JURISPRUDÊNCIA DO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL
 
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  ACTC nº 200/99
   Título
   Sumário
Procº nº 22-PP
2ª Secção Relator:- BRAVO SERRA
(Consº GUILHERME DA FONSECA)

1. O Movimento para a Unidade dos Trabalhadores (MUT) veio requerer, em 27 de Janeiro de 1999, ao Tribunal Constitucional 'a alteração do nome, sigla e símbolo', indicando que estes passarão a ser os seguintes:-
- Denominação: Partido Operário da Unidade Socialista
- Sigla: POUS
- Símbolo: o indicado no anexo, conforme o documento que acompanha os Estatutos que se juntam
O requerimento vem assinado por Carmelinda Maria dos Santos Pereira
('Pela Comissão Coordenadora do MUT'), tendo sido posteriormente, a convite do Relator, anexado aos autos 'fotocópia do BI 630629 de 23/01/89 do Arquivo de Lisboa de Carmelinda Maria dos Santos Pereira', e nele assinala-se que a alteração peticionada resultou de 'deliberação do Congresso extraordinário do MUT', que, 'conforme acta que se anexa, decidiu constituir a:
- Comissão Nacional pelos militantes: Carmelinda Maria Santos Pereira, António Jorge de Oliveira Aires Rodrigues, Joaquim António Costa Franco Pagarete, Daniel Mendes Gatoeiro, Ana Paula da Conceição Martins do Amaral, Carlos Alberto Araújo Melo e José Júlio Santana Henriques;
- Comissão de Controlo pelos militantes: Helena Augusta Fortuna
Wallis de Carvalho e Rionildo Eloi Marques'.
O aludido requerimento vem acompanhado com a Acta do Congresso Extraordinário do MUT - Movimento para a Unidade dos Trabalhadores, sem data, e assinada pelos membros da sua Mesa [dela constando que 'foi decidido que o nome do Partido se passava a designar 'Partido Operário de Unidade Socialista', com a sua sigla 'POUS' e adoptasse como símbolo um 'punho direito fechado sobre um fundo circular vermelho assente sobre a sigla POUS' (vidé figura que se junta)' e 'foram adoptados os estatutos e programa que se juntam'], com duas fotocópias dos bilhetes de identidade correspondendo aos assinantes da acta, com o documento que contém a nova denominação, sigla e símbolo do partido, com os Estatutos do P.O.U.S. e com o 'Programa de transição' [A Agonia do Capitalismo e as Tarefas da IV Internacional (a mobilização das massas em torno das reivindicações transitórias como preparação da tomada do poder)].

2. Os primeiros artigos daqueles Estatutos rezam como se segue:-

' Artigo 1º - O Partido Operário de Unidade Socialista (POUS) é uma associação voluntária de militantes e tem por finalidade principal ajudar a classe operária e todos os trabalhadores explorados e oprimidos na luta pela sua emancipação, pela tomada do poder e a vitória do socialismo. O POUS adopta o Programa de Transição da IV Internacional - Mobilização das massas em torno das suas reivindicações transitórias como preparação da tomada do poder. O POUS luta pela construção do Partido Revolucionário do proletariado português e pela construção da IV Internacional. Artigo 2º- A sua sede nacional é em Lisboa, mas poderá ter secções em qualquer localidade sempre que a Comissão Nacional o considere necessário. Artigo 3º - São membros do POUS todos aqueles que militam regularmente nos seus organismos de base, que defendem publicamente a orientação geral do Partido, que aceitam a sua disciplina e pagam as quotizações fixadas'.

A eles se seguem catorze artigos relativos às estruturas do partido
(deles constando o Congresso, que 'é o órgão supremo do POUS', sendo 'soberano em todas as suas decisões' - artº 5º, nº 1), às inscrições, à disciplina e às sanções.
O Ex.mo Representante do Ministério Público junto deste Tribunal não se opôs à pretensão ora deduzida.
Cumpre decidir.

3. De harmonia com o disposto nos artigos 9º, alínea b), e 103º, nº
2, da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, compete ao Tribunal Constitucional apreciar e decidir sobre a legalidade da denominação, sigla e símbolo dos partidos políticos. Nos termos do artigo 51º, nº 3, da Constituição, os partidos políticos não podem usar denominação que contenha expressões directamente relacionadas com quaisquer religiões ou igrejas, bem como emblemas confundíveis com símbolos nacionais ou religiosos. E, por força do estatuído no artigo 5º, nº
6, do Decreto-Lei nº 595/74, de 7 de Novembro, na redacção do Decreto-Lei nº
126/75, de 13 de Março, a denominação, sigla e símbolo de um partido não podem ser idênticos ou semelhantes a quaisquer de outros partidos anteriormente inscritos.
Deste preceito resulta ainda que os símbolos dos partidos políticos não podem confundir-se ou ter relação gráfica ou fonética com símbolo e emblemas nacionais ou com imagens e símbolos religiosos.

Em face desta parametrização normativa, há, num primeiro momento, que considerar que, in casu, se assiste à ocorrência de legitimidade da requerente para deduzir a solicitação que efectuou, que se não verificam irregularidades na formulação do pedido, que as alterações que agora se pretende ver registadas tocantemente à denominação e à sigla do Partido em causa se mantêm no quadro dos seus novos estatutos, tendo as intentadas alterações sido aprovadas pelo órgão estatutariamente competente.

3.1. Resta, todavia, apurar se o símbolo que se deseja ser o identificador do Partido obedece aos comandos do mencionado artº 5º, nº 6, do Decreto-Lei nº 595/74.
A ratio desse preceito, como é claro, visa assegurar uma seriedade política aquando da realização dos actos eleitorais, obstando que os cidadãos eleitores, designadamente aqueles que tenham maiores dificuldades visuais ou que se apresentem com níveis de literacismo pouco acentuado ou mesmo nulo - que dispõem da mesmíssima capacidade eleitoral activa dos outros cidadãos e sem cuja participação a democracia se não pode desenhar de forma correcta - possam, eventualmente, ser induzidos em erro no momento em que expressam a sua vontade no acto da eleição.
Visa-se, assim, proteger a total liberdade de escolha dos eleitores e a fidedignidade da sua vontade, que se reflecte no exercício do poder político do povo através do sufrágio universal, igual, directo, secreto e periódico.
Compreende-se, por isso, que, no que tange, nomeadamente, ao símbolo, que é o que no momento releva, não possa haver pontos de identidade ou de semelhança tais que porventura desencadeiem confusão nos eleitores.
Isso não significa, porém, que, à partida, assumidos, por um dado partido, determinados elementos gráficos no seu símbolo, e uma vez que se encontrem registados, já não possa nenhum desses elementos ser adoptado por um outro partido que posteriormente venha requerer o seu registo ou o registo de novo símbolo.
Mister é que tais elementos, e tendo em conta um eleitor com reduzida cultura, com parca ou até nula capacidade de ler ou com acuidade visual limitada, sejam suficientemente distinguíveis para que, no momento de aposição da sua vontade no boletim de voto, possam, com consciência e, logo, sem hesitações ou dúvidas sobre qual o partido da sua escolha, saber que é esse o seu eleito.
Por isso, o punctm saliens de uma apreciação tal como a que agora se impõe fazer há-de, tendo por referência aquele eleitor, incidir mais incisivamente nas semelhanças do que nas diferenças dos elementos gráficos dos símbolos em confronto, por forma a que, numa visão global de todos os elementos, dela não resulte a possibilidade de confusão.

3.2. Neste contexto, o que resulta dos presentes autos?
Resulta que, conquanto a mancha gráfica dos símbolos do Partido requerente e do Partido Socialista apresente efectivamente alguns elementos de onde se retira a existência de diferenças, não deverá deixar de assinalar-se que um e outro contêm um círculo no qual está representado uma mão fechada.
É certo que, no símbolo do Partido Socialista, coroando aquele círculo, se denota um outro círculo concêntrico no qual se inscreve a sua denominação, enquanto que, no símbolo intentado adoptar pelo Partido requerente, abaixo do círculo que contém a mão fechada, se inscreve a sua sigla.
Há, contudo, que reconhecer que, quer a denominação de um, quer a sigla de outro, se fundam, como não pode deixar de ser, em elementos gráficos representativos da palavra escrita, ou seja, em letras.
Sendo assim, um eleitor que não saiba decifrar estes últimos elementos gráficos, por não saber ler, não poderá, com base neles, diferenciar um e outro partido. Por isso, na ocasião em que vai exprimir a sua vontade eleitoral, esse cidadão há-de fazer recair a sua atenção nas manchas gráficas meramente figurativa que fazem parte dos símbolos.
Ora, numa tal postura, entende o Tribunal que, muito embora não haja uma perfeita identidade daquelas manchas gráficas meramente figurativas dos símbolos em questão (por isso que o «desenho» das mãos é perspectivado de diferentes ângulos e referentemente a uma mão dextra e uma mão sinistra), de todo o modo o que se não pode deixar de sublinhar é que o que se retira dessas manchas é uma imediata impressão de confundibilidade entre ambas. Perante esta constatação, seria inaceitável que, tomando como ponto de referência o eleitor a que acima se aludiu, este órgão de administração de justiça aceitasse que não se tornava desproporcionada a exigência àquele eleitor de um esforço tendente à descortinação das dissemelhenças atrás mencionadas, a fim de o mesmo, livre e conscientemente, exercer a sua escolha.
Em suma:- considera o Tribunal que os pontos de semelhança entre as manchas gráficas meramente figurativas do símbolo do Partido Socialista e do símbolo pretendido adoptar pelo Partido Operário da Unidade Socialista apresentam um grau tal que deve ser considerado como bastante para induzir em erro os eleitores mais desprevenidos ou, pelo menos, aqueles a que acima se fez menção. E, por isso, no caso em espécie, não se poderá ter como obedecido o preceituado no artº 5º, nº 6, do Decreto-Lei nº 595/74 quanto à legalidade deste
último símbolo.

4. Em face do que se deixa dito, e por se entender que o símbolo pretendido adoptar enferma de ilegalidade por não obedecer àquela disposição legal, decide-se não ordenar o registo de alteração apresentado pelo Partido peticionante.
Lisboa,
25 de Março de 1999. Bravo Serra Maria Fernanda Palma Guilherme da Fonseca ( vencido, por entender não se verificarem os pontos de semelhança referidos no acórdão e, por isso, deferiria o pedido) Paulo Mota Pinto (vencido, por entender que os símbolos partidários em causa não são semelhantes, nem, sequer, confundíveis, dada a disposição e a apresentação gráfica dos seus elementos, incluindo, obviamente, o das letras que integram o símbolo, sua extensão, forma e dimensão; por isso, deferiria o pedido). José Manuel Cardoso da Costa