Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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 - ACRL de 10-04-2018   Cúmulo jurídico. Medida da pena. Liberdade condicional.
No cúmulo jurídico que engloba pena de prisão, cujo período em falta o arguido cumpre em liberdade condicional, verificando-se a integração familiar, social e profissional do arguido e que os factos ocorreram há mais de dez anos, deve a pena única dele resultante ser suspensa na sua execução pelo tempo equivalente à pena que lhe faltaria cumprir, com sujeição aos mesmos deveres equivalentes, mutatis mutandis, fixados aquando da concessão da liberdade condicional e com acompanhamento pelos serviços de reinserção social.
Proc. 3019/17.9T8ALM.L1 5ª Secção
Desembargadores:  Agostinho Torres - João Carrola - -
Sumário elaborado por Ana Paula Vitorino
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NUIPC 3019/17.9T8ALM
ACORDAM EM CONFERÊNCIA OS JUÍZES NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA - 5.ª SECÇÃO (PENAL)
I-RELATÓRIO
1.1- Por acórdão de 25 de Setembro de 2017 foi decidido:
Nos presentes autos de processo comum e com intervenção de Tribunal Colectivo procede-se a cúmulo de penas aplicadas ao arguido,
J..., solteiro, calceteiro, nascido a 29/02/1982 natural da Baixa da Banheira, .filho de J... e de D..., residente na R…, Baixa da Banheira, o qual foi julgado.
01- O arguido foi julgado no processo comum com intervenção do Tribunal Singular n°233/08.IPBMTA que correu termos no 3 Juízo da Moita tendo sido condenado em 30/03/2012 com trânsito em julgado em 9/09/2013 pela prática de um crime de roubo na pena de 2 anos e 8 meses de prisão, por factos cometidos em 6 de Janeiro de 2008, data em que o arguido juntamente com outros três indivíduos abordaram o ofendido A... na Baixa da Banheira, cercando-o, tendo o arguido constrangido a entregar-lhe o seu telemóvel pessoal, havendo revistado o ofendido e lhe retirado a carteira, altura em que uni dos indivíduos desfere uma bofetada na face do ofendido. Na posse da carteira, o arguido e os restantes três indivíduos dirigiram-se à viatura da vítima que ali se encontrava estacionada e depois de revolver o seu interior, de lá retiraram uni leitor de CD's e uma caixa com vários CD's, tendo posteriormente largado no local os referidos objectos (certidão de fls.401 a 13).
2 - O arguido foi julgado no processo comum com intervenção do Tribunal Colectivo n° 1557107.OG BMTA que correu termos no Juízo Central Criminal de Almada tendo sido condenado em 21/03/2012 com trânsito em julgado em 2/05/2013 pela prática de um crime de roubo na pena de 2 anos e 6 meses de prisão, por factos cometidos em 2 de Dezembro de 2007, data em que o arguido juntamente com outros cinco indivíduos abordaram o ofendido na Baixa da Banheira, manietando-o, prendendo-lhe os braços, desferindo-lhe pontapés nas costas, tendo caído no chão, continuando a ser agredido com socos, retirando-lhe uma pulseira, um anel, unta aliança e uma carteira com 200 euros e ainda 2 telemóveis, todos colocando-se em fuga, excepto o arguido que lhe restituiu a carteira somente com os documentos, colocando-se em fuga de seguida (certidão de fls.1062 a 1099).
3 - 0 arguido foi julgado no processo comum com intervenção do Tribunal Colectivo n°239111.3PDBRR que correu termos no 2° Juízo Criminal do Tribunal do Barreiro tendo sido condenado em 17/12/2013 com trânsito em julgado em 29/01/2014 pela prática de um crime de ofensa à integridade física na pena de 9 meses de prisão, substituídos por 270 dias de multa à taxa diária de 5€, que por sua vez foi substituída por 270 horas de trabalho a favor da comunidade, por factos cometidos em 13 de Setembro de 2011. A pena veio a ser extinta pelo cumprimento (certidão delis./ 156 a 1158).
4 - O arguido foi julgado no processo comum com intervenção do Tribunal Colectivo n°1274107.1GBMTA que correu termos no 1' Juízo do Tribunal da Moita tendo sido condenado em 14/10/2010 com trânsito em julgado em 3/11/2010 pela prática de um crime de roubo na pena de 2 anos de prisão com execução suspensa sujeita a regime de prova, por factos cometidos em 27/09/2007, tendo essa pena sido extinta pelo decurso do tempo (certidão de fls.l 101 a 1112).
5 - O arguido foi julgado no processo comum com intervenção do Tribunal Colectivo n°603108.5PBMTA que correu termos no 1 Juízo da Moita tendo sido condenado em 28/09/2009 com trânsito em julgado em 19/05/2009 pela prática de um crime de detenção de arma proibida na pena de 4 meses de prisão, substituídos por 120 dias de multa à taxa diária de 6€, que por sua vez foi substituída por 120 horas de trabalho a favor da comunidade, por factos cometidos em 9 de Julho de 2008. A pena veio a ser extinta pelo cumprimento (certidão de fls.l 114 a 1123).
6 - O arguido foi julgado no processo comum com intervenção do Tribunal Colectivo n°334/06.0PBBRR que correu termos no 1 Juízo Criminal do Barreiro tendo sido condenado em 20/07/2007 com trânsito em julgado em 7/05/2007 pela prática de um crime de furto de uso do veículo em concurso com um crime de furto qualificado na pena única de 2 anos e 7 meses de prisão, cuja execução foi suspensa pelo período de 4 anos, por factos cometidos em 29/03/2006. A pena veio a ser julgada extinta pelo decurso do tempo (certidão de fls.1145 e 1146).
Designado dia para a audiência a que alude o artigo 472 do Código de Processo Penal, veio esta a ter lugar com a observância do formalismo legal, conforme da acta consta.
FACTOS PROVADOS:
1 - O arguido foi julgado no processo comum com intervenção do Tribunal Singular n°233/08.1PBMTA que correu termos no 3 Juízo do Tribunal Judicial da Moita tendo sido condenado em 30/03/2012 com trânsito em julgado em 9/09/2013 pela prática de um crime de roubo na pena de 2 anos e 8 meses de prisão, por factos cometidos em 6 de Janeiro de 2008, data em que o arguido juntamente com outros três indivíduos abordaram o ofendido A... na Baixa da Banheira, cercando-o, tendo o arguido constrangido a entregar-lhe o seu telemóvel pessoal, havendo revistado o ofendido e lhe retirado a carteira, altura em que um dos indivíduos desfere uma bofetada na face do ofendido. Na posse da carteira, o arguido e os restantes três indivíduos dirigiram-se à viatura da vítima que ali se encontrava estacionada e depois de revolver o seu interior, de lá retiraram um leitor de CD's e uma caixa com vários CD's, tendo posteriormente largado no local os referidos objectos (certidão de fls.401 a 13). O arguido cumpriu já parte desta pena de prisão vindo a beneficiar da concessão de liberdade condicional conforme decisão do Tribunal de Execução de Penas (certidão defls. 936 a 942).
O 2 - 0 arguido foi julgado no processo comum com intervenção do Tribunal Colectivo n° 1557/07.OGBMTA que correu termos no Juízo Central Criminal de Almada, J6, tendo sido condenado em 21/03/2012 cora trânsito em julgado em 2/05/2013 pela prática de um crime de roubo na pena de 2 anos e 6 meses de prisão, por factos cometidos em 2 de Dezembro de 2007, data em que o arguido juntamente com outros cinco indivíduos abordaram o ofendido na Baixa da Banheira, manietando-o, prendendo-lhe os braços, desferindo-lhe pontapés nas costas, tendo caído no chão, continuando a ser agredido com socos, retirando-lhe uma pulseira, um anel, uma aliança e uma carteira com 200 euros e ainda 2 telemóveis, todos colocando-se em fuga, excepto o arguido que lhe restituiu a carteira somente com os documentos, colocando-se em fuga de seguida (certidão de fls. 1062 a 1099).
3 - O arguido ,foi julgado no processo comum com intervenção do Tribunal Colectivo n°239111.3PDBRR que correu termos no 2° Juízo Criminal do Tribunal do Barreiro tendo sido condenado em 17/12/2013 com trânsito em julgado em 29/01/2014 pela prática de um crime de ofensa à integridade física na pena de 9 meses de prisão, substituídos por 270 dias de multa à taxa diária de 5€, que por sua vez foi substituída por 270 horas de trabalho a favor da comunidade, por factos cometidos em 13 de Setembro de 2011. A pena veio a ser extinta pelo cumprimento (certidão de fls. 1156 a 1158).
4 - 0 arguido foi julgado no processo comum com intervenção do Tribunal Colectivo n1274/07.1GBMTA que correu termos no 1° Juízo do Tribunal da Moita tendo sido condenado em 14/10/2010 com trânsito em julgado em 3/11/2010 pela prática de um crime de roubo na pena de 2 anos de prisão com execução suspensa sujeita a regime de prova, por factos cometidos em 27/09/2007, tendo essa pena sido extinta pelo decurso do tempo (certidão de fls. 1101 a 1112).
5 - 0 arguido foi julgado no processo comum com intervenção do Tribunal Colectivo n°603/08.SPBNITA que correu termos no 1° Juízo da Moita tendo sido condenado em 28/09/2009 com trânsito em julgado em 19/05/2009 pela prática de um crime de detenção de arma proibida na pena de 4 meses de prisão, substituídos por 120 dias de multa à taxa diária de 6€, que por sua vez foi substituída por 120 horas de trabalho a favor da comunidade, por factos cometidos em 9 de Julho de 2008. A pena veio a ser extinta pelo cumprimento (certidão de fls. 1114 a 1123).
6 - O arguido foi julgado no processo comum com intervenção do Tribunal Colectivo n°334/06.OPBBRR que correu termos no 1 Juízo Criminal do Barreiro tendo sido condenado em 20/07/2007 com trânsito em julgado em 7/05/2007 pela prática de um crime de furto de uso do veículo em concurso com um crime de furto qualificado na pena única de 2 anos e 7 meses de prisão, cuja execução foi suspensa pelo período de 4 anos, por factos cometidos em 29/03/2006. A pena veio a ser julgada extinta pelo decurso do tempo (certidão de fls. 1145 e 1146).
5 - 0 absentismo escolar, coevo de maus tratos de seu pai para sua mãe (estes derivados do consumo de álcool), levou o arguido a terminar apenas o 4 ano de escolaridade.
6 - Cedo iniciou o consumo de haxixe e de álcool em excesso e, mais tarde, de heroína.
7 - 0 arguido desde que saiu em liberdade condicional, em 2015, em trabalhado numa loja de fruta, auferindo mensalmente 650euros..
8 - 0 arguido vive com mulher desempregada e com três filhos com idades compreendidas entre os 2, 5 e 12 anos de idade. Despende 250€ a título de rena de casa.
9 - Também tem o apoio de sua irmã.
10- Muito embora os seus hábitos aditivos, não consome estupefacientes desde há mais de um ano.
Fundamentação da decisão de facto.
O Tribunal formou a sua convicção com base nas certidões que se discriminaram nos factos provados; no CRC de fls.1168 a 1183, assim como nas declarações do arguido prestadas em audiência.
Cumpre decidir.
Na ponderação dos termos do cúmulo a realizar o disposto nos arts.77° e 78° do Cód.Penal determinam os critérios legais definidores daquela aferição.
As penas dos delitos cometidos no tempo decorrido até ao termo do trânsito em julgado são susceptíveis de ser integrados numa única pena, com as vantagens que decorrem de uma análise global da conduta dos arguidos e da sua personalidade, assim se aperfeiçoando a justiça a cominar ao arguido integrada numa só condenação que relacione todos os factos delituais e a sua personalidade aferida em termos globais.
Nos termos do art. 78°n°sl e 2 do Cód.Penal as condenações relacionadas nos factos provados 1 a 5, encontram-se em relação de concurso.
Contudo, somente subsistem as penas das condenações correspondentes aos pontos 1 e 2 dos factos provados em relação de cúmulo, dado que as restantes condenações, reportadas aos pontos 3 a 5 dos factos provados, encontrando-se todas extintas, ou respeitam a penas de diferente natureza, ou a penas de substituição, no caso pena de prisão suspensa na sua execução, mas insusceptível de cúmulo, por já se encontrar extinta.
Operando o cúmulo jurídico das referidas penas parcelares dos diversos crimes, verifica-se que estão sujeitas à operação de cúmulo a realizar nos termos dos arts.77° n°3 e 78° n°l do Cód. Penal, onde
dominam os crimes de roubo, o que agrava as exigências de prevenção especial, assim como os pretéritos hábitos de consumo de estupefacientes pela recidiva inerente, como factor de risco sempre ponderável. Seja como for, o arguido para além de ter beneficiado da concessão de liberdade condicional, com os inerentes juízos de prognose favorável que lhe foram formulados, desde que se encontra em liberdade, tem estado integrado social, familiar e profissionalmente, evidenciando uma personalidade
resiliente na sua recuperação o que em muito abona a seu favor, fazendo diminuir as exigências de prevenção especial, que somente serão detidas no seu reflexo na pena única, pelas exigências de prevenção geral, que, por definição, fixarão o limite mínimo da ponderação, como forma de reforçar o valor jurídico das normas e bens tutelados pelo ordenamento jurídico perante a comunidade.
O arguido sendo de modesta condição sócio-económica, mostra-se empenhado no sustento do seu agregado familiar.
Pelo exposto, considerando os limites abstractos do cúmulo das condenações referidas nos pontos uni e dois dos factos provados, nos termos do art.78° do Cód. Penal, condena-se o arguido J... na pena única de 3 (três) anos e 4 (quatro) meses de prisão.
Após trânsito:
Remeta boletim ao Registo Criminal.
Comunique ao processo referido no ponto 2 dos factos provados, cuja pena integra a decisão de cúmulo dos presentes autos.
Tendo em conta a decisão do TEP de fls.936 a 942 que concedeu liberdade condicional ao arguido no âmbito do cumprimento de pena no processo n°233/08.IPBMTA (integrado neste cúmulo), solicite informação sobre a decisão que venha a recair sobre a situação do arguido, tendo em conta esta decisão de cúmulo tardia (por só agora ter sido suscitada a este Tribunal Central).
1.2 - Desta decisão recorreu o arguido J..., dizendo em conclusões da motivação apresentada:
Ia - A douta decisão cumulatória foi proferida em Setembro de 2017, reconhecendo-se ela mesma como tardia (cfr. penúltimo parágrafo do douto acórdão), e deixando transparecer alguma preocupação com os efeitos negativos que deste carácter tardio podem resultar para os efeitos ressocializadores já verificados em consequência do cumprimento, entretanto verificado, das penas parcelares.
2a -Com efeito, os factos que deram origem às penas cumuladas ocorreram entre 2006 e 2011 e as respectivas decisões transitaram em julgado entre 2007 e 2014; quatro das penas mostram-se extintas, por cumprimento ou decurso do tempo; as duas decisões agora cumuladas transitaram ambas em julgado em 2013.
3.ª- Quanto a uma das penas de prisão efectiva objecto de cúmulo (a pena de dois anos e oito meses de prisão, cominada no processo 233/08.1PBMTA) foi cumprida parcialmente, entre 2013 e 2015 tendo o Arguido saído em Março de 2015 em liberdade condicional.
4a - O Arguido, apesar das suas poucas qualificações literárias (4 classe) e do seu passado prisional, encontra-se desde que saiu em liberdade condicional a trabalhar (com contrato, como o mesmo referiu), tendo-se mantido no mesmo emprego, numa loja de fruta, até ao presente, e mostrando-se, como assinala o douto acórdão (página 5. no final) integrado social. Familiar e profissionalmente- evidenciando uma personalidade resiliente na sua recuperação, o que mudo abona a seu favor.
5a - Refere ainda o douto acórdão que O arguido. sendo de modesta condição socio-económica. mostra-se empenhado no sustento do seu agregado familiar.
6a - Parece-nos que a decisão a proferir, sob pena de cair no absurdo de desliizer a ressoeializacão já conseguida, não pode nem deve ser tomada como se o tivesse sido na altura em que normalmente tal deveria ter ocorrido - deve ser proferida no momento presente. e considerando todos os factos entretanto adquiridos.
7a - A questão que aqui se coloca é se a pena única aqui aplicada será benéfica, de um ponto de vista social e individual, ou se, pelo contrário, será nociva - afigurando-se que a resposta, sem grande esforço de argumentação, é a última.
8a - Com efeito, o arguido refez a sua vida, trabalha e mantém o seu emprego desde Março de 2015, e provê ao sustento da sua família (tendo três filhos de 2, 5 e 12 anos de idade, encontrando-se a mulher desempregada), não se registando qualquer recidiva em comportamento penalmente punível posteriormente à sua libertação.
9.ª - As exigências de prevenção geral c especial bastam-se no caso concreto com a Fixação da pena única no seu limite mínimo. ou seja. na medida 'da mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes (não deixando de se ponderar que foram também cumpridas penas substitutivas de trabalho a favor da comunidade, algumas já em período de cumprimento de prisão) - conforme o disposto no art. 77°, n° 2, do Código Penal - ,
l0.ª - Atendendo-se, na medida da pena, a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele, conforme dispõe o corpo do art. 71 °, n° 2, do CP - norma que deveria ter sido aplicada, e não foi -, sendo aqui sem dúvida de considerar a existência de circunstâncias posteriores que diminuem de forma acentuada a necessidade da pena, e, concretamente, as condições pessoais do agente, a conduta posterior ao Facto. e (decisivamente) a preparação do agente para manter uma conduta lícita - que está efectivamente demonstrada pela sua integração social, laboral e familiar, assinalada na douta decisão recorrida.
11a - Atendendendo às circunstâncias concretas, ao longo tempo decorrido, às penas já cumpridas; visando essencialmente evitar a abertura de urna ferida onde o tecido social já cicatrizou, e a criação de um problema onde ele já não existe. deveria a aplicação do disposto no art. 71 ° do CP conduzir à fixação da pena única no seu limite mínimo.
12a - Deverá assim, no nosso entendimento, a douta decisão recorrida ser revogada, e substituída por outra que fixe a pena única no seu limite mínimo, observando as normas de determinação da medida da pena do art. 71°, n° 2, do Código Penal, em especial, a contrario, e decisivamente, a preparação do agente para manter uma conduta lícita, demonstrada através da efectiva integração social, familiar e laborai reconhecidas naquela decisão.
1.3- Em resposta disse o M°P°, em síntese:
O arguido foi colocado em LC, em 26.03.15, por decisão do TEP, proferida na véspera, a meio da pena de 2A e 8M que expiava, no âmbito do pº 233/08.1PBMTA. Tal pena parcelar, porém, veio a ser englobada, nos presentes autos (1557/07.OGBMTA), pelo Acórdão recorrido, com a parcelar deste processo (2A e 6M), gerando a pena única, recorrida, de 3A e 4M.
O percurso criminal do agente é caracterizado por condenações várias, umas de privação de liberdade, efectivas e suspensas, outras substitutivas, emergindo os crimes de roubo/furto, explicados por dependências aditivas que só recentemente controlou (facto provado 10), existindo sempre um perigo, potencial que seja, de recidiva, que urge prevenir, de que se deu conta o Colectivo, prudentemente.
A pretensão do arguido vai no sentido de manter a liberdade (condicional, por ora), a que a efectivação do cúmulo poderá obstar ou, minimamente, desencadear um regresso à reclusão.
O reforço sancionatório (art 77°,2, CP) traduziu-se em 8 M, bem encostado ao mínimo abstracto da pena única (equivalente à pena parcelar de 2A e 8M, cuja metade cumpriu, saindo em LC após), sem que se descortine desproporção punitiva, atenta a nova condenação (parcelar) que sobreveio, no âmbito dos presentes autos (2 A e 6M), a avaliação conjunta da factualidade (de ambos os pºs cumulados) e a personalidade que essa visão unitária permitiu captar (art 772,1, CP), sempre com os olhos nas finalidades irrenunciáveis da punição (arts 402,1, 712, 1 e 772, CP), que, no seu todo, impediram maior generosidade judicial (3 A e 6M= (8M que a pena parcelar mais grave, de 2A e 8M).
No fundo, ao invés das preocupações e objecções do recorrente, o Colectivo não visou interromper a vigente LC, matéria que nem é da sua competência material (L 115/09, 12.10:CEPMPL), consabidamente, tanto que aditou à condenação inicial (parcelar) um tempo escasso (8 meses), que poderá nem ser expiado (e, no limite, sempre o seria, em regra, apenas na sua metade, 4 M: art 61º,2,a), CP), por um lado, e, por outro, nunca olvidou que o TEP dispõe da válvula do art 62º, CP, que, garantidamente, impedirá, até em função do quadro bastante favorável em que se vem movendo o arguido no meio livre, qualquer reclusão efectiva, (cfr art 188º, L 115/09, 12.10).
Ignorar, pura e simplesmente, a 22 condenação (parcelar: pº 1557/07.OGBMTA) do cúmulo, mantendo a primeira pena singular, seria desprezar uma infracção grave (roubo), idêntica à anterior, até com maior acutilância agressiva sobre a vítima, também grupalmente protagonizada, abandonando interesses da própria punição, qual seja o sinal comunitário de intolerância com actos tão lesivos do sentimento colectivo de segurança, logo num fenómeno que se inscreve na Lei de Política Criminal (cfr L 72/15, 20.07, e art ie,j), CPP).
Razões indeclináveis de prevenção geral impedem esse apagão punitivo, sendo que, afinal, o suplemento sancionatório, muito provavelmente não adquirirá cumprimento efectivo, que apenas emergirá em situação revogatória da LC, impensável no momento actual, em qualquer caso unicamente dependente da vontade do recorrente.
Donde que pugnemos pela manutenção do quantum da pena única, adaptável à manutenção do regime de LC, aliás já comunicado ao TEP, mesmo sem trânsito, para sensibilizar a ponderação (art 62º, CP) devida.
1.4- Admitido o recurso e remetido a esta Relação, o M°P° emitiu parecer no sentido da improcedência do mesmo pelas razões já elencadas pelo seu par na resposta em la instância.
1.5- Após exame preliminar e vistos legais foram remetidos os autos à Conferência, cumprindo agora decidir.
II- CONHECENDO
2.1-0 âmbito dos recursos encontra-se delimitado em função das questões sumariadas pelo recorrente nas conclusões extraídas da respectiva motivação, sem prejuízo do dever de conhecimento oficioso de certos vícios ou nulidades, designadamente dos vícios indicados no art. 410°, n.°2 do CPP.
Tais conclusões visam permitir ou habilitar o tribunal ad quem a conhecer as razões de discordância do recorrente em relação à decisão recorrida.
Assim, traçado o quadro legal temos por certo que as questões levantadas no recurso são cognoscíveis no âmbito dos poderes desta Relação.
2.2-Está em discussão para apreciação , em síntese, a seguinte questão:
A pena única deveria ter sido fixada no limite mínimo equivalente à pena em concurso mais grave dada a prognose positiva de ressocialização já sinalizada na sequência da colocação do arguido em liberdade condicional?
2.3- A POSIÇÃO DESTE TRIBUNAL
2.3.1- Vejamos então o caso dos autos:
1.0 arguido foi julgado no processo comum com intervenção do Tribunal Singular n°233/08.1 PBMTA que correu termos no 3° Juízo da Moita tendo sido condenado em 30/03/2012 com trânsito em julgado em 9/09/2013 pela prática de um crime de roubo na pena de 2 anos e 8 meses de prisão, por factos cometidos em 6 de Janeiro de 2008,
2.0 arguido foi julgado no processo comum com intervenção do Tribunal Colectivo n°1557/07.OGBMTA que correu termos no Juízo Central Criminal de Almada tendo sido condenado em 21/03/2012 com trânsito em julgado em 2/05/2013 pela prática de um crime de roubo na pena de 2 anos e 6 meses de prisão, por factos cometidos em 2 de Dezembro de 2007,
3 . 0 arguido foi julgado no processo comum com intervenção do Tribunal Colectivo n°239/11.3PDBRR que correu termos no 2° Juízo Criminal do Tribunal do Barreiro tendo sido condenado em 17/12/2013 com trânsito em julgado em 29/01/2014 pela prática de um crime de ofensa à integridade física na pena de 9 meses de prisão, substituídos por 270 dias de multa à taxa diária de 5€, que por sua vez foi substituída por 270 horas de trabalho a favor da comunidade, por factos cometidos em 13 de Setembro de 2011. A pena veio a ser extinta pelo cumprimento
4. 0 arguido foi julgado no processo comum com intervenção do Tribunal Colectivo n°1274/07.1GBMTA que correu termos no 1° Juízo do
Tribunal da Moita tendo sido condenado em 14/10/2010 com trânsito em julgado em 3/11/2010 pela prática de um crime de roubo na pena de 2 anos de prisão com execução suspensa sujeita a regime de prova, por factos cometidos em 27/09/2007, tendo essa pena sido extinta pelo decurso do tempo
5. 0 arguido foi julgado no processo comum com intervenção do Tribunal Colectivo n°603/08.5PBMTA que correu termos no 1° Juízo da Moita tendo sido condenado em 28/09/2009 com trânsito em julgado em 19/05/2009 pela prática de um crime de detenção de arma proibida na pena de 4 meses de prisão, substituídos por 120 dias de multa à taxa diária de 6€, que por sua vez foi substituída por 120 horas de trabalho a favor da comunidade, por factos cometidos em 9 de Julho de 2008. A pena veio a ser extinta pelo cumprimento
6. O arguido foi julgado no processo comum com intervenção do Tribunal Colectivo n°334/06.OPBBRR que correu termos no 1° Juízo Criminal do Barreiro tendo sido condenado em 20/07/2007 com trânsito em julgado em 7/05/2007 pela prática de um crime de furto de uso do veículo em concurso com um crime de furto qualificado na pena única de 2 anos e 7 meses de prisão, cuja execução foi suspensa pelo período de 4 anos, por factos cometidos em 29/03/2006. A pena veio a ser julgada extinta pelo decurso do tempo.
Assim:
A pena veio a ser extinta pelo cumprimento nos proc°s n°239/11.3PDBRR e n°603/08.5PBMTA
A pena veio a ser extinta pelo decurso do tempo nos proc°s n°334106.OPBBRR, e n°1274/07.1GBMTA,
2.3.2- Nos presentes autos os crimes em análise respeitam a factos cometidos entre 6 de Janeiro de 29/03/2006 e 13 de Setembro de 2011
A primeira decisão com trânsito em julgado ocorreu 7/05/2007 e a última a 29/01/2014 (-Nuipc239/11...,) pela prática de um crime de ofensa à integridade física- pena de 9 meses de prisão, substituídos por 270 dias de multa à taxa diária de 5€, que por sua vez foi substituída por 270 horas de trabalho a favor da comunidade, por factos cometidos em 13 de Setembro de 2011-pena essa extinta pelo cumprimento)
Os factos essenciais em cúmulo e mais relevantes para este efeito foram cometidos entre Janeiro de 2008 e 2 de Dezembro de 2007, com último trânsito em julgado em 2013.
São respeitantes a crimes de roubo pelos quais foram aplicadas penas
de 2 anos e 8 meses de prisão, por factos cometidos em 6 de Janeiro de 2008 e 2 anos e 6 meses de prisão, por factos cometidos em 2 de Dezembro de 2007.
O tribunal , na ponderação do cúmulo jurídico, dada a relação de concurso, considerou que:
- 0 arguido desde que saiu em liberdade condicional, em 2015, tem trabalhado numa loja
de fruta, auferindo mensalmente 650euros.., vive com mulher desempregada e com três filhos com idades compreendidas entre os 2, 5 e 12 anos de idade, despende 250€ a título de rena de casa, também tem o apoio de sua irmã e muito embora os seus hábitos aditivos, não consome estupefacientes desde há mais de um ano.
- somente subsistem as penas das condenações correspondentes aos pontos 1 e 2 dos factos provados em relação de cúmulo, dado que as restantes condenações, reportadas aos pontos 3 a 5 dos factos provados, encontrando-se todas extintas, ou respeitam a penas de diferente natureza, ou a penas de substituição, no caso pena de prisão suspensa na sua execução, mas insusceptível de cúmulo, por já se encontrar extinta.
- dominam os crimes de roubo, o que agrava as exigências de prevenção especial, assim como os pretéritos hábitos de consumo de estupefacientes pela recidiva inerente, como factor de risco sempre ponderável. Seja como for, o arguido para além de ter beneficiado da concessão de liberdade condicional, com os inerentes juízos de prognose favorável que lhe foram formulados, desde que se encontra em liberdade, tem estado integrado social, familiar e profissionalmente, evidenciando uma personalidade resiliente na sua recuperação o que em muito abona a seu favor, fazendo diminuir as exigências de prevenção especial, que somente serão detidas no seu reflexo na pena única, pelas exigências de prevenção geral, que, por definição, fixarão o limite mínimo da ponderação, como forma de reforçar o valor jurídico das normas e bens tutelados pelo ordenamento jurídico perante a comunidade.
- O arguido sendo de modesta condição sócio-económica, mostra-se empenhado no sustento do seu agregado familiar.
Avulta pois a consideração da actual situação do arguido em liberdade condicional e a sua situação sócio-profissional e familiar.
Os factos relevantes ocorreram há mais de 10 anos, ainda que revestindo a gravidade do crime de roubo, cujas exigências de prevenção especial e gerais eram e ainda se revelam prementes.
Há uma acentuada mitigação, no tempo, das relativas à prevenção especial e uma vez que o arguido se mostra em processo de ressocialização com sinais de alguma estabilidade profissional e familiar e colocado desde 2015 em liberdade condicional.
A pena mínima, a mais grave (face às regras do concurso em causa) foi de 2 anos e 8 meses.
O tribunal a quo, perante a outra pena, de 2 anos e 6 meses, operou o cúmulo apenas acrescentando à mais grave mais 8 meses, ou seja cerca de 1/4 da pena menos grave.
Reconheceu o carácter tardio do cúmulo.
O arguido foi colocado em liberdade condicional no proc.° 233/08.1PBMTA (com condenação em 2 anos e 8 meses de prisão) com efeitos desde 26-03-2015 pelo tempo que faltaria cumprir ainda, até 26/7/2016.
Assim, teria cumprido metade da pena aplicada nesse processo.
A concessão de liberdade condicional não pode ser inferior a metade da pena aplicada (art°.61° n°2 do CP)
O recorrente pretende a fixação da pena única (resultante da fusão jurídica com a outra parcelar, provinda do p9 1557/07.OGBMTA, esta cifrada em 2 A e 6M) no limite mínimo abstractamente possível (art 77°,2, CP, isto é, em 2 A e 8M), só assim se precludindo ou prevenindo, eficazmente, o risco de regresso ao meio prisional.
Informa o MP que (...)sensibiliza-nos, pela fundamentada e exposta razão, a preocupação do arguido, que se vê exposto a ter que voltar à vida penitenciária, quando, tudo o indica, e disso faz eco o Acórdão cumulatório posto em crise, abriu, de há algum tempo, porventura já antes da LC, um novo ciclo pessoal, claramente pro-normativo e consolidado, quebrando com um passado de crimes, basicamente contra o património, e de problemas aditivos, esforçando-se, para tanto, por adquirir competências pessoais e outras durante a reclusão, cuja utilização muito lhe conveio na bem sucedida reintegração social.(...)
Porém, a fim de evitar a reclusão do arguido, propõe o MP se do mecanismo previsto no art.° 62.° do CP.
Este dispõe sobre adaptação à liberdade condicional no sentido em que (...)para efeito de adaptação à liberdade condicional, verificados os pressupostos previstos no artigo anterior, a colocação em liberdade condicional pode ser antecipada pelo tribunal, por um período máximo de um ano, ficando o condenado obrigado durante o período da antecipação, para além do cumprimento das demais condições impostas, c/o regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância.
Este normativo deve ser conjugado com o art.° 188° n°7 da Lei u.° 115/2009, de 12 de Outubro (CÓDIGO DA EXECUÇÃO DAS PENAS E MEDIDAS PRIVATIVAS DA LIBERDADE)
(..)
7 - A execução da adaptação à liberdade condicional em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, é efectuada de acordo com os artigos 183.° a 186.° e nos demais termos previstos na lei, devendo os serviços de reinserção social:
a) Imediatamente após a libertação do recluso, proceder à instalação dos meios técnicos de controlo à distância, comunicando-a ao tribunal de execução das penas;
b) No termo do período de adaptação à liberdade condicional, retirar os meios técnicos de controlo à distância, comunicando-o ao tribunal de execução das penas.
Ora, não estando o arguido em regime de reclusão, porquanto em liberdade condicional, seria uma mera ficção estar a pensar numa adaptação a uma situação de LC quando afinal já dela beneficia. Depois, estando a trabalhar, aquela modalidade implicaria uma retenção domiciliária com vigilância electrónica incapacitante da deslocação laboral e fortemente afectante do mencionado percurso de reintegração
Cremos que a ultrapassagem deste problema se resolve pela necessidade ou não de aplicação da pena única.
Na verdade, fixar um cúmulo jurídico apenas no limite da pena mais grave seria um passar de esponja violador das exigências de censura e de prevenção quer gerais quer especiais.
Por isso, os critérios de cúmulo gizados não nos parecem incorrectos nem exagerados.
Mas, assim, o arguido teria de voltar ao ambiente prisional o que, em face da forte sinalização ressocializadora do seu processo de integração, seria de todo injusto e inaceitável.
Encontramos porém outra via para satisfazer as exigências de censura e prevenção em compaginação com os níveis de ressocialização já conseguidos: o da suspensão da pena única aplicada, nos termos do art.° 50.° n.° 1 e 5 do CP
Para o efeito, o arguido ficará nesse regime durante 2 (dois) anos, tempo equivalente à pena que lhe faltaria cumprir, com sujeição ao mesmos deveres equivalentes, mutatis mutandis, fixados quando da atribuição da liberdade condicional e com acompanhamento pelos serviços de reinserção social.
III- DECISÃO
3.1 - Pelo exposto, julga-se o recurso parcialmente provido suspendendo apenas a pena única fixada nos termos e regime e com os deveres anteriormente enunciados, pelo período de 2 (dois) anos.
Lisboa, 10 de Abril de 2018
Os Juízes Desembargadores
(texto elaborado em suporte informático , revisto e rubricado pelo relator - (art° 94° do CPP)
Agostinho Torres
João Carrola
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