à saciedade, que LIE..., Lda., no estabelecimento em causa, procedia à recolha e armazenamento dos resíduos discriminados em Itens 3.) (para além daqueles para que estava licenciada), incluindo papel e papelão, acumuladores de chumbo (baterias, que constituem depósitos do minério) e um veículo em fim de vida, ainda com óleos no seu interior (fls. 11-12).
É evidente que, para se encontrarem armazenados nas suas instalações, a arguida recolheu-os, recebendo-os dos anteriores detentores destes materiais e equipamentos, do que é prova categórica a emissão da competente guia quanto ao papelão (cfr. fls. 17). É precisamente deste acervo de facto que a recorrente fracassa na sua impugnação do elemento subjectivo do ilícito negligente tido por comprovado na decisão administrativa (Factos 5.)). Se é certo que a questão da culpa dolosa não se achava sequer colocada na temática do processo (embora a recorrente discorra a esse propósito nas alegações de recurso), não há dúvidas nenhumas que bastaria aos seus gestores e/ou trabalhadores, desde que alfabetizados, ler o tipo de resíduos abrangidos pelo licenciamento titulado pelo alvará
de fls. 14 (cobre, bronze, latão, alumínio, metais ferrosos, madeira e plásticos), para concluir que não lhe era admitido proceder à recolha e armazenamento nas suas instalações dos resíduos discriminados em Factos Provados 3.) (daqui resulta, desde já se adianta, a decisão de não-comprovação quanto ao Item G.)).
Haverá, porém, que registar uma medida de decaimento da decisão administrativa. É que foi dado por provado em al. d) do despacho condenatório que a recorrente procedia à gestão dos elementos constantes do Item 3.) da Matéria Provada (cfr. fls. 17), o que, de facto, pode ser interpretado (e assim o interpretou a recorrente) como um juízo de facto mais abrangente que aquele que decorre da prova: assim, manipulação, reciclagem, transporte, colocação para venda, etc., são actos passíveis de serem entendidos como gestão, que de forma nenhuma se podem entender comprovados pela prova produzida. Regista-se, por inerência, o inerente decaimento, que manifesta a simétrica procedência da impugnação da matéria de facto (cfr. Factos Não-Provados A.)).
Decidiu-se, pois, nos termos patenteados em Itens 1.) a 5.) e Factos Não-Provados A.).
3.3.2. A factualidade alegada pela recorrente foi, genericamente, tida por não-provada, já que, para além da junção de documentos (com a defesa escrita, a fls. 55-68), não existiu prova corroborativa que permitisse concluir pela veracidade dos factos suscitados e, de resto, em boa parte a prova que viemos de enunciar desmentem-nos de forma patente.
De facto, pode entender-se que o documento de fls. 59 é bastante para comprovar a comunicação por CCDR de Lisboa e Vale do Tejo à recorrente e também que os documentos anexos de fls. 60-63 acompanharam a respectiva folha de rosto, em conformidade com a alegação (cfr. Factos Provados 6.)). Não obstante, desconhece-se inteiramente em que condições foram elaborados os demais que foram apresentados aos autos pela arguida. Trata-se de impressões em folhas de papel cuja proveniência e circunstâncias em que foram produzidas são absolutamente desconhecidas e não existiu sequer uma única testemunha que atestasse que, de facto, são reproduções do resultado de comunicações electrónicas entre trabalhadores de LIE..., Lda. e entidades administrativas.
De certo, com base na documentação sabemos que a alegação da recorrente sobre interpelações e pedidos de esclarecimentos a IGA... nunca se verificou, já que a composição da caixa electrónica de destino (geral@.....,pt) nem parece reportar a essa entidade. É tanto mais impossível perceber se fls. 65, realmente, certifica um registo de eliminação de um e-mail que tivesse sido enviado pela arguida e que tivesse por conteúdo o constante de fls. 64. Parece até pouco provável que fosse, já que a fls. 65 se diz que a mensagem foi eliminada, sem ser lida com respeito a um e-mail enviado em 13 de fevereiro de 2013, ao passo que a mensagem de fls. 64 foi remetida em 07.02.2013, a acreditar na datação constante do documento.
Todo este acervo, que se pretendeu sustentar uma troca de comunicações entre LIE..., Lda. e urna entidade administrativa a propósito do licenciamento da gestão de resíduos, casa muito mal com a afirmação da recorrente que não possuía nenhuma consciência da regulamentação aplicável sobre a actividade detectada pelo IGA..., já que reflecte o pleno domínio dos códigos LER (cfr. fls. 64), com certeza a componente mais árida e mais difícil de conhecer no âmbito legislativo colocado.
Enfim, porque nenhuma prova permitiu perceber o contexto e condições em que foram elaborados os documentos juntos pela recorrente e porque, isoladamente considerados, são
inidóneos para permitir perceber qualquer factualidade que lhes estivesse subjacente, sc decidiu pela não-comprovação (cfr. Factos Não-Provados B.) a G.)).
3.3.3. Relativamente a Factos Provados 7.) a 9.), a decisão apoia-se no auto de fls. 4-5 (quanto à titularidade de estabelecimento), nos elementos de contabilidade analítica de fls. 191-259, nos obtidos de bases de dados administrativas de fls. 271-279 e no CRC de fls. 280.
3.4. Caracterização Geral da Infracção
O que resulta das disposições conjugadas dos arts. 9.°/2, 23.° e 67.°/l, al. d), todos do Decreto-Lei n.° 178/2006 de 05.09 (que conformam o tipo-de-contra-ordenação e o classificam como muito grave) e 22.°/4, al. b) da Lei n.° 50/2006 de 29.08 (que estabelece a moldura sancionatória para a contra-ordenação ambiental muito grave), constitui um tipode-ilícito de mera ordenação que sanciona a desobediência a comando normativo despido de eticidade mas inserido no plano da organização económica na vertente do impacto que produz na dimensão ambiental, na sua componente de resíduos, tal como se arvora na Lei de Bases da Política do Ambiente (incluindo, este diploma, a disciplina sobre produção, circulação e controlo de resíduos produzidos pela actividade humana — cfr. art. 11.° da Lei n.° 19/2014, de 14.04), tutelando a disciplina administrativa da vida em sociedade nesta vertente, conformadora e promotora da ordem pública, da paz social e da segurança.
3.5. Do Ilícito Imputado à Arguida
3.5.1. O referido tipo-de-contra-ordenação integra no seu elemento objectivo um facto positivo e outro negativo: assim, e por um lado, o delito depende do (i) desenvolvimento de actividade de tratamento de resíduos (norma de reenvio interno, para o disposto no art. 3.°, al. rr) do NUIPC 172/18.8T8LNI-I
Decreto-Lei n.° 178/2006 de 05.09) (ii) sem que o respectivo agente esteja acobertado pelo licenciamento administrativo imposto pelo art. 23.° do Decreto-Lei n.° 178/2006 de 05.09.
Relativamente ao elemento subjectivo a punição da infracção administrativa inclui a culpa negligente e dolosa (art. 9.° do Decreto-Lei n.° 50/2006 de 29.08, Lei Quadro das Contra-Ordenações Ambientais), incluindo, assim, tanto o desvalor de vontade que radique no conhecimento integral do desvalor (ordenatório), da existência de proibição e do especial direccionamento da vontade, como o simples comportamento que traduza omissão de deveres de cuidado, ainda que sem projecção da verificação do comportamento típico.
3.5.2. No caso dos autos, temos que a arguida, agindo displicentemente e em abrogação de um dever elementar de cuidado (Factos Provados 5.)), recebeu de terceiros e armazenou nas suas instalações, resíduos de papel e cartão, acumuladores de chumbo e um veículo em fim de vida, para o que não estava licenciada (cfr. Factos Provados 3.) e 4.)). Ora, nos termos do art. 3.°, al. rr) e anexo IV do Decreto-Lei n.° 178/2006 de 05.09, as operações de tratamento de resíduos (art. 67.°/1, al. d) do Decreto-Lei n.° 178/2006 de 05.09) são definidas como, para além do mais e para o que nos interessa, a recolha, tratamento e eliminação de resíduos. Assim, não há dúvidas que a actividade patenteada em Item 3.) (recolha de resíduos em instalações de pessoas ou entidades terceiras e seu armazenamento nas instalações) se identifica com a conduta típica da infracção por que foi a arguida condenada.
Os argumentos terçados pela recorrente, que teriam existido factores externos, incontroláveis pela empresa e imputáveis a entidades administrativas, surgiram incomprovados (cfr. Factos Não-Provados B.) a G.)) mas, ainda que assim não fosse, em qualquer caso estaria sinalizada, flagrantemente, uma culpa negligente pela impreparação e pela incúria, oferecendo inteira sustentabilidade à condenação. De facto, mesmo que a recorrente estivesse a aguardar resposta da entidade administrativa para proceder ao licenciamento da actividade que desenvolvia, como alegou no recurso interposto, de modo nenhum lhe seria admitido desenvolver actividade, recebendo e armazenando resíduos de papel e papelão, acumuladores de chumbo e veículos de fim de vinda, enquanto não obtivesse o competente deferimento. O cumprimento deste dever legal é devido perante a comunidade cívica em que se integra a recorrente, não propriamente perante IGA..., pelo que, de todo o modo, teríamos por caracterizada a actuação ilícita e culposa de que depende a contra-ordenação.
Temos, portanto, que naufraga o argumento da recorrente, razão por que a condenação operada em sede administrativa será, na presente instância jurisdicional, confirmada.
3.6. Determinação Concreta da Coima
3.6.1. O ilícito praticado pela arguida possui por moldura legal da coima, nos termos conjugados dos arts. 67.°/l, al. d), todos do Decreto-Lei n.° 178/2006 de 05.09 e 22.°/4, al. b) da Lei n.° 50/2006 de 29.08, cifra entre € 24.000,00 e € 144.000,00.
A decisão administrativa entendeu ser de aplicar a coima no seu ponto mínimo, de € 24.000,00.
3.6.2. Ora, o art. 72.°/1 do CP agasalha no ordenamento uma cláusula geral de atenuação especial da pena, ancorando por pressuposto, para o que aqui nos interessa, a verificação de uma amplitude de intrusão do facto no bem jurídico tutelado minimizada (ilicitude reduzida) (cfr. art. 72.°/1, in fine, do CP), de acordo com uma imagem globalizada e de conjunto da constelação circunstancial com que se confronta o julgador (cfr. J. FIGUEIREDO DIAS, Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, Coimbra, 2005, pp. 306-307).
O regime da atenuação especial, conquanto o RGCO busca no Código Penal o seu substrato subsidiário (art. 32.° do RGCO) e é convocável em matéria de ilícito de ordenação (cfr. acórdão do tribunal da Relação de 06.11.2013 no Proc. 60/13.4TBALD.C1 in www.dgsi.pt) (cfr. art. 18.°/3 do RGCO), razão por que, aqui, será de conjecturável aplicabilidade, pois que constitui um mecanismo legal de convergência com o princípio da proporcionalidade, enformativo de qualquer intrusão em direitos, liberdades e garantias, com que interfere qualquer sanção, tanto mais pelos valores, extremamente impressivos, da moldura contra-ordenacional (cfr. art. 18.° da Constituição da República).
No entanto, não se vislumbra absolutamente facto nenhum que autorizasse a operatividade deste dispositivo de Lei no caso sub iudicio. A arguida desenvolve uma actividade que sofre condicionantes, pelo que a desorganização dos seus meios físicos no que tange o controlo da sua actividade e a obtenção de licenciamentos devidos por lei não justifica de modo nenhum a infracção ocorrida.
3.6. Determinação Concreta da Coima
3.6.1. O ilícito praticado pela arguida possui por moldura legal da coima, nos termos conjugados dos arts. 67.°/1, al. d), todos do Decreto-Lei n.° 178/2006 de 05.09 e 22.°/4, al. b) da Lei n.° 50/2006 de 29.08, cifra entre € 24.000,00 e € 144.000,00.
A decisão administrativa entendeu ser de aplicar a coima no seu ponto mínimo, de € 24.000,00.
3.6.2. Ora, o art. 72.°/1 do CP agasalha no ordenamento uma cláusula geral de atenuação especial da pena, ancorando por pressuposto, para o que aqui nos interessa, a verificação de uma amplitude de intrusão do facto no bem jurídico tutelado minimizada (ilicitude reduzida) (cfr. art. 72.°/1, in fine, do CP), de acordo com uma imagem globalizada e de conjunto da constelação circunstancial com que se confronta o julgador (cfr. J. FIGUEIREDO DIAS, Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, Coimbra, 2005, pp. 306-307).
O regime da atenuação especial, conquanto o RGCO busca no Código Penal o seu substrato subsidiário (art. 32.° do RGCO) e é convocável em matéria de ilícito de ordenação (cfr. acórdão do tribunal da Relação de 06.11.2013 no Proc. 60/13.4TBALD.C1 in www.desi.pt) (cfr. art. 18.°/3 do RGCO), razão por que, aqui, será de conjecturável aplicabilidade, pois que constitui um mecanismo legal de convergência com o princípio da proporcionalidade, enformativo de qualquer intrusão em direitos, liberdades e garantias, com que interfere qualquer sanção, tanto mais pelos valores, extremamente impressivos, da moldura contra-ordenacional (cfr. art. 18.° da Constituição da República).
No entanto, não se vislumbra absolutamente facto nenhum que autorizasse a operatividade deste dispositivo de Lei no caso sub iudicio. A arguida desenvolve uma actividade que sofre condicionantes, pelo que a desorganização dos seus meios físicos no que tange o controlo da sua actividade e a obtenção de licenciamentos devidos por lei não justifica de modo nenhum a infracção ocorrida. A situação de negligência, no caso sub iudicio, é expressiva pelo nível de impreparação para a obediência aos requisitos de actividade no âmbito da organização de meios da recorrente (trata-se de uma autorização central, de que depende a licitude da sua própria actividade) e, se é verdade que não se conclui que existiriam outras formas de manipulação dos resíduos ou que tivesse sido produzido dano efectivo para o ambiente, a punição não depende desses factos. A geração de um circuito de perigo neste plano é a conduta sancionada e, se não teve outras incidências ou consequências (ou, pelo menos, outros não se apuraram, non liquet que abona a recorrente — cfr. art. 32.°/2 da Constituição da República), tanto não se deveu ao cumprimento dos deveres impostos à arguida.
É certo que o benefício económico obtido com a infracção apurado não é especialmente elevado, a poupança decorrente da irregularidade não é directamente aferível, mas fica claro que a arguida se dispensou de se munir das condições que lhe permitissem, cabalmente, cumprir as obrigações de actividade a que está sujeita, o que desde logo sinaliza em alguma medida o encurtamento de encargos de actividade, designadamente em taxas de emissão de licença. De resto, quando um agente económico orientado para a geração de mais-valias (uma sociedade comercial, como é o caso — cfr. art. 980.° do CC) acede a um ramo de actividade empresarial que não lhe é lícito, necessariamente existe uma sinalização de vantagem por esse simples facto, representativo de um ganho económico, mas que não nos é lícito presumir, à míngua de factos apurados que o sustentassem, como possuindo mais que esse significado patrimonial (cfr. art. 32.°/2 e 10 da Constituição da República, que impõe a consideração da dúvida em benefício do arguido, também em sede contra-ordenacional).
Em face do exposto, o ganho obtido pela infracção e a ausência de prévias condenações (cfr. Factos 9.)), ou, melhor dizendo, o non liquet a esse respeito, serão, obviamente, factores a convocar ao juízo de determinação concreta da sanção, no sentido erosivo da mesma, de mitigação da sua severidade, mas não depõem no sentido de um invulgar quadro factício que estabelecesse como dificilmente compatíveis os elementos do tipo com a realidade factual com que se confrontou a entidade administrativa.
As condições financeiras da arguida (Factos 7.) e 8.)), no entanto, sopesam em seu desabono: face ao seu volume de encargos e de proveitos, a mitigação da coima a valores reduzidos diluiria o desfalque patrimonial pela sua actividade corrente, como nada mais que um ligeiro percalço, destituindo todo e qualquer efeito dissuasor, de recomposição da forma
como a recorrente observa campos de proibição e disciplina e organiza a sua actividade e estrutura empresarial em função deles.
Por outro lado, a sua situação de capitais próprios é de € (140.766,93) e, como tal, bastante negativa, mas conclui-se da matéria provada que respeita a uma opção de financiamento da sua actividade pelos sócios, de modo nenhum caracterizando a iminência de uma situação insolvencial.
É que os participantes no capital escolheram realizar o seu investimento na empresa por via de suprimentos (empréstimos por investidores) à sociedade e não mediante obrigações de entrada. Estes mútuos de regime especial são responsáveis por 55,15/prct. do passivo total de LIE..., Lda.. Os suprimentos de caixa foram pensados para supressões transitórias de tesouraria, mas esta função foi claramente corrompida pelos sócios da arguida, que a converteram no principal instrumento de financiamento da actividade da recorrente. Bastaria que fossem convertidos em capital para que a sociedade gozasse de uma situação líquida positiva de 23.130,63. Dito de outro modo, foi decisão dos sócios que LIE..., Lda. expusesse uma sobre-alavancagem grosseira que reclamou a destruição do seu ratio de solvabilidade. O financiamento junto de terceiros (banca e fornecedores) é, de facto, ridículo por comparação, o que comprova que, das contas da empresa, apenas se extrai uma opção de gestão dos seus investidores, já não o colapso económico de um ente colectivo.
Assim sendo e em suma: desconsiderando a aplicabilidade de um quadro de atenuação especial, por o caso sub iudicio (de todo) não o consentir, ainda assim entendemos que os factores de ponderação aplicáveis (art. 18.°/1 e 2 do RGCO) não permitem que a determinação concreta da sanção excedesse o limite mínimo, de € 24.000,00 (de notar que o regime legal das contra-ordenações ambientais não impõe a proibição de reformatio in pejus — cfr. art. 75.° da Lei n.° 50/2006 de 29.08), também quando se leve em conta o alcance punitivo da coima mínima e a natureza do ilícito por que será condenada a recorrente (de mera ordenação, fora da lesão de paradigmas éticos), razão por que a sua determinação concreta não será alterada.
Nada mais resta, por conseguinte, que não confirmar a decisão administrativa.
IV. DISPOSITIVO
Nestes termos e com estes fundamentos, NEGO PROVIMENTO ao Recurso Judicial de contra-ordenação interposto e, por consequência, CONDENO a arguida LIE... —Importação e Exportação, Lda. pela prática de uma contra-ordenação ambiental, p. e p. pelo art. 9.°/2 e 67.°/1, al. d), ambos do Decreto-Lei n.° 178/2006 de 05.09 e, quanto a moldura sancionatória, art. 22.°/4, al. b) da Lei n.° 50/2006 de 29.08, na COIMA de € 24.000,00 (VINTE E QUATRO MIL EUROS).
(•••)
1.2 — Desta decisão recorreu a acoimada LIE..., Lda ( doravante LIE...,lda) , dizendo em conclusões da motivação apresentada:
a) Confirma a Douta Sentença recorrida que não ficou provada ...qualquer forma de manipulação de resíduos ou que tivesse sido produzido dano para o ambiente tal como o beneficio económico... para a RECORRENTE sequer foi identificado;
b) A condenação da RECORRENTE como tendo praticado tratamento de resíduos é errada e não se sustenta nem no auto de notícia nem na Douta Sentença em qualquer facto provado, resultando de uma incorrecta aplicação do Direito aos factos;
c) Por tratamento entende-se, nos termos da al. oo) do art° 3° do DL 178/2006, de 5/9 oo) «Tratamento» qualquer operação de valorização ou de eliminação de resíduos, incluindo a preparação prévia à valorização ou eliminação e as actividades económicas referidas no anexo iv do presente decreto-lei, do qual faz parte integrante; o qual é taxativo;
d) Ora, a RECORRENTE, cfr. Douta Sentença recorrida (Facto Provado 3) Em data não concretamente apurada anterior a 15.01.2013, a arguida recebeu no estabelecimento supra referido e armazenou no interior do mesmo resíduos de papel e cartão (código LER 15.01.01), de acumuladores de chumbo (código LER 16.06.01) e um veículo em fim de vida, contendo óleo de motor e de travões (código LER 16.01.04); ;
e) Nada consta da Douta Sentença ou dos factos provados em sede de audiência de discussão e julgamento que a mesma estivesse a proceder ao tratamento dos resíduos inspeccionados e que originaram a presente contraordenação e posterior sentença no sentido taxativo da al. oo) do art° 3° do citado DL, não sendo a nomenclatura constante do Anexo IV demonstrativa de tal prática - que não ficou provada sequer - porquanto tal (anexo) releva apenas para efeitos de CAE;
fl E, para se verificar, s. m. o., a prática da contraordenação pela qual foi a RECORRENTE condenada seria necessário que a mesma estivesse a proceder efectivamente ao tratamento de tais resíduos no sentido taxativo previsto na sobredita alínea e nos termos do disposto na al. d) do n° 1 do art° 67° do DL 178/2006, de 5/9;
g) Só desta forma seria o armazenamento constatado de resíduos como contraordenação ambiental muito grave face ao disposto na al. referida d) O exercício não licenciado das actividades de tratamento de resíduos em violação do disposto no n. ° 2 do artigo 9. ° e no artigo 23.0; ;
h) Só a operação de tratamento de resíduos é proibida nos termos do referido DL e só essa é passível de condenação se não for objecto de licenciamento prévio conforme n° 1 do art° 23° do DL 178/2006, de 5/9;
i) Sendo taxativa a definição de tratamento, a conduta da RECORRENTE não pode ser objecto de contraordenação nos termos da Douta Sentença recorrida sob pena de violação do Princípio nulla poena sine lege e consequente violação do art° 29° da Constituição da República Portuguesa;
i) A Douta Sentença conclui que o tipo de contraordenação depende do desenvolvimento da actividade de tratamento de resíduos..., que não se verificou ou não ficou provada (sequer consta de Factos Provados);
1) A verificar-se a infracção e no tocante à moldura sancionatória, à data da prática dos factos (15 de Janeiro de 2013) aplicava-se a moldura b) Se praticadas por pessoas colectivas, de (euro) 15 000 a (euro) 30 000 em caso de negligência e de (euro) 30 000 a (euro) 48 000 em caso de dolo. prevista na Lei 89/2009, de 31/8 devendo esta ser a aplicável, em abstracto, por ser mais favorável. e em caso de negligência como consta da Douta Sentença e da decisão administrativa;
m) No que concerne à não aplicação da atenuação especial da pena, entende o Tribunal a quo que o n° 1 do art° 72° do Código Penal implica, para a sua verificação e aplicação ao caso sub judice [ou qualquer caso] a verificação de uma amplitude de intrusão do facto no bem jurídico minimizada (ilicitude reduzida cfr. n° 1 do art° 72° do CP in fine);
n) A aplicação da sobredita atenuação especial da pena é convocável em sede de ilícito de ordenação nos termos do art° 32° do RGCO mas que, no caso concreto ¬segundo Douta Sentença - tal não merece acolhimento porquanto não se vislumbra absolutamente facto nenhum que autorizasse a operatividade deste dispositivo de Lei;
o) Para tal alega desorganização dos meios físicos da RECORRENTE que, em lado algum da Douta Sentença recorrida ficou demonstrada;
ID) Foi aplicada a coima de 24.000,00 € à RECORRENTE em sede de
infracção negligente quando, à data da prática dos factos o limite mínimo visado pela decisão administrativa é de 15.000,00 € nos termos da Lei 89/2009, de 31/8, sendo esta a aplicável por ser mais favorável;
q) O Tribunal a quo não faz aplicação da norma constante do n° 1 e al. a)
e b) do n° 2 art° 23°-A da Lei 50/2006, de 29/8 cuja aplicação é automática face aos factos demonstrados nos autos em apreço, devendo fazê-lo;
q) Sobre a data da infracção já passaram mais de 2 anos (al. b) do n° 2 do art° 23°-A da Lei 50/2006, de 29/8) e, como demonstra a própria Douta Sentença recorrida, não há notícia da RECORRENTE ter sido condenada anteriormente por prática de contraordenação ou crime (Facto Provado 9);
r) A atenuação especial da pena terá sempre lugar face aos factos em apreço por força da verificação do n° 1 e da sobredita al. b) do n° 2 do art° 23°-A da Lei 50/2006, de 29/8;
s) Tal atenuação implica a redução da coima para metade nos termos do preceituado no art° 23°-B da referida Lei 50/2006, de 29/8 e, conforme visto - quanto à moldura sancionatória - o mínimo é 15.000,00 € - devendo a pena, em limite, ser aplicável pelo montante de 7.500,00 €;
t) Não foi correctamente interpretada a norma constante da al. oo) do art° 3° do DL 178/2006, de 5/9 quando intepretado no sentido de que a taxatividade de tratamento implica o armazenamento definido no Anexo IV que serve para efeitos de CAE;
u) Foi incorrectamente interpretado e aplicado o n° 2 do art° 9° e a al. d) do n° 1 do art° 67° do DL 178/2006, de 5/9 quando deveria ter resultado dos factos e das provas juntas aos autos que a RECORRENTE não praticou estes actos tal como definidos no diploma aplicável;
x) A Douta Sentença recorrida que acolhe in totum a decisão administrativa, acrescenta factos de índole subjectiva que imputa à RECORRENTE posteriormente e que não constavam da decisão administrativa;
z) A falta de descrição na acusação de elementos subjectivos do crime, nomeadamente dos que se traduzem no conhecimento, representação ou previsão de todas as circunstâncias da factualidade típica, na livre determinação do agente (RECORRENTE) e na vontade de praticar o facto com
acrescenta factos de índole subjectiva que imputa à RECORRENTE posteriormente e que não constavam da decisão administrativa;
z) A falta de descrição na acusação de elementos subjectivos do crime, nomeadamente dos que se traduzem no conhecimento, representação ou previsão de todas as circunstâncias da factualidade típica, na livre determinação do agente (RECORRENTE) e na vontade de praticar o facto com o sentido do correspondente desvalor, não pode ser integrada em julgamento - como o foi na Douta Sentença recorrida - por recurso ao art° 358° do CPP;
aa) Foi violado o disposto no art° 358° do CPP;
ab) Não se sabe efectivamente qual a data em que os factos contraordenacionais foram ¬se foram - praticados pois a Douta Sentença e a decisão administrativa referem Em data não concretamente apurada anterior a 15/01/2013..., facto que é relevante para aferir se se verificou o instituto da prescrição;
ac) A prescrição verifica-se e conta, com todas as interrupções e suspensões legais, desde a data da prática do facto nos termos do disposto no n° 1 do art° 119° do Código Penal aplicável ex vi art° 32° do RGCO;
ad) A Douta Sentença recorrida em sede de análise da verificação do instituto da prescrição refere que o facto tem data (15/01/2013) mas em sede de Factos Provados 3) refere que recebeu (para armazenamento) em data anterior a esta...sem precisar.
ae) Não precisando, decidir que o prazo da prescrição se diferiu para 15/07/2020 e que este se encontra suspenso novamente por força do disposto na al. c) do n° 1 do art° 27°-A do RGCO é excessivo e manifestamente incorrecto, devendo, em consequência, verificar-se o Princípio in dubio pro reo.
TERMOS EM QUE — e nos demais de direito — deve ser dado provimento ao presente recurso e, por via dele, ser alterada a Douta decisão recorrida e, em consequências ser a RECORRENTE absolvida da prática da contraordenação pela qual vem condenada ou, in limine, ser aplicado in totum o instituto da atenuação especial da pena previsto nos artigos 72° e 73 do Código Penal com cumprimento do disposto no n° 3 do art° 18° do RGCO e art° 23°¬A e 23°-B da Lei 50/2006, de 29/8 pelo montante devido pela Lei 89/2009, de 31/8,
1.3- Nada disse o M°P° em resposta.
1.4- Admitido o recurso e remetido a esta Relação, o M°P° emitiu parecer no sentido de o mesmo não merecer provimento dizendo em síntese:
Entendemos que os factos provados não constituem a contra-ordenação pela qual a arguida foi condenada.
Começamos por estranhar a legislação sobre esta questão, poiso Mm.° Juiz a quo fundamentou de direito com referência à al. rr) do art.° 3.° do DL 178/2006, de 5 de Setembro — vd. fls. 289 — a que se refere o Anexo IV do mesmo DL, mas não encontrámos tal alínea no art.° 3.° citado, apesar das buscas que realizámos no Diário da República e na excelente página da internet da PGD de Lisboa. No entanto, pela leitura da fundamentação de direito do próprio acto administrativo pelo qual a arguida foi condenada — vd. fls. 119 —, ali vem referido que aquela referência é à al. qq), que estabelece a valorização dos resíduos (vulgo reciclagem), para a qual é necessária uma autorização, que a arguida não possui.
Ora, não vem considerado provado que a arguida destinava os resíduos armazenados à reciclagem (leia-se valorização) mas tão-somente que os tinha armazenado, não possuindo, porém, licença para assim proceder.
Logo, não nos parece que se possa considerar que a arguida tenha procedido a tratamento de resíduos perigosos, mas sim e somente ao seu armazenamento — em sentido semelhante veja-se em wwvv.dgsi.pt o Ac. desta Relação de Lisboa lavrado no Proc. 1252/10.3TALRS.L1-9 em 17-02-2011.
Nessa medida, entendemos que a arguida deve ser absolvida da prática da contra-ordenação cm que foi condenada.
1.5- Após exame preliminar e vistos legais foram remetidos os autos à Conferência, cumprindo agora decidir.
II- CONHECENDO
2.1-0 âmbito dos recursos encontra-se delimitado em função das questões sumariadas pelo recorrente nas conclusões extraídas da respectiva motivação, sem prejuízo do dever de conhecimento oficioso de certos vícios ou nulidades, designadamente dos vícios indicados no art. 410°, n.°2 do CPP.
Tais conclusões visam permitir ou habilitar o tribunal ad quem a conhecer as razões de discordância do recorrente em relação à decisão recorrida.
Assim, traçado o quadro legal temos por certo que as questões levantadas no recurso são cognoscíveis no âmbito dos poderes desta Relação.
Em recurso contraordenacional a Relação apenas conhece de questões de direito, sem prejuízo de eventuais vícios que sejam detectáveis e oficiosamente-cfr art° 75° do DL 433/82 ( RGCC)
2.2-Está em discussão para apreciação e em síntese da perspectiva da recorrente conforme se retira das suas conclusões:
A) Prescrição
Não precisando a data da infracção_ sobre a qual já passaram mais de 2 anos e decidindo que o prazo da prescrição se diferiu para 15/07/2020 e que este se encontra suspenso novamente por força do disposto na al. c) do n° 1 do art° 27°-A do RGCO é excessivo e manifestamente incorrecto, devendo, em consequência, verificar-se o Princípio in dubio pro reo.
B) Noção jurídico-contraordenacional de tratamento de resíduos
A condenação da RECORRENTE como tendo praticado tratamento de resíduos é errada e não se sustenta nem no auto de notícia nem na Douta Sentença em qualquer facto provado, resultando de uma incorrecta aplicação do Direito aos factos; Nada consta da Douta Sentença ou dos factos provados em sede de audiência de discussão e julgamento que a mesma estivesse a proceder ao tratamento dos resíduos inspeccionados e que originaram a presente contraordenação no sentido taxativo da al. oo) do art° 3° do citado DL condenada seria necessário que a mesma estivesse a proceder efectivamente ao tratamento de tais resíduos no sentido taxativo previsto na sobredita alínea e nos termos do disposto na al. d) do n° 1 do art° 67° do DL 178/2006, de 5/9; Só a operação de tratamento de resíduos é proibida nos termos do referido DL e só essa é passível de condenação se não for objecto de
licenciamento prévio.
O Tribunal a quo não faz aplicação da norma constante do n° 1 e al. a) e b) do n° 2 art° 23°-A da Lei 50/2006, de 29/8 cuja aplicação é automática. Não foi correctamente interpretada a norma constante da al. oo) do art° 3° do DL 178/2006, de 5/9 quando intepretado no sentido de que a taxatividade de tratamento implica o armazenamento definido no Anexo IV que serve para efeitos de CAE;
C) Alteração de factos- art° 358° cpp
A Douta Sentença recorrida que acolhe in totum a decisão administrativa, acrescenta factos de índole subjectiva que imputa à RECORRENTE posteriormente e que não constavam da decisão administrativa- falta de descrição na acusação de elementos subjectivos do crime, nomeadamente dos que se traduzem no conhecimento, representação ou previsão de todas as circunstâncias da factualidade típica, na livre determinação do agente (RECORRENTE) e na vontade de praticar o facto não pode ser integrada em julgamento ¬como o foi na Douta Sentença recorrida - por recurso ao art° 358° do CPP;
D) Dolo ou negligência- aplicação de lei mais favorável
À data da prática dos factos (15 de Janeiro de 2013) aplicava-se a moldura b) Se praticadas por pessoas colectivas, de (euro) 15 000 a (euro) 30 000 em caso de negligência e de (euro) 30 000 a (euro) 48 000 em caso de dolo. prevista na Lei 89/2009, de 31/8 devendo esta ser a aplicável, em abstracto, por ser mais favorável, e em caso de negligência como consta da Douta Sentença e da decisão administrativa; Foi aplicada a coima de 24.000,00 € à RECORRENTE em sede de infracção negligente quando, à data da prática dos factos o limite mínimo visado pela decisão administrativa é de 15.000,00 € nos termos da Lei 89/2009, de 31/8, sendo esta a aplicável por ser mais favorável;
E) Atenuação especial da coima e sua (não) aplicabilidade
A não aplicação da atenuação especial da pena segundo a Sentença não merece acolhimento porquanto alega desorganização dos meios físicos da RECORRENTE que, em lado algum da Douta Sentença recorrida ficou demonstrada; A atenuação especial da pena implica a redução da coima para metade.
2.3- A POSIÇÃO DESTE TRIBUNAL ad quem.
Conhecendo então das 5 questões enunciadas pela respectiva ordem de prejudicialidade.
A) Da Prescrição
A.1) Alega a recorrente que a sentença, não precisando a data da infracção, sobre a qual já passaram mais de 2 anos e decidindo que o prazo da prescrição se diferiu para 15/07/2020 , que este se encontra suspenso novamente por força do disposto na al. c) do n° 1 do art° 27°-A do RGCO, é excessiva e manifestamente incorrecta, devendo, em consequência, verificando-se assim o Princípio in dubio pro reo.
Vejamos:
Decidiu-se na sentença que a prescrição não ocorreu porquanto:
(...) 2.2. A infracção imputada à arguida tem data de consumação (veremos adiante sobre o conceito subjacente à infracção, sobre gestão de resíduos) em 15.01.2013, considerando que não se colocam quaisquer outros factos subsumíveis ao tipo que tivessem sido praticados depois dessa data. Ora, o art. 67.°/1, al. d) do Decreto-Lei n.° 178/2006 de 05.09 tipifica o delito imputado à recorrente como contra-ordenação ambiental muito grave, impondo a aplicabilidade da LQCA (Lei n.° 50/2006 de 29.08).
Por seu lado, o art. 40.°/1 deste diploma impõe um prazo de cinco anos para prescrição do procedimento contra-ordenacional (abrogando o disposto no art. 27.° do RGCO) que se viu interrompido aquando da notificação de LIE..., Lda. para o exercício de audição prévia por IGA..., em 25.11.2013 (cfr. fls. 28-29), ex vi art. 28.°/1, al. a) do RGCO (art. 40.°/1, parte final, da LQCA).
O prazo de prescrição, assim sendo, viu-se diferido para 15.07.2020, mas ficou também suspenso em 07.05.2018, com a notificação à recorrente do despacho que admitiu o recurso judicial por ela interposto (cfr. fls. 165 e 168) (cfr. art. 27.°-A/1, al. c) do RGCO).
Em face do exposto, dúvidas não existem que o prazo de prescrição do procedimento por
contra-ordenação ambiental muito grave não se esgotou ainda. (...)
A2) Decorre da matéria de facto provada que:
1.No dia 15.01.2013, pelas 14h30, foi realizada urna acção de inspecção ao estabelecimento denominado LIE..., Lda., sito em Rua da …, L..., pertencente e explorado pela sociedade LIE..., Lda., ora arguida;
2. O estabelecimento estava em funcionamento, dedicando-se à actividade de transporte, recepção, triagem, armazenagem e expedição de resíduos não-perigosos num armazém com área coberta de 660m2;
3. Em data não concretamente apurada anterior a 15.01.2013, a arguida recebeu no estabelecimento supra referido e armazenou no interior do mesmo resíduos de papel e cartão (código LER 15.01.01), de acumuladores de chumbo (código LER 16.06.01) e um veículo em fim de vida, contendo óleo de motor e de travões (código LER 16.01.04);
4. A arguida não gozava de licenciamento administrativo para a recolha e armazenamento de resíduos classificáveis com os códigos LER 15.01.01, 16.06.01 e 16.01.04, designadamente os descritos em Factos Provados 3.);
(• • .)
Daqui se concluiu que na data da inspecção se verificou a existência daqueles materiais residuais, os quais ali se encontravam recolhidos por terem sido ali recebidos desde data desconhecida. mas anterior a 5.1.2013.
Independentemente da qualificação que juridicamente se lhe possa dar, a manutenção e armazenamento pelo menos até essa data, na perspectiva da decisão recorrida foi contínua, manteve-se em estado de permanência na imputada ilicitude (adiante veremos melhor se ela se verificou) até à data da inspecção e enquanto omissivo se definiu o estado de licenciamento do armazenamento dos resíduos.
Nos termos do art° 5° do RGCC a comissão da manutenção em armazenamento dos resíduos por omissão de licenciamento mantinha-se enquanto o licenciamento não tivesse sido concedido.
Na perspectiva do ar° 119° n°2,a) do CP e 5° do RGCC inexistia dúvida alguma sobre a não consumação anterior à data da inspecção.
A consumação operou para efeitos prescricionais no mínimo só a partir daquela data e os prazos prescricionais só a ela poderiam atender.
A3)- Tendo em conta da natureza da imputada infracção e a moldura da coima aplicável, o prazo normal seria de 5 anos.
Artigo 40.° da Lei 50/2006
(Prescrição)
1 - O procedimento pelas contraordenações graves e muito graves prescreve logo que sobre a prática da contraordenação haja decorrido o prazo de cinco anos, sem prejuízo das
causas de interrupção e suspensão previstas no regime geral.
2 - O procedimento pelas contraordenações leves prescreve logo que sobre a prática da contraordenação haja decorrido o prazo de três anos, sem prejuízo das causas de interrupção e suspensão previstas no regime geral.
A arguida foi condenada. pela prática de uma contra-ordenação ambiental, p. e p. pelo art. 9.°/2 e 67.°/1, al. d), ambos do Decreto-Lei n.° 178/2006 de 05.09 e, quanto à moldura sancionatória, pelo art. 22.°/4, al. b) da Lei n.° 50/2006 de 29.08,
A4) Da legislação aplicável
-Artigo 22.0 da Lei 50/2006
(Montantes das coimas)
1 - A cada escalão classificativo de gravidade das contraordenações corresponde uma coima variável
consoante seja aplicada a uma pessoa singular ou coletiva e em função do grau de culpa, salvo o
disposto no artigo seguinte.
(...)
4 - Às contraordenações muito graves correspondem as seguintes coimas:
a) Se praticadas por pessoas singulares, de (euro) 10 000 a (euro) 100 000 em caso de negligência e de
(euro) 20 000 a (euro) 200 000 em caso de dolo;
b) Se praticadas por pessoas coletivas, de (euro) 24 000 a (euro) 144 000 em caso de negligência e de (euro) 240 000 a (euro) 5 000 000 em caso de dolo.
-Art. 67.°/1, al. d):
1 - Constitui contra-ordenação ambiental muito grave, punível nos termos da Lei n.° 50/2006, de 29 de Agosto, alterada pela Lei n.° 89/2009, de 31 de Agosto, e rectificada pela Declaração de Rectificação n.° 70/2009, de 1 de Outubro, a prática dos seguintes actos:
(• • •)
d) O exercício não licenciado das actividades de tratamento de resíduos em violação do disposto no n.°
2 do artigo 9.° e no artigo 23.°;
(• • •)
(Prescrição)
1 - O procedimento pelas contraordenações graves e muito graves prescreve logo que sobre a prática da contraordenação haja decorrido o prazo de cinco anos, sem prejuízo das causas de interrupção e suspensão previstas no regime geral.
2 - O procedimento pelas contraordenações leves prescreve logo que sobre a prática da contraordenação haja decorrido o prazo de três anos, sem prejuízo das causas de interrupção e suspensão previstas no regime geral.
Ora, tendo em conta o prazo geral aludido de 5 anos (e que, in casu, não depende da regra geral da moldura da coima mas antes da gravidade da infracção) e a qualificação operada na decisão como contraordenação muito grave, tendo em conta o disposto nas regras de suspensão e de interrupção previsto nos art° 27°A , n°1 ala c) e n°2, e 28° n°1 a), c), d) e n°3, do RGCC, tal significa que desde 15.1.2013 teremos um prazo total de 8 anos ( até 15.1.2021) para ocorrência inultrapassável da prescrição do procedimento contra-ordenacional.
Indefere-se assim o argumento da extinção por alegada ocorrência do prazo de prescrição.
B) Noção jurídico-contraordenacional de tratamento de resíduos
Alega a recorrente que:
A condenação da RECORRENTE corno tendo praticado tratamento de resíduos é errada e não se sustenta nem no auto de notícia nem na Douta Sentença em qualquer facto provado, resultando de uma incorrecta aplicação do Direito aos factos; Nada consta da Douta Sentença ou dos factos provados em sede de audiência de discussão e julgamento que a mesma estivesse a proceder ao tratamento dos resíduos inspeccionados e que originaram a presente contraordenação no sentido taxativo da al. oo) do art° 3° do citado DL condenada seria necessário que a mesma estivesse a proceder efectivamente ao tratamento de tais resíduos no sentido taxativo previsto na sobredita alínea e nos termos do disposto na al. d) do n° 1 do art° 67° do DL 178/2006, de 5/9; Só a operação de tratamento de resíduos é proibida nos termos do referido DL e só essa é passível de condenação se não for objecto de licenciamento prévio.
O Tribunal a quo não faz aplicação da norma constante do n° 1 e al. a) e b) do n° 2 art° 23°-A da Lei 50/2006, de 29/8 cuja aplicação é automática. Não foi correctamente interpretada a norma constante da al. oo) do art° 3° do DL 178/2006, de 5/9 quando intepretado no sentido de que a taxatividade de tratamento implica o armazenamento definido no Anexo IV que serve para efeitos de CAE;
A recorrente tem toda a razão.
A punição de que foi alvo teve em conta que esta cometeu uma
contraordenação por tratamento de resíduos não licenciadamente.
O tratamento é um conceito definido no at° 3° do DL 178/06:
Artigo 3.°
Definições
Para os efeitos do disposto no presente decreto-lei, entende-se por:
a) «Abandono» a renúncia ao controlo de resíduo sem qualquer beneficiário determinado, impedindo a sua gestão;
b) «Armazenagem» a deposição controlada de resíduos, antes do seu tratamento e por prazo determinado, designadamente as operações R 13 e D 15 identificadas nos anexos i e ii do presente decreto-lei, do qual fazem parte integrante;
c) «Armazenagem preliminar» a deposição controlada de resíduos, no próprio local de produção, por período não superior a um ano, antes da recolha, em instalações onde os
resíduos são produzidos ou descarregados a fim de serem preparados para posterior transporte para outro local para efeitos de tratamento;
d) «Biorresíduos» os resíduos biodegradáveis de espaços verdes, nomeadamente os de jardins, parques, campos desportivos, bem como os resíduos biodegradáveis alimentares e de cozinha das habitações, das unidades de fornecimento de refeições e de retalho e os resíduos similares das unidades de transformação de alimentos;
e) «Centro de recepção de resíduos» a instalação onde se procede à armazenagem ou triagem de resíduos inseridos quer em sistemas integrados de gestão de fluxos de resíduos quer em sistemas de gestão de resíduos urbanos;
f) «Comerciante» qualquer pessoa singular ou colectiva que intervenha a título principal na compra e subsequente venda de resíduos mesmo que não tome a posse física dos resíduos;
g) «Composto» a matéria fertilizante resultante da decomposição controlada de resíduos orgânicos obtida pelo processo de compostagem ou por digestão anaeróbia seguida de compostagem;
h) «Corretor» qualquer empresa que organize a valorização ou eliminação de resíduos por conta de outrem mesmo que não tome a posse física dos resíduos;
i) «Descarga» a operação de deposição de resíduos;
j) «Descontaminação de solos» o procedimento de remoção da fonte de contaminação e o confinamento, tratamento, in situ ou ex situ, conducente à remoção e ou à redução de agentes poluentes nos solos, bem como à eliminação ou diminuição dos efeitos por estes causados; 1) «Detentor» a pessoa singular ou colectiva que tenha resíduos, pelo menos, na sua simples detenção, nos termos da legislação civil;
m) «Eliminação» qualquer operação que não seja de valorização, nomeadamente as incluídas no anexo i do presente decreto-lei, ainda que se verifique como consequência secundária a recuperação de substâncias ou de energia;
n) «Fileira de resíduos» o tipo de material constituinte dos resíduos, nomeadamente fileira dos vidros, fileira dos plásticos, fileira dos metais, fileira da matéria orgânica ou fileira do papel e cartão;
o) «Fluxo específico de resíduos» a categoria de resíduos cuja proveniência é transversal às várias origens ou sectores de actividade, sujeitos a uma gestão específica;
p) «Gestão de resíduos» a recolha, o transporte, a valorização e a eliminação de resíduos, incluindo a supervisão destas operações, a manutenção dos locais de eliminação no pós-encerramento, bem como as medidas adoptadas na qualidade de comerciante ou corretor;
q) «Instalação» a unidade fixa ou móvel em que se desenvolvem operações de gestão de resíduos;
r) «Operador» qualquer pessoa singular ou colectiva que procede, a título profissional, à gestão de resíduos;
s) «Passivo ambiental» a situação de degradação ambiental resultante do lançamento de contaminantes ao longo do tempo e ou de forma não controlada, nomeadamente nos casos em que não seja possível identificar o respectivo agente poluidor;
t) «Plano» o estudo integrado dos elementos que regulam as acções de intervenção no âmbito da gestão de resíduos, identificando os objectivos a alcançar, as actividades a realizar, as competências e atribuições dos agentes envolvidos e os meios necessários à concretização das acções previstas;
u) «Ponto de retoma» o local do estabelecimento de comercialização e ou de distribuição de produtos que retoma, por obrigação legal ou a título voluntário, os resíduos resultantes da utilização desses produtos;
v) «Preparação para reutilização» as operações de valorização que consistem no controlo, limpeza ou reparação, mediante as quais os produtos ou os componentes de produtos que assumam a natureza de resíduos são preparados para serem utilizados novamente, sem qualquer outro tipo de
pré-processamento;
x) «Prevenção» a adopção de medidas antes de uma substância, material ou produto assumir a natureza de resíduo, destinadas a reduzir:
i) A quantidade de resíduos produzidos, designadamente através da reutilização de produtos ou do prolongamento do tempo de vida dos produtos;
ii) Os impactes adversos no ambiente e na saúde humana resultantes dos resíduos produzidos;
OU
iii) O teor de substâncias nocivas presentes nos materiais e nos produtos; z) «Produtor de resíduos» qualquer pessoa, singular ou colectiva, cuja actividade produza resíduos (produtor inicial de resíduos) ou que efectue operações de pré-processamento, de mistura ou outras que alterem a natureza ou a composição desses resíduos; aa) «Produtor do produto» qualquer pessoa, singular ou colectiva, que desenvolva, fabrique, embale ou faça embalar, transforme, trate, venda ou importe produtos para o território nacional no âmbito da sua actividade profissional;
bb) «Reciclagem» qualquer operação de valorização, incluindo o reprocessamento de materiais orgânicos, através da qual os materiais constituintes dos resíduos são novamente transformados em produtos, materiais ou substâncias para o seu fim original ou para outros fins mas que não inclui a valorização energética nem o reprocessamento em materiais que devam ser utilizados como combustível ou em operações de enchimento; cc) 'Recolha' a coleta de resíduos, incluindo a triagem e o armazenamento preliminares dos resíduos, para fins de transporte para uma instalação de tratamento de resíduos; dd) «Recolha selectiva» a recolha efectuada de forma a manter o fluxo de resíduos separados por tipo e natureza com vista a facilitar o tratamento específico; ee) «Resíduos» quaisquer substâncias ou objectos de que o detentor se desfaz ou tem a intenção ou a obrigação de se desfazer;
ff) «Resíduo agrícola» o resíduo proveniente de exploração agrícola e ou pecuária ou similar; gg) «Resíduo de construção e demolição» o resíduo proveniente de obras de construção, reconstrução, ampliação, alteração, conservação e demolição e da derrocada de edificações; hh) «Resíduo hospitalar» os resíduos resultantes de actividades de prestação de cuidados de saúde a seres humanos ou a animais, nas áreas da prevenção, diagnóstico, tratamento, reabilitação ou investigação e ensino, bem como de outras actividades envolvendo
procedimentos invasivos, tais como acupunctura, piercings e tatuagens; ii) «Resíduo industrial» o resíduo gerado em processos produtivos industriais, bem como o que resulte das actividades de produção e distribuição de electricidade, gás e água; jj) «Resíduo inerte» o resíduo que não sofre transformações físicas, químicas ou biológicas importantes e, em consequência, não pode ser solúvel nem inflamável, nem ter qualquer outro tipo de reacção física ou química, e não pode ser biodegradável, nem afectar negativamente outras substâncias com as quais entre em contacto de forma susceptível de aumentar a poluição do ambiente ou prejudicar a saúde humana, e cujos lixiviabilidade total, conteúdo poluente e ecotoxicidade do lixiviado são insignificantes e, em especial, não põem em perigo a qualidade das águas superficiais e ou subterrâneas;
11) 'Resíduo perigoso' resíduo que apresenta uma ou mais características de perigosidade constantes do Regulamento (UE) n.° 1357/2014, da Comissão, de 18 de dezembro de 2014; mm) «Resíduo urbano» o resíduo proveniente de habitações bem como outro resíduo que, pela sua natureza ou composição, seja semelhante ao resíduo proveniente de habitações; nn) «Reutilização» qualquer operação mediante a qual produtos ou componentes que não sejam resíduos são utilizados novamente para o mesmo fim para que foram concebidos; oo) «Tratamento» qualquer operação de valorização ou de eliminação de resíduos, incluindo a preparação prévia à valorização ou eliminação e as actividades económicas referidas no anexo iv do presente decreto-lei, do qual faz parte integrante;
pp) «Triagem» o acto de separação de resíduos mediante processos manuais ou mecânicos, sem alteração das suas características, com vista ao seu tratamento; qq) «Valorização» qualquer operação, nomeadamente as constantes no anexo ii do presente decreto-lei, cujo resultado principal seja a transformação dos resíduos de modo a servirem um fim útil, substituindo outros materiais que, caso contrário, teriam sido utilizados para um fim específico ou a preparação dos resíduos para esse fim na instalação ou conjunto da economia.
Artigo 9.° do DL 172/2006
(Princípio da regulação da gestão de resíduos)
1 - A gestão de resíduos é realizada de acordo com os princípios gerais fixados nos termos do presente decreto-lei e demais legislação aplicável e em respeito dos critérios qualitativos e quantitativos fixados nos instrumentos regulamentares e de planeamento.
2 - É proibida a realização de operações de tratamento de resíduos não licenciadas
nos termos do presente decreto-lei.
Na acepção do diploma :
oo) «Tratamento» consiste em qualquer operação de valorização ou de eliminação de resíduos, incluindo a preparação prévia à valorização ou eliminação e as actividades económicas referidas no anexo iv do presente decreto-lei, do qual faz parte integrante; (...)
(...)
qq) «Valorização» qualquer operação, nomeadamente as constantes no anexo ii do presente decreto-lei, cujo resultado principal seja a transformação dos resíduos de modo a servirem um fim útil, substituindo outros materiais que, caso contrário, teriam sido utilizados para um fim específico ou a preparação dos resíduos para esse fim na instalação ou conjunto da economia
Ora, nada se revela como clara e definitivamente provado em como a arguida estivesse a armazenar para valorizar ou eliminar os resíduos ou em actos de preparação prévia para tal efeito. E, tão pouco, até em face da natureza da própria actividade social da arguida, se pode retirar que tivesse sido provado factualidade suficiente no sentido de se poder concluir que o armazenamento se destinasse a qualquer urna das actividades elencadas no Anexo II do DL 178/2006
Operações de valorização.
R 1 - Utilização principal como combustível ou outro meio de produção de energia (1).
R 2 - Recuperação/regeneração de solventes.
R 3 - Reciclagem/recuperação de substâncias orgânicas não utilizadas como solventes
(incluindo digestão anaeróbia e ou
compostagem e outros processos de transformação biológica) (2).
R 4 - Reciclagem/recuperação de metais e compostos metálicos.
R 5 - Reciclagem/recuperação de outros materiais inorgânicos (3).
R 6 - Regeneração de ácidos ou bases.
R 7 - Valorização de componentes utilizados na redução da poluição.
R 8 - Valorização de componentes de catalisadores.
R 9 - Refinação de óleos e outras reutilizações de óleos.
R 10 - Tratamento do solo para benefício agrícola ou melhoramento ambiental.
R 11 - Utilização de resíduos obtidos a partir de qualquer das operações enumeradas de R 1 a R 10.
R 12 - Troca de resíduos com vista a submetê-los a uma das operações enumeradas de R 1 a R 11 (4).
R 13 - Armazenamento de resíduos destinados a uma das operações enumeradas de R 1 a R 12 (com exclusão do armazenamento temporário, antes da recolha, no local onde os resíduos foram produzido
(• • •)
Nestes termos:
A Matéria de facto assente não é subsumível ao normativo contraordenacional pelo qual a arguida foi punida, pelo que a mesma será dela absolvida, ficando prejudicadas as restantes questões elencadas no recurso.
Alinhamos aqui de muito perto com a solução idêntica em tema já decidido no Ac RL de 17.2.2011, aliás chamado à colação pelo MP° nesta Relação:
(...)O processamento das contra-ordenações ambientais rege-se pela Lei Quadro das Contra-ordenações Ambientais, aprovada pela Lei 50/2006, de 29/08 Que entrou em vigor em 03/09/2006., Entretanto alterada pela Lei 89/2009, de 31/08, que entrou em vigor em 05/09/2009.. Esta Lei, no seu art.° 2°/1, estabelece como regime subsidiário o disposto no RGCO Regime Geral das Contra-Ordenações, constante do DL 433/82, de 27/10, que entrou em vigor em 01/11/1982, com as várias alterações que entretanto lhe foram introduzidas., aprovado pelo DL 433/82, de 27/10, que, por sua vez, no art.° 41°/1, quanto ao processamento, remete subsidiariamente para as normas processuais penais Já quanto ao direito subsidiário substantivo, remete para o Código Penal (art.° 32°).
Nos recursos da sentença proferida em sede de impugnação judicial, o Tribunal da Relação só
conhece da matéria de direito (art.° 75°/1 do RGCO), salvo no caso de se verificarem os vícios referidos no art.° 4100/2 do CPP, que são de conhecimento oficioso Cf. Ac. do STJ de 19/10/1995, in DR 1' Série A, de 12/28/1995, que fixou jurisprudência no sentido de que é oficioso o conhecimento, pelo tribunal de recurso, dos vícios indicados no art.° 410.°/2 CPP..
Não tem aplicação nestes recursos a limitação pelo conteúdo da decisão recorrida, nem pelas alegações do recorrente, nos termos do disposto no art.° 75°/2 do RGCO Neste sentido, cf. Simas Santos e Jorge Lopes de Sousa, in Contra-ordenações — Anotações ao Regime Geral, Vislis Editores, 4 ed., 2007, págs. 573 e 574.
A gestão de resíduos é legalmente disciplinada pelo Regime Geral da Gestão de Resíduos Doravante RGGR., aprovado pelo DL 178/2006, de 05/09 Que entrou em vigor em 10/09/2006., que transpôs para a ordem jurídica interna as Directivas 2006/12/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 05/04, e 91/689/CEE, do Conselho, de 12/12. Importa referir que, entretanto, estas directivas foram revogadas pelo art.° 41° da Directiva 2008/98/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 19/11. Nos termos do art.° 40°/1, esta Directiva devia ter sido transposta para o direito interno até 12/12/2010, o que ainda não aconteceu, estando, portanto, Portugal em falta.
São operações de gestão de resíduos as de recolha, transporte, armazenagem, triagem, tratamento, valorização e eliminação (art.° 2°/1 do RGGR).
Algumas dessas operações estão sujeitas a licenciamento: as de armazenagem, triagem, tratamento, valorização e eliminação (art.°s 9°/2 e 23°/1 do RGGR). Também se não podem descarregar resíduosem locais não licenciados para a realização de operações de gestão de resíduos (art.° 9°/3). Assim, em geral, não estão sujeitas a licenciamento as operações de recolha e de transporte e resíduos (art.° 23°/4 do RGGR).
O que está aqui em causa é, pois, determinar se os factos provados integram o conceito de armazenagem, consagrado no art.° 3°/b) do RGGR.
De qualquer forma, não vemos como, com estes elementos, se possa concluir que estiveram armazenados nas instalações da Recorrente. Pelo contrário, é forçoso concluir que se tratou de uma operação de recolha.
Como dissemos, as operações de recolha e de transporte de resíduosnão estão sujeitas a licenciamento (art.° 23u/4 do RGGR)
Nos termos do disposto no art.° 75° do RGCO, a decisão do recurso pode alterar a decisão do tribunal recorrido sem qualquer vinculação aos termos e ao sentido da decisão recorrida.
É o que faremos, considerando que as operações dadas como provadas na decisão recorrida não integram o conceito de armazenamento mas sim o de recolha.
Esta não está sujeita a licenciamento (art.° 23° do RGGR), pelo que se não pode concluir que a Recorrente tenha praticado uma contra-ordenação p. e p. pelo disposto no art.° 67°/1-b) do RGGR, razão pela qual deve ser absolvida.
(...)
III- DECISÃO
3.1 - Pelo exposto, julga-se o recurso parcialmente procedente e absolve-se a arguida da contraordenação imputada.
Lisboa, 12 de Fevereiro de 2019
Os Juízes Desembargadores
(texto elaborado em suporte informático , revisto e rubricado pelo relator — (art° 94° do CPP)
Agostinho Torres
João Carrola
   Contactos      Índice      Links      Direitos      Privacidade  Copyright© 2001-2024 Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa