Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
Actualidade | Jurisprudência | Legislação pesquisa:


    Jurisprudência da Relação Laboral
Assunto    Área   Frase
Processo   Sec.                     Ver todos
 - ACRL de 21-03-2018   Acidente de trabalho. Pensão. Remissão. Incidente de revisão.
Atribuída que foi uma pensão em consequência de acidente de trabalho, pensão essa obrigatoriamente remida, se, por força de incidente de revisão, essa pensão vier a ser aumentada, sendo, ainda assim, igualmente remível, o responsável deverá suportar o pagamento da diferença entre ambos os capitais de remição.
Proc. 546/07.0TTSNT.L1 4ª Secção
Desembargadores:  Manuela Fialho - Sérgio Manuel de Almeida - -
Sumário elaborado por Susana Leandro
_______
Proc° 546/07.OTTSNT Comarca de Lisboa Oeste Juízo do Trabalho de Sintra
Acordam na secção social do Tribunal da Relação de Lisboa:
F... - COMPANHIA DE SEGUROS, SA, entidade responsável, com sede no Largo do Calhariz, 30, em Lisboa, notificada da sentença, com a qual não se conforma, vem dela interpor recurso.
Pede a respetiva revogação.
Conclui como segue:
1. O pagamento da pensão não pode corresponder ao capital de remição de uma pensão anual e vitalícia de 757,15€, sem prejuízo da dedução da parte já antes remida.
2. Com efeito, de acordo com o ensinamento que se colhe da jurisprudência é que ao valor da pensão que serviu de base ao cálculo do capital de remição já pago, deve ser abatido ao valor da pensão agora fixada e não o montante do capital de remição já pago.
3. A sinistrada já foi indemnizada pelas pensões que teria direito até ao final da vida decorrente da IPP inicialmente fixada de 5/prct., através da entrega do capital de remição, sendo esta remição o resgate da pensão que receberia até ao final da vida, através da entrega imediata de uma quantia.
4. Estando resgatada a pensão devida ao sinistrado até ao fim da vida correspondente à IPP de 5/prct. inicialmente fixada, não podia a Mma Juíza a quo deixar de proceder à dedução no valor da nova pensão o valor da pensão já remida.
5. Ao invés ordenou o pagamento à sinistrada do capital de remição de uma pensão anual e vitalícia de 757,15€, sem prejuízo da dedução da parte já antes remida, o que não é a mesma coisa e conduz a resultados diferentes.
6. Como a sinistrada é atualmente portadora da IPP de 7/prct., corresponde-lhe uma pensão anual e vitalícia de 757,15€.
7. Mas, como já foi remida a pensão de 540,82€, correspondente à IPP de 5/prct., então, à pensão anual e vitalícia de 757,15€, haverá que descontar a pensão já remida de 540,82€, resultando, assim, que a pensão anual e vitalícia devida à sinistrada é de 216,33€.
8. A douta sentença sob recurso viola a lógica do sistema reparatório explanado na LAT, os princípios gerais de direito, a noção e o sentido da remição, o princípio da justa reparação dos acidentes de trabalho estabelecido no art.° 59 n.° 1 alínea f) da CRP, o disposto nos artigos 1° n. 1, 23° e 25° da lei 100/97 de 13/09.
O MINISTÉRIO PÚBLICO contra-alegou pugnando pela manutenção do decidido.

Para melhor nos situarmos exaramos, abaixo, um breve resumo dos autos.
F... - Companhia de Seguros, S. A., entidade responsável nos autos emergentes de acidente de trabalho acima identificados, veio deduzir incidente de revisão da incapacidade da sinistrada A....
Alegou que a mesma sofreu agravamento das sequelas já desvalorizadas com 5/prct. de IPP.
Foi realizado exame médico que concluiu pelo agravamento com proposta de IPP de 7/prct..
Foi proferida decisão que veio a ser anulada por despacho proferido pelo Tribunal a quo, que invocou lapso na respetiva colocação no sistema.
Concomitantemente proferiu-se nova decisão que considera o(a) sinistrado(a) afetado(a) da IPP de 7/prct., desde o pedido de revisão, a 21 de abril de 2017, condenando-se a responsável a pagar-lhe o capital de remição de uma pensão anual e vitalícia de € 757,15 (setecentos e cinquenta e sete euros e quinze cêntimos) desde aquela data, sem prejuízo da dedução da parte já antes remida.

As conclusões delimitam o objeto do recurso, o que decorre do que vem disposto nos Art.° 608°/2 e 635°/4 do CPC. Apenas se exceciona desta regra a apreciação das questões que sejam de conhecimento oficioso.
Nestes termos, considerando a natureza jurídica da matéria visada, é a seguinte a questão a decidir, extraída das conclusões:
- Como já foi remida a pensão de 540,82€, correspondente à IPP de 5/prct., então, à pensão anual e vitalícia de 757,15€, haverá que descontar a pensão já remida de 540,82€, resultando, assim, que a pensão anual e vitalícia devida à sinistrada é de 216,33€.

O DIREITO:
Em causa nos presentes autos está apenas o segmento da decisão que condena a responsável a pagar o capital de remição de uma pensão anual e vitalícia de € 757,15, sem prejuízo da dedução da parte já antes remida.
Defende a Recrte. que o valor da pensão que serviu de base ao cálculo do capital de remição já pago, deve ser abatido ao valor da pensão agora fixada e não o montante do capital de remição já pago. Ou seja, como a sinistrada é atualmente portadora da IPP de 7/prct., corresponde-lhe uma pensão anual e vitalícia de 757,15€, mas, como já foi remida a pensão de 540,82€, correspondente à IPP de 5/prct., então, à pensão anual e vitalícia de 757,15€, haverá que descontar a pensão já remida de 540,82€, resultando, assim, que a pensão anual e vitalícia devida à sinistrada é de 216,33€.
Contrapõe o Ministério Público que nos termos do disposto no artigo 47° n° 1 al. c) da Lei 98/2009 as prestações em dinheiro previstas na al. b) do artigo 23° compreende a indemnização em capital (por um lado) e pensão (por outro lado) por incapacidade permanente. Depois, o artigo 75° n° 1 da mesma lei estabelece a obrigatoriedade da remição das pensões. Ou seja, se a pensão em causa não se integra dentro da previsão do artigo 75° n° 1, então aquilo que é devido ao sinistrado é realmente uma pensão anual e vitalícia. Já no caso de a pensão se integrar dentro da previsão daquele preceito (mais precisamente, quando o sinistrado tem uma incapacidade parcial inferior a 30/prct. e/ou a pensão anual e vitalícia não excede seis vezes o valor da retribuição mínima garantida) então aquilo que é devido ao sinistrado não é uma pensão anual é vitalícia, mas antes o capital de remição de uma pensão anual e vitalícia. No seguimento desta lógica reparatória, quando surge a reavaliação da situação de um sinistrado de que resulta o agravamento da sua incapacidade e, em consequência, a reformulação da compensação que lhe é devida, aquilo em que a entidade responsável é condenada reporta-se ao pagamento do capital de remição de uma pensão anual e vitalícia. E, sendo certo que anteriormente outro capital de remição foi pago, calculado este sobre uma pensão de menor valor por respeitar a menor incapacidade permanente parcial, então importa efetuar esta subtração.
Vejamos!
Compulsada a decisão que se debruçou sobre o incidente de revisão, constatamos que a mesma não encerra qualquer factualidade.
Como é comumente aceite pela jurisprudência as regras substantivas para apreciação ,da revisão da incapacidade deverão ser as que vigoravam à data do acidente de trabalho.
No caso concreto, estando apenas em causa o segmento decisório supra referenciado, a decisão a proferir passa, ainda assim, necessariamente, pela ponderação das regras vigentes no momento da ocorrência do acidente incapacitante.
Compulsados os autos apuramos, a partir da tentativa de conciliação levada a cabo durante a fase conciliatória do processo (inicial), que o acidente ocorreu em 2/01/2007 ali se tendo proposto o pagamento de um capital de remição de uma pensão anual vitalícia de 540,82€ em consequência de IPP de 5/prct..
Aceite que foi a proposta, veio o acordo celebrado a ser homologado por sentença proferida em 29/10/2007. ,l
Partiremòs, pois, dos dados ali consignados para a análise se se impõe.
A primeira consequência a retirar de tais dados é que à decisão da questão em apreciação, colocada no âmbito do incidente de revisão, se aplicarão as regras vigentes à data do acidente, ou seja,. ao Lei 100/97 de 13/09 e o DL 143/99 de 30/04.
Em presença de tais diplomas legais sempre que do acidente resultar redução na capacidade de trabalho ou ganho do sinistrado, este terá direito, quando em presença de incapacidade permanente parcial inferior a 30/prct., a um capital de remição de uma pensão anual e, vitalícia (Art° 17°/1-d) da Lei).
Quando se verifique modificação da capacidade de ganho do sinistrado proveniente de agravamento da lesão que deu origem à reparação... as prestações poderão ser revistas e aumentadas... de harmonia com a alteração verificada (Art° 25°/1 da Lei).
Em presença do disposto no Art° 56°/1-b) do DL 143/99 são obrigatoriamente remidas as pensões anuais devidas a sinistrados por incapacidade permanente parcial inferior a 30/prct..
E a remição não prejudica o direito de o sinistrado requerer a revisão da sua pensão (Art° 58°/b) do DL).
Isto posto, parece certo que em presença de uma incapacidade inferior a 30/prct. o sinistrado tem direito a uma pensão cujo valor é necessariamente remido, sendo o capital de remição um modo de liberar do pagamento, especialmente aplicável ao caso.
Na situação que nos ocupa foi atribuída ao sinistrado o capital de remição de uma pensão anual vitalícia no valor de 540,82 o que significa que à incapacidade que lhe foi reconhecida cabia uma pensão deste valor.
Revista que foi a sua incapacidade, e tendo a mesma sofrido agravamento de 5 para 7/prct., assiste-lhe agora direito (também a um capital de remição de) uma pensão no valor de 757,15€ (valor não impugnado e que, por isso mesmo, não se discutirá).
Consignou-se na decisão sob recurso que este valor é devido sem prejuízo da dedução da parte já antes remida .
E é contra este segmento que se insurge a Apelante, defendendo que o valor da pensão que serviu de base ao cálculo do capital de remição já pago, deve ser abatido ao valor da pensão agora fixada e não o montante do capital de remição ja pago.
Tendo já sido pago um capital de remição com base numa pensão anual de 540,82€ e resultando agora que é devida, em face do agravamento, uma pensão de 757,15€, afigura-se-nos líquido que é devida a diferença entre o valor de capital apurado a partir da data de referência atual (21/04/2017) e o valor já pago.
Ou seja, deverá apurar-se o capital de remição da pensão anual vitalícia de 757,15, deduzindo-se do respetivo valor o montante pago a título de capital de remição da pensão de 540,82€.
Isto porque não é de nova pensão que se trata. É antes da mesma pensão, agora apurada com base num distinto pressuposto - o agravamento.
Discordamos, pois, da Apelante quando alega que a pensão anual devida à sinistrada deverá ser fixada na quantia de 216,33€, valor que corresponde à diferença entre a pensão de 757,15€ pela IPP de 7/prct. e a pensão já remida de 540,82€, devida pela IPP inicialmente fixada de 5/prct..
Tal como alega o Ministério Público quando surge a reavaliação da situação de um sinistrado de que resulta o agravamento da sua incapacidade e, em consequência, a reformulação da compensação que lhe é devida, aquilo em que a entidade responsável é condenada reporta-se ao pagamento do capital de remição de uma pensão anual e vitalícia. E, sendo certo que anteriormente outro capital de remição foi pago, calculado este sobre uma pensão de menor valor por respeitar a menor incapacidade permanente parcial, então importa efetuar esta subtração.
São, pois, distintos os pressupostos em que assenta o caso concreto quando comparados com aqueles a que se reporta quer o Ac. da RE mencionado em sede alegatória, quer o desta Relação, porquanto o que ali está pressuposto são formas distintas de pagamento da pensão, formas essas que há que harmonizar (o que aqui não ocorre).
E, conforme se .antevê não subscrevemos inteiramente quanto se decidiu no Ac. desta Relação, também invocado pela Apelante, acórdão que parte do princípio de que o capital de remição extingue o direito à pensão.
Ora, do nosso ponto de vista a pensão remida, podendo ser revista e aumentada - vide Art° 25°/1 da LAT e 58°/b) do DL regulamentar- não está extinta. Não deixa de ser significativo que o DL 143/99 se reporte ao direito do sinistrado a rever a sua pensão ainda que tenha havido remição.
Com o pagamento do capital de remição a parte desobriga-se do cumprimento. Porém, na medida em que o direito à pensão que nasce por efeito do acidente pode vir a ser revisto, não há extinção.
Assim, fixado um valor de pensão que, por força da lei, é obrigatoriamente remido, se tal valor vier a ser revisto por força do incidente de revisão, a pensão é a mesma, só que com distinta expressão numérica.
E, neste circunstancialismo as razões subjacentes à necessidade de harmonização dos modos de pagamento,' invocadas na jurisprudência citada, não subsistem.
Nenhuma censura merece, pois, a sentença.
Em conformidade com o exposto; acorda-se em julgar a apelação improcedente e, em consequência, confirmar a sentença.
Custas pela Recorrente.
Notifique.
Elabora-se o seguinte sumário:
Atribuída que foi uma pensão em consequência de acidente de trabalho, pensão essa obrigatoriamente remida, se, por força de incidente de revisão, essa pensão vier a ser aumentada, sendo, ainda assim, igualmente remível, o responsável deverá suportar o pagamento da diferença entre ambos os capitais de remição.
Lisboa, 21-3-2018
MANUELA BENTO FIALHO
Sérgio Almeida
Francisco Mendes
   Contactos      Índice      Links      Direitos      Privacidade  Copyright© 2001-2024 Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa