Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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31-01-2005   Actividades da PGDL
FENÓMENOS DE CRIMINALIDADE NO DISTRITO JUDICIAL DE LISBOA.
Breve análise referente à criminalidade: fiscal; praticada por agentes de autoridade; praticada contra agentes de autoridade; contra a paz e humanidade; praticada no exercício de funções públicas.
MEMORANDO N.º 5/005

CRIMINALIDADE NO DISTRITO JUDICIAL DE LISBOA
(BREVE ANÁLISE REFERENTE À : FISCAL; PRATICADA POR AGENTES DE AUTORIDADE; PRATICADA CONTRA AGENTES DE AUTORIDADE; CONTRA A PAZ E HUMANIDADE; PRATICADA NO EXERCÍCIO DE FUNÇÕES PÚBLICAS)

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CONCLUSÕES



Dando execução a despacho de Sua Excelência o Conselheiro Procurador-Geral da República, datado de 8 de Março de 2002, publicado no Diário da República n.º79, de 4 de Abril de 2002, II série (divulgado também, pelo Distrito Judicial de Lisboa, pela Circular n.º 9 - DL de 13 de Março de 2002 - na PGR n.º 6/2002 de 11 de Março de 2002 -), o Procurador-Geral Distrital de Lisboa exarou outro (despacho), datado de 16 de Dezembro de 2002 (divulgado pelo Distrito Judicial de Lisboa, pela Circular n.º 12 - DL de 17 de Dezembro de 2002), pelo qual estabeleceu sistema de registo de inquéritos que têm por objecto crimes de determinada natureza.

Esse registo, com específico método (alterável se o sistema informático entretanto o possibilitasse), respeitante a cinco tipos de infracções (fiscais, praticadas por agentes de autoridade, em que é ofendido agente de autoridade, crimes contra a paz e humanidade, crimes cometidos no exercício de funções públicas) possibilitou a recolha e transmissão dos respectivos dados, em cada círculo judicial, para agora, com eles tratados na PGD, se proceder à presente breve análise.

A inexistência/deficiência de sistema informático adequado, na quase totalidade dos círculos judiciais, faz/fez persistir sistema de registo mais moroso e susceptível de mais facilmente gerar erros, no que concerne a esta concreta criminalidade (como a toda outra de qualquer natureza), tudo a contribuir para que se não atinjam melhores níveis de qualidade e celeridade na prestação judiciária.

Na verdade, com sistema informático bem implementado, seria possível (por desejável e útil), fazer avaliações, nomeadamente da natureza da criminalidade (esta agora objecto de breve análise, como qualquer outra), definindo-se estratégias eficazes ao seu combate, para, pelo menos, a conter em níveis razoáveis.

A inexistência de sistema informático capaz é uma deficiência grave na estrutura judiciária, sem dúvida a carecer da adequada intervenção, certo sendo que teria bem maior e melhor impacto que muitas outras medidas que se referenciam como reformadoras da Justiça.

Esta breve análise vai cingir-se mais aos números, que sempre são bons indicadores objectivos, evitando-se partir deles para expressar outras conclusões, nomeadamente de natureza valorativa, que seriam possíveis, se disponibilizados estivessem outros dados, possibilitantes de comparações por referência. Apesar do mencionado, ousar-se-á extrair algumas, no final.

Para se ter ideia relativa da incidência territorial desta criminalidade, agora em análise, é interessante referir o valor percentual aproximado que em cada círculo judicial, representa o número de inquéritos iniciados por ano, comparativamente com todo o Distrito Judicial de Lisboa no mesmo período.

No Círculo Judicial de Almada iniciam-se anualmente cerca de 9% dos inquéritos começados no Distrito Judicial de Lisboa; no de Angra do Heroísmo, 2%; no do Barreiro, 5%; no das Caldas da Rainha, 3%; no de Cascais, 7%; no do Funchal, 6%; no de Lisboa, 39%; no de Loures, 7%; no de Oeiras, 4%; no de Ponta Delgada, 3%; no de Sintra, 8%; no de Torres Vedras, 3%; no de Vila Franca de Xira, 4%.

Deste documento ficam a fazer parte integrante seis quadros, assim descriminados:

QUADRO I - Constituído por duas folhas, estruturado em 13 colunas verticais e que consente apreender, relativamente a cada círculo judicial, os números de inquéritos iniciados, respeitantes a cada um dos referidos tipos de infracção (em 2003 e 2004), número de findos (por acusação, arquivamento ou outro motivo) em cada um desses referidos anos e ainda os pendentes em 31.12.004 relativamente ao total e aos inquéritos dos anos de 2003 e 2004.

QUADRO II - Este refere-se aos crimes fiscais, evidenciando também, em cada círculo judicial, os iniciados (em 2003 e 2004), os findos de cada um desses anos e natureza da decisão (acusação, arquivamento, outro motivo) e os pendentes (no total e relativamente a cada um dos anos).

QUADRO III - Respeita aos crimes praticados por agentes de autoridade, evidenciando iguais factores aos referidos relativamente ao QUADRO II.

QUADRO IV - Respeitando a crimes em que é ofendido agente de autoridade, tem igual estrutura aos dois anteriores (II e III).

QUADRO V - Respeita a crimes contra a paz e a humanidade, aqui valendo também o que se disse relativamente aos quadros II e III.

QUADRO VI - Respeitante a crimes no exercício de funções públicas, estrutura-se nos mesmos termos dos anteriores.

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Com a devida ressalva para eventuais erros (que de todo modo se pensa não serem significativos) gerados no facto de os dados serem recolhidos em sistemas de registo manual, que não informático, relevemos o seguinte:

1 Relativamente ao QUADRO I, que documenta o número de processos respeitantes à criminalidade em análise, nas 40 comarcas que se agrupam em treze círculos judiciais do Distrito Judicial de Lisboa (duas outras comarcas - Amadora, que também é o 14.º Círculo Judicial e Lagoa, não instalada, estão englobadas, nesta análise, respectivamente, nos Círculos de Lisboa e Ponta Delgada) anota-se:
1.1 Nos dois anos iniciaram-se 4.538 inquéritos, tendo por objecto a criminalidade em análise, o que equivale a cerca de 1% dos inquéritos iniciados, no Distrito Judicial, nesses dois anos (203.963 em 2003 e 203.132 em 2004).
1.2 De 2003 para 2004, a criminalidade em análise, gerando inquéritos, aumentou cerca de 27%, quando a criminalidade geral/total se apresentou quase estável.
1.3 Cerca de 50% desse número de iniciados pertencem à Comarca de Lisboa, sendo certo que nesta comarca se iniciam anualmente cerca de 39% do total de inquéritos do Distrito Judicial.
1.4 Nesses dois anos, e respeitando só aos processos nesse período iniciados, produziram-se 607 despachos de acusação, 746 de arquivamento e 1.065 outros despachos que findaram com os processos nos respectivos círculos judiciais. (Evidencia-se que não se contabilizam despachos da mesma natureza proferidos no período, em processos iniciados em anos anteriores).
1.5 As acusações representam cerca de 25% dos despachos com que se findaram os processos, percentagem bastante superior à geral, por cada ano, pois que, no Distrito Judicial de Lisboa (semelhantemente a nível nacional), os despachos totais de acusação correspondem a cerca de 17% dos que findaram os processos.
1.6 Em 31 de Dezembro de 2004 ficaram pendentes 2.120 inquéritos (sendo 789 do ano de 2003 e 1.331 do ano de 2004), cerca de 47% do total de iniciados.
1.7 Os pendentes de 2003 (789) correspondem a cerca de 39% dos iniciados nesse ano, a significar que sua investigação reveste acentuada morosidade (um ano e mais, após o início do inquérito, ainda este se não apresenta terminado).
2 Relativamente ao QUADRO II, que respeita aos crimes fiscais (aqui valendo o que se disse relativamente ao QUADRO I) evidencia-se:
2.1 Iniciaram-se, nos dois anos, 2.431 inquéritos; de 2003 para 2004 aumentou esta criminalidade, noticiada ao M.ºP.º, em cerca de 47% (bastante acima do crescimento operado na criminalidade global em análise - vide ponto 1.2 -).
2.2 Em duas comarcas (Funchal e Lisboa) iniciaram-se, nos dois anos em consideração, 1.817 inquéritos, o que representa cerca de 75% do número de iniciados, no distrito judicial.
2.3 Dos processos iniciados findaram-se 1.261 (152 por acusação, 248 por arquivamento, 860 por outros motivos) ficando pendentes em 31.12.004, 1.170 (430 de 2003, 740 de 2004).
2.4 O número de acusações é bastante baixo (cerca de 12% dos findos); a pendência total, é muito elevada (cerca de 48% dos entrados); os pendentes do ano de 2003 é excessiva (cerca de 44% dos entrados nesse ano), a revelar grande morosidade nas investigações.
2.5 A criminalidade fiscal carece de ser encarada, com novas estratégias e modelos de investigação. Na verdade, chegam notícias várias de constrangimentos, estes a passarem, desde logo, pela tardia aquisição pelo M.ºP.º da notícia do crime, a que se soma a falta de resposta na realização atempada do inquérito, pelo órgão de polícia criminal competente, no caso o organismo que fiscaliza e cobra os impostos.
3 Relativamente ao QUADRO III, respeitante a crimes praticados por agentes de autoridade, anota-se:
3.1 Iniciaram-se, nos dois anos em apreço, 737 inquéritos, sem variação sensível de um para outro ano (364 e 373, respectivamente).
3.2 Findaram-se 365 (por acusação 72, por arquivamento 226, por outro motivo 67), ficando pendentes em 31.12.004, 372 (154 do ano de 2003, 218 do ano de 2004).
3.3 As acusações representam 20% do número de findos.
3.4 Dos que ficaram pendentes, (50% dos iniciados nos dois anos), os do ano de 2003 representam ainda 42% dos iniciados nesse ano, a revelar também morosidade na conclusão dos inquéritos.
4 Relativamente ao QUADRO IV, respeitante a crimes praticados contra agentes de autoridade, evidencia-se:
4.1 Iniciaram-se, nos dois anos em análise, 817 inquéritos, verificando-se um acréscimo de 2003 para 2004 de cerca de 35%.
4.2 Findaram-se 457 (por acusação 320, por arquivamento 100, por outros motivos 37), ficando pendentes em 31.12.004, 360 (108 de 2003 e 252 de 2004).
4.3 As acusações representam 70% do número de findos.
4.4 Dos que ficaram pendentes (44% dos iniciados), os do ano de 2003 correspondem a 31% dos iniciados nesse ano.
5 Relativamente ao QUADRO V, respeitante a crimes contra a paz e a humanidade, evidencia-se:
5.1 O pouco significado quantitativo desta criminalidade (iniciaram-se 12 inquéritos, terminaram-se 8 e ficaram pendentes 4).
5.2 Produziram-se duas acusações nos inquéritos iniciados com essa classificação.
5.3 Só nos Círculos Judiciais do Funchal (2 inquéritos iniciados em 2004, que já foram arquivados), Lisboa (4 inquéritos iniciados, metade deles em cada ano) e Sintra (6 inquéritos iniciados, três em cada ano, estando pendente um, com duas acusações dadas entretanto) se encontram registos de processos tendo esta criminalidade por objecto.
6 Relativamente ao QUADRO VI, respeitante a crimes praticados no exercício de funções públicas, releva-se:
6.1 Iniciaram-se, nos dois anos em apreço, 541 inquéritos, com decréscimo de 2003 para 2004 equivalente a 20% (301 iniciados em 2003 e 240 em 2004).
6.2 Findaram-se 327 (por acusação 60, por arquivamento 166, por outros motivos 101), ficando pendentes 214 (95 do ano de 2003 e 119 do ano de 2004).
6.3 As acusações representam 18% do número de findos.
6.4 Dos que ficaram pendentes (40% dos iniciados nos dois anos), os de 2003 representam 32% dos iniciados nesse ano.
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Tiremos agora algumas CONCLUSÕES:

1º. Seria temerário valorar, com os dados disponíveis, o grau de incidência desta criminalidade, em termos gerais ou específicos, até por se carecer de elementos de comparação, sejam de nível internacional, nacional ou temporal.
2º. Sendo estes os dados colhidos, podem eles pelo menos servir para, no futuro, serem base de comparação, noutras análises que se queiram fazer.
3º. Houve um acréscimo de inquéritos iniciados, tendo esta criminalidade por objecto, de 2003 para 2004, essencialmente devido ao que aconteceu com a criminalidade fiscal, com a outra a manter linha de estabilidade.
4º. Os despachos de acusação, globalmente, situaram-se acima do nível percentual geral, atingido no Distrito Judicial de Lisboa (como a nível nacional), mas no que se refere aos crimes fiscais, ficou abaixo o que teve compensação no elevado número de acusações dadas nos inquéritos que tinham por objecto crimes praticados contra agentes de autoridade.
5º. Ainda nos findos anota-se geral e especificamente um acentuado número dos que o foram por outros motivos. Não se colheram informações que esclarecessem esta constatação, crendo-se que a junção de processos e a transmissão para outra comarca sejam os factores mais relevantes.
6º. Nos pendentes recolhe-se a ideia de ocorrer significativa morosidade na conclusão dos inquéritos. Na verdade, tomando como referência, tão só os inquéritos que se iniciaram em 2003 e que restavam pendentes em 31.12.004, constata-se que, na consideração como unidade, de toda a criminalidade, a pendência atinge o valor percentual de 39%; a criminalidade fiscal e a praticada por agentes de autoridade sobe na morosidade (44% e 42% respectivamente); a criminalidade praticada contra agentes de autoridade e no exercício de funções públicas estão abaixo da percentagem geral (31% e 32% respectivamente).
7º. A morosidade vem sendo apontada como um dos essenciais factores na crise da Justiça; os inquéritos, no Distrito Judicial de Lisboa, considerados na sua totalidade, têm um tempo de pendência a situar-se em cerca de seis meses, para o que contribui significativamente o pouco tempo que pendem aqueles contra autores incertos; muitos inquéritos respeitantes à criminalidade que se está a apreciar ultrapassam os 12 meses para se concluírem (como, aliás, outros que têm por objecto outra criminalidade).
8º. O investimento nos órgãos de polícia criminal (que compreendem os funcionários de justiça afectos ao M.ºP.º), dotando-os com mais meios humanos, organização e formação, superaria a deficiência traduzida na morosidade.
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Os magistrados do M.ºP.º do Distrito Judicial de Lisboa, especialmente os procuradores da República que têm funções de direcção, não deixarão de fazer análises semelhantes, nas suas circunscrições e o que é mais importante, certamente transporão para a sua acção, os ensinamentos que não deixarão de colher.

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Dando sequência à intenção de conferir transparência à Administração da Justiça, este MEMORANDO terá divulgação na página da PGD de Lisboa na Internet, a que se acede por www.pgdlisboa.pt, sem prejuízo de o enviar a outras entidades.

Lisboa, 31 de Janeiro de 2005

O Procurador-Geral Distrital

(João Dias Borges)
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