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    Peças processuais - doc nº 681
Peça nº681 - Petição inicial   Providência cautelar. Defesa do ambiente e da saúde pública      24-10-2006
Providência cautelar não especificada intentada pelo Ministério Público ao abrigo do estatuído no artº 66º da CRP, artºs 42º e 45º da Lei nº 11/87, de 7/4 e artºs 26º-A e 381º do CPC.
Fundamenta-se a pretensão no facto das requeridas colocarem, diariamente, na varanda do apartamento onde residem, recipientes contendo arroz e água, que se destinam à alimentação de pombos. Essa actuação tem provocado uma elevada concentração de pombos no local, situação que vem perturbando a vida dos moradores; isto porque, os pombos inundam de penas e dejectos os telhados, as chaminés e os algerozes, as varandas e os estendais, bem como a rua e as viaturas nela estacionadas, o que, além do mais, coloca em perigo a saúde e a qualidade de vida das requeridas, e a das pessoas que residem na zona ou ali necessitam de se deslocar.
Visa-se, com a providência cautelar, a condenação das requeridas a absterem-se de continuar a alimentar os pombos, requerendo-se, ainda a fixação de uma “sanção pecuniária compulsória no montante diário de 100 € por cada dia que as requeridas alimentem os pombos no apartamento, por forma a assegurar a efectividade da providência que vier a ser decretada”.

Texto integral:

Processo Administrativo nº 1668/2005 B (Providência Cautelar)

Exmº Sr. Juiz de Direito das Varas Cíveis da Comarca de LISBOA

O Ministério Público vem, ao abrigo do disposto no artº 66º da Constituição da República Portuguesa, nos artºs 42º e 45º da Lei nº 11/87, de 7 de Abril, e nos artºs 26º-A e 381º do Código de Processo Civil, requerer providência cautelar não especificada, contra:

- A(…) casada, nascida em 2.03.1925, no Brasil, residente na Rua (…), em Lisboa; e

- B(…), solteira, maior, nascida em 2.6.1950, residente na Rua (…), em Lisboa;

nos termos e pelos fundamentos seguintes:

Da isenção de custas

Ao abrigo do disposto no artigo 2º, nº 1º, al. a), do Dec-Lei nº 324/2003 – Código das Custas Judiciais – o Ministério Público está isento de custas.

Da Providência Cautelar

A 1ª e 2ª requeridas são mãe e filha, respectivamente, e habitam o 5º andar dtº., do prédio sito na Rua (…), em Lisboa (doc.s nºs 1 e 2, mas protestando juntar os respectivos Assentos de Nascimento).

O prédio das requeridas é composto por cinco andares, cada um com dois apartamentos, direito e esquerdo, e o r/c por duas lojas que comercializam produtos chineses.

Aí residem cerca de 40 pessoas, sendo que cerca de 10 são idosos e 1 criança.

Desde o início do ano de 2003 que as requeridas vêm alimentando pombos na varanda do respectivo apartamento (doc.s nºs 3 a 12).

Para tanto, as requeridas colocaram na aludida varanda quatro recipientes de plástico e, diariamente, cerca de 3 vezes por dia, de manhã, à hora do almoço e à tarde, vêm enchendo os recipientes com arroz e água (doc.s nºs 3 a 12).

Os pombos permanecem em atitude expectante à espera da comida das requeridas no telhado do prédio do nº 60 da mesma rua, situado em frente ao prédio das requeridas.

E logo que as requeridas enchem os recipientes na varanda com arroz e água, os pombos voam do telhado do prédio do nº 60 para a varanda das requeridas para se alimentarem.

A aludida alimentação diária dos pombos tem provocado uma elevada concentração de pombos no local, designadamente, no telhado dos prédios circundantes, em especial no telhado do prédio do nº 60º da mesma Rua, situado em frente ao prédio das requeridas (doc.s 3 a 12).

10ºO que tem constituído um factor perturbador da vida dos moradores do prédio onde habitam as requeridas e dos prédios circundantes, já que os pombos que ali permanecem têm vindo a inundar de penas e dejectos os telhados, as chaminés e os algerozes, as varandas e os estendais, bem como a rua e as viaturas nela estacionados ou que nela circulem (doc.s nºs 3 a 17).

11ºA situação é de tal modo insustentável que, presentemente, mostra-se prejudicada a utilização dos próprios espaços das habitações, em concreto das varandas e dos estendais das roupas, impedindo os respectivos proprietários ou arrendatários de aí se deslocarem ou de estenderem a roupa (doc.s 3 a 17).

12º Por outro lado, a elevada concentração de pombos e a sujidade que provocam, com as penas e dejectos que ali vêm depositando, colocam em perigo a saúde e a qualidade de vida das requeridas, dos restantes moradores do mesmo prédio das requeridas, bem como da dos prédios contíguos, assim como de todos quantos aí têm necessidade de permanecer ou de se deslocar, residentes ou não no local.

13ºE constituem um foco de transmissão de doenças infecciosas para os moradores, designadamente as seguintes :

- HISTOPLASMOSE : doença causada por fungos que crescem nas dejecções dos pombos, transmitida por inalação e que podem causar fadiga, febres e dores no peito;

- CRIPTOCOCOSE : doença fúngica causada pelos dejectos dos pombos e que podem causar depressão do sistema imunitário humano;

- PSITACOSE : doença bacteriana e infecciosa transmitida por inalação de partículas dos dejectos dos pombos e que podem causar fadiga, febre, cefaleias, arrepios e por vezes pneumonia;

- SALMONELOSE : infecção gastrointestinal provocada por bactéria existentes nos dejectos dos pombos e que podem causar náuseas, vómitos, diarreia que pode provocar desidratação, dores abdominais, febres e mau estar geral;

- PIOLHOS : presentes nos pombos e transmissíveis a pessoas e animais domésticos; e

- DOENÇA DO TRATADOR DE POMBOS : reacção alérgica pulmonar, não atópica, a substâncias antigénicas das excreções das aves e que podem provocar arrepios, febres e tosse com dispneia. A exposição contínua pode conduzir a fibrose pulmonar, debilitante e levar mesmo à morte (doc.s nºs 18, 19 e 20).

14º Os efeitos nocivos para o ambiente e para a qualidade de vida das pessoas que habitam e trabalham junto da residência das requeridas aumentam com o decurso do tempo;

15ºexistindo maior probabilidade das pessoas contraírem uma patologia transmitida pelos pombos e pelos seus dejectos decorrente da exposição permanente e continuada junto das habitações ou dos locais de trabalho.

16º O facto das requeridas continuarem a alimentar os pombos nos moldes descritos, têm feito com que estes desprezem a alimentação com contraceptivos orais que lhes é fornecida pela Câmara Municipal de Lisboa, o que inviabiliza a respectiva captura por parte dos organismos camarários competentes (doc.s nº 3 a 12).

17º Os diversos moradores do prédio da requerida, bem como dos prédios circundantes, alertaram a entidade policial, o Centro de Saúde e o Departamento de Higiene Urbana e de Resíduos Sólidos da Câmara Municipal de Lisboa, entidades essas que vistoriaram o local e constataram que aquela situação de grave insalubridade é susceptível de colocar em perigo a saúde pública (doc.s 3 a 17).

18ºTodavia, não intervieram de molde a pôr cobro à situação em virtude de a fracção ser de habitação e não disporem, nem de autorização, nem da colaboração das requeridas, razão pela qual não lhes era lícito intervir (doc.s nº 3 a 17).

19ºApesar de interpeladas por diversas vezes para proceder à limpeza da fracção, as requeridas continuam a alimentar os pombos nos moldes descritos (doc.s nº 3 a 17).

20º Impõe-se, pois, com urgência, a tomada de medidas tendentes a evitar que as requeridas continuem a alimentar os pombos e, dessa forma, procurando eliminar a elevada concentração de pombos no local.

21º A situação descrita é susceptível de contender com direitos fundamentais dos cidadãos que ali se desloquem ou permaneçam, residentes ou não, designadamente, com o direito ao ambiente saudável e o direito à saúde, bem como o direito de propriedade – neste sentido ver, entre outros, Ac. da relação de Coimbra de 7.01.1992, in BMJ nº 413º, pág. 624; Ac. da Relação do Porto de 26.10.1995, in BMJ nº 450º, pág. 559; e Ac. da Relação do Porto de 1.2.1996, in BMJ nº 454º, pág. 796.

22ºE só poderá colocar-se cobro à situação, desde que as requeridas sejam condenadas a absterem-se de continuar a alimentar os pombos no respectivo apartamento, designadamente, condenando-as em multa por cada dia que prevariquem.

23º A urgência desta providência antecipatória adequada a afastar ou a minimizar o dano ambiental e o risco para a saúde das próprias requeridas e dos restantes moradores do prédio e de todos aqueles quantos aí tenham de se deslocar ou permanecer, bem como de todos quantos aí têm necessidade de permanecer ou de se deslocar, residentes ou não no local, não se compadece com a instauração da acção de condenação de que esta providência é dependência.

24º Com o objectivo de assegurar o efectivo respeito pela providência a decretar, requer-se ao abrigo do artº 384º, nº 2º, do Código de Proc. Civil, e do artº 829º-A, do Código Civil, a fixação de uma sanção pecuniária compulsória no montante de € 100,00 por cada dia que as requeridas alimentem os pombos no apartamento.

Nestes termos, deve a presente providência ser julgada procedente, por provada e, em consequência:

1. Serem as requeridas condenadas a absterem-se de continuar a alimentarem os pombos no respectivo apartamento; e

2. Ser fixada uma sanção pecuniária compulsória no montante diário de € 100,00 por cada dia que as requeridas alimentem os pombos no apartamento, por forma assegurar a efectividade da providência que vier a ser decretada.

PROVA:

1. M(…), Delegada de saúde do Centro de Saúde de (…), com domicílio profissional (…);

2. M(…), Chefe de Divisão de Higiene e Controlo Sanitário da Câmara Municipal de Lisboa, com domicílio profissional na (…);

3. M(…), divorciada, residente na Rua (…);

4. M(…), viúva, reformada, residente na Rua (…); e

5. M(…), casado, reformado, residente na Rua (…)

Valor: € 14.963,95 (catorze mil, novecentos e sessenta e três euros e noventa e cinco cêntimos).

Junta: 20 documentos, duplicados legais, cópia de segurança e suporte informático.

Protesta-se juntar os Assentos de Nascimento das requeridas.

O Procurador-Adjunto

(Jaime Manuel Nunes Olivença)

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