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INSTITUTOS DE CONCILIAÇÃO NO PROCESSO PENAL
Ana Cristina Matono Afonso  31-03-2005
Arquivamento em caso de dispensa de pena. Suspensão provisória do Processo. Processo Sumaríssimo - Quadro Legal. Questões práticas - Algumas sugestões









INSTITUTOS DE CONCILIAÇÃO NO PROCESSO PENAL






1. Arquivamento em caso de dispensa de pena


2. Suspensão Provisória do Processo


3. Processo Sumaríssimo








- Quadro legal

- Questões práticas

- Algumas sugestões




A primeira questão que se coloca tem a ver com o
enquadramento destes institutos ao nível de dois importantes princípios do
processo penal, a saber, o princípio da legalidade e o princípio da
oportunidade.



Doutrinariamente designados por mecanismos de
diversão e de consenso, os referidos institutos que escolhemos para analisar
enquanto faculdades que o Ministério Público tem como titular da acção penal
serão corolários do princípio da oportunidade, ou antes limitações ao princípio
da legalidade?



O Princípio da legalidade domina o processo penal
português, quer de um ponto de vista legal – artºs 262º, nº 2 e 283º do CPP -
quer de um ponto de vista constitucional - art. 219º da CRP do qual resulta no
seu nº 1 “Ao Ministério Público compete (…) exercer a acção penal orientada pelo princípio da legalidade
(…)”.



No entanto a consagração legal das formas de
conciliação referidas apontam para limitações ao princípio da legalidade no
sentido da oportunidade.



Com efeito, o Ministério Público pode, em determinados casos previstos na lei, decidir-se pelo arquivamento em caso de
dispensa de pena ou decidir-se pela suspensão provisória do processo, mediante
a imposição ao arguido de injunções e regras de conduta, em ambos os casos com
a concordância do juiz de instrução.



No caso da opção do Ministério Público pela forma
especial de processo sumaríssimo, nas situações previstas no art. 392º do CPP,
a lei não refere que o Ministério Público pode requerer, mas sim que requer
ao tribunal que a aplicação da pena ou medida de segurança não privativas de
liberdade tenha lugar em processo sumaríssimo.



No entanto, também neste caso, o Ministério Público
pode ou não optar por tal requerimento, mas antes deduzir acusação, verificados
que sejam os requisitos legais aludidos no art. 283º, nº1 (Acusação sob a forma
comum) ou 391º-A, nº 1 do CPP (Acusação sob a forma especial de processo
abreviado).



Mas esta possibilidade que a lei atribui ao
Ministério Público não constitui um juízo discricionário ou desvinculado da lei
ancorado em qualquer conveniência ou oportunidade individual ou institucional,
antes constitui um juízo a fazer em concreto, verificados que sejam os
respectivos pressupostos legais, e sujeito a um acordo judicial, em qualquer
dos três casos.



Assim sendo, os referidos institutos que escolhemos
para analisar como faculdades que o Ministério Público tem enquanto titular da
acção penal não são encarados como a consagração pura do princípio da
oportunidade, mas antes como limitações do princípio da legalidade, que
permitem ao Ministério Público optar por eles, em alternativa à dedução de
acusação.



Conforme bem explica Pedro Caeiro, em publicação do
Ministério Público de 2002, subordinada ao tema Legalidade versus Oportunidade a
página 56, trata-se de um juízo cujo resultado constitui o Ministério Público
num dever embora um dos sentidos da decisão desemboque num limite ao princípio
da legalidade: o dever de acusar cessa em função da emergência de um dever de arquivar/suspender o processo.



E não existem dúvidas que, embora não aplicados com
muita frequência na prática, por força de uma tradição acusatória que temos, os
referidos institutos têm um reconhecido sucesso. Em caso de dispensa de pena e
de suspensão provisória do processo, o processo crime será oportunamente
arquivado sem que fique registada qualquer condenação no registo criminal do
arguido. E no caso do requerimento para aplicação ao arguido de uma sanção em
processo sumaríssimo, sempre o Ministério Público terá de ponderar a sugestão
de uma sanção não muito excessiva com a qual previsivelmente o arguido venha a concordar,
sem prejuízo de se terem em conta os critérios legais previstos no art. 72º do
C.P. para a fixação da medida da pena.



Assim sendo, e desde que sempre salvaguardados os direitos de assistentes e partes civis, sujeitos processuais que procuraremos
sempre considerar neste trabalho, o recurso aos institutos de conciliação acima
referidos sempre serão uma opção importante para o Ministério Público enquanto
titular da acção penal.



Faremos em seguida um comentário às normas jurídicas que compõem estes três institutos, com indicação de alguma jurisprudência sobre
os mesmos e análise crítica de algumas dessas normas, mormente em face de
algumas dificuldades e casos práticos surgidos no exercício das nossas funções
enquanto Magistrada do Ministério Público num Tribunal de competência
especializada – Tribunal de Pequena Instância Criminal de Lisboa.








Lisboa, Março de 2005



Ana Cristina Matono Afonso



Procuradora Adjunta no Tribunal de Pequena Instância Criminal de Lisboa













1. Arquivamento em caso de dispensa de pena





Resulta do disposto no art. 280º do C.P. inserido no
título II do C. Penal – Do Inquérito – que:



  1. Se o processo for por
    crime relativamente ao qual se encontre expressamente prevista na lei penal a
    possibilidade de dispensa da pena, o Ministério Público, com a concordância do
    juiz de instrução, pode decidir-se pelo arquivamento do processo, se se
    verificarem os pressupostos daquela dispensa.


  2. Se a acusação tiver sido
    deduzida, pode o juiz de instrução, enquanto esta decorrer, arquivar o processo
    com a concordância do Ministério Público e do arguido, se se verificarem os
    pressupostos da dispensa da pena.


  3. A decisão de arquivamento,
    em conformidade com o disposto nos números anteriores, não é susceptível de
    impugnação.



O arquivamento em caso de dispensa de pena
encontra-se ainda previsto no processo sumário, por força do art. 384º do
C.P.P.



A dispensa de pena encontra-se definida no art. 74º
do C.P., concretamente no seu nº 1'Quando o crime for punível com pena de
prisão não superior a 6 meses, ou só com multa não superior a 120 dias, pode o
tribunal declarar o réu culpado, mas não aplicar qualquer pena se:


a) A ilicitude do facto e a culpa do agente forem
diminutas;


b) O dano tiver sido reparado; e


c) À dispensa de pena não se opuserem razões de
prevenção.(…)



O Código Penal prevê ainda as seguintes situações em
que é possível a dispensa da pena:



- na situação prevista no nº 2 do art. 35º do C.P.



- no crime de ofensa à integridade física simples, nas situações do nº 3 do art. 143º, ou
seja, quando tendo havido lesões recíprocas não tiver provado qual dos
contendores agrediu primeiro ou quando o agente tiver unicamente exercido
retorsão sobre o agressor;



- no crime de ofensa à integridade física por negligência, nas situações previstas no nº
3 do art. 148º , ou seja, quando o agente for médico no exercício da sua
profissão e do acto médico não resultar doença ou incapacidade para o trabalho
por mais de 8 dias ou quando da ofensa não resultar doença ou incapacidade para
o trabalho por mais de 3 dias.;



- nos crimes de difamação e injúria, nas situações previstas no art. 186º do C.P.



- no crime de violação da obrigação de alimentos, na situação prevista no nº 3 do art.
250º, ou seja, se a obrigação vier a ser cumprida;



- nos crimes de perigo comum, ou seja, nos casos previstos nos artºs 272º, 273º, 277º ou
280º a 284º, se o agente remover voluntariamente o perigo antes de se ter
verificado dano considerável – vd. art. 286º do C.P.;



- nos crimes contra a segurança das comunicações, p. e p. nos artºs 287º a 291º do C.P.,
por força do nº 3 do art. 294º, que remete para o art. 286º do C.P.;



- nos casos dos crimes de falsidade de depoimento ou declaração, falsidade de testemunho,
perícia, interpretação ou tradução e de suborno
, p. e p. pelos artºs 359º,
360º e 363º, respectivamente , nas situações previstas no art. 364º do C.P.;



- no crime de corrupção passiva para acto ilícito, na situação prevista no nº 3 do art.
372º do C.P., ou seja, se o agente, antes da prática do facto, voluntariamente
repudiar o oferecimento ou a promessa que aceitara, ou restituir a vantagem,
ou, tratando-se de coisa fungível, o seu valor ;



- no crime de corrupção passiva de acto lícito, na situação prevista no nº 3 do art. 372º
do C.P., ou seja, se o agente, antes da prática do facto, voluntariamente
repudiar o oferecimento ou a promessa que aceitara, ou restituir a vantagem,
ou, tratando-se de coisa fungível, o seu valor, e na situação referida na al.
b) do art. 364º , por força do nº 2 do art. 373º do C.P., que remete para o nº
3 do art. 372º e para o disposto na al. b) do artº 364º;



- no crime de corrupção activa, na situação prevista na al. b) do art. 364º do C.P.,
para o qual remete o nº 3 do art. 374º do C.P.



Tal como refere Maia Gonçalves no Código Penal Anotado, 1999, pp. 263 em anotação ao art. 74º “ A dispensa de pena é um
instituto destinado a resolver casos de bagatelas penais, em que se verificam
todos os pressupostos da punibilidade mas em que não se justificaria a
aplicação de qualquer sanção penal, já que tanto não seria exigido pelos fins
das penas.(…)



Em qualquer caso, o poder conferido ao tribunal de
dispensar a pena é um poder dever, um poder vinculado, que o tribunal portanto
aplicará sempre que se verificarem os pressupostos formais e estiverem já
realizados os fins da pena.”



Em sede de inquérito cabe ao Ministério Público
aferir, em face das referidas situações criminais, se se verificam os
pressupostos formais e legais para uma possível dispensa de pena, justificando
que se mostram realizados os fins das penas, e assim decidir do arquivamento do
inquérito, com a prévia concordância do juiz de instrução.



Importa referir que este instituto tem tido na
prática insignificante aplicação (verdadeiramente não conhecemos nenhum caso
concreto, e também pessoalmente nunca o aplicámos até à data, atentas as
mencionadas especificidades do mesmo).



No caso deste instituto, a lei não faz qualquer
referência à concordância do arguido, o que se compreende pelo facto de o
arguido não poder requerer a abertura da instrução relativamente a factos sobre
os quais tenha incidido um despacho de arquivamento – art. 287º, nº 1, al. a)
do C.P.P. “ a contrario”.



Também não é feita qualquer referência ás partes
civis, uma vez que esta é uma das situações de excepção ao princípio da adesão,
consagrado no art. 71º do C.P.P, permitindo-se a realização de pedido cível em
separado, por força do arquivamento do inquérito, nos termos do art. 72º, nº 2,
al. b) do C.P.P., com extracção de certidão do inquérito, a fim de a parte
cível intentar a competente acção, apesar de o inquérito ter sido arquivado.



E quanto ao assistente?



O art. 280º do C.P.P. não faz qualquer referência ao
assistente, no sentido de possibilitar que o mesmo dê a sua concordância com o
arquivamento em caso de dispensa de pena, contrariamente ao que faz em relação
ao arguido, no que toca ao instituto da suspensão provisória do processo – vd.
art. 281º, nº 1, al. a) do C.P.P.



Mas não se revelará esta solução algo injusta em
termos de coerência sistemática, tanto mais que a decisão de arquivamento não é
susceptível de impugnação, nos termos do nº 3 do art. 280º, ficando assim o
assistente com os seus direitos processuais coarctados, a saber, o direito de
requerer a abertura da instrução, nos termos do art. 287º, nº 1, al. b) do
C.P.P. e o direito de recorrer – art. 401º, nº 1, al. b) do C.P.P.?



Afigura-se-nos que sim, pelo que nos parece que
também neste caso o legislador deveria ter consagrado expressamente a
possibilidade de o assistente dar ou não a sua concordância com o arquivamento
do inquérito em caso de dispensa de pena, não ficando essa faculdade reservada
ao Ministério Público ou ao juiz de instrução consoante a fase processual em
questão - inquérito ou instrução – nºs 1 e 2 do art. 280º.



Não o tendo consagrado, parece-nos ser de ponderar
com algumas reservas o recurso a este instituto, no caso em que haja assistente
constituído no decurso do inquérito, precisamente para evitar alguma situação
de menor equidade.



A menos que se considere como defende Maia Gonçalves
in Código Penal Anotado, pp. 563 e anotação a esta disposição legal, que o
assistente tenha a possibilidade de recorrer do despacho de arquivamento, não
se lhe aplicando o nº 3 do art. 280º do C.P.P., o que não é, no entanto o que
resulta da letra do art. 280º, nº 3.



No sentido de uma maior clarificação legal, parece-nos que
deveria resultar expressamente do art. 280º do C.P.P., a possibilidade de
impugnação pelo assistente que discordasse do arquivamento em caso de dispensa
de pena ou então que o assistente também desse a sua concordância com a
aplicação do instituto, o que significaria uma maior unidade sistemática com o
instituto da suspensão provisória do processo que no artº281º, nº1, al. a) tem
como requisito de aplicação a concordância também do assistente.














2. Suspensão Provisória do Processo




Este instituto encontra-se consagrado legalmente
pelos artºs 281º e 282º do C.P.P., que passaremos a seguir a analisar.



Resulta do disposto no art. 281º do C.P.P. que:



  1. Se o crime for punível com pena de prisão não superior a cinco anos ou com sanção
    diferente da prisão, pode o Ministério Público decidir-se, com a concordância o
    juiz de instrução, pela suspensão do processo, mediante a imposição ao arguido
    de injunções e regras de conduta, se se verificarem os seguintes pressupostos:


    a)Concordância do arguido e do assistente;


    b) Ausência de antecedentes criminais do arguido;


    c) Não haver lugar a medida de segurança de internamento;


    d) Carácter diminuto da culpa; e


    e) Ser de prever que o cumprimento das injunções e regras de conduta responda
    suficientemente às exigências de prevenção que no caso se façam sentir.




  2. São oponíveis ao arguido as seguintes injunções e regras de conduta:



  3. a) Indemnizar o lesado;


    b) Dar ao lesado satisfação moral adequada;


    c) Entregar ao Estado ou instituições privadas de solidariedade social certa quantia;


    d) Não exercer determinadas profissões;


    e) Não frequentar certos meios ou lugares;


    f) Não residir em certos lugares ou regiões;


    g) Não acompanhar alojar ou receber certas pessoas;


    h) Não ter em seu poder determinados objectos capazes de facilitar a prática de outro
    crime;


    i) Qualquer outro comportamento especialmente exigido pelo caso.




  4. As injunções e regras de conduta impostas não podem em caso algum
    representar para o condenado obrigações cujo cumprimento não seja
    razoavelmente de lhe exigir.

  5. Para apoio e vigilância do cumprimento das injunções e regras de
    conduta, podem o juiz de instrução e o Ministério Público, consoante os
    casos, recorrer aos serviços de reinserção social, a órgão de polícia
    criminal e às autoridades administrativas.

  6. A decisão de suspensão, em conformidade com o nº 1, não é
    susceptível de impugnação.



Dispõe, por sua vez, o art. 282º do C.P.P.



  1. A suspensão do processo pode ir até dois anos.

  2. A prescrição não corre no decurso do prazo de suspensão do
    processo.

  3. Se o arguido cumprir as injunções e regras de conduta, o
    Ministério Público arquiva o processo, não podendo ser reaberto. Se as não
    cumprir, o processo segue e as prestações feitas, não podem ser repetidas.



A suspensão provisória do processo encontra-se ainda
prevista no processo sumário tal como resulta do art. 384º do C.P.P.



Al. a) do nº 1 do art. 281º



Este é o instituto que mais claramente se aproxima
do princípio da oportunidade ao fazer intervir para a sua aplicação o juiz de
instrução, o Ministério Público, o arguido e o assistente.



Só com a concordância de todos estes sujeitos
processuais é possível suspender provisoriamente o processo, constituindo um
poder discricionário de cada um deles.



A este respeito, importa desde já referir que
jurisprudencialmente se tem entendido que o despacho do juiz de instrução
determinante da não concordância com o despacho do Ministério Público que,
findo o inquérito, determinou a suspensão provisória do processo, é
irrecorrível, por se entender que tal despacho não é uma decisão final e é
proferido no âmbito dos poderes discricionários do juiz de instrução.



Neste sentido, referimos os Acórdãos da RL no
Processo nº 30355, de 1 de Junho de 1999; no Processo nº 8015, de 26 de Junho
de 1990; no Processo nº 76845, de 21 de Dezembro de 1999, todos publicados e
podendo ser consultados no site da DGSI (www.dgsi.pt/),
ou ainda os Acórdãos da RL no Processo nº 5841/01 da 3ª Secção, de 10 de
Outubro de 2001; no Processo nº 5650/2003 da 5ª Secção, de 15 de Julho de 2003, publicados e podendo
ser consultados no site da PGD de Lisboa (www.pgdlisboa.pt/).



Importa ainda esclarecer que a lei só refere a
concordância do assistente, pelo que, se no momento em que o Ministério Público
decide a suspensão provisória do processo não existir assistente constituído
nos autos, não há que notificar o ofendido para que ele, querendo, se constitua
assistente. – ver neste sentido o Acórdão da RL no Processo nº 2553, de 19 de
Maio de 1996 publicado no site da DGSI (www.dgsi.pt/).



Finalmente, e em relação à concordância do arguido impõe-se que o arguido dê o seu
consentimento quer à suspensão provisória do processo quer às injunções e
regras de condutas que o MP entender ajustadas ao caso concreto, tendo de ter
conhecimento prévio das mesmas.



Não basta, pois, uma concordância do arguido, prestada em abstracto, relativamente
à suspensão provisória do processo – ver neste sentido o Acórdão da RL nº 18915, de 28
de Abril de 1998 publicado no site da DGSI (www.dgsi.pt/).



Al. b) do nº 1 do art. 281º



O requisito de ausência de antecedentes criminais do
arguido, constitui um impedimento legal que, muitas vezes, impossibilita a
aplicação da suspensão provisória do processo.



Este requisito, porém, não fará muito sentido, se considerarmos
que o facto de o arguido não ser primário é impeditivo de uma suspensão
provisória do processo, perante a situação, por exemplo, de o crime que motivou
o antecedente criminal do arguido ter uma natureza diferente, ou tutelar um bem
jurídico diferente, daquele crime em investigação no inquérito em que se
pretende aplicar a suspensão provisória do processo.



Por exemplo, por que motivo não se pode suspender o
processo no inquérito em que se investiga um crime de ofensa à integridade
física, quando o arguido tem averbado no seu registo criminal um crime de
condução sem legal habilitação ou um crime de desobediência?



Numa situação como a descrita, não nos parece que
ocorresse qualquer alarme social, que terceiros não fossem ressarcidos ou que
as exigências de prevenção não se fizessem sentir no caso concreto, pelo facto
de o processo ser suspenso provisoriamente, desde que verificados os demais
requisitos e que determinadas injunções e regras de conduta adequadas ao caso
concreto fossem aplicadas.



Al c) do nº 1 do art. 281º do CPP



Só é possível suspender provisoriamente o processo
se não houver lugar a aplicação de medida de segurança de internamento, tal
como a mesma é definida nos artºs 40º e 91º e ss do C.P.



Al. d) do nº 1 do art. 281º do CPP



Quanto ao requisito do carácter diminuto da culpa
encontramos uma referência jurisprudencial sobre o mesmo no Acórdão da RL no
Processo nº 4713 , de 18 de Outubro de 1995 publicado e podendo ser consultado
no site da DGSI (www.dgsi.pt/), com o
seguinte sumário:



'I. É ao juiz de instrução criminal que, no uso da
sua competência funcional, cabe verificar e declarar se estão reunidos os
pressupostos de facto e de direito da suspensão provisória do processo,
podendo, para o efeito socorrer-se de elementos fácticos não constantes do
despacho do Ministério Público, propondo aquela medida.


II. Não é de autorizar tal suspensão se o arguido,
visto o condicionalismo indicado nos autos, concorreu para acidente de viação
de que adveio a morte de terceiro, não sendo diminuta a sua culpa.'



Veja-se ainda o Acórdão da RL de 26 de Abril de
1989, in CJ Ano XIV, Tomo 2, pág. 170.



Al. e) do nº 1 e nº2 do art. 281º do CPP



Finalmente, o último requisito previsto, e
cumulativamente com os demais, é que seja de prever que o cumprimento das
injunções e regras de conduta, responda suficientemente às exigências de
prevenção que no caso se façam sentir.



As injunções e regras de conduta oponíveis ao
arguido estão claramente elencadas nas alíneas a) a h) do nº 2 do art. 281º do
CPP, sendo de chamar a atenção, para a al. h) onde se prevê a imposição de
qualquer comportamento especialmente exigido pelo caso.



Esta situação permite que o Ministério Público
aplique ao arguido qualquer outra injunção ou regra de conduta, além das
taxativamente previstas nas alíneas anteriores, que seja especialmente exigida
no caso concreto, desde que não representem para o arguido obrigações cujo
cumprimento não seja razoavelmente de lhe exigir, nos termos do nº 3 do art.
281º do CPP.



A respeito da al. h) do nº 2 importa referir que a
jurisprudência tem entendido que não é válida para efeito da suspensão
provisória do processo a injunção de não praticar quaisquer ilícitos de
natureza penal no decurso de um certo prazo, pois se estaria a exigir ao
arguido um comportamento que se exige para todo o cidadão, não um comportamento
especialmente exigido no caso concreto.



Citamos o sumário do Ac. da RL no Processo nº 32553,
de 11 de Junho de 1997 publicado na CJ Ano XXII, tomo 3, pág. 155.



'I. A “injunção” consiste na imposição, ao arguido, de um 'facere' ou
'non facere', ou seja de uma conduta activa, ou passiva que condicione a sua normal actividade.


II. Não constitui, porém, injunção ou imposição de regra
de conduta, a ordenação ao arguido de um comportamento que era obrigado a
adoptar, ainda que não houvesse essa infracção ou obrigação, como seria a de
não cometer qualquer ilícito penal, durante o decurso de certo prazo.'



Neste sentido referimos ainda dois outros Acórdãos da RL no Processo nº 7595,
de 7 de Janeiro de 1997 e no Processo nº 79425, de 21 de Abril de 1998, publicados e
podendo ser consultados no site da DGSI (www.dgsi.pt/).



Artigo 282º do C.P.P.




  1. A suspensão do processo pode ir até dois anos.
  2. A prescrição não corre no decurso do prazo de suspensão do processo.
  3. Se o arguido cumprir as injunções e regras de conduta, o
    Ministério Público arquiva o processo, não podendo ser reaberto. Se as não
    cumprir, o processo segue e as prestações feitas, não podem ser repetidas.


Nº 2 do art. 282º



Uma primeira questão se coloca: A suspensão provisória do processo constitui uma das causas de
suspensão da prescrição ou de interrupção da prescrição do procedimento criminal?



Cremos tratar-se não de uma causa de interrupção do
procedimento, uma vez que tais causas se encontram taxativamente determinadas
no art. 121º do C.P., mas sim de um causa de suspensão da prescrição que, não
se encontrando descriminada nas várias alíneas do nº 1 do art. 120º do C.P.,
cabe nos outros casos especialmente previstos na lei, tal como resulta desta
disposição legal.



Um desses casos de suspensão é precisamente o prazo
de suspensão provisória do processo, previsto no nº 2 do art. 282º do C.P.P.



Agora uma segunda questão: Desde quando se começa a contar tal prazo de suspensão?



Referindo a lei que a prescrição não corre no
decurso da suspensão do processo cremos que o início de tal suspensão deverá
contar-se a partir da notificação ao arguido dessa suspensão, ou seja do
despacho do Ministério Público que determinou a suspensão e do despacho
concordante do juiz de instrução.



É o que parece resultar de uma interpretação
sistemática com outra das causas de suspensão do procedimento criminal prevista
na al. b) do nº 1 do art. 120º do C.P. que determina que a prescrição do
procedimento se suspende durante o tempo em que o procedimento criminal estiver
pendente a partir da notificação da acusação ou, não tendo esta sido deduzida,
a partir da notificação da decisão instrutória que pronunciar o arguido ou do
requerimento para aplicação de sanção em processo sumaríssimo.



Quanto ao termo da suspensão a mesma ocorrerá quando
for determinado por despacho do Ministério Público o prosseguimento do processo
por falta de cumprimento das injunções e regras de conduta pelo arguido.



Nº 3 do art. 282º



Importa ainda considerar que nos termos do nº 3 do
art. 282º se o arguido cumprir as injunções e regras de conduta, decorrido o
período de suspensão provisória do processo, o Ministério Público determina o
arquivamento dos autos de inquérito, pelo que, após tal arquivamento, o
ofendido ou queixoso não pode requerer a sua constituição como assistente ou a
reabertura do processo uma vez que o mesmo não tem legitimidade para requerer a
abertura da instrução – art. 287º, nº 1, al. b) do C.P.P.



Nestes sentido referimos o Acórdão da RL no Processo
nº 9347/02 da 3ª Secção, de 22 de Janeiro de 2003, publicado e podendo ser
consultado no site da PGD de Lisboa (www.pgdlisboa.pt).













3. Processo Sumaríssimo




O processo Sumaríssimo é uma das formas de processo
especial prevista no Código do Processo Penal a par do Processo Sumário e do
Processo Abreviado e encontra-se previsto nos art. 392º e ss do C.P.P.



Artigo 392º do C.P.P. (Quando tem lugar)




  1. Em caso de crime punível com pena de prisão não superior a três anos ou só com pena de
    multa, o Ministério Público, quando entender que ao caso deve ser
    concretamente aplicada pena ou medida de segurança não privativas de
    liberdade, requer ao tribunal que a aplicação tenha lugar em processo
    sumaríssimo.
  2. Se o procedimento criminal depender de acusação particular, o requerimento previsto no
    número anterior depende da concordância do assistente.


1) Uma primeira questão se coloca em relação a esta forma de Processo Especial.

Será que no processo sumaríssimo é obrigatória a realização de inquérito?



Citamos parte do Acórdão do Tribunal da Relação do
Porto no Processo nº 0411893, de 19 de Maio de 2004, publicado e podendo ser consultado no site da DGSI
(www.dgsi.pt/).



'Como se disse: o inquérito é integrado por diligências que visam a recolha de elementos para a
decisão sobre a acusação. Tem natureza diferente, pois deve, além de enunciar
sumariamente as razões pelas quais o Ministério Público entende que ao caso não
deve ser concretamente aplicada a pena de prisão, conter a indicação precisa
das sanções cuja aplicação concretamente propõe.

Além disso, o processo sumaríssimo é uma forma de processo ainda mais simplificada que o
processo abreviado, havendo neste acusação, possibilidade de instrução e
julgamento, o que não acontece naquele. E, coerentemente, o processo
sumaríssimo aplica-se aos casos menos graves que o abreviado: este pode usar-se
por crimes puníveis com pena de prisão até 5 anos e até com pena superior,
desde que se faça uso do art. 16º, nº 3; do processo sumaríssimo só pode
lançar-se mão em caso de crime punível com pena de prisão não superior a 3 anos
ou só com pena de multa.

Ora, no processo abreviado pode não haver inquérito, como se vê do art. 391º-A nº 1(…)

Se no processo abreviado se pode prescindir do inquérito, por maioria de razão isso acontecerá
no processo sumaríssimo.'



Concluímos que, sendo esta uma forma de processo especial não é exigida legalmente a
realização de inquérito, aliás, tal como acontece nas outras formas de processo especial,
tais como o processo sumário (art. 381º do CPP) e o processo abreviado (art. 391º-A do CPP.)



E se o M.P. pode optar pela não realização de inquérito no caso do processo abreviado,
por maioria de razão o poderá fazer no caso do processo sumaríssimo.



No entanto, na prática e em regra, o Ministério Público
opta pela realização de inquérito, e só encerrado o mesmo, procede à elaboração
do requerimento a que alude o nº 1 do art. 392º do CPP. Por duas ordens de
razão:



a) Por um lado, porque só com a realização de
inquérito, ainda que sumário, se poderão obter os elementos necessários ao
apuramento da situação económica e financeira do arguido que depois permitem
melhor fixar a medida concreta da pena de multa a propor no requerimento (art.
47º, nºs 1 e 2 do C.P.) ou se poderá apurar da existência ou não de
antecedentes criminais do arguido de modo a melhor decidir sobre a aplicação do
processo sumaríssimo.



b) Por outro, porque caso contrário poderiam ocorrer
situações de julgamento sob a forma comum com intervenção do Tribunal Singular
sem o mesmo ser precedido de inquérito, a saber:



-quando o requerimento do M.P. seja rejeitado nos
termos do art. 395º, nº 1 do C.P.P., por força do nº 3 da referida disposição
legal;



-quando o arguido se opuser ao requerimento (art.
398º do C.P.P.) ou não seja possível notificá-lo para exercer esse direito por
desconhecimento do seu paradeiro,



- quando legalmente, só é possível a realização de
julgamento sem inquérito, bastando o auto de notícia, no caso da forma especial
de processo Sumário (art. 381º do C.P.P.) ou no caso da forma de processo
especial Abreviado, por força do art. 391º- A do C.P.P., pelo que um julgamento
sob a forma de Processo Comum sem inquérito implicaria uma violação dos
direitos de defesa do arguido.



Sobre a noção de forma comum falaremos mais à frente a
propósito do art. 398º do C.P.P.



2) Sobre o nº 2 do art. 392º do C.P.P. importa fazer
a mesma consideração que fizemos a propósito do arquivamento em caso de
dispensa da pena, em relação ao facto de a lei não consagrar a necessidade de
concordância da assistente com o requerimento do M.P., não só nos crimes
particulares mas também nos crimes públicos ou semi-públicos.



Não se revelará também esta solução algo injusta em
termos de coerência sistemática, tanto mais que o despacho judicial que
ratificar o requerimento do M.P., obtida a concordância do arguido, nos termos
do art. 396º do C.P.P., transita imediatamente em julgado, ficando assim o
assistente com os seus direitos processuais coarctados, a saber, o direito de
requerer a abertura da instrução, nos termos do art. 287º, nº 1, al. b) do
C.P.P. e o direito de recorrer – art. 401º, nº 1, al. b) do C.P.P.?



Afigura-se-nos que sim, pelo que nos parece que
também neste caso o legislador deveria ter consagrado a possibilidade de o
assistente nos crimes públicos e semi-públicos dar ou não a sua concordância
com o requerimento do M.P., e não apenas nos casos dos crimes particulares.



Não o tendo consagrado, parece-nos ser de ponderar
com algumas reservas o recurso a este instituto, no caso em que haja assistente
constituído no decurso do inquérito, precisamente para evitar alguma situação
de menor equidade.



3) Finalmente, propósito do Processo Sumaríssimo talvez se pudessem fazer uma
breve sugestão que mais iriam enriquecer o recurso a esta forma de processo especial,
sempre em articulação com as demais formas de Processos especiais prevista no
Código de Processo Penal.



Uma seria a de ser permitir a aplicação do art. 16º, nº 3 do C.P.P, tal como o
previsto no art. 381º, nº 2 do C.P.P. a propósito do Processo Sumário e o
previsto no art. 391º-A, nº 2 do C.P.P.



Com efeito, podemos referir a título de exemplo, uma situação em que ao arguido
seja imputado em concurso um crime de condução sem legal habilitação, p. e p. com
pena de prisão até 2 anos ou multa até 240 dias; um crime de condução em estado de
embriaguez , p. e p. com pena de prisão até 1 ano ou multa até 120 dias e um crime de
desobediência, p. e p. com pena de prisão até 1 ano ou multa até 120 dias, em que
o limite máximo das penas, em abstracto é de 4 anos de prisão.



No entanto, sendo o arguido primário e admitindo os factos, por exemplo, porque razão não se recorrer à
forma de Processo Sumaríssimo, requerendo o M.P., a aplicação de uma pena única
de multa ao arguido, após cúmulo com as penas parcelares concretas, desde que
exista concordância do Juiz e do arguido?



Seria uma forma de dar maior rentabilidade à aplicação do processo Sumaríssimo como forma de conciliação.



Artigo 393º do C.P.P.



Não é permitida, em processo sumaríssimo, a intervenção de partes civis.



Sobre este dispositivo importa tecer uma consideração
importante.



Será que no caso de o lesado ter deduzido ou tiver
manifestado intenção de deduzir pedido cível no âmbito do inquérito, o
Ministério Público não pode recorrer ao requerimento em processo sumaríssimo?



Não é essa a intenção legal nem o que resulta da letra da lei.



Tal como resulta do disposto no art. 72º, al. h) do C.P.P., uma das excepções ao
princípio da adesão consagrado no art. 71º do C.P.P. é precisamente o recurso ao
processo sumaríssimo, pelo que em caso de formulação de tal pedido, o mesmo deverá
ser processado autonomamente na jurisdição cível, depois de decidida esta questão
pelo M.P. não sendo fundamento para obstar à aplicação desta forma de processo especial.



Sendo o processo sumaríssimo uma das formas de
conciliação em que Ministério Público, arguido e Tribunal (e assistente se o
procedimento criminal depender de acusação particular) concordam com a
aplicação de uma medida concreta de pena, não faria sentido que a tal acordo
obstasse uma parte civil que sempre verá salvaguardado o seu direito na
competente jurisdição cível.



Artigo 394º do C.P.P.




  1. O requerimento do Ministério Público é escrito e contem as indicações tendentes à
    identificação do arguido, a descrição dos factos imputados e a menção das
    disposições legais violadas, a prova existente e o enunciado do sumário
    das razões pelas quais entende que ao caso não deve ser concretamente
    aplicada pena de prisão.
  2. O requerimento termina com a indicação precisa das sanções cuja aplicação o Ministério Público
    concretamente propõe.


Artigo 395º do C.P.P.




  1. O juiz rejeita o requerimento e reenvia para a forma comum:


    a) Quando for legalmente inadmissível o procedimento;

    b) Quando o requerimento for manifestamente infundado, nos termos do
    disposto no art. 311º, nº 3;

    c) Quando discordar da sanção proposta, sem prejuízo do disposto no número seguinte.




  2. No caso previsto na alínea c) do número anterior, o juiz pode fixar sanção diferente, na sua
    espécie ou medida, da proposta pelo Ministério Público, com a concordância
    deste.
  3. Se o juiz reenviar o processo para a forma comum, o requerimento do Ministério Público equivale
    à acusação.
  4. Do despacho que se refere o nº 1 não há recurso.


Será irrecorrível todo o despacho judicial que determinar o reenvio dos autos para a forma comum?



Só assim será nos casos das situações previstas no nº 1 do art. 395º.



Por exemplo, referimos uma situação prática que tivemos em que o juiz rejeitou o requerimento do
Ministério Público pelo facto de ter sido requerida a aplicação de multa pelo crime e de coima pela
contra-ordenação, por esta última situação ser legalmente inadmissível, nos
termos do nº 1, al. a) do art. 395º, tendo em conta que tal forma de processo
só se aplica em caso de crime punível com pena de prisão não superior a três
anos ou só com pena de multa e o Ministério Público entender que ao caso deve
ser concretamente aplicada pena ou medida de segurança não privativas de
liberdade.



Neste caso, ainda que se discuta a possibilidade de
recurso a esta forma especial de processo também no caso de existir uma
contra-ordenação, constando do requerimento do M.P. a referência a uma coima,
utilizando um argumento de maioria de razão em relação à multa criminal, se o
requerimento for rejeitado e o processo remetido para a forma comum, com base
na al. a) do nº 1 do art. 395º, desse despacho não há recurso.



Também deveria ser consagrada expressamente no art.
392º, nº 1 do C.P.P. a possibilidade de recurso a esta forma especial de
processo no caso de existir além do crime uma contra-ordenação, constando do
requerimento do M.P. a referência a uma coima.



Se porém, não estiver em causa qualquer da situações previstas no nº 1 do art. 395º do C.P.P.,
é de admitir o recurso interposto do despacho que, em processo sumaríssimo, ordenou a remessa do processo para a
forma comum, não sendo aplicável o disposto no nº 4 daquele preceito.



Neste sentido veja-se a Reclamação decidida no Processo n.º 10171/2003, da 9ª Secção da Relação
de Lisboa, de 05.01.04., publicada em sumário e podendo ser consultada no site da DGSI (
www.dgsi.pt/).



Importa referir que o juiz actualmente não pode rejeitar o requerimento do M. P. por
manifestamente infundado no caso de considerar que do inquérito ou do processo não existem
indícios suficientes da prática do ilícito (art. 311º, nº 3 do C.P.P.).



Mas como refere o Prof. Germano Marques da Silva, in Curso de Processo Penal , 2ª Edição,
III, pág. 28, no caso da forma de processo sumaríssimo, se entender que existe essa falta de
indícios sempre pode rejeitar o requerimento com fundamento na al. c) do nº 1 do art. 395º, ou seja,
discordando da sanção proposta e não recorrendo à faculdade que o nº 2 deste
artigo lhe confere.



Sendo o processo sumaríssimo uma forma de conciliação entre arguido, M. P. e juiz, e uma vez que o
despacho que aplicar a sanção proposta tem o valor de uma sentença, o juiz tem de concordar
integralmente com a sanção proposta no pressuposto que concorda com a
existência de indícios da prática do crime ou de quem é o seu autor, sob pena
de estar apenas a sancionar um requerimento com o qual não concordasse apesar
de o arguido o poder aceitar.



Esta solução permite, no entanto, que o requerimento
seja rejeitado por o juiz discordar da sanção proposta pelo M.P., sem que o
juiz tenha obrigatoriamente de propor nova sanção, uma vez que o nº 2 do art.
395º não impõe essa obrigatoriedade, sendo que tal despacho não é recorrível,
assim se inviabilizando o processo sumaríssimo.



Sobre esta questão cremos que em sede de alteração legislativa, seria mais curial
que a lei determinasse que, caso o juiz não concordasse com a sanção proposta pelo M.P.
deveria ter de propor a que entendesse ser a mais adequada, a qual poderia, por acordo de todos,
vir a ser a aplicada.



No caso de o juiz entender que do processo não existem indícios suficientes, ou crime, ou não
resulta ser o arguido o autor dos factos/crimes, sugere-se a criação de um número novo que previsse tal
situação apenas com rejeição do requerimento e a recorribilidade do despacho.



Artigo 396º do C.P.P.




  1. O juiz, se não rejeitar o requerimento nos termos do número anterior:



    a) Nomeia defensor ao arguido que não tenha advogado constituído ou defensor nomeado; e


    b) Ordena a notificação ao arguido do requerimento do Ministério Público e, sendo caso disso,
    do despacho a que se refere o nº 2 do artigo anterior, para, querendo, se opor no prazo de
    quinze dias.




  2. A notificação a que se refere o número anterior é feita ou contacto pessoal, nos termos do art.
    113º, nº 1, alínea a) e, deve conter obrigatoriamente:


    a) A informação do direito de o arguido se opor à sanção e da forma de o fazer;


    b) A indicação do prazo para a oposição e do seu termo final;


    c) O esclarecimento dos efeitos da oposição e da não oposição a que se refere o artigo seguinte.




  3. O requerimento é igualmente notificado ao defensor.
  4. A oposição pode ser deduzida por simples declaração.



Artigo 397º do C.P.P. (Decisão)




  1. Quando o arguido se não opuser ao requerimento, o juiz, por despacho, procede à aplicação da
    sanção, acrescentando condenação em custas, sendo a taxa de justiça
    reduzida a um terço.
  2. O despacho a que se refere o número anterior vale como sentença condenatória e transita
    imediatamente em julgado.
  3. É nulo o despacho que aplique pena diferente da proposta ou fixada nos termos do disposto nos
    artºs 394º, nº 2 e 395º, nº 2.


A propósito do nº 2 desta disposição legal importa referir que o despacho que aplique a sanção
proposta pelo Ministério Público vale como sentença e transita imediatamente em julgado, não havendo
recurso do mesmo, uma vez que já houve concordância do arguido com a sanção proposta, em virtude
de uma prévia notificação ao mesmo por contacto pessoal.

A especial exigência da notificação por contacto pessoal a que alude nº 2 do art. 397º do C.P.P.
vale como pressuposto para que o despacho judicial referido no nº 1 do art. 397º e que tem o valor de sentença
transite de imediato em julgado.



Artigo 398º do C.P.P. (Prosseguimento do processo)



Se o arguido deduzir oposição, o juiz ordena o reenvio do processo para a forma comum,
equivalendo à acusação o requerimento do Ministério Público formulado nos termos
do art. 394º.



Sobre esta disposição legal importa referir que caso o arguido se oponha ao requerimento
do Ministério Público, deve o juiz remeter os autos para a forma comum, valendo o requerimento
do Ministério Público como acusação.



Esta acusação deve ser notificada aos interessados pelo serviços do M.P. onde foi elaborado
o requerimento, nos termos do art. 283º, nº 5 do CPP., de modo a poderem aqueles com legitimidade
para tal requererem a abertura da instrução.



Neste sentido vejam-se os Acórdãos da Relação de Lisboa no Processo n.º 28435, de 25.06.02, no
Processo 20075, de 18.03.03 e no Processo 3516/2003, da 3ª Secção, publicados e podendo ser consultados
no site da DGSI (www.dgsi.pt/).



Citamos ainda o Ac. R. Guimarães de 06.01.03, in CJ XXVII, tomo I, pp. 299:



“ 1. Deduzindo o arguido oposição ao requerimento acusatório do Ministério Público em processo
sumaríssimo, deve o juiz reenviar os autos para processo comum, remetendo-os para o efeito ao
Ministério Público, para que este proceda à notificação da acusação ao arguido.


2. É que, se os enviasse directamente para julgamento, o arguido, apesar de não concordar com o
requerimento acusatório em processo sumaríssimo, tinha obrigatoriamente que sujeitar-se a um julgamento em
processo comum sem lhe dar a possibilidade de requerer a instrução o que representava a eliminação
de uma garantia de defesa.”



Tendo o Ministério Público tramitado o processo como
processo sumaríssimo, a impossibilidade de notificação ao arguido da sanção
proposta nos termos do art. 396º, nº1, al. b) por desconhecimento do seu
paradeiro, inviabiliza que o processo prossiga naquela forma especial, devendo
proceder-se também neste caso ao reenvio para a forma comum, sob pena de o processo
se arrastar eternamente na forma sumaríssima.



Neste sentido ver o Ac. R.L., de 11.10.01, in CJ XXVI, tomo 4, pp. 143. ou o Ac. R.
Guimarães de 6 de Setembro de 2004, publicado e podendo ser consultado no site
da DGSI. (www.dgsi.pt/).



Esta situação também deveria estar consagrada expressamente no art. 398º do C.P.P..



Aqui colocamos uma questão que de algum modo tem a ver com a noção de forma comum, tal
como ela é frequentemente referenciada no nosso Código do Processo Penal:



No caso de reenvio dos autos para a forma comum, nos
termos do art. 395º, nº 1 ou do art. 398º do C.P.P, os autos podem seguir a
forma especial de Processo Abreviado, desde que observados os requisitos do
art. 391º-A, nº 1 do C.P.P., ou necessariamente têm de prosseguir para
julgamento em Processo Comum, com intervenção de Tribunal Singular, com base no
requerimento do M.P., que entretanto se converteu em acusação?



A referência à forma comum surge ainda no corpo do art. 390º do C.P.P.



Sempre que se verificar:

a)(…)

b)(…)

o tribunal, por despacho irrecorrível, remete os autos ao Ministério Público para tramitação
sobre outra forma processual.



Anteriormente à alteração deste normativo (artº 390º) pela Lei n.º 59/98, de 25 de
Agosto, dispunha-se que o tribunal decidia por despacho irrecorrível, a
tramitação do processo sob forma comum.



Como refere Maia Gonçalves em Código de Processo Penal, 1999, pp. 704 em anotação ao art. 390º,
houve uma substituição da forma comum por outra forma processual, em virtude de a
supramencionada Lei ter introduzido uma nova forma de processo - o processo abreviado.



Ocorre uma diferença entre o conceito de forma comum e o de outra forma processual, sendo
esta última mais abrangente, podendo abranger as seguintes situações:



1 - inquérito com acusação em processo comum, com intervenção do tribunal singular;

2 - acusação sob a forma especial de processo abreviado;

3 - acusação sob a forma especial de processo abreviado face ao auto de notícia.


O actual art. 398º do CPP cujo texto foi introduzido pela Lei n.º 59/98, de 25 de Agosto,
e corresponde ao nº 2 do art. 397º da versão originária, faz referência ao reenvio do processo
para a forma comum e não a outra forma processual, parecendo não admitir assim, contrariamente ao
art. 390º, a acusação sob a forma de processo abreviado.



No entanto, será de questionar por que motivo não é
possível que o requerimento do M.P. se converta em acusação sob a forma de
processo abreviado desde que respeitado o prazo de 90 dias e demais requisitos
legais consagrados no nº 1 do art. 391º-A do C.P.P.



Sugerimos então que o conceito de forma comum fosse também no art. 398º substituído por
outra forma processual de modo a que o requerimento do M.P. se pudesse converter em acusação
em processo comum com intervenção do tribunal singular ou em acusação em processo abreviado, se ainda
estivesse no prazo de 90 dias sobre a data dos factos quando o processo volta ao M.P. a fim e proceder
às notificações para efeitos de requerimento para abertura da instrução – art. 287º do CPP – ou de
requerimento para debate instrutório – art. 391º-C do CPP.




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