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  Regulamento n.º 707/2016, de 21 de Julho
  REGULAMENTO DE DEONTOLOGIA MÉDICA(versão actualizada)
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SUMÁRIO
Regulamento de Deontologia Médica
_____________________

Regulamento n.º 707/2016
Regulamento de Deontologia Médica
A Ordem dos Médicos foi criada pelo Decreto-Lei n.º 29171, de 24 de novembro de 1938, posteriormente alterado pelo Decreto-Lei n.º 40651, de 21 de junho de 1956 que, por seu lado, foi substituído pelo Estatuto aprovado pelo Decreto-Lei n.º 282/77, de 05 de julho.
Com a publicação da Lei n.º 2/2013, de 10 de janeiro, que aprovou o regime jurídico de criação, organização e funcionamento das associações públicas profissionais, tornou-se necessário proceder à revisão do aludido Estatuto da Ordem dos Médicos, adequando-o ao regime jurídico aprovado e às alterações que marcaram o ordenamento jurídico nestas últimas décadas. Tal revisão foi operada através da Lei 117/2015, de 31 de agosto, que, para além de importantes alterações ao nível da estrutura da Ordem dos Médicos prevê no seu articulado a existência de diversos regulamentos que têm de se conformar com o conteúdo do Estatuto.
Daí que, após a entrada em vigor da nova redação do Estatuto da Ordem dos Médicos, o Conselho Nacional da Ordem dos Médicos tenha deliberado constituir um grupo de trabalho, presidido pelo Bastonário e composto por membros dos três conselhos regionais, que ficou encarregue de apresentar as respetivas propostas. Os projetos de regulamentos, uma vez elaborados, foram mandados publicar pelo Conselho Nacional no Diário da República para consulta pública, nos termos do disposto no artigo 101.º do Código do Procedimento Administrativo, e foram publicados no portal da Ordem.
Finalmente, a Assembleia de Representantes, reunida no Porto no dia 20 de maio de 2016, nos termos do disposto na alínea b) do artigo 49.º do Estatuto da Ordem dos Médicos, na redação introduzida pela Lei n.º 117/2015, deliberou aprovar, sob proposta do Conselho Nacional, o Regulamento com o anexo que constitui o Código Deontológico para que se adeque às alterações estatutárias decorrentes da publicação da Lei 117/2015, de 31 de agosto.

Artigo 1.º
Ao abrigo do disposto no artigo 144.º e em desenvolvimento do estabelecido nos artigos 135.º a 143.º, todos do Estatuto da Ordem dos Médicos, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 282/77, de 5 de julho, com as alterações resultantes da Lei n.º 117/2015, de 31 de agosto, é aprovado o Código Deontológico da Ordem dos Médicos, em anexo.

Artigo 2.º
O Código Deontológico entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

ANEXO

Código Deontológico

Preâmbulo
O Código Deontológico da Ordem dos Médicos é um conjunto de normas de comportamento que serve de orientação nos diferentes aspetos das relações humanas que se estabelecem no decurso do exercício profissional da medicina.
As condutas que o Código estabelece são condicionadas pela informação científica disponível, pelas recomendações da Ordem que, por seu lado, estão balizadas pelos princípios éticos fundamentais que constituem os pilares da profissão médica.
Um Código Deontológico, para plasmar em cada realidade temporal os valores da Ética Médica que lhe dá origem, é algo em permanente evolução, atualização e adaptação. Por outro lado, inscrevendo-se o Código Deontológico no acervo jurídico da sociedade, e retirando a sua força vinculativa da autorregulação outorgada à Ordem dos Médicos, integra-se no quadro legislativo geral.
Nas normas do presente Código foram consagradas as regras deontológicas fundamentais, atualizando-se aspetos relacionados com os conhecimentos atuais da ciência médica e procurando-se encontrar as soluções bioéticas mais consonantes com o estado da arte.

TÍTULO I
Disposições Gerais
CAPÍTULO I
Definição, âmbito e competência
  Artigo 1.º
Deontologia médica
A Deontologia Médica é o conjunto de regras de natureza ética que, com caráter de permanência e a necessária adequação histórica, o médico deve observar no exercício da sua atividade profissional.

  Artigo 2.º
Âmbito
As disposições reguladoras da Deontologia Médica são aplicáveis a todos os médicos no exercício da sua profissão, independentemente do regime em que esta seja exercida.

  Artigo 3.º
Competência exclusiva da Ordem dos Médicos
1 - É da competência exclusiva da Ordem dos Médicos o conhecimento da responsabilidade disciplinar dos médicos emergente de infrações à Deontologia Médica
2 - Quando as violações à Deontologia Médica se verifiquem em relação a médicos que exerçam a sua profissão vinculados a entidades públicas, cooperativas, sociais ou privadas devem estas entidades limitar-se a comunicar à Ordem as presumíveis infrações.
3 - Se a factualidade das infrações deontológicas e técnicas preencher também os pressupostos de uma infração disciplinar incluída na competência legal daquelas entidades, as respetivas competências devem ser exercidas separadamente.


CAPÍTULO II
Deveres dos médicos
  Artigo 4.º
Princípios gerais de conduta
1 - O médico deve exercer a sua profissão de acordo com as leges artis com o maior respeito pelo direito à saúde das pessoas e da comunidade.
2 - O médico no exercício da sua profissão tem direito a uma justa remuneração.
3 - O médico deve abster-se de práticas não justificadas pelo interesse do doente ou que pressuponham ou criem falsas necessidades de consumo.
4 - O médico, no exercício da sua profissão, deve e na medida que tal não conflitue com o interesse do seu doente, proteger a sociedade, garantindo um exercício consciente, procurando a maior eficácia e eficiência na gestão rigorosa dos recursos existentes.
5 - O médico deve prestar a sua atividade profissional sem qualquer forma de discriminação.
6 - O médico, na medida das suas possibilidades, conhecimentos e experiência, deve, em qualquer lugar ou circunstância, prestar tratamento de urgência a pessoas que se encontrem em perigo imediato, independentemente da sua função específica ou da sua formação especializada.
7 - O exercício do direito à greve não pode violar os princípios da Deontologia Médica, devendo os médicos assegurar os cuidados inadiáveis aos doentes.
8 - O médico deve cuidar da permanente atualização da sua cultura científica e da sua preparação técnica, sendo dever ético fundamental o exercício profissional diligente e tecnicamente adequado às regras da arte médica.
9 - O médico deve ter comportamento público e profissional adequado à dignidade da sua profissão, sem prejuízo dos seus direitos de cidadania e liberdade individual.


CAPÍTULO III
O médico ao serviço do doente
  Artigo 5.º
Qualidade dos cuidados médicos
O médico que aceite o encargo ou tenha o dever de atender um doente obriga-se à prestação dos melhores cuidados ao seu alcance, agindo sempre com correção e delicadeza, no intuito de promover ou restituir a saúde, conservar a vida e a sua qualidade, suavizar os sofrimentos, nomeadamente nos doentes sem esperança de cura ou em fase terminal, no pleno respeito pela dignidade do ser humano.

  Artigo 6.º
Independência dos médicos
1 - O médico, no exercício da sua profissão, é técnica e deontologicamente independente e responsável pelos seus atos.
2 - Em caso algum o médico pode ser subordinado à orientação técnica e deontológica de estranhos à profissão médica no exercício das funções clínicas.
3 - O disposto no número anterior não contraria a existência de hierarquias técnicas institucionais, legal ou contratualmente estabelecidas, não podendo, contudo, em nenhum caso, um médico ser constrangido a praticar atos médicos contra sua vontade, sem prejuízo do disposto relativamente a situações de urgência e, bem assim, ao direito de recusa de prestação de cuidados, nos termos previstos neste Regulamento.

  Artigo 7.º
Isenção e liberdade profissionais
1 - O médico só deve tomar decisões ditadas pela ciência e pela sua consciência.
2 - O médico tem liberdade de escolha de meios de diagnóstico e terapêutica, devendo, porém, abster-se de prescrever desnecessariamente exames ou tratamentos onerosos ou de realizar atos médicos supérfluos.

  Artigo 8.º
Condições de exercício
1 - O médico deve exercer a sua profissão em condições que não prejudiquem a qualidade dos seus serviços e a especificidade da sua ação, não aceitando situações de interferência externa que lhe cerceiem a liberdade de fazer juízos clínicos e éticos e de atuar em conformidade com as leges artis.
2 - O médico tem o dever de comunicar à Ordem todas as tentativas de condicionar a liberdade do seu exercício ou de imposição de condições que prejudiquem os doentes.

  Artigo 9.º
Responsabilidade
1 - O médico é responsável pelos seus atos e pelos praticados por profissionais sob a sua orientação, desde que estes não se afastem das suas instruções, nem excedam os limites da sua competência.
2 - Nas equipas multidisciplinares, a responsabilidade de cada médico deve ser apreciada individualmente.

  Artigo 10.º
Tratamentos vedados ou condicionados
1 - O médico deve abster-se de praticar atos que não estejam de acordo com as leges artis.
2 - Excetuam-se os atos não reconhecidos pelas leges artis, mas sobre os quais se disponha de dados promissores, em situações em que não haja alternativa, desde que com consentimento do doente ou do seu representante legal, no caso daquele o não poder fazer, e ainda os atos que se integram em protocolos de investigação ou ensaios clínicos, cumpridas as regras que condicionam a experimentação em e com pessoas humanas.

  Artigo 11.º
Respeito por qualificações e competências
1 - O médico não pode ultrapassar os limites das suas qualificações e competências.
2 - As especialidades, subespecialidades, competências e formações reconhecidas pela Ordem devem ser tidas em conta.
3 - Sempre que entenda necessário, o médico deve pedir a colaboração de outro médico ou indicar ao doente um colega que julgue mais qualificado.
4 - Quando o médico incumbir outros profissionais de saúde, médicos ou não médicos devidamente habilitados, da prática de atos é dever do médico não ultrapassar as competências destes profissionais, sendo também responsável pelos atos praticados sob a sua orientação, nos termos do artigo 9.º
5 - Exceto em situações de emergência em que não possa recorrer em tempo útil a colega competente, o médico não pode, em caso algum, praticar atos médicos para os quais reconheça não ser capaz ou não possuir a competência técnica e capacidade física e mentais exigíveis.
6 - O médico não pode incumbir outros profissionais de saúde da realização de diagnóstico, prescrição ou gestão clínica autónoma de doentes.

  Artigo 12.º
Objeção de consciência
1 - O médico tem o direito de recusar a prática de ato da sua profissão quando tal prática entre em conflito com a sua consciência, ofendendo os seus princípios éticos, morais, religiosos, filosóficos, ideológicos ou humanitários.
2 - A objeção de consciência é manifestada perante situações concretas em documento que pode ser registado na Ordem, assinado pelo médico objetor e comunicado ao diretor clínico do estabelecimento de saúde, devendo a sua decisão ser comunicada ao doente, ou a quem no seu lugar prestar o consentimento, em tempo útil.
3 - A objeção de consciência não pode ser invocada em situação urgente e que implique perigo de vida ou grave dano para a saúde, se não houver outro médico disponível a quem o doente possa recorrer.
4 - O médico objetor não pode sofrer qualquer prejuízo pessoal ou profissional pelo exercício do seu direito à objeção de consciência.

  Artigo 13.º
Objeção técnica
A recusa de subordinação a ordens técnicas oriundas de hierarquias institucionais, legal ou contratualmente estabelecidas, ou a normas de orientação adotadas institucionalmente, só pode ser usada quando o médico se sentir constrangido a praticar ou deixar de praticar atos médicos, contra a sua opinião técnica, devendo, nesse caso, justificar-se de forma clara e por escrito.

  Artigo 14.º
Dever de respeito
1 - O médico tem o dever de respeitar a pessoa do doente.
2 - A idade, o sexo, as convicções do doente, bem como a natureza da doença devem ser tidos em consideração no exame clínico e tratamento do doente.
3 - A situação de vulnerabilidade que caracteriza a pessoa doente, bem como a dependência física e emocional que se pode estabelecer entre esta e o seu médico, torna o assédio sexual uma infração muito grave quando praticada pelo médico.

  Artigo 15.º
Livre escolha pelo doente
1 - O doente tem o direito de escolher livremente o seu médico, e este o dever de respeitar e defender tal direito.
2 - O médico assistente deve respeitar o direito do doente a mudar de médico, devendo antecipar-se, por dignidade profissional, à menor suspeita de que tal vontade exista.

  Artigo 16.º
Direito de recusa de assistência
1 - O médico pode recusar-se a prestar assistência a um doente, exceto quando este se encontrar em perigo iminente de vida ou não existir outro médico com a qualificação adequada a quem o doente possa recorrer.
2 - O médico pode recusar continuar a prestar assistência a um doente, quando se verifiquem cumulativamente os seguintes requisitos:
a) Não haja prejuízo para o doente, por lhe ser possível assegurar assistência por médico com a qualificação adequada;
b) O médico forneça os esclarecimentos necessários para a regular continuidade do tratamento;
c) O médico advirta o doente ou a família com a antecedência necessária a assegurar a substituição.
3 - A incapacidade para controlar a doença não justifica o abandono do doente.

  Artigo 17.º
Direito de recusa de ato ou exame
O médico pode recusar a realização de qualquer ato ou exame cuja indicação clínica lhe pareça mal fundamentada.

  Artigo 18.º
Referenciação
1 - O médico, ao referenciar o doente ou ao ajudá-lo na escolha de outro médico, deve exclusivamente considerar o seu conhecimento profissional e o interesse daquele.
2 - Nos termos do número anterior, o médico pode recomendar ao doente quaisquer estabelecimentos ou entidades prestadoras de cuidados de Saúde, seja qual for a sua natureza e independentemente do setor ou organização em que funcionalmente aqueles se integrem.
3 - É considerada violação deontológica grave a partilha de honorários, traduzida na perceção de vantagens financeiras, patrimoniais ou outras, pela referenciação do doente.

  Artigo 19.º
Esclarecimento do médico ao doente
1 - O doente tem direito a receber e o médico o dever de prestar esclarecimento sobre o diagnóstico, a terapêutica e o prognóstico da sua doença.
2 - O esclarecimento deve ser prestado previamente e incidir sobre os aspetos relevantes de atos e práticas, dos seus objetivos e consequências funcionais, permitindo que o doente possa consentir em consciência.
3 - O esclarecimento deve ser prestado pelo médico com palavras adequadas, em termos compreensíveis, adaptados a cada doente, realçando o que tem importância ou o que, sendo menos importante, preocupa o doente.
4 - O esclarecimento deve ter em conta o estado emocional do doente, a sua capacidade de compreensão e o seu nível cultural.
5 - O esclarecimento deve ser feito, sempre que possível, em função dos dados probabilísticos e facultando ao doente as informações necessárias para que possa ter uma visão clara da situação clínica e tomar uma decisão consciente.

  Artigo 20.º
Consentimento do doente
1 - O consentimento do doente só é válido se este, no momento em que o dá, tiver capacidade de decidir livremente, se estiver na posse da informação relevante e se for dado na ausência de coações físicas ou morais.
2 - Entre o esclarecimento e o consentimento deverá existir, sempre que possível, um intervalo de tempo que permita ao doente refletir e aconselhar-se.
3 - O médico deve aceitar e pode sugerir que o doente procure outra opinião médica, particularmente se a decisão envolver riscos significativos ou graves consequências para a sua saúde e vida.

  Artigo 21.º
Doentes incapazes de dar o consentimento
1 - O consentimento dos menores ou de doentes com alterações cognitivas que os tornem incapazes, temporária ou definitivamente, de dar o seu consentimento, deve ser solicitado ao seu representante legal, se possível.
2 - Quando existir uma diretiva antecipada de vontade ou a nomeação de um procurador de cuidados de saúde por parte do doente, o médico deve respeitar as suas decisões nos termos previstos na lei, sem prejuízo do exercício do direito à objeção de consciência.
3 - A opinião dos menores deve ser tomada em consideração, de acordo com a sua maturidade, mas o médico não fica desobrigado de obter o consentimento aos representantes legais daqueles e de ponderar eventuais interesses contrapostos.
4 - A atuação dos médicos deve ter sempre como finalidade a defesa dos melhores interesses dos doentes, e em especial dos doentes incapazes de comunicarem a sua vontade.
5 - Para os efeitos do presente artigo entende-se como melhor interesse do doente a decisão que este tomaria de forma livre e esclarecida se para tal tivesse capacidade.
6 - A informação fornecida pelos representantes legais, familiares ou pessoas das relações próximas é relevante para o esclarecimento da vontade dos doentes.
7 - Cabe ao médico ponderar, em cada caso, a necessidade de requerer ao tribunal o suprimento judicial de consentimento do doente.

  Artigo 22.º
Consentimento presumido
O médico deve presumir o consentimento dos doentes nos seguintes casos:
a) Em situações de urgência, quando não for possível obter o consentimento do doente e desde que não haja qualquer indicação segura de que o doente recusaria a intervenção se tivesse a possibilidade de manifestar a sua vontade;
b) Quando só puder ser obtido com adiamento que implique perigo para a vida ou perigo grave para a saúde;
c) Quando tiver sido dado para certa intervenção ou tratamento, tendo vindo a realizar-se outro diferente, por se ter revelado imposto como meio para evitar perigo para a vida ou perigo grave para a saúde, salvo se se verificarem circunstâncias que permitam concluir com segurança que o consentimento seria recusado.

  Artigo 23.º
Formas de consentimento
1 - O consentimento pode assumir a forma oral ou escrita.
2 - O consentimento escrito e ou testemunhado é exigível em casos expressamente determinados pela lei ou regulamento deontológico.

  Artigo 24.º
Recusa de exames e tratamentos
1 - Se o doente, a família ou o representante legal, esgotadas todas as formas de esclarecimento adequadas, recusarem os exames ou tratamentos indicados pelo médico, pode este recusar-se a assisti-lo nos termos do artigo 16.º, sem prejuízo do disposto na parte final do n.º 7 do artigo 21.º
2 - Em caso de perigo de vida de doente com capacidade para decidir, a recusa de tratamento imediato que a situação imponha só pode ser feita pelo próprio doente, expressa e livremente.

  Artigo 25.º
Informação de diagnóstico e prognóstico
1 - O diagnóstico e o prognóstico devem, por regra, ser comunicados ao doente, em respeito pela sua dignidade e autonomia.
2 - A informação exige prudência e delicadeza, devendo ser efetuada em toda a extensão e no tempo requerido pelo doente, ponderados os eventuais danos que esta lhe possa causar.
3 - A informação não pode ser imposta ao doente, pelo que não deve ser prestada se este não a desejar.
4 - O diagnóstico e prognóstico só podem ser dados a conhecer a terceiros, nomeadamente familiares, com o consentimento do doente, a menos que este seja menor ou cognitivamente incompetente, sem prejuízo do disposto no artigo 33.º

  Artigo 26.º
Respeito pelas crenças e interesses do doente
1 - O médico deve respeitar as opções religiosas, filosóficas ou ideológicas e os interesses legítimos do doente.
2 - O doente tem direito a receber ou a recusar conforto moral e espiritual, nomeadamente o auxílio de um membro qualificado da sua própria religião.
3 - Se o doente ou, na incapacidade deste, os seus familiares ou representantes legais quiserem chamar um ministro ou outro membro de qualquer culto, um notário ou outra entidade legalmente competente, o médico tem o dever de o possibilitar no momento que considere mais oportuno.

  Artigo 27.º
Menores, idosos e deficientes
1 - O médico deve usar de especial solicitude e cuidado para com o menor, o idoso, o deficiente ou pessoa particularmente indefesa quando verificar que os seus familiares ou outros responsáveis não são capazes ou cuidadosos para tratar da sua saúde ou assegurar o seu bem-estar.
2 - Sempre que o médico, chamado a tratar um menor, um idoso, um deficiente, um incapaz ou pessoa particularmente indefesa, verifique que estes são vítimas de sevícias, maus-tratos ou assédio, deve tomar as providências adequadas para os proteger, nomeadamente alertar as autoridades competentes.

  Artigo 28.º
Acompanhante do doente e limitação de visitas
1 - O médico respeitará a vontade do doente em ser acompanhado por alguém da sua confiança, exceto quando tal possa interferir com a prestação de cuidados médicos.
2 - O médico pode limitar o horário e a duração das visitas de terceiros aos doentes sob sua responsabilidade, se entender necessário à saúde do doente ou à defesa dos direitos de terceiros, tendo em vista o normal funcionamento dos serviços.


CAPÍTULO IV
Segredo médico
  Artigo 29.º
O segredo médico
O segredo médico é condição essencial ao relacionamento médico-doente, assenta no interesse moral, social, profissional e ético, que pressupõe e permite uma base de verdade e de mútua confiança.

  Artigo 30.º
Âmbito do segredo médico
1 - O segredo médico impõe-se em todas as circunstâncias dado que resulta de um direito inalienável de todos os doentes.
2 - O segredo abrange todos os factos que tenham chegado ao conhecimento do médico no exercício da sua profissão ou por causa dela e compreende especialmente:
a) Os factos revelados diretamente pela pessoa, por outrem a seu pedido ou por terceiro com quem tenha contactado durante a prestação de cuidados ou por causa dela;
b) Os factos apercebidos pelo médico, provenientes ou não da observação clínica do doente ou de terceiros;
c) Os factos resultantes do conhecimento dos meios complementares de diagnóstico e terapêutica referentes ao doente;
d) Os factos comunicados por outro médico ou profissional de saúde, obrigado, quanto aos mesmos, a segredo.
3 - A obrigação de segredo médico existe, quer o serviço solicitado tenha ou não sido prestado e quer seja ou não remunerado.
4 - O segredo médico mantém-se após a morte do doente.
5 - É expressamente proibido ao médico enviar doentes para fins de diagnóstico ou terapêutica a qualquer entidade não vinculada ao segredo médico.

  Artigo 31.º
Segredo médico em unidades de saúde públicas, sociais, cooperativas ou privadas
1 - Os médicos que trabalhem em unidades de saúde estão obrigados, singular e coletivamente, a guardar segredo médico quanto às informações que constem do processo individual do doente.
2 - Compete aos médicos referidos no número anterior a identificação dos elementos dos respetivos processos clínicos que, não estando abrangidos pelo segredo médico, podem ser comunicados a entidades, mesmo hierárquicas, que os hajam solicitado.
3 - As unidades de saúde em colaboração com os diretores clínicos devem impedir o acesso indevido de terceiros aos processos clínicos e aos sistemas informáticos que contenham informação de saúde.
4 - Qualquer litígio suscitado entre médicos e as entidades não-médicas referidas nos dois números anteriores, em que seja invocado segredo médico, é decidido, no plano ético, pelo Bastonário da Ordem.

  Artigo 32.º
Escusa do segredo médico
Excluem o dever de segredo médico:
a) O consentimento do doente ou, em caso de impedimento, do seu representante legal, quando a revelação não prejudique terceiras pessoas com interesse na manutenção do segredo médico;
b) O que for absolutamente necessário à defesa da dignidade, da honra e dos legítimos interesses do médico, do doente ou de terceiros, não podendo em qualquer destes casos o médico revelar mais do que o necessário, nem o podendo fazer sem prévia autorização do Bastonário;
c) O que revele um nascimento ou um óbito;
d) As doenças de declaração obrigatória.

  Artigo 33.º
Precauções que não violam o segredo médico
1 - A obrigação do segredo médico não impede que o médico tome as precauções necessárias, promova ou participe em medidas de defesa da saúde, indispensáveis à salvaguarda da vida e saúde de pessoas que possam contactar com o doente, nomeadamente dos membros da família e outros conviventes.
2 - Sendo a preservação da vida um valor fundamental, deverá o médico, em circunstância em que um doente tenha um comportamento que traga um risco real e significativo para a vida ou perigo grave para a saúde de outra pessoa, tentar persuadi-lo a modificar o seu comportamento, nomeadamente declarando que de outro modo irá revelar a sua situação às pessoas interessadas. Se o doente não modificar o seu comportamento, apesar de advertido, o médico deve informar as pessoas em risco, caso as conheça, após comunicar ao doente que o vai fazer.
3 - Nas situações em que o risco de vida e o perigo para a saúde ou vida de terceiros seja grave ou iminente, o médico deve tomar as medidas adequadas a evitar que o mesmo se produza, devendo adotar as providências necessárias junto das entidades competentes.

  Artigo 34.º
Manutenção do segredo médico em cobrança de honorários
Na cobrança judicial ou extrajudicial de honorários, o médico não pode quebrar o segredo médico a que está vinculado, salvo em situações excecionais em que tal se mostre imprescindível para a defesa dos seus interesses e desde que para tanto tenha autorização do Bastonário da Ordem.

  Artigo 35.º
Intervenção em processos administrativos ou judiciais
1 - O médico que nessa qualidade seja convocado como testemunha para comparecer perante a autoridade que o convocou, não poderá prestar declarações ou produzir depoimento sobre matéria de segredo médico, exceto nas situações previstas nas alíneas a) e b) do artigo 32.º ou na lei.
2 - Quando, nas situações referidas no número anterior, o médico invoque o dever de segredo, pode solicitar à Ordem declaração que ateste a natureza inviolável do sigilo no processo ou procedimento em causa.

  Artigo 36.º
Dados médicos informatizados
1 - Os ficheiros automatizados, as bases e bancos de dados médicos, contendo informações extraídas de histórias clínicas sujeitas a segredo médico, devem ser equipados com sistemas, e utilizados com procedimentos de segurança, que impeçam a consulta, alteração ou destruição de dados por pessoa não autorizada a fazê-lo e que permitam detetar desvios de informação.
2 - O acesso aos ficheiros automatizados, as bases e bancos de dados médicos são da responsabilidade de um médico.
3 - Os responsáveis pelos ficheiros automatizados, as bases e bancos de dados médicos, bem como as pessoas que, no exercício das suas funções, tenham conhecimento dos dados pessoais neles registados, ficam obrigados a segredo, mesmo após o termo de funções.
4 - Os ficheiros automatizados, as bases e bancos de dados médicos não podem estar conectados com outro tipo de redes informáticas, a menos que possam garantir-se as condições de segurança referidas no n.º 1.

  Artigo 37.º
Tratamento da informação da saúde
1 - Os responsáveis pelo tratamento da informação de saúde devem tomar as providências adequadas à proteção da sua confidencialidade, garantindo a segurança das instalações e equipamentos, o controlo no acesso à informação, bem como o reforço do dever de sigilo e da educação deontológica de todos os profissionais.
2 - As unidades do sistema de saúde devem impedir o acesso indevido de terceiros aos processos clínicos e aos sistemas informáticos que contenham informação de saúde, incluindo as respetivas cópias de segurança, assegurando os níveis de segurança apropriados e cumprindo as exigências estabelecidas pela legislação que regula a proteção de dados pessoais, nomeadamente para evitar a sua destruição, acidental ou ilícita, a alteração, difusão ou acesso não autorizado ou qualquer outra forma de tratamento ilícito da informação.
3 - A informação de saúde só pode ser utilizada pelo sistema de saúde nas condições expressas em autorização escrita do seu titular ou de quem o represente.
4 - O acesso a informação de saúde pode, desde que anonimizada, ser facultado para fins de investigação.
5 - A gestão dos sistemas que organizam a informação de saúde deve garantir a separação entre a informação de saúde e genética e a restante informação pessoal, designadamente através da definição de diversos níveis de acesso.
6 - A gestão dos sistemas de informação deve garantir o processamento regular e frequente de cópias de segurança da informação de saúde, salvaguardadas as garantias de confidencialidade estabelecidas por lei.

  Artigo 38.º
Responsabilidade do médico com funções directivas
Os médicos com cargos de direção em organismos prestadores de cuidados de saúde são responsáveis pela adequação às normas deontológicas dos serviços que dirigem, devendo nomeadamente:
a) Estabelecer os mecanismos necessários para a preservação da intimidade e confidencialidade dos doentes;
b) Tratar as informações a serem transmitidas aos meios de comunicação social de um modo adequado e após obtenção do consentimento do doente ou do seu representante legal;
c) Exigir dos seus colaboradores médicos e não-médicos, e ainda dos estudantes das diversas áreas de saúde, a preservação da intimidade e da confidencialidade das informações clínicas, sujeitas a segredo médico.


CAPÍTULO V
Informação médica e Processo clínico
  Artigo 39.º
Informação médica
1 - A informação médica é a informação de saúde destinada a ser utilizada em prestações de cuidados ou tratamentos de saúde.
2 - Entende-se por «processo clínico» qualquer registo, informatizado ou não, que contenha informação de saúde sobre doentes ou seus familiares.
3 - Cada processo clínico deve conter toda a informação médica disponível que diga respeito ao doente.
4 - A informação médica é inscrita no processo clínico pelo médico que tenha assistido o doente ou, sob a supervisão daquele, por outro profissional igualmente sujeito ao dever de segredo.
5 - O processo clínico só pode ser consultado por médico incumbido da realização de prestações de saúde a favor do doente a que respeita ou, sob a supervisão daquele, por outro profissional de saúde obrigado a segredo e na medida do estritamente necessário à realização das mesmas, sem prejuízo da investigação epidemiológica, clínica ou genética que possa ser feita sobre os mesmos.

  Artigo 40.º
Processo clínico, ficha clínica e exames complementares
1 - O médico, seja qual for o enquadramento da sua ação profissional, deve registar, de forma clara e detalhada, os resultados que considere relevantes das observações clínicas dos doentes a seu cargo, conservando-os ao abrigo de qualquer indiscrição, de acordo com as normas do segredo médico.
2 - A ficha clínica é o registo dos dados clínicos do doente, das anotações pessoais do médico e tem como finalidade a memória futura e a comunicação entre os profissionais que tratem o doente.
3 - O doente tem direito a conhecer a informação registada no seu processo clínico, a qual lhe é transmitida, se requerida, pelo próprio médico assistente ou, no caso de instituição de saúde, por médico designado pelo doente para este efeito.
4 - Sempre que tenha de facultar informação do processo clínico o médico tem o direito de expurgar as suas anotações pessoais e o dever de não fornecer informações sujeitas a segredo de terceiros e não comunicar circunstâncias que, a serem conhecidas pelo paciente, poriam em perigo a sua vida ou seriam suscetíveis de lhe causar grave dano à saúde, física ou psíquica.
5 - Os exames complementares de diagnóstico e terapêutica são lhe facultados quando este os solicite, aceitando-se no entanto que o material a fornecer seja constituído por cópias correspondentes aos elementos constantes do processo clínico.

  Artigo 41.º
Transmissão de dados clínicos entre médicos
Sempre que o interesse do doente o exija, o médico deve comunicar, sem demora, a qualquer outro médico assistente, os elementos do processo clínico necessários à continuidade dos cuidados.

  Artigo 42.º
Publicações científicas
O médico pode servir-se do processo clínico para as suas publicações, mas deve proceder de modo a que não seja possível a identificação dos doentes, a menos que expressamente autorizado por escrito a tal pelos próprios doentes ou seus representantes legais.

  Artigo 43.º
Destino do processo clínico em caso de transmissão de consultório
1 - Quando o médico cesse a sua atividade profissional, os seus processos clínicos devem ser transmitidos ao médico que lhe suceda, salvaguardada a vontade dos doentes interessados em que a informação relevante seja transmitida a outro médico por si determinado.
2 - Na falta de médico que lhe suceda, deve o facto ser comunicado à Ordem, por quem receber o espólio do consultório ou pelos médicos que tenham conhecimento da situação, a qual determina o destino a dar-lhes.


CAPÍTULO VI
Atestado médico
  Artigo 44.º
O Atestado médico
1 - Por solicitação livre e sem qualquer coação do interessado ou seu legal representante, o médico tem o dever de atestar e registar os estados de saúde ou doença que verifique durante a prestação do ato médico.
2 - Os atestados médicos, certificados, relatórios ou declarações são documentos particulares, assinados pelo seu autor de forma reconhecível e só são emitidos a pedido do interessado, ou do seu representante legal, deles devendo constar a menção desse pedido.
3 - Os atestados de doença, além da correta identificação do interessado, devem afirmar, sendo verdade, a existência de doença, a data do seu início, os impedimentos resultantes e o tempo provável de incapacidade que determine; não devem especificar o diagnóstico de que o doente sofre, salvo por solicitação expressa do doente, devendo o médico, nesse caso, fazer constar esse condicionalismo.
4 - Para prorrogação do prazo de incapacidade referido no número anterior, deve proceder-se à emissão de novo atestado médico.
5 - O médico não está impedido de realizar atos médicos sobre si próprio ou familiares diretos.
6 - O médico está impedido de emitir atestados a si próprio ou em situação de manifesto conflito de interesses.

  Artigo 45.º
Proibição de atestado de complacência
1 - O médico não pode emitir atestados de complacência ou relatórios tendenciosos sobre o estado de saúde ou doença de qualquer pessoa mesmo que esta lho solicite.
2 - Todos os factos atestados, bem como as razões subjacentes às declarações produzidas, devem constar de um registo na posse do médico ou da instituição prestadora.


CAPÍTULO VII
Telemedicina
  Artigo 46.º
Relação médico-doente
1 - A telemedicina deve respeitar a relação médico-doente, mantendo a confiança mútua, a independência de opinião do médico, a autonomia do doente e a confidencialidade.
2 - Quando o doente pede ou se submete a uma consulta por telemedicina, esta não deve substituir a relação médico-doente e deve realizar-se em condições sobreponíveis a uma consulta presencial, e só será dada quando o médico tiver uma ideia clara e justificável da situação clínica.
3 - O médico que usa os meios da telemedicina e não observa presencialmente o doente, deve avaliar cuidadosamente a informação recebida, só podendo dar opiniões, recomendações ou tomar decisões médicas, se a qualidade da informação recebida for suficiente e relevante.
4 - Na utilização da telemedicina em situações de urgência, pode a opinião do médico teleconsultado ser baseada numa informação incompleta, mas nesta situação excecional o médico assistente é responsável pela decisão a tomar.

  Artigo 47.º
Responsabilidade do médico na telemedicina
1 - O médico tem liberdade e completa independência de decidir se utiliza ou recusa a telemedicina.
2 - O médico que pede a opinião de um colega é responsável pelo tratamento e pelas decisões e recomendações por ele dadas ao doente.
3 - O médico teleconsultado não é obrigado a emitir opinião se não tem conhecimentos ou suficiente informação do doente para emitir um parecer fundamentado, mas, caso a emita, é responsável por ela.
4 - Quanto aos colaboradores não médicos participantes na transmissão ou receção de dados, o médico deve assegurar-se que a formação e a competência destes profissionais sejam adequadas, de modo a poder garantir uma utilização apropriada da telemedicina e a salvaguarda do segredo médico.
5 - O médico praticante da telemedicina esclarece o doente e obtém o consentimento, nos termos dos artigos 20.º, 21.º, 22.º e 23.º
6 - O médico deve assegurar a aplicação das medidas de segurança estabelecidas para proteger a confidencialidade do doente.

  Artigo 48.º
Garantias de qualidade e segurança
1 - O médico só deve utilizar a telemedicina depois de se certificar que a equipa encarregue da sua realização garante um nível de qualidade suficientemente alto, funciona de forma adequada e cumpre com as normas estipuladas.
2 - O médico deve dispor de sistemas de suporte e utilizar controlos de qualidade e procedimentos de avaliação para vigiar a precisão e a qualidade da informação recebida e transmitida.
3 - O médico só deve utilizar a telemedicina depois de se certificar que o sistema utilizado e os seus utilizadores garantem o segredo médico, nomeadamente através da encriptação de nomes e outros dados identificadores.

  Artigo 49.º
História clínica
1 - O médico que utilize a telemedicina deve registar na ficha clínica os métodos de identificação do doente, as informações pretendidas e as recebidas.
2 - O médico teleconsultado deve registar em ficha clínica as opiniões que emitiu e também a informação em que se baseou.
3 - Os métodos informatizados de arquivamento e transmissão dos dados do doente só devem ser utilizados quando se tenham tomado medidas suficientes para proteger a confidencialidade e a segurança da informação registada ou permutada.


CAPÍTULO VIII
Honorários
  Artigo 50.º
Remuneração da atividade médica
A prestação de cuidados médicos aos doentes, deve ser compensada de modo a permitir a digna subsistência do médico.

  Artigo 51.º
Fixação e cobrança de honorários
1 - Na fixação de honorários deve o médico proceder com justo critério, atendendo à importância do serviço prestado, ao tempo habitualmente despendido, à sua diferenciação técnica, ao valor dos equipamentos utilizados, aos gastos em material, à capacidade económica do doente e aos usos e costumes da região.
2 - O médico deve expor, no seu local de exercício, o preçário indicativo dos atos médicos que pratica, em conformidade com as normas legais em vigor.
3 - A conta de honorários pode ser apresentada nos suportes permitidos por lei, enumerando e quantificando o valor dos serviços prestados.
4 - O médico tem a liberdade de, sempre que o entender, prestar gratuitamente os seus cuidados.
5 - O disposto no presente artigo não se aplica ao médico que pratica os seus serviços profissionais em empresa prestadora de cuidados médicos, a qual apresenta diretamente a conta de honorários.

  Artigo 52.º
Chamadas ao domicílio
O médico chamado ao domicílio do doente, tendo comparecido atempadamente, goza do direito a honorários mesmo que, por motivo alheio à sua vontade, não chegue a prestar assistência médica.

  Artigo 53.º
Intervenções cirúrgicas e em equipa
1 - Na prestação de serviços médicos por equipa médica ou multiprofissional, os honorários podem ser reclamados por cada um dos intervenientes ou só por um, sem prejuízo de terem de ser sempre discriminados.
2 - A presença do médico assistente numa intervenção cirúrgica, quando solicitada pelo doente ou pelos seus representantes, dá direito a honorários próprios que podem ser apresentados nos termos do número anterior.

  Artigo 54.º
Dever de gratuitidade
1 - O médico deve tratar gratuitamente todos os colegas e os familiares que vivem a seu cargo, podendo todavia fazer-se abonar dos gastos originados pelos atos médicos. Tal dever prolonga-se, quando adequado, em caso de morte do colega.
2 - O médico fica isento do dever de gratuitidade se existir entidade que cubra os custos da assistência prestada e, bem assim, nas situações em que não tem poder de decisão quanto à cobrança do serviço prestado.

  Artigo 55.º
Comparticipações vedadas
1 - O médico não pode praticar a dicotomia, assim como a sua oferta ou a sua exigência, nomeadamente o recebimento de quaisquer comissões ou gratificações por serviços prestados por outros, tais como, análises, radiografias, aplicações de fisioterapia, consultas ou operações, bem como pelo encaminhamento de doentes para quaisquer outros prestadores de cuidados de saúde;
2 - É autorizada a partilha de honorários entre médicos, se corresponderem a efetivos serviços prestados a doentes, quer no âmbito da medicina de grupo, quer no âmbito de trabalho em equipa.


CAPÍTULO IX
Publicidade
  Artigo 56.º
Princípio geral da divulgação da atividade médica
1 - Na divulgação da sua atividade profissional o médico deve nortear-se pelo interesse do doente abstendo-se de práticas que pressuponham ou criem falsas necessidades de consumo.
2 - A publicidade da atividade médica deve ser meramente informativa das condições de atendimento ao público e da qualificação profissional do médico cujo título esteja reconhecido pela Ordem.
3 - É vedada aos médicos a divulgação de informação suscetível de ser considerada como garantia de resultados ou que possa ser considerada publicidade enganosa.
4 - A publicação de anúncios em qualquer dos suportes permitido por lei, bem como a divulgação de informações, tem de revestir forma discreta e prudente.

  Artigo 57.º
Títulos profissionais e académicos
1 - O médico deve respeitar a veracidade dos títulos profissionais e académicos que utilize.
2 - É vedado aos médicos utilizar na prática clínica quaisquer títulos ou designações derivados de provas, concursos ou formação nacional ou internacional que não correspondam à área específica de especialização clínica e que não tenham obtido a prévia concordância da Ordem.

  Artigo 58.º
Publicitação de estudos, investigações ou descobertas científicas e colaboração com os meios de comunicação social
1 - A publicitação de estudos, investigações ou descobertas científicas deve ser feita através de revistas ou de outras publicações de caráter técnico-científico.
2 - A publicação noutros meios de comunicação social só é aceitável como forma de divulgação de manifesto interesse público e nunca com fins de autopromoção ou publicidade à sua atividade profissional.


CAPÍTULO X
Consultório médico
  Artigo 59.º
O Consultório médico
O consultório médico é o local de trabalho onde o médico exerce a sua atividade profissional.

  Artigo 60.º
Instalações, meios técnicos e localização
1 - O consultório médico deve ter instalações e meios técnicos adequados ao exercício da profissão.
2 - Não podem ser realizadas atividades em condições ou locais que possam comprometer a dignidade da profissão, a qualidade dos atos médicos, a reserva da intimidade dos doentes e o respeito pelo segredo médico.
3 - Consideram-se abrangidas pela proibição do número anterior, nomeadamente, as seguintes situações:
a) Farmácias e parafarmácias;
b) Estabelecimentos de vendas de próteses e ortóteses;
c) Estabelecimentos de óticas;
d) Ervanárias.

  Artigo 61.º
Transmissão de consultório
É vedado aos médicos que exercem a profissão em consultório adquirido por transmissão utilizar o nome ou designação do médico anterior em qualquer ato da sua atividade profissional, inclusive na identificação do próprio consultório.

  Artigo 62.º
Consultório detidos por sociedades
Os consultórios detidos por sociedades consideram-se abrangidos pelo estabelecido nas normas deontológicas deste Regulamento, respondendo o seu diretor clínico pelo cumprimento das suas disposições, independentemente das responsabilidades individuais que caibam a cada médico.


TÍTULO II
Da vida
CAPÍTULO I
O início da vida
  Artigo 63.º
Respeito pela vida humana
1 - O médico deve guardar respeito pela vida humana desde o momento do seu início.
2 - O disposto no número anterior não impede a adoção de terapêutica que ponha em perigo ou anule a vida do feto mas que constitua o único meio capaz de preservar a vida da grávida.

  Artigo 64.º
Interrupção voluntária da gravidez
1 - A interrupção do estado de gravidez, por decisão da mulher, pode ser proposta ao médico nos termos e prazos previstos na lei.
2 - O médico decide sobre a proposta, de acordo com os seus valores profissionais e com a sua consciência.


CAPÍTULO II
Fim da vida
  Artigo 65.º
O fim da vida
1 - O médico deve respeitar a dignidade do doente no momento do fim da vida.
2 - Ao médico é vedada a ajuda ao suicídio, a eutanásia e a distanásia.

  Artigo 66.º
Cuidados paliativos
1 - Nas situações de doenças avançadas e progressivas cujos tratamentos não permitem reverter a sua evolução natural, o médico deve dirigir a sua ação para o bem-estar dos doentes, evitando a futilidade terapêutica, designadamente a utilização de meios de diagnóstico e terapêutica que podem, por si próprios, induzir mais sofrimento, sem que daí advenha qualquer benefício.
2 - Os cuidados paliativos, com o objetivo de minimizar o sofrimento e melhorar, tanto quanto possível, a qualidade de vida dos doentes, constituem o padrão do tratamento nas situações a que o número anterior se refere.

  Artigo 67.º
Morte
1 - O uso de meios de suporte artificial de funções vitais deve ser interrompido após o diagnóstico de morte do tronco cerebral, com exceção das situações em que se proceda à colheita de órgãos para transplante.
2 - Este diagnóstico e correspondente declaração devem ser verificados, processados e assumidos de acordo com os critérios definidos pela Ordem.
3 - O uso de meios extraordinários de manutenção de vida deve ser interrompido nos casos irrecuperáveis de prognóstico seguramente fatal e próximo, quando da continuação de tais terapêuticas não resulte benefício para o doente.
4 - O uso de meios extraordinários de manutenção da vida não deve ser iniciado ou continuado contra a vontade do doente.
5 - Não se consideram meios extraordinários de manutenção da vida, mesmo que administrados por via artificial, a hidratação e a alimentação ou a administração por meios simples de pequenos débitos de oxigénio suplementar.


CAPÍTULO III
Transplante de órgãos e tecidos humanos
  Artigo 68.º
Colheita de órgãos ou tecidos humanos em pessoa viva
1 - A remoção de órgão ou tecidos a transplantar colhidos do corpo de pessoa viva não é admitida quando, com elevado grau de probabilidade, envolva a diminuição grave e permanente da integridade física ou da saúde do dador.
2 - A remoção de órgãos ou tecidos insubstituíveis e importantes na economia do organismo, mas não indispensáveis à sua sobrevivência, apenas será permitida após esclarecimentos detalhados ao dador e ao recetor dos riscos envolvidos e consequências a curto, médio e longo prazo.
3 - Salvo em situação de urgência, o esclarecimento ao dador e ao recetor, desde que sejam cognitivamente competentes e juridicamente capazes, deve ser facultado ao longo de todo o período das diversas consultas preparatórias, valorizando o risco do procedimento e as suas consequências imediatas e futuras.
4 - Além do esclarecimento referido no número anterior, é aconselhável que o dador seja também esclarecido por médicos que não intervenham no tratamento do recetor.
5 - Tratando-se de dadores menores, o consentimento deve ser prestado pelos pais, desde que não inibidos do exercício do poder paternal, ou, em caso de inibição ou falta de ambos, pelo tribunal.
6 - A dádiva e colheita de órgãos, tecidos e células de menores com capacidade de entendimento e de manifestação de vontade carecem também da concordância destes.
7 - A colheita em maiores incapazes por razões de anomalia psíquica só pode ser feita mediante autorização judicial.
8 - É interdito ao médico participar na colheita ou transplantação de órgãos ou tecidos humanos objeto de comercialização.

  Artigo 69.º
Colheita de órgãos ou tecidos em cadáveres humanos
1 - A colheita de órgãos ou tecidos em cadáver só pode efetuar-se após o preenchimento de todas as regras científicas e normas legais estabelecidas.
2 - A verificação da morte não deve ser feita por médicos que integrem a equipa de transplante.
3 - Nos casos em que se preveja a colheita de órgãos para transplante é permitida a manutenção de meios artificiais de suporte de vida após o diagnóstico de morte do tronco cerebral.


CAPÍTULO IV
Procriação medicamente assistida
  Artigo 70.º
A procriação medicamente assistida
É lícito o recurso a técnicas de procriação medicamente assistida nos termos da lei.

  Artigo 71.º
Casos em que o médico pode realizar procriação medicamente assistida
1 - A execução das técnicas de procriação medicamente assistida deve ter sempre como referência ética que a fecundação de ovócitos não deve conduzir sistematicamente à ocorrência de embriões supranumerários, caso em que deve estar disponível a possibilidade de criopreservação para ulterior transferência.
2 - A execução de técnicas de procriação medicamente assistida deve procurar reduzir a incidência de gravidez múltipla.
3 - A maternidade de substituição só pode ser ponderada em situações da maior excecionalidade, nos termos da lei.
4 - É aceitável o recurso a doação de gâmetas em casos específicos e a regulamentar.

  Artigo 72.º
Casos em que o médico não pode realizar procriação medicamente assistida
1 - O médico não pode realizar a procriação medicamente assistida com qualquer dos objetivos seguintes:
a) Criar seres humanos geneticamente idênticos.
b) Criar embriões humanos para investigação.
c) Criar embriões com o fim de melhorar características, promover a escolha do sexo ou para originar híbridos ou quimeras.
2 - O médico não pode, no âmbito de um processo de procriação medicamente assistida, fazer a aplicação de diagnóstico genético pré-implantação em doenças multifatoriais em que o valor preditor do teste genético seja muito baixo.
3 - Excetuam-se os casos em que haja elevado risco de doença genética grave e de mau prognóstico, para a qual não seja possível a deteção por diagnóstico pré-natal ou diagnóstico genético pré-implantação.

  Artigo 73.º
Esclarecimento do médico e consentimento dos doentes na procriação medicamente assistida
1 - O esclarecimento do médico aos doentes será feito nos termos do artigo 19.º, com as adaptações para a procriação medicamente assistida.
2 - O consentimento dos doentes deverá ser feito, por escrito, nos termos do artigo 20.º, com as adaptações para a procriação medicamente assistida.


CAPÍTULO V
Esterilização
  Artigo 74.º
Laqueação tubária e vasectomia
1 - Os métodos de esterilização irreversível, laqueação tubária e vasectomia só podem ser realizados a pedido do próprio e com o seu expresso e explícito consentimento pleno, após esclarecimentos detalhados sobre os riscos e sobre a irreversibilidade destes métodos.
2 - Exceto em situações urgentes com risco de vida, é desejável a existência de um período de reflexão entre esta prestação de esclarecimentos e a tomada final da decisão.
3 - É expressamente vedada aos médicos a prática de métodos de esterilização irreversíveis por solicitação de terceiros sem consentimento plenamente livre e informado do doente, prestado nos termos do n.º 1 deste artigo.
4 - Os métodos de esterilização irreversíveis só devem ser executados em menores ou incapazes após pedido devidamente fundamentado no sentido de evitar graves riscos para a sua vida ou saúde dos seus filhos hipotéticos e, sempre, mediante prévio parecer do Conselho Nacional de Ética e Deontologia da Ordem dos Médicos.


CAPÍTULO VI
Intervenções no genoma humano
  Artigo 75.º
Testes genéticos
A realização de testes genotípicos de diagnóstico pré-sintomático de doenças genéticas e de testes de suscetibilidade deve apenas ter lugar para fins médicos ou de investigação médica, visando o bem do indivíduo em que forem realizados, não podendo servir propósitos de que decorra discriminação do indivíduo.

  Artigo 76.º
Terapêutica génica
Qualquer intervenção sobre o genoma humano visando a sua modificação pode apenas ter lugar para fins médicos e, designadamente, terapêutica génica, estando excluída qualquer alteração em células germinais de que resulte modificação genética da descendência.


CAPÍTULO VII
Disforia de género
  Artigo 77.º
Cirurgia para transição de género
É proibida a cirurgia para transição de género em pessoas morfologicamente normais, salvo nos casos clínicos adequadamente diagnosticados como disforia do género.

  Artigo 78.º
Pressupostos da terapêutica cirúrgica
O doente sujeito a terapêutica cirúrgica deve ser maior de idade e cognitivamente capaz.

  Artigo 79.º
Avaliação e acompanhamento clínico
1 - O diagnóstico de Disforia de Género e seu acompanhamento devem seguir as leges artis e deve ter caráter multidisciplinar, sendo realizado por um médico com a Competência em Sexologia Clínica, um especialista em Psiquiatra e um especialista em Endocrinologia, com reconhecida experiência na matéria.
2 - Devem ser obtidos dois diagnósticos de Disforia de Género elaborados por equipas distintas, de modo a obter-se uma avaliação independente.
3 - O médico deve:
a) Acompanhar o doente em todas as fases do Processo de Reatribuição Sexual, desde o estabelecimento do diagnóstico à fase pós-cirúrgica. O período antes da intervenção cirúrgica não deve ser inferior a dois anos;
b) Assegurar que o doente tem apoio Psicológico/Psicoterapêutico ao longo de todo o Processo de Reatribuição Sexual;
c) Assegurar que o doente está isento de distúrbio mental permanente.

  Artigo 80.º
Esclarecimento do médico e consentimento do doente na cirurgia para transição do género
1 - O esclarecimento do médico deve ser dado nos termos deste Regulamento e deve especificar que a cirurgia não garante a satisfação sexual, mas visa sobretudo contribuir para o equilíbrio psicológico do doente.
2 - O consentimento do doente deve ser prestado por escrito, na presença de pelo menos uma testemunha.


CAPÍTULO VIII
O médico e o indivíduo privado de liberdade
  Artigo 81.º
O médico e o doente privado de liberdade
1 - O médico que preste, ainda que ocasionalmente, cuidados clínicos em instituições em que o doente esteja, por força da lei, privado da sua liberdade, tem o dever de respeitar sempre o interesse do doente e a integridade da sua pessoa.
2 - O médico deve impedir e denunciar à Ordem qualquer ato lesivo da saúde física ou psíquica dos presos ou detidos, nomeadamente daqueles por cuja saúde é responsável.

  Artigo 82.º
Tortura
1 - O médico não deve em circunstância alguma praticar, colaborar, consentir ou estar presente em atos de violência, tortura, ou quaisquer outras atuações cruéis, desumanas ou degradantes, seja qual for o crime cometido ou imputado ao preso ou detido e nomeadamente em estado de sítio, de guerra ou de conflito civil.
2 - O médico deve recusar ceder instalações, instrumentos ou fármacos, bem como recusar fornecer os seus conhecimentos científicos para permitir a prática da tortura.
3 - O médico deve denunciar junto da Ordem os atos referidos nos números anteriores.

  Artigo 83.º
Proibição de meios coercivos
1 - O médico não pode impor coercivamente aos presos ou detidos, capazes de exercer a sua autonomia, exames médicos, tratamentos ou alimentação.
2 - Em caso de perigo para a vida ou grave perigo para a saúde de presos ou detidos, a recusa pelo doente dos atos referidos no n.º 1, deve ser confirmada por médico estranho à instituição.


CAPÍTULO IX
Experimentação humana
  Artigo 84.º
Princípios gerais na experimentação humana
A experimentação humana de novas técnicas ou ensaios clínicos de medicamentos só pode ser posta em prática em estreita observância dos seguintes princípios:
a) O bem do indivíduo deve prevalecer sobre os interesses da ciência e da comunidade;
b) A integridade física e psíquica do indivíduo envolvido deve ser escrupulosamente respeitada;
c) Os resultados obtidos na experimentação animal devem permitir concluir que os riscos para o indivíduo a submeter ao ensaio são proporcionais aos benefícios que para esse indivíduo se apresentam como previsíveis;
d) A realização da experimentação deve ser feita por médico cientificamente qualificado e com o objetivo de beneficiar o indivíduo ou outros que possam vir a beneficiar do ensaio realizado;
e) O médico que participe em qualquer experimentação tem o dever de comunicar, nos termos da lei, todos os conflitos de interesse que possam ser invocados, nomeadamente relacionamento atual ou passado com empresas produtoras de produtos farmacêuticos ou dispositivos médicos;
f) A investigação de novos fármacos deve ser feita por comparação com terapêuticas eficazes conhecidas, quando existam;
g) A todas as pessoas envolvidas na investigação deve ser assegurada a continuação de terapêutica eficaz após o fim do ensaio.

  Artigo 85.º
Experimentação em indivíduo saudável
A experimentação em indivíduos saudáveis deve revestir-se de especiais cuidados, evitando-se qualquer risco previsível para a sua integridade física e psíquica, só podendo ser realizada após a prestação de consentimento informado escrito.

  Artigo 86.º
Experimentação em casos especiais
1 - Em caso de doentes incuráveis no estado atual dos conhecimentos médicos, inclusive na fase terminal da doença, o ensaio de novas terapêuticas médico-cirúrgicas deve apresentar razoáveis probabilidades de se revelar útil e ter em conta particularmente o bem-estar físico e psíquico do doente, sem lhe impor sofrimento, desconforto ou encargos desnecessários ou desproporcionados em face dos benefícios esperados.
2 - A experimentação em menores e incapazes é eticamente admissível, desde que diretamente ditada pelo interesse dos mesmos.
3 - A experimentação em mulheres grávidas só é eticamente admissível quando não possa ser realizada noutras circunstâncias e tenha interesse direto para a mãe ou para o filho e desde que dela não possa resultar grave prejuízo para a saúde ou para a vida do outro.
4 - É proibida a experimentação em indivíduos privados de liberdade.

  Artigo 87.º
Ensaio de novos medicamentos
O ensaio de novos medicamentos, especialmente com utilização do método da dupla ocultação, não pode privar deliberadamente o doente de tratamento reconhecidamente eficaz, cuja omissão faça correr riscos desproporcionados.

  Artigo 88.º
Garantias éticas
Qualquer investigação de diagnóstico ou de terapêutica, médica ou cirúrgica, deve revestir-se de garantias éticas, apoiadas nas comissões de ética das instituições de saúde onde se realiza a investigação, e apreciadas, sempre que tal se justifique, pelo Conselho Nacional de Ética e Deontologia Médicas da Ordem.

  Artigo 89.º
Consentimento livre e esclarecido na experimentação humana
1 - O médico investigador deve informar a natureza, o alcance, as consequências, os riscos e os benefícios previsíveis do ensaio, bem como os métodos e objetivos prosseguidos, facultando a documentação adequada que deve ser escrita de forma clara e em termos compreensíveis.
2 - O médico deve disponibilizar-se para qualquer esclarecimento adicional que o doente entenda necessário.
3 - O consentimento deve ser prestado nos termos gerais, observando-se o seguinte:
a) Deve ser feito por escrito, datado e assinado, ficando o doente com uma cópia do consentimento dado;
b) Excecionalmente, se o declarante não estiver em condições de dar o seu consentimento por escrito, pode ser dado oralmente, na presença de duas testemunhas da sua confiança e não relacionadas com a investigação, ficando o ato de autorização devidamente documentado com a identificação das testemunhas.
4 - O consentimento deve salvaguardar a interrupção da experimentação a qualquer momento, sem qualquer contrapartida por parte do sujeito daquela e sem perda do direito do doente a ser tratado da melhor forma.

  Artigo 90.º
Confidencialidade na experimentação
Todos aqueles que participem em experimentações ou, por qualquer modo, tiverem conhecimento da sua realização estão obrigados a não revelar quaisquer dados a que tenham acesso, exceto quando a manutenção do segredo ponha em risco a saúde do doente.

  Artigo 91.º
Independência do médico na experimentação
1 - O médico responsável pela experimentação ou ensaio deve ter total independência relativamente a qualquer entidade com interesse comercial na promoção de tratamentos ou técnicas.
2 - O médico responsável deve assegurar-se do rigor científico do ensaio e obter a garantia da publicação do universo dos resultados.


TÍTULO III
O Médico ao Serviço da Comunidade
CAPÍTULO I
Responsabilidades do médico perante a comunidade
  Artigo 92.º
Princípio geral de colaboração
1 - Seja qual for o seu estatuto profissional, o médico deve, com pleno respeito pelos preceitos deontológicos, colaborar e apoiar as entidades prestadoras de cuidados de saúde.
2 - Pode porém cessar a sua colaboração em caso de grave violação dos direitos, liberdades e garantias individuais das pessoas que lhe estão confiadas, ou em caso de grave violação da dignidade, liberdade e independência da sua ação profissional.
3 - O médico pode, ainda, recusar a sua colaboração em situações concretas relativamente às quais invoque o direito à objeção de consciência.

  Artigo 93.º
Responsabilidade social
1 - O médico no exercício do seu direito à independência na orientação dos cuidados e na escolha da terapêutica deve assumir uma atitude responsável perante os custos globais da saúde.
2 - O médico deve prestar os melhores cuidados possíveis no condicionalismo financeiro existente, mas não pode, em função deste, realizar ou prescrever o que considere deletério para o doente.
3 - Em caso algum pode o médico prescrever terapêuticas ou solicitar exames complementares de diagnóstico que não visem o interesse direto do doente a seu cargo.
4 - É proibida qualquer forma de prescrição que vise o interesse financeiro do próprio médico ou de terceiros.
5 - O médico tem obrigação de conhecer os custos das terapêuticas que prescreve, devendo optar pelos menos onerosos, desde que esta atitude não prejudique os interesses do doente.

  Artigo 94.º
Emissão de documentos
Sem prejuízo do segredo profissional, o médico deve emitir a documentação necessária para que o doente possa exercer os seus direitos.

  Artigo 95.º
Saúde pública
No exercício da sua profissão, deve o médico cooperar para a defesa da saúde pública, competindo-lhe designadamente:
a) Participar prontamente às autoridades de saúde os casos de doenças contagiosas de declaração obrigatória e os casos de doenças contagiosas graves ou de fácil difusão;
b) Prestar serviços profissionais em caso de epidemia, sem abandonar os seus doentes, sempre que tal lhe seja solicitado pelas autoridades de saúde;
c) Prestar serviços profissionais em caso de catástrofe, oferecendo os seus préstimos às autoridades e atuando em coordenação com elas;
d) Cooperar com as autoridades na execução de medidas destinadas a prevenir o uso ilícito de drogas;
e) Prestar informações, no que seja do seu conhecimento, à autoridade de saúde, sobre os factos e circunstâncias que possam respeitar à saúde pública e responder a qualquer inquérito quando por elas solicitado;
f) Obedecer às determinações das autoridades de saúde, sem prejuízo do cumprimento das normas deontológicas;
g) Desencadear os mecanismos adequados de ajuda a colegas vítimas de doença física ou psíquica quando estes não reconheçam a sua doença.

  Artigo 96.º
Declaração, verificação e certificado de óbito
1 - A declaração de óbito deve ser confirmada pelo certificado de óbito, emitido pelo médico que o verifique, em suporte oficialmente aprovado.
2 - No certificado de óbito de pessoa a quem o médico tenha prestado assistência, este deve indicar a doença causadora da morte, se dela tiver conhecimento. Para este efeito, considerar-se-á como assistente o médico que tenha preceituado ou dirigido o tratamento da doença até à morte, ou que tenha visitado ou dado consulta extra-hospitalar ao doente dentro da semana que tiver precedido o óbito. Exclui-se desta obrigação o médico que tenha prestado assistência trabalhando em instituições oficiais de saúde, as quais devem fornecer ao médico assistente ou à autoridade de saúde as informações necessárias.
3 - Havendo indícios de morte violenta ou se o médico ignorar a causa da morte, este deve comunicar imediatamente o fato às autoridades competentes, a fim de estas promoverem as diligências necessárias à averiguação da causa da morte e das circunstâncias em que esta tenha ocorrido.
4 - O médico deve participar à autoridade competente todos os casos de falecimento do indivíduo a quem não tenha prestado assistência médica nos termos do n.º 2 e cujo óbito tenha verificado.
5 - O médico deve participar à autoridade de saúde local os casos de óbito por doenças contagiosas consideradas graves ou de fácil difusão.
6 - O médico deve indicar no certificado de óbito a necessidade de inumação fora do prazo legal, nomeadamente de inumação urgente, em caso de epidemia ou doença contagiosa que assim o exija, ou de qualquer outra circunstância que interesse à saúde pública, devendo preceituar, em caso de ausência da respetiva autoridade de saúde, as condições de isolamento, transporte e inumação do cadáver.

  Artigo 97.º
Dever de isenção no exercício da actividade
O médico que presta serviço em estabelecimento de saúde não deve exercer essas funções em proveito da sua clínica particular ou de qualquer outra instituição de cuidados de saúde.

  Artigo 98.º
Dever de prevenir a Ordem
É dever imperioso do médico comunicar à Ordem, de forma rigorosa, objetiva e confidencial, as atitudes fraudulentas ou de incompetência no exercício da Medicina de que tenha conhecimento, aceitando depor nos processos que, em consequência, sejam instaurados.

  Artigo 99.º
Requisitos mínimos das prescrições
1 - As prescrições de terapêuticas e de exames de diagnóstico devem obedecer, salvo disposição legal em contrário, aos seguintes requisitos mínimos:
a) Devem ser claras, redigidas de forma legível, conterem informação que permita o contacto imediato do médico em caso de dúvida e devem apresentar de forma inequívoca o nome e o número da cédula profissional do médico prescritor;
b) Ser redigidas em língua portuguesa, manuscritas a tinta com letra bem legível ou impressas de forma bem percetível, sem abreviaturas não consagradas e devidamente datadas e validadas com assinatura, quando for o caso.
2 - As doses prescritas serão expressas de harmonia com o sistema decimal, devendo as doses menos habituais serem convenientemente assinaladas, designadamente através da simultânea menção por extenso e por algarismos, por sublinhado ou por qualquer outra forma julgada adequada.
3 - Sempre que haja necessidade de usar um fármaco prolongadamente, pode o médico calcular e prescrever o total de doses para o tempo a decorrer até à consulta seguinte.
4 - As receitas devem ser acompanhadas de instruções claras sobre a dose, o horário de administração e a finalidade dos fármacos prescritos.
5 - Os relatórios médicos, nomeadamente os referentes a exames especializados, devem ser redigidos com clareza e respeitar o estabelecido nas alíneas a) e b) do n.º 1 deste artigo.


CAPÍTULO II
Médico perito
  Artigo 100.º
O médico perito
1 - O médico encarregue de funções de caráter pericial deve submeter-se aos preceitos deontológicos, não podendo aceitar que ponham em causa esses preceitos.
2 - Todo o médico, desde que reúna a respetivas competências, tem o dever de prestar colaboração como perito quando para tal for solicitado ou indicado pela Ordem.
3 - Para o efeito do número anterior entende-se que o médico reúne as competências para a peritagem sempre que possua o título da especialidade, da subespecialidade ou detenha uma competência atribuída pela Ordem dos Médicos, que permita diferenciá-lo para a perícia a realizar.
4 - O médico que desempenhe funções periciais não pode aproveitar esse facto como meio de publicidade profissional, direta ou indireta.

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