Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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 - ACRL de 17-10-2018   Acidente de trabalho. Indemnização.
1 - Sem que na decisão prevista no artigo 138.°, n.° 2 do CPT, constem os factos necessários à conclusão de que o sinistrado esteve afectado de ITA ou ITP, por que períodos o esteve, e, sendo caso disso, quais os valores que a seguradora lhe pagou a tal título, a decisão relativa à correspondente indemnização carece de base factual em que se sustente.
2 - A mera circunstância de o sinistrado se encontrar com incapacidade temporária, ainda que a trabalhar e a auferir o seu salário, não liberta a seguradora do dever de reparar o dano, pagando as prestações que correspondem à incapacidade que o afecta.
Proc. 20489/16.5T8LSB.L1 4ª Secção
Desembargadores:  Maria José Costa Pinto - Manuela Fialho - -
Sumário elaborado por Susana Leandro
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Processo n.° 20489/16.5T8LSB.L1
4.ª Secção
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa:

1. Relatório
1.1. Os presentes autos emergentes de acidente de trabalho em que é sinistrada ALC..., nascida em 8 de Abril de 1972, e entidade responsável a CAR..., S.A., tiveram a sua origem no acidente ocorrido em 5 de Agosto de 2015, quando a sinistrada se encontrava a trabalhar sob as ordens, direcção e fiscalização da TEL..., S.A., a qual tinha a sua responsabilidade infortunística laboral transferida para a identificada Companhia de Seguros tendo em consideração a totalidade do salário auferido pela sinistrada, tal como a seguradora veio posteriormente a aceitar na contestação apresentada (fls. 153 e ss.).
Realizada no dia 17 de Maio de 2017 a tentativa de conciliação sob a presidência do Ministério Público (fls. 118 e ss.), frustrando-se a conciliação na medida em que sinistrada e a seguradora discordaram do resultado do exame médico realizado na fase conciliatória — a IPP de 3/prct. fixada pelo perito médico na fase conciliatória (exame documentado a fls. 79-80) —, não aceitando ainda a seguradora que a responsabilidade do empregador estivesse para si transferida com base no valor salarial efectivamente auferido, pois, na sua perspectiva, o mesmo não abrangia o valor de € 254,64 (€ 20,47 x 12 relativo a prémios de produtividade).
A sinistrada ALC... desencadeou a fase contenciosa da acção, apresentando petição inicial em que demandava a CAR..., S.A., e a TEL..., S.A.
Na contestação apresentada, a R. CAR..., S.A., veio dizer que, afinal, concorda com a transferência de responsabilidade pelo valor global da remuneração anual da sinistrada, a saber, € 12.474,06.
Perante tal contestação, a Mma. Juiz a quo, ponderando que a transferência de responsabilidade quanto ao acidente de trabalho sofrido se encontra totalmente transferida para a Seguradora, não cabendo qualquer responsabilidade à entidade patronal que, necessariamente, será absolvida, bem como que a única discordância entre a sinistrada e a seguradora se prende com a questão da incapacidade para o trabalho e com os períodos de ITA sofridos, o que tem que ser apreciadas e decididas pela Junta Médica, decidiu, ao abrigo do princípio da adequação processual, que os autos prosseguissem os seus termos com a realização de Junta Médica, sem necessidade de realização de audiência de discussão e julgamento, cabendo à Junta Médica fixar a incapacidade permanente parcial da sinistrada e, bem assim, o(s) período(s) de incapacidade temporária absoluta.
Realizada a junta médica, os Exmos. Peritos responderam aos quesitos formulados e concluíram, por unanimidade, estar a sinistrada afectada de Incapacidade Permanente Parcial, a que corresponde segundo a T.N.I. o coeficiente de desvalorização funcional de 3/prct. (fls. 196¬197) e ter sofrido os períodos de incapacidade temporária referidos no auto de exame médico singular (a fls. 79).
A Mma Juiz do Tribunal do Juízo do Trabalho de Sintra (Juiz 3) proferiu em 20 de Março de 2018 sentença em que, depois de assentar os factos que entendeu provados, decidiu o seguinte:
«[...]
Consequentemente, considerando estes factos provados à luz do direito aplicável, designadamente dos ares 48°, n.ºs 1 e 3, alínea c), 71° e 75° da Lei n° 98/2009, de 04.09, condeno a responsável a pagar à sinistrada o capital de remição duma pensão anual e vitalícia de € 261,95, desde 21.02.2014, bem como a quantia de € 9.740,79 (€9.404,15 + €147,74 + €188,90 — vidé auto de fls. 119), a título de indemnização pelos períodos de incapacidade e ainda a quantia de € 30,00 a título de despesas com transportes, acrescidas de juros de mora, à taxa legal, até integral pagamento.
A entidade patronal vai totalmente absolvida do pedido.
Custas pela responsável.
Valor da ação: € 13.708,42 (cfr. artigo 120° do CPT).
[...]»

1.2. A seguradora interpôs recurso desta decisão, tendo formulado, a terminar as respectivas alegações, as seguintes conclusões:
1. No âmbito dos presentes autos, em 22 de Março de 2018, o Tribunal a quo proferiu Sentença, na qual decidiu:
(...) Consequentemente, considerando estes factos provados à luz do direito aplicável, designadamente dos art°s 48°, nos 1 e 3, alínea c), 71° e 75° da Lei n° 98/2009, de 04.09, condeno a responsável a pagar à sinistrada o capital de remição duma pensão anual e vitalícia de € 261,95, desde 21.02.2014, bem como a quantia de € 9.740,79 (€9.404,15 + €147,74 + €188,90 — vidé auto de fls. 119), a título de indemnização pelos períodos de incapacidade e ainda a quantia de € 30,00 a título de despesas com transportes, acrescidas de juros de mora, à taxa legal, até integral pagamento (...). (negrito da Recorrente)
2. O Tribunal a quo proferiu tal decisão, através da seguinte fundamentação constante da Sentença recorrida:
Nos presentes autos de ação emergente de acidente de trabalho em que é sinistrada ALC..., nascida em 08.04.1972, e é responsável CAR..., S.A., provaram-se os seguintes factos (com base no acordo das partes na fase conciliatória e no resultado do exame por Junta Médica):
1. No dia 05.08.2015, quando exercia a sua profissão de Customer Service Representative ao serviço da entidade patronal TEL..., S.A., em execução de um contrato de trabalho entre ambos vigente, a sinistrada tropeçou e torceu o tornozelo esquerdo, por meio de atropelamento, de que lhe resultaram as lesões e sequelas descritas nos autos, que lhe determinaram a IPP de 3/prct. desde a data da alta em 30.09.2016.
2. À data do acidente, a sinistrada auferia a retribuição anual de € 12,474,06 (€791,87 x 14 meses de remuneração base + €103,84 x 11 de subsídio de alimentação + €20,47 x 12 de prémios de produtividade).
3. A entidade patronal tinha a responsabilidade emergente do acidente de trabalho totalmente transferida para a seguradora supra identificadas, mediante contrato de seguro.
4. A sinistrada teve despesas com transportes a tribunal, no valor de Euros 30,00.(...)
3. Porém, mal andou o Tribunal a quo a proferir tal decisão nos termos em que o fez.
4. Com a prolacção desta decisão, o Tribunal a quo fez tábua rasa da prova produzida nos presentes autos, sendo vários os erros — formais e materiais — de que a mesma enferma.
5. Dessa forma, não se conformando com a decisão proferida pelo Tribunal a quo, vem a Ré, ora Recorrente, da mesma recorrer, pugnando pela sua revogação e, consequente, modificação conforme infra se explicará com rigor e detalhe.
6. O presente Recurso incide sobre 4 (quatro) questões: sobre a errada descrição do acidente de trabalho objecto dos presentes autos na Sentença recorrida (1); sobre a incorrecta data constante do dispositivo da Sentença para efeitos de cálculo do capital de remição (2); sobre os concretos períodos de incapacidade da Autora, ora Recorrida, em discussão nos presentes autos e respectivos valores auferidos pela mesma durante tais períodos de incapacidade (3) e sobre a não dedução, no dispositivo da Sentença, das quantias já liquidadas à Autora, ora Recorrida, pela Recorrente a título de indemnização pelos períodos de incapacidade (4).
7. A Sentença recorrida, conforme se predisse, condenou a Recorrente a proceder ao pagamento a Autora, ora Recorrida, das seguintes quantias:
a) O capital de remição de uma pensão anual e vitalícia de € 261,95 (duzentos e sessenta e um euros e noventa e cinco cêntimos), desde 21.02.2014;
b) A quantia de € 9.740,79 (nove mil setecentos e quarenta euros e setenta e nove cêntimos), a título de indemnização pelos períodos de incapacidade;
c) A quantia de € 30,00 (trinta euros), a titulo de despesas com transportes, acrescidas de juros de mora, à taxa legal, até integral pagamento.
8. A 1ª (primeira) questão a suscitar no presente Recurso refere-se ao facto de, na Sentença recorrida, o Tribunal a quo ter errado na descrição do acidente de trabalho objecto dos presentes autos.
9. Embora esta questão não tenha qualquer influência na decisão a tomar nos presentes autos, importa que a Sentença recorrida faça uma correcta descrição do acidente de trabalho em questão.
10. A este propósito, refere a Sentença recorrida, no Ponto 1 dos Facos Provados, que:
(...) 1. No dia 05.08.2015, quando exercia a sua profissão de Customer Service Representative ao serviço da entidade patronal TEL..., S.A., em execução de um contrato de trabalho entre ambos vigente, a sinistrada tropeçou e torceu o tornozelo esquerdo, por meio de atropelamento, de que lhe resultaram as lesões e sequelas descritas nos autos, que lhe determinaram a IPP de 3/prct. desde a data da alta em 30.09.2016.(...) (sublinhado da Recorrente)
11. Sucede que o acidente de trabalho objectos presentes autos não foi, como diz a Sentença recorrida, um atropelamento.
12. A Autora, ora Recorrida, quando trabalhava sob a autoridade e direcção da sua entidade patronal, a sociedade comercial TEL..., S.A. (ora Co-Ré), foi vítima de 1 (um) acidente de trabalho que consistiu no seguinte: tropeçou, caiu e torceu o tornozelo esquerdo.
13. Foi este, pois, o acidente de trabalho em questão nos presentes autos, o qual está, aliás, provado através do Auto de Tentativa de Conciliação, da Petição Inicial e da Contestação, todos a fls. dos presentes autos.
14. Pelo que o Ponto 1 dos Factos Provados da Sentença recorrida tem que ser alterado nessa conformidade, retirando-se de lá a expressão atropelamento.
15. Assim, o Ponto 1 dos Factos Provados da Sentença recorrida deve ser alterado e modificado neste sentido:
(...) 1. No dia 05.08.2015, quando exercia a sua profissão de Customer Service Representative ao serviço da entidade patronal TEL..., S.A., em execução de um contrato de trabalho entre ambos vigente, a sinistrada tropeçou, caiu e torceu o tornozelo esquerdo, de que lhe resultaram as lesões e sequelas descritas nos autos, que lhe determinaram a IPP de 3/prct. desde a data da alta em 30.09.2016.(...)
16. A 2.a (segunda) questão a suscitar no presente Recurso refere-se ao facto de, no dispositivo da Sentença recorrida, o Tribunal a quo ter dado como data inicial para o cálculo do capital de remição a data de 21 de Fevereiro de 2014 (21.02.2014).
17. Na verdade, diz o dispositivo da Sentença recorrida que:
(...) Consequentemente, considerando estes factos provados à luz do direito aplicável, designadamente dos art°s 48°, n°s 1 e 3, alínea c), 71° e 75° da Lei n° 98/2009, de 04.09, condeno a responsável a pagar à sinistrada o capital de remição duma pensão anual e vitalícia de € 261,95, desde 21,02.2014, bem como a quantia de € 9.740,79 (€9.404,15 + €147,74 + €188,90 — vide auto de fls. 119), a título de indemnização pelos períodos de incapacidade e ainda a quantia de € 30,00 a título de despesas com transportes, acrescidas de juros de mora, à taxa legal, até integral pagamento (.,.), (negrito da Recorrente)
18. Não é, de forma alguma, essa a data para iniciar o cálculo do capital de remição nos presentes autos.
19. Essa data é até anterior à data do acidente de trabalho objecto dos presentes autos — 5 de Agosto de 2015 (05.08.2015).
20. A data que deveria constar no dispositivo da Sentença recorrida seria a data de 1 de Outubro de 2016 (01.10.2016) e não o dia 21 de Fevereiro de 2014 (21.02.2014).
21. Está, plenamente, comprovado nos autos que a data da alta da Autora, ora Recorrida, ocorreu no dia 30 de Setembro de 2016 (30.09.2016) e que lhe resultaram as lesões e as sequelas descritas nos autos, que determinaram uma IPP de 3/prct., desde essa data.
22, Tal factualidade resulta, aliás, do Ponto n.° 1 dos Factos Provados constantes na Sentença recorrida, que diz, e cita-se:
(,..) 1. No dia 05.08.2015, quando exercia a sua profissão de Customer Service Representative ao serviço da entidade patronal TEL..., S.A., em execução de um contrato de trabalho entre ambos vigente, a sinistrada tropeçou e torceu o tornozelo esquerdo, por meio de atropelamento, de que lhe resultaram as lesões e sequelas descritas nos autos, que lhe determinaram a IPP de 3/prct. desde a data da alta em 30.09.2016.(...) (sublinhado da Recorrente)
23. Sendo a alta no dia 30 de Setembro de 2016 (30,09.2016), tem, assim a Autora, ora Recorrida, direito, a partir do dia seguinte àquela da alta, ao pagamento de uma pensão anual e vitalícia, a calcular de harmonia com os artigos 8.°, n.° 1, 21.°, 23.°, alínea b), 48.°, 50.° e 72.° da Lei n.° 98/2009, de 4 de Setembro, tendo-se, ainda, em consideração o referido salário e a desvalorização fixada.
24, O dia seguinte ao dia da alta (30.09.2016) é, pois, o dia 1 de Outubro de 2016 (01.10.2016).
25. Pelo que seria essa a data que deveria constar do dispositivo da Sentença para o início do cálculo do capital de remição de uma pensão anual e vitalícia devida nos presentes autos.
26. Assim, o dispositivo da Sentença recorrida deve ser alterado e modificado neste sentido:
(...) Consequentemente, considerando estes factos provados à luz do direito aplicável, designadamente dos art°s 48°, n°s 1 e 3, alínea c), 71° e 75° da Lei n° 98/2009, de 04.09, condeno a responsável a pagar à sinistrada o capital de remição duma pensão anual e vitalícia de € 261,95, desde 01.10.2016, bem como a quantia de € 9.740,79 (€9.404,15 + €147,74 + €188,90 — vidé auto de fls. 119), a título de indemnização pelos períodos de incapacidade e ainda a quantia de € 30,00 a titulo de despesas com transportes, acrescidas de juros de mora, à taxa legal, até integral pagamento (...),
27. A 3.a (terceira) questão a suscitar no presente Recurso refere-se ao facto de, no dispositivo da Sentença recorrida, não estarem correctos os concretos períodos de incapacidade da Autora, ora Recorrida, e respectivos valores auferidos pela mesma durante tais períodos de incapacidade.
28. Com efeito, diz a Sentença recorrida, a este propósito, que:
(...) Consequentemente, considerando estes factos provados à luz do direito aplicável, designadamente dos art°s 48°, n°s 1 e 3, alínea c), 71° e 75° da Lei n° 98/2009, de 04.09, condeno a responsável a pagar à sinistrada o capital de remição duma pensão anual e vitalícia de € 261,95, desde 21.02.2014, bem como a quantia de € 9.740,79 (€9.404,15 + €147,74 + €188,90 — vidé auto de fls. 119), a título de indemnização pelos períodos de incapacidade e ainda a quantia de € 30,00 a título de despesas com transportes, acrescidas de juros de mora, à taxa legal, até integral pagamento (...). (negrito da Recorrente)
29. O Tribunal a quo condena, assim, a Recorrente a pagar à Autora, ora Recorrida, a quantia de € 9.740,79 (nove mil setecentos e quarenta euros e setenta e nove cêntimos) — € 9.404,15 + € 147,74 + € 188,90 —, a título de indemnização pelos períodos de incapacidade.
30. No entanto, o Tribunal a quo não poderia, também e de forma alguma, ter tomado esta decisão no que respeita à quantia a pagar pela Recorrente à Autora, ora Recorrida, a título de indemnização pelos períodos de incapacidade.
31. O Tribunal a quo erra, desde logo, no cálculo dos períodos relativos às Incapacidades Temporárias.
32. A Autora, ora Recorrida, esteve, com ITA (Incapacidade Temporária Absoluta) para o trabalho no período compreendido entre o dia 6 de Agosto de 2015 até ao dia 17 de Setembro de 2015, ou seja, durante 43 (quarenta e três) dias.
33. E no período compreendido entre o dia 25 de Janeiro de 2016 até ao dia 9 de Setembro de 2016, ou seja, durante 229 (duzentos e vinte e nove) dias.
34. A Autora, ora Recorrida esteve, assim, com ITA (Incapacidade Temporária Absoluta) para o trabalho durante 272 (duzentos e setenta e dois) dias, conforme está, aliás, comprovado nos autos.
35. E não durante 401 (quatrocentos e um) dias, conforme o Tribunal a quo defende na Sentença recorrida.
36. Salvo o devido respeito, nesta sede, o Tribunal a quo plasmou, na Sentença recorrida, a tese defendida pela Autora, ora Recorrida, na sua Petição Inicial, o que está totalmente errado!
37. A documentação clínica junta aos autos a fls. não permite ao Tribunal a quo concluir como concluiu.
38. A Autora, ora Recorrida, no período compreendido entre o dia 18 de Setembro de 2015 e o dia 24 de Janeiro de 2016 esteve em tratamento nos serviços clínicos da ora Ré sem incapacidade (SI).
39. Durante esse período, a Autora, ora Recorrida, terá estado a trabalhar e a receber o seu salário sem qualquer redução.
40. Pelo que, a Recorrente, na sua Contestação, requereu ao Tribunal a quo que a Autora, ora Recorrida, e a Co-Ré, TEL..., S.A., fossem notificadas para vir juntar aos presentes autos os Recibos de Vencimento da mesma, relativos ao período compreendido entre o dia 18 de Setembro de 2015 e o dia 24 Janeiro de 2016.
41. Sucede, no entanto, que o Tribunal a quo não se pronunciou acerca deste pedido, fazendo, salvo o devido respeito, tábua rasa do requerido pela Recorrente na sua Contestação.
42. O Tribunal a quo passou do Exame por Junta Médica realizado à Autora, ora Recorrida, directamente para a Sentença recorrida, sem se pronunciar sobre o referido requerimento apresentado pela Recorrente na sua Contestação, o qual era fundamental para a sua correcta decisão no que respeita ao cálculo do valor de indemnização a título dos períodos de incapacidade.
43. O Tribunal a quo a decidir, na Sentença recorrida, pela atribuição de ITA nesse período (18 de Setembro de 2015 a 24 de Janeiro de 2016) consubstancia, clara e inequivocamente, uma situação de enriquecimento sem causa por parte da Autora, ora Recorrida.
44, Resulta, pois, que são esses 272 (duzentos e setenta e dois) dias — e só esses! — que a Autora, ora Recorrida, tem direito a receber a titulo de ITA (Incapacidade Temporária Absoluta) para o trabalho.
45. Assim, a Autora, ora Recorrida, tem direito a receber da Recorrente a quantia de € 6.507,02 (seis mil quinhentos e sete euros e dois cêntimos) pela ITA de 272 (duzentos e setenta e dois) dias sofrida, desde 06/08/2015 a 17/09/2015 e de 25/01/2016 a 09/09/2016 (RATS de € 12.474,06 : 365 dias x 70/prct. x 272 dias).
46. Bem como tem, também, a Autora, ora Recorrida, direito a receber da Recorrente a quantia de € 150,71 (cento e cinquenta euros e setenta e um cêntimos), relativos a 21 (vinte e um) dias — de 10/09/2016 a 30/09/2016) — de ITP (Incapacidade Temporária Parcial) — RATS de € 12.474,06 : 365 dias x 70/prct. x 30 x 21 dias.
47. Resulta, pois, que a Recorrente deveria proceder ao pagamento à Autora, ora Recorrida, da quantia global de € 6.657,73 (seis mil seiscentos e cinquenta e sete euros e setenta e três cêntimos) - € 6.507,02 (ITA) + € 150,71 (ITP).
48. Era este o valor que deveria constar do dispositivo da Sentença recorrida (€ 6.657,73) e não aquele que lá está aposto (€ 9.740,79), a título de indemnização pelos períodos de incapacidade.
49. Assim, o dispositivo da Sentença recorrida deve ser alterado e modificado neste sentido:
(...) Consequentemente, considerando estes factos provados à luz do direito aplicável, designadamente dos art°s 48°, nos 1 e 3, alínea c), 71° e 75° da Lei n° 98/2009, de 04.09, condeno a responsável a pagar à sinistrada o capital de remição duma pensão anual e vitalícia
de 261,95, desde 01.10.2016, bem como a quantia de 6.657,73 — € 6.507,02 (ITA) + €
150,71 (ITP) —, a título de indemnização pelos períodos de incapacidade e ainda a quantia de 30,00 a titulo de despesas com transportes, acrescidas de juros de mora, à taxa legal, até integral pagamento (...).
50. Ou, se V. Excelências assim não entenderem, deve, antes de tudo, ser o Tribunal a quo obrigado a pronunciar-se sobre o requerimento apresentado pela Recorrente na sua Contestação, ou seja, que a Autora, ora Recorrida, e a Co-Ré, TEL..., S.A., sejam notificadas para vir juntar aos presentes autos os Recibos de Vencimento da mesma, relativos ao período compreendido entre o dia 18 de Setembro de 2015 e o dia 24 Janeiro de 2016, com o intuito de se confirmar o quanto se predisse nesta sede.
51. A 4.ª (quarta) e última questão a suscitar no presente Recurso refere-se ao facto de, no dispositivo da Sentença recorrida, o Tribunal a quo não ter deduzido, como era sua obrigação, as quantias já liquidadas à Autora, ora Recorrida, pela Recorrente a título de indemnização pelos períodos de incapacidade.
52. É que a Recorrente já pagou à Autora, ora Recorrida, a quantia de € 6.644,30 (seis mil seiscentos e quarenta e quatro euros e trinta cêntimos), a titulo de indemnizações por incapacidades temporárias (ITA e ITP), conforme Quadro/Relação de Pagamentos que se juntou como Documento n.° 3 da Contestação, a fls. dos presentes autos, e conforme Recibos de Indemnização, assinados pela Autora, ora Recorrida, que também se juntaram como Documentos n.°s 4 a 20 da Contestação, a fls. dos presentes autos.
53. No entanto, na Sentença recorrida, o Tribunal a quo, pura e simplesmente, omitiu tal factualidade.
54. O Tribunal a quo omitiu que a Autora, ora Recorrida, já recebeu da Recorrente a quantia de € 6.644,30 (seis mil seiscentos e quarenta e quatro euros e trinta cêntimos), a título de indemnizações por incapacidades temporárias (ITA e ITP), o que não deixa de ser estranho!
55. Assim, é inequívoco concluir que a Recorrente só deve à Autora, ora Recorrida, a quantia de € 13,43 (treze euros e quarenta e três cêntimos), atento o valor já liquidado por aquela a esta, a título de indemnização por incapacidades temporárias (ITA e IPP) — € 6.644,30 (seis mil seiscentos e quarenta e quatro euros e trinta cêntimos).
56. Ou seja: € 6.657,73 (ITA e ITP) - € 6.644,30 (Valor pago pela Recorrente) = € 13,43
57. E não o valor constante na Sentença como sendo o valor que a Recorrente teria que pagar à Autora, ora Recorrida, a titulo de indemnização pelos períodos de incapacidade (€9.740,79).
58. Se assim fosse, estaríamos perante uma clara situação de enriquecimento sem causa por parte da Autora, ora Recorrida, uma vez que a mesma receberia 2 (duas) vezes igual quantia.
59. A dedução dos valores já liquidados pela Recorrente à Autora, ora Recorrida, a titulo de indemnização pelos períodos de incapacidade, foi objecto de Despacho proferido pelo Tribunal a quo, em 14 de Novembro de 2017, junto a fls. dos presentes autos.
60. No referido Despacho, refere o Tribunal a quo, e cita-se, que:
(...) Consigna-se que aos valores devidos à sinistrada serão deduzidos aqueles que já tenham sido liquidados pela Seguradora, a título de ITA e ITP, e que estejam devidamente comprovados nos autos (...). (sublinhado e negrito da Recorrente)
61. No entanto, o Tribunal a quo, na Sentença recorrida, faz precisamente o contrário daquilo que defende naquele Despacho, ou seja, não deduz as quantias liquidadas pela Recorrente à Autora, ora Recorrida, a título de indemnização pelos periodos de incapacidade.
62, Quando, na presente data, a Recorrente só deve à Autora, ora Recorrida, a este título e conforme se predisse, a quantia de € 13,43 (treze euros e quarenta e três cêntimos).
63. Era este, pois, o valor que deveria constar da Sentença recorrida e não qualquer outro.
64. Assim, o dispositivo da Sentença recorrida deve ser alterado e modificado neste sentido:
(...) Consequentemente, considerando estes factos provados à luz do direito aplicável, designadamente dos art°s 48°, n°s 1 e 3, alínea c), 71° e 75° da Lei n° 98/2009, de 04.09, condeno a responsável a pagar à sinistrada o capital de remição duma pensão anual e vitalícia de € 261,95, desde 01.10.2016, bem como a quantia de € 6,657,73 — € 6.507,02 (ITA) + € 150,71 (ITP) —, à qual deve ser descontado o valor já liquidado pela responsável à sinistrada (€ 6.644,30), o que dá a quantia de € 13,43, a titulo de indemnização pelos períodos de incapacidade e ainda a quantia de € 30,00 a título de despesas com transportes, acrescidas de juros de mora, à taxa legal, até integral pagamento (...).
65. Ou, se V. Excelências assim não entenderem e considerarem o valor constante na Sentença recorrida (€ 9.740,79) como o valor correcto a título de indemnização pelos períodos de incapacidade, deverá o dispositivo da mesma deve ser alterado e modificado neste sentido:
(...) Consequentemente, considerando estes factos provados à luz do direito aplicável, designadamente dos art°s 48°, n°s 1 e 3, alínea c), 71° e 75° da Lei n° 98/2009, de 04.09, condeno a responsável a pagar à sinistrada o capital de remição duma pensão anual e vitalícia de € 261,95, desde 01.10.2016, bem como a quantia de € 9.740,79 (€9.404,15 + €147,74 + €188,90 — vidé auto de fls. 119), à qual deve ser descontado o valor já liquidado pela responsável à sinistrada (€ 6.644,30), a título de indemnização pelos períodos de incapacidade e ainda a quantia de € 30,00 a título de despesas com transportes, acrescidas de juros de mora, à taxa legal, até integral pagamento (...).
66. A Sentença proferida pelo Tribunal a quo deverá ser, assim, revogada e alterada em conformidade com o peticionado pela Recorrente no presente Recurso.
Termos em que, Deve ser dado provimento ao presente Recurso, revogando-se e alterando-se a douta Sentença recorrida, nos termos e com os fundamentos supra alegados, como é de Lei e de Justiça!»
1.3. Mostra-se lavrado despacho de admissão do recurso (vide fls. 202).
1.4. O Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu Parecer em que opina pela improcedência do recurso. Notificadas as partes, nenhuma delas se pronunciou sobre este Parecer.
Cumprido o disposto na primeira parte do n° 2 do artigo 657° do Código de Processo Civil aprovado pela Lei n.° 41/2013, de 26 de Junho, aplicável ex vi do artigo 87.°, n.° 1, do Código de Processo do Trabalho, e realizada a Conferência, cumpre decidir.
2. Objecto do recurso
O âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente —artigos 635.°, n.° 4 e 639.°, n.°s 1 e 2 do Código de Processo Civil aprovado pela Lei n.° 41/2013, de 26 de Junho, aplicável ex vi do artigo 87.°, n.° 1, do Código de Processo do Trabalho —, ressalvadas as questões de conhecimento oficioso que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado.
Assim, vistas as conclusões do recurso, verificamos que a este tribunal se colocam as seguintes questões, que elencamos por ordem lógica da sua apreciação:
1.ª — da impugnação do ponto 1. da decisão de facto quanto à descrição do acidente de trabalho objecto dos presentes autos;
2ª — da inclusão na decisão de facto dos concretos períodos de incapacidade da Autora e dos valores auferidos pela mesma durante tais períodos de incapacidade;
3ª — da dedução das quantias já liquidadas à recorrida, pela recorrente, a título de indemnização pelos períodos de incapacidade temporária;
4ª — da data a atender para efeitos de cálculo do capital de remição.
3. Fundamentação de facto

3.1. A sentença sob recurso considerou provados os seguintes factos:
1. No dia 05.08.2015, quando exercia a sua profissão de Customer Service Representative ao serviço da entidade patronal TEL..., S.A., em execução de um contrato de trabalho entre ambos vigente, a sinistrada tropeçou e torceu o tornozelo esquerdo, por meio de atropelamento, de que lhe resultaram as lesões e sequelas descritas nos autos, que lhe determinaram a IPP de 3/prct. desde a data da alta em 30.09.2016.
2. À data do acidente, a sinistrada auferia a retribuição anual de € 12.474,06 (€791,87 x 14 meses de remuneração base + €103,84 x 11 de subsídio de alimentação + €20,47 x 12 de prémios de produtividade).
3. A entidade patronal tinha a responsabilidade emergente do acidente de trabalho totalmente transferida para a seguradora supra identificadas, mediante contrato de seguro.
4. A sinistrada teve despesas com transportes a tribunal, no valor de Euros 30,00.
3.2. A primeira questão suscitada no recurso prende-se com a decisão constante do ponto 1. da matéria de facto elencada na sentença.
Alega a recorrente que o acidente de trabalho objecto destes autos se encontra aí erradamente descrito pois não se verificou um atropelamento, pelo que deve retirar-se essa expressão do ponto 1. dos factos provados.
Analisando o auto de tentativa de conciliação de fls. 118 e ss., verifica-se que o ponto 1. dos factos provados relata expressis verbis o que naquele auto foi dito quanto ao modo como ocorreu o acidente, a saber: que a sinistrada foi vítima de um acidente de trabalho ocorrido no dia 05-08-2015 e que este consistiu em ter tropeçado e torcido o tornozelo esquerdo, por meio de atropelamento. Na referida diligência, a sinistrada aceitou os factos descritos como verdadeiros e a seguradora aceitou a existência e caracterização do acidente como de trabalho, nada referindo em contrário daquela descrição.
Verifica-se, contudo, que na petição inicial a sinistrada jamais faz referência a um atropelamento, descrevendo o acidente no respectivo artigo 5.° do seguinte modo: Sucede que, a 05/08/2015, durante o seu horário de trabalho, a A. tropeçou no local de trabalho, tendo caído e, por esse motivo, torceu o tornozelo esquerdo.
Por seu turno a R. na contestação, além de descrever o acidente nos artigos 11.° e 24.° da sua peça processual em termos coincidentes com os usados pela A., vem a aceitar expressamente o alegado no artigo 5.° da petição inicial (cfr. o artigo 19.° da contestação).
Acresce que a forma como é descrito o acidente no auto de tentativa de conciliação de fls. 118-120 não se nos afigura lógica e coerente, pois dificilmente perspectivamos que se tropece por meio de atropelamento, tudo levando a crer que a referência que dele ficou a constar a um atropelamento resulte da descrição do auto de exame médico lavrado nos Serviços do Ministério Público de fls. 79 e que esta, por sua vez, se deveu a um lapso, eventualmente decorrente do aproveitamento informático de um auto referente a outro processo, pois que em nenhum outro momento deste processo se refere ter havido um atropelamento da sinistrada.
Na verdade, um tal evento (o atropelamento) não vem referido na participação inicial da seguradora ao Ministério Público constante de fls. 1 (onde se refere tão só que a sinistrada ao deslocar-se tropeçou e magoou o tornozelo, produzindo entorse), nem no primeiro memorial médico que consta de fls. 17 (que refere um entorse), nem na participação do empregador à seguradora constante de fls. 43 (que refere que a sinistrada ao deslocar-se tropeçou e magoou o tornozelo).
E não lhe é também feita qualquer referência na fase contenciosa dos autos, em que as partes expressam por escrito, e naturalmente com um cuidado acrescido quanto à fidedignidade do que dizem, as suas posições.
Cremos pois que, in casu, o acordo das partes expresso nos articulados deve sobrelevar a descrição constante do auto de tentativa de conciliação (sendo de notar que a seguradora aceitou a existência e caracterização do acidente como de trabalho, mas não fez referência expressa aos concretos termos da sua descrição).
Assim, não obstante a vinculação que emerge do conteúdo fáctico do auto de tentativa de conciliação nos termos que resultam dos artigos 112.°, 131.°, n.° 1, alínea c) e 140.°, n.° 1, do Código de Processo do Trabalho, mas tendo em atenção o disposto nos artigos 249.° do Código Civil e 614.° do Código de Processo Civil quanto à rectificação de erros materiais, bem como o disposto no já referido artigo 131.°, n.° 1, alínea c) do Código de Processo do Trabalho quanto ao relevo do acordo entre as partes expresso nos articulados, entendemos que deve suprimir-se a referência do ponto 1. da decisão ao atropelamento, o que se decide.

3.3. Em sede de decisão de facto, cabe ainda apreciar a inclusão no elenco dos factos dos concretos períodos de incapacidade temporária da Autora e dos valores percebidos pela mesma durante tais períodos.
Não obstante esta questão venha a ser referida sequencialmente pela recorrente em momento ulterior, é patente que a mesma é ainda uma questão de facto. Sem que na sentença constem os factos necessários à conclusão de que a A. esteve afectada de ITA ou ITP, por que períodos o esteve, e quais os valores que a recorrente lhe pagou a tal título, a decisão relativa à correspondente indemnização carece de base factual em que se sustente.
Vejamos pois.
Na tentativa de conciliação, não existiu consenso entre as partes quanto ao resultado do exame médico singular de fls. 79, exame no qual se descreviam, quer os períodos de incapacidade temporária sofridos pela sinistrada e respectivos graus, quer o grau de incapacidade permanente que passou a afectá-la (vide o auto de fls. 118-121).
Quando determinou a adequação processual e decidiu que os autos prosseguissem os seus termos com a realização de Junta Médica, sem necessidade de realização de audiência de discussão e julgamento, a Mma. Juiz a quo enunciou expressamente que caberia à Junta Médica fixar a incapacidade permanente parcial da sinistrada e, bem assim, o(s) período(s) de incapacidade temporária absoluta, referenciando, ainda, que aos valores devidos à sinistrada serão deduzidos aqueles que já tenham sido liquidados pela Seguradora, a título de ITA e ITP, e que estejam devidamente comprovados nos autos (despacho de fls. 77 e verso).
Não obstante tenha determinado a instrução (através de junta médica) quanto aos dois tipos de incapacidade, a sentença sob recurso é absolutamente silente na sua decisão de facto relativamente à afirmação, positiva ou negativa, dos dias em que a ora recorrida esteve afectada de ITA ou de ITP. E nada refere, também, quanto a valores que a seguradora tenha pago à sinistrada a título de incapacidades temporárias.
Verifica-se, pois, insuficiência da matéria de facto para a decisão de direito pelo que, ainda que a seguradora ora recorrente não houvesse suscitado esta questão, sempre ao Tribunal da Relação caberia o dever de, oficiosamente, conhecer deste vício da decisão e alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto ou proceder à sua anulação caso não dispusesse de todos os elementos que permitam a sua alteração nos exactos termos prescritos no artigo 662.°, n.° 2, alínea c) do Código de Processo Civil.
No caso em análise, entendemos que o Tribunal da Relação dispõe dos elementos necessários a proferir decisão de facto sobre esta matéria na medida em que, por força da adequação processual, o processo passou a seguir a tramitação prevista no artigo 138.°, n.° 2 do Código de Processo do Trabalho e a Mma. Juiz a quo, através do despacho de fls. 177 e verso — que foi devidamente notificado às partes e não suscitou a reacção de qualquer delas —, determinou a produção de prova pericial relativamente às incapacidades permanente e períodos de incapacidade temporária e, além disso, explicitou que se deduziriam aos valores devidos à sinistrada a título de ITA e ITP os que estivessem devidamente comprovados nos autos. No mesmo despacho, dispensou-se a realização de audiência de discussão e julgamento (com as inerentes instrução e discussão nos termos disciplinados no Código de Processo Civil).
Realizando-se a junta médica, esta pronunciou-se efectivamente sobre as incapacidades temporárias sofridas pela sinistrada, afirmando que os períodos de incapacidade temporária são os propostos a fls. 79 no auto de exame singular (vide o auto de fls. 196 e 197), ou seja, ITA de 6 de Agosto de 2015 até 9 de Setembro de 2016 e ITP de 30/prct. de 1 O de Setembro até 30 de Setembro de 2016.
É certo que na contestação a R. seguradora alegou que a A. esteve sem incapacidade, entre 18 de Setembro de 2015 e 24 de Janeiro de 2016 e em tratamento nos serviços clínicos da R., mas a verdade é que, após aberta a instrução nos termos específicos determinados no despacho de fls. 177, não fez qualquer esforço no sentido de o demonstrar, apesar de saber que a junta médica se iria debruçar sobre esta questão, sendo de notar que na junta médica realizada o perito por si nomeado subscreveu o auto sem qualquer ressalva, aceitando, pois, que naquele período compreendido entre 18 de Setembro de 2015 e 24 de Janeiro de 2016 a A. esteve afectada de ITA.
Não tem qualquer relevo para estes efeitos a afirmação da R. de que a A. terá estado a trabalhar e a receber o seu salário nesse período. Não só não o afirmou inequivocamente, limitando-se a conjecturar que assim tenha sido (através de uma afirmação hipotética), como, ainda que efectivamente a A. tenha estado a trabalhar, a mera circunstância de se encontrar com incapacidade (ainda que a trabalhar) não liberta a seguradora do dever de reparar o dano, pagando as prestações que correspondem à incapacidade que a afecta.
Seria pois despiciendo proceder à notificação da empregadora para o comprovar, nada justificando que se retome neste momento a fase instrutória para inúteis efeitos, em desconformidade com o disposto no artigo 130.° do Código de Processo Civil.
Assim, não havendo elementos para pôr em causa a conclusão pericial unânime dos Exmos. Peritos, acolhemos o resultado pericial expresso na junta médica e entendemos poder assentar-se que a sinistrada:
• esteve afectada de ITA de 6 de Agosto de 2015 até 9 de Setembro de 2016 e
• esteve afectada de ITP de 30/prct. deli) de Setembro até 30 de Setembro de 2016 (21 dias).
Quanto aos pagamentos efectuados, a seguradora juntou os recibos de fls. 3 a 16 e 53 a 55 (que depois replicou a fls. 167 verso a 175), todos referentes a pagamentos de indemnizações relativas a estes períodos de incapacidade absoluta e parcial, sem que tais documentos tenham sido de algum modo impugnados pela parte contrária que, igualmente, não respondeu à inerente excepção do pagamento, após notificada da contestação em que a mesma foi alegada.
Assim, e quanto a este aspecto, fazendo o cômputo dos enunciados recibos, pode considerar-se provado que a R. pagou à A. o valor global de € 6.644,30 a título de incapacidades temporárias por esta sofridas entre 6 de Agosto de 2015 e 30 de Setembro de 2016.
Facto este que deve acrescentar-se à decisão de facto, procedendo neste aspecto o recurso interposto.
3.4. Os factos a atender para a decisão são, assim, após a intervenção deste Tribunal da Relação, os seguintes:
I. No dia 05.08.2015, quando exercia a sua profissão de Customer Service Representative ao serviço da entidade patronal TEL..., S.A., em execução de um contrato de trabalho entre ambas vigente, a sinistrada tropeçou e torceu o tornozelo esquerdo, de que lhe resultaram as lesões e sequelas descritas nos autos, que lhe determinaram a IPP de 3/prct. desde a data da alta em 30.09.2016.
2. À data do acidente, a sinistrada auferia a retribuição anual de € 12.474,06 (€791,87 x 14 meses de remuneração base + €103,84 x 11 de subsídio de alimentação + €20,47 x 12 de prémios de produtividade).
3. A entidade patronal tinha a responsabilidade emergente do acidente de trabalho totalmente transferida para a seguradora supra identificadas, mediante contrato de seguro.
4. A sinistrada teve despesas com transportes a tribunal, no valor de Euros 30,00.
5. A sinistrada esteve afectada de ITA de 6 de Agosto de 2015 até 9 de Setembro de 2016 (401 dias) e esteve afectada de ITP de 30/prct. de 1 O de Setembro até 30 de Setembro de 2016 (21 dias).
6. A R. pagou à A. o valor global de € 6.644,30 a título de incapacidades temporárias por esta sofridas entre 6 de Agosto de 2015 e 30 de Setembro de 2016.
4. Fundamentação de direito
4.1. Aqui chegados, a resposta às questões de direito que se suscitam reveste-se de patente simplicidade.
Uma vez apurado que o empregador transferiu para a seguradora a sua responsabilidade civil emergente de acidente de trabalho sofrido pela sinistrada tendo em consideração a totalidade dos valores retributivos por esta auferidos, há que atender, no que diz respeito à indemnização pela incapacidade temporária sofrida, ao disposto no artigo 48.°, n.°, 1, alíneas d) e e) da Lei dos Acidentes de Trabalho aprovada pela Lei n.° 98/2009, de 4 de Setembro, segundo as quais:
- nos casos da incapacidade temporária absoluta, a indemnização diária é igual a 70/prct. da retribuição nos primeiros doze meses e a 75/prct. no período subsequente e
- nos casos da incapacidade temporária parcial, a indemnização diária é igual a 70/prct. da redução sofrida na capacidade geral de ganho.
Nos presentes autos ficou provado que a sinistrada esteve com ITA entre 6 de Agosto de 2015 e 9 de Setembro de 2016 (401 dias, dos quais 366 dias nos primeiros doze meses e 35 dias no período restante).
E ficou provado que esteve com ITP de 30/prct. del0 a 30 de Setembro de 2016 (21 dias).
Assim sendo, aplicando os critérios legais supra mencionados, tinha a sinistrada direito, a esse título, a ser paga da quantia global de € 9.610,53, assim calculada:
- € 12.228,42 : 365 dias x 70/prct. x 366 dias = € 8.583,35
- €12.228,42 : 365 dias x 75/prct. x 35 dias = € 879,44
- € 12.228,42: 365 dias x 70/prct. x 30/prct. x 21 dias = € 147,74 Alcançamos assim um total de indemnização por ITA de € 9.610,53.
Uma vez apurado que a recorrente pagou à A. o valor global de € 6.644,30 a título de incapacidades temporárias por esta sofridas entre 6 de Agosto de 2015 e 30 de Setembro de 2016, extinguiu-se nessa exacta medida a sua obrigação nos termos do artigo 762.° do Código Civil, pelo que permanece em dívida o valor de € 2.966,23.
Procede, nesta exacta medida, a apelação da R.

4.2. Resta aferir qual a data a atender para efeitos de cálculo do capital de remição.
Ficou provado nestes autos que as lesões e sequelas sofridas pela sinistrada em consequência do acidente de trabalho sub judice lhe determinaram a IPP de 3/prct. desde 30 de Setembro de 2016 (facto 1.).
Nos termos do preceituado no artigo 50.°, n.° 2 da LAT, [a] pensão por incapacidade permanente é fixada em montante anual e começa a vencer-se no dia seguinte ao da alta do sinistrado.
Tratando-se de pensão a remir obrigatoriamente (artigo 75.°, n.° 1 da LAT), a data a atender para o cálculo do capital da remição deve ser, pois, o dia seguinte ao da alta da sinistrada, a saber, 1 de Outubro de 2016.
Procede, também neste aspecto, a apelação.
4.3. Nos termos do artigo 120.° do Código de Processo do Trabalho e tendo como referência a Portaria n.° 11/2000, de 13 de Janeiro, fixar-se-á o valor da acção em € 6.886,45 [(261,95 x 14,851) + 30,00 + 2.966,23].

4.4. As custas do recurso deverão ser suportadas pela recorrente, na proporção em que ficou vencida, e pela recorrida, que viu reduzidos os valores que a 1.a instância condenou a recorrente a pagar-lhe e, nessa medida, ficou também vencida (artigo 527.°, n.°s 1 e 2, do Código de Processo Civil). Fixa-se essa proporção em metade para cada uma das partes, tendo por referência o seu vencimento, com reflexo no próprio valor da acção. Ter-se-á contudo em consideração que a recorrida não é responsável pelo pagamento de taxa de justiça, uma vez que não contra-alegou (artigo 7.°, n.° 2 do Regulamento das Custas Processuais). Não havendo lugar a encargos no recurso, a sua condenação é restrita às custas de parte que haja.
5. Decisão
Em face do exposto, acorda-se em conceder parcial provimento ao recurso de apelação interposto e, em consequência, altera-se a decisão recorrida condenando-se a CAR..., S.A., a pagar à sinistrada ALC... o capital de remição de uma pensão anual e vitalícia de € 261,95, com vencimento reportado a 1 de Outubro de 2016, a quantia de € 2.966,23 a título de indemnização ainda não paga pelos períodos de incapacidade temporária e a quantia de € 30,00 a título de despesas com transportes, acrescidas de juros de mora, à taxa legal, até integral pagamento.
Mantém-se a sentença da 1•a instância no que diz respeito à absolvição da R. empregadora.
Condenam-se recorrente e recorrida nas custas devidas, na proporção de metade, sendo a condenação da recorrida restrita às custas de parte que haja.
Fixa-se o valor da acção em 6.886,45.
Nos termos do artigo 663.°, n.° 7, do Código de Processo Civil, anexa-se o sumário do presente acórdão.
Lisboa, 17 de Outubro de 2018
(Maria José Costa Pinto)
(Manuela Bento Fialho)
(Sérgio Almeida)
Nos termos do artigo 663.°, n.° 7, do Código de Processo Civil, lavra-se o sumário do antecedente acórdão nos seguintes termos:
I — Sem que na decisão prevista no artigo 138.°, n.° 2 do CPT, constem os factos necessários à conclusão de que o sinistrado esteve afectado de ITA ou ITP, por que períodos o esteve, e, sendo caso disso, quais os valores que a seguradora lhe pagou a tal título, a decisão relativa à correspondente indemnização carece de base factual em que se sustente.
II — A mera circunstância de o sinistrado se encontrar com incapacidade temporária, ainda que a trabalhar e a auferir o seu salário, não liberta a seguradora do dever de reparar o dano, pagando as prestações que correspondem à incapacidade que o afecta.
Lisboa, 17 de Outubro de 2018
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