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    Jurisprudência da Relação Laboral
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 - ACRL de 10-01-2018   Contraordenação. Condutor Independente. Livrete Individual de Controlo.
I – Em presença do disposto no artigo 49º, n.º 2, da lei 14.09, deve, com fundamento na manifesta necessidade de melhoria da aplicação do direito, aceitar-se o recurso de uma decisão judicial que manteve uma coima de 306,00€ se, estando em causa a aplicabilidade de uma portaria, a decisão da autoridade administrativa consigna de forma contraditória, a respectiva aplicabilidade e não aplicabilidade, o Tribunal pressupõe que a mesma é aplicável e, da aplicabilidade da dita portaria podem resultar consequências para uma generalidade de trabalhadores, visto que, nestas circunstâncias, se impõe a clarificação do direito vigente.
II – O tipo legal contraordenacional previsto no artigo 7º, da Lei 117/2012, de 05.06 pressupõe a prova da condução por condutor independente não sujeito a aparelho de controlo em violação de alguma das alíneas do seu número um.
Proc. 562/17.3T8LSB.L1 4ª Secção
Desembargadores:  Manuela Fialho - Sérgio Manuel de Almeida - -
Sumário elaborado por Margarida Fernandes
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Tribunal da Relação de Lisboa
4.ª Secção (Social)
Proc° 562/17.3T8LSB
Acordam na secção social do Tribunal da Relação de Lisboa:
I..., impugnante no recurso de contraordenação, não se conformando com a sentença, vem da mesma interpor recurso ao abrigo do disposto no Art° 49°/2 da Lei 107/2009 de 14/09.
Pede a revogação da decisão e, preliminarmente, em requerimento fundamentado, a admissibilidade do recurso tendo em vista a melhoria da aplicação do direito e a promoção da uniformidade da jurisprudência.
Funda-se nas seguintes conclusões:
QUESTÃO PRÉVIA:
1. Os autos têm origem num recurso de contraordenação laboral;
2. Foi o Impugnante, ora Recorrente, acusado de: ...Em 21/10/2014, pelas 16h15, na via pública. arruamento, na Praça Marechal Humberto Delgado, 1500-044 São Domingos de I3enfica, em Lisboa, o Arguido mantinha a circular o veículo automóvel ligeiro de passageiros, em serviço de aluguer (Táxi), com a matrícula 54-ET-53, conduzido por I…, estando em serviço e à disposição cio publico, na praça da citada artéria, apresentando os dispositivos luminosos de táxi ligados, e em que o Motorista, na qualidade de gerente da empresa Arguida, não possuía o Livrete Individual de Controlo (LIC), para o registo da sua atividade como motorista... (negrito nosso - Vide Proposta de Decisão):
3. A admissibilidade do presente recurso depende de requerimento prévio a invocar que a revisão pretendida se afigura necessária à
melhoria da aplicação do direito e/ou promoção da uniformidade da jurisprudência, conforme consagrado no n° 2 do art° 49º do RCLSS;
4. Desde logo, o Recorrente entende, em consonância com a associação do setor a que pertence, a ANTRAL, que o LIC não se aplica ao setor dos táxis;
5. Posteriormente, a ACT publicou uma circular a determinar em que circunstâncias os motoristas estariam abrangidos pela obrigatoriedade do uso do LIC, conforme Ofício - Circular n.° 12/DirACT/14 (vide doc. n.°1);
6. Essa circular, e demais legislação, é exclusivamente canalizada ou, se se quiser, destinada aos motoristas na qualidade de trabalhadores dependentes;
7. Acresce que, no caso sub judice, nem sequer estamos a falar de um trabalhador, ou motorista mas, sim, cio próprio proprietário do táxi, ou sejà, era empresário em nome individual;
I. Da Melhoria da Aplicação do Direito :
8. Conforme referido, o motorista, e ora Recorrente, I..., sujeito à fiscalização que deu origem aos presentes autos, é o proprietário do veículo fiscalizado, ou seja, é Empresário em Nome Individual;
9. Com efeito, a Lei, quanto a esta matéria, não deixa margem para d ávidas, ou seja, não existe qualquer obrigatoriedade, nem de LIC, nem d.e horário de trabalho, quando o veículo é conduzido pelo, sócio e gerente da sociedade detentora de alvará, in casu, em nome individual;
10. Com efeito, a obrigação de publicitação do mapa de horário de trabalho, ou do LIC:, não se verifica relativamente a qualquer condutor mas, sim, e apenas aquele que tenha a qualidade de trabalhador dependente;
11. Ora, na ausência da figura de TRABALHADOR DEPENDENTE não poderia haver imposição legal do uso do LIC. Aliás, existe vasta e unânime jurisprudência neste sentido, conforme adiante veremos;
12. Assim, e sempre, com todo o imenso respeito, a douta sentença, ora recorrida, merece o presente recurso em virtude de se afigurar a necessidade de uma melhoria da aplicação do Direito, uma vez que, ao não existir qualquer relação laborai entre o motorista e o proprietário (que é o mesmo indivíduo) não vemos como, entre ele (s), pode existir uma qualquer relação laboral;
II. Da Promoção da Uniformidade da Jurisprudência:
13. Conforme referido, impõe-se. também, a revisão da douta sentença na medida em que, vai contra anteriores decisões judiciais emanadas sobre a situação em crise, ou seja, o LIC não é aplicável ao sector táxi;
14. Nesta vasta jurisprudência, é referido que o LIC não é aplicável nos casos em que os motoristas sejam sócios e/ou gerentes das empresas de táxi, conforme doutas e sábias sentenças;
15. Ora, no caso sub judice, o Recorrente não era, nem sócio e gerente nem, tinha constituído qualquer empresa de táxi nem, sequer tinha motoristas ao serviço. Apenas, era Empresário em Nome Individual;
16. Assim, salvo melhor entendimento, a legislação citada sobre o uso do LIC, não é aplicável ao setor táxi pois, os motoristas que exercem esta profissão não são trabalhadores móveis, nos termos previstos na alínea d) do artigo 2° elo Decreto-Lei n.° 237/2007. de 19 de Junho:
17. Pelo que, tal ausência de imposição legal, isenta todo o setor de táxi da obrigatoriedade da utilização do LIC;
18.E, admitindo-se, por mera hipótese de raciocínio, que se aplica ao setor, a verdade é que, nem nesse caso poderia prevalecer a douta sentença recorrida, uma vez que, o motorista fiscalizado, e autuado, era empresário em nome individual;
19. Deste modo, os presentes autos de recurso adquirem uma dimensão acrescida na medida em que os mesmos se mostram manifestamente necessários à melhoria da aplicação do direito, e também, e sobretudo, revela-se fundamental para a promoção da uniformidade da jurisprudência, conforme previsto no art.° 49°, n° 2, e 50° do RCLSS.
O MINISTÉRIO PÚBLICO contra motivou começando por se insurgir contra a admissibilidade do recurso porquanto, segundo afirma, não se verificam os respetivos requisitos legais. Quanto ao fundo, defendeu que a sentença não merece qualquer reparo.
Já nesta Relação o Ministério Público acompanhou o teor das contra motivações.

A Autoridade para as Condições de Trabalho julgou praticada pelo Arguido uma infração prevista no Art°. 7°, n° 3, por referência aos n°s 1 e 2, do Art°. 7° do D.L. n° 117/2012 de 05/06, conjugado com os Art° 1° a 3° da Portaria n° 983/2007 de 27/08, e punida pelo Art°. 555°, n° 3 do CT, pelo que lhe aplicou uma coima no montante de € 306,00.
O arguido, I..., veio impugnar tal decisão, concluindo a pedir a revogação da mesma.
Procedeu-se à audiência de julgamento, finda a qual se veio a proferir sentença que julgou improcedente a impugnação e manteve a coima aplicada.

Das conclusões apresentadas extraem-se as seguintes questões a decidir:
1 a - O recurso deve ser admitido?
2a - A legislação citada sobre o uso de livrete individual de condução não é aplicável ao setor táxi?

QUESTÃO PRÉVIA - A admissibilidade do recurso
O arguido foi condenado pela Autoridade Administrativa pela prática de uma contraordenação com uma coima de 306,00€, coima esta mantida pelo Tribunal recorrido.
E desta decisão judicial que vem interposto o presente recurso.
Efetivamente, como é pacífico nos autos, dado o valor da coima ser inferior a 25UC, o recurso, atento o disposto no n° 1 do Art° 49° da Lei 107/2009 de 14/09, está inviabilizado.
Porém, de acordo com o n° 2 do mesmo dispositivo legal, pode o Tribunal da Relação, a requerimento do arguido ou do Ministério Público, aceitar o recurso da decisão quando tal se afigure manifestamente necessário à melhoria da aplicação do direito ou à promoção da uniformidade da jurisprudência.
Conforme defende António Beça Pereira a propósito da correspondente norma constante do Art° 72°/2 do DL 433/82 de 27/10 (RGCO), nestes casos, para além do recurso propriamente dito, há um requerimento prévio no qual se terão que alegar factos demonstrativos da manifesta necessidade de melhorar a apreciação do direito ou de promover a uniformidade da jurisprudência (Regime Geral das Contraordenações e Coimas, l0a ed°, 213).
E, neste mesmo sentido, se lavrou, em 20/02/2017, na RG, decisão segundo a qual O recurso excecional previsto no art° 49°, n° 2, da Lei n° 107/2009, de 14.09, pressupõe que, independentemente da indicação desta norma no respetivo requerimento de interposição, o arguido ou o Ministério Público aleguem em concreto as razões da necessidade de melhoria da aplicação do direito e da promoção da uniformidade da jurisprudência.
Assim, nesta fase prévia não se trata de aquilatar do bem ou mal fundado da decisão recorrida, mas sim da manifesta necessidade de melhorar a aplicação do direito ou de promover a uniformização jurisprudencial.
No caso vertente pretende-se que o recurso é necessário à melhoria da aplicação do direito e à promoção da uniformidade jurisprudencial.
A fundamentar a primeira alega-se que o livrete individual de controlo não se aplica ao setor dos táxis, posição que também foi perfilhada pela ACT numa primeira fase, que, após, veio a emitir uma circular destinada a motoristas na qualidade de trabalhadores dependentes, qualidade que o arguido não possui visto ser proprietário do veículo fiscalizado. Assim, não impende sobre o mesmo qualquer obrigação legal de uso do documento em crise.
Para sustentar a promoção da uniformidade da jurisprudência avança com diversas decisões judiciais de acordo com as quais, alegadamente, o livrete individual de controlo não é aplicável ao setor táxi.
Da literalidade da norma que exceciona o direito ao recurso decorre a necessidade de alegação e convencimento de que o mesmo é, não só necessário, mas manifestamente necessário quer à melhoria da aplicação do direito, quer à promoção da uniformidade da jurisprudência.
O conceito de manifesta melhoria da aplicação do direito destina-se a tutelar interesses de ordem pública, da estabilidade da aplicação da lei ou da igualdade dos cidadãos que poderiam ser afetados nos casos em que a decisão não satisfizesse alguma das condições previstas no n° 1 (Abrantes Geraldes, Recursos no Processo de Trabalho, Novo Regime, 2010, 169 e 170).
À semelhança do que ali se estipula, também o CPC, contém norma semelhante, desta feita para permitir a revista excecional, defendendo-se que relativamente às situações em que esteja em causa questão jurídica cuja apreciação, pelo seu relevo, seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito, naturalmente não basta atentar no interesse subjetivo da parte que, tendo ficado vencida, pretenda a intervenção do STJ. O recurso deve ser reservado para questões que, no critério do próprio STJ, justifiquem o terceiro grau de jurisdição, atento o seu efeito preventivo ou reparador de polémicas jurisprudenciais ou doutrinais.
A sua concretização no foro laboral pode verificar-se em face de questões submetidas a soluções diversas causadoras de forte perturbação ou insegurança ou quando surja legislação nova geradora de dúvidas interpretativas que, afetando negativamente os destinatários diretos da decisão recorrida, sejam suscetíveis de se repercutir na resolução de casos semelhantes (ob. cit., 108).
A Relação de Coimbra, em acórdão proferido em 09/12/2010 decidiu que deve entender-se que só se observa a referida manifesta necessidade quando da decisão impugnada se observe um erro jurídico grosseiro, incomum, uma errónea aplicação do direito bem visível, assim não sucedendo perante uma mera discordância quanto à aplicação do direito (Proc° 51/10.7 TTMR.C1, disponível no sítio www.trc.pt e em www.dgsi.pt/jtrc). Por sua vez, a Relação do Porto decidiu já que a admissibilidade de recurso para melhoria da aplicação do direito, nos termos do Art° 49°/2 da Lei 107/2009 de 14/09, depende da existência da manifesta necessidade de prevenir solução jurídica evidentemente grosseira, errada, indigna ou que comporte efeitos particularmente graves (Ac. de 24/09/2012, www.dgsi.p ). Por seu turno, a Relação de Guimarães decidiu que ...podemos concluir que é de aceitar o recurso quando na decisão recorrida o erro avultar de forma categórica e, pela dignidade da questão, pelos importantes reflexos materiais que a solução desta comporte para os por ela visados e generalidade que importe na aplicação do direito, seja inexoravelmente preciso corrigir aquele (Ac. RG 8/11/2004, Proc° 1073/04.1).
No caso concreto está em perspetiva a condenação por uma contraordenação prevista pelo Art° 7° do DL 117/2012 de 5/06.
Dispõe-se aqui que:
1 - O condutor independente não sujeito ao aparelho de controlo previsto no Regulamento (CEE) n.° 3821/85, de 20 de dezembro de 1985, alterado pelo Regulamento (CE) n.° 561/2006, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de março de 2006, ou previsto no AETR, deve:
a) Registar os tempos de trabalho e os intervalos de descanso;
b) Conservar os suportes dos registos durante cinco anos após o termo do período a que se referem, à disposição das entidades com competência fiscalizadora.
2 - A forma do registo a que se refere o número anterior é estabelecida por portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas laboral e dos transportes.
3 - Constitui contraordenação grave a violação do disposto no n.° 1.
A motivar a admissibilidade do recurso tendo na sua base a manifesta necessidade de melhoria da aplicação do direito alega o Recrte. que não é trabalhador, mas sim proprietário do táxi que conduzia, razão pela qual sobre ele não impende qualquer obrigação legal de uso do documento denominado livrete individual de controlo e que a Portaria atinente a este livrete - Portaria 983/2007 de 27/08 - apenas é aplicável a trabalhadores integrando uma relação de emprego.
Na sentença recorrida defendeu-se a aplicabilidade desta Portaria como traduzindo a mesma o ato reportado no n° 2 do Art° 7° do DL 117/2012.
Considerando que a matéria pode ter reflexos numa generalidade de trabalhadores, que a própria decisão administrativa refere, a um passo, que tal Portaria não tem aplicação ao caso (pg. 6) e a outro que a forma de registo em causa é a estabelecida pela Portaria 983/2007 de 27/09 (pg. 7), entendemos que se justifica o conhecimento do objeto do recurso por ser manifestamente necessário melhorar a aplicação do direito de modo a clarificar o regime vigente.
Por outro lado, ainda se invoca a necessidade de promoção de uniformização da jurisprudência, para o que se anexam cópias de cinco decisões proferidas por tribunais de 1a instância (duas da Comarca de Viseu, e três da de Lisboa).
De entre estas apenas as da Comarca de Viseu (Proc° 1010/16.1T8VIS e 2265/16.7T8VIS) reportam situação idêntica à dos autos: condução por trabalhador por conta própria. E, contrariamente à decisão sob recurso, concluíram que é pressuposto de aplicação da referida Portaria a existência de uma relação laboral.
Nos restantes casos a factualidade é distinta. Num deles discutiu-se se o trabalhador era um trabalhador móvel (Proc° 2457/15.6T8BRR), noutro se o trabalhador era independente (Proc° 281/17.0T8LSB) e noutro se o trabalhador mantinha alguma relação com a arguida (Proc° 12064/16.0T8LSB).
O conhecimento do recurso tendo por pressuposto a promoção da uniformidade da jurisprudência requer, não só que a decisão proferida se revele diversa de outras relativamente à mesma questão de direito, mas também que seja manifesta a necessidade de promover a uniformização.
Sobre a manifesta necessidade de promover a uniformização o requerimento de interposição do recurso nada diz, não se nos afigurando que baste a afirmação da existência de duas decisões em sentido oposto à dos autos e que se acene com outras que se debruçaram sobre matéria não coincidente.
Assim, por falta de alegação dos necessários fundamentos revela-se, deste último ponto de vista, inviável a admissibilidade do recurso.
Porém, conforme já dissemos, aceita-se o mesmo tendo em vista a manifesta necessidade de promoção da melhoria da aplicação do direito.

FACTOS PROVADOS:
A la instância declarou provados os seguintes factos:
A) - Em 27/10/2014, foi levantada a participação de fls. 5 contra o arguido, ora impugnante, imputando-lhe a prática de uma infração prevista no art. 216°, n°s 1, 4 e 5, com referência aos arts 1° e 2° da Portaria n° 983/2007 de 27/08, do CT e punida pelo art. 554°, n° 2, do mesmo diploma legal, porquanto, no dia 21/10/2014, pelas 16:15 horas, no decurso de ação de fiscalização na Praça Marechal Humberto Delgado, em Lisboa, foi verificado que o arguido, ora impugnante, na qualidade de gerente, conduzia o veículo ligeiro de passageiros, matrícula …, de sua propriedade, sem que registasse a sua atividade no Livro Individual de Controlo (LIC).
B) - Por despacho proferido em 03/10/2016, que consta de fls. 11 dos autos e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, foi alterada a qualificação jurídica dos factos descritos no auto de notícia, ao abrigo do disposto no art. 358°, n° 3, do CPP, considerando que os mesmos integram a prática, pelo arguido, do ilícito contraordenacional previsto na al. a) do n° 1 e n° 2 do art. 7° do D.L. n° 117/2012 de 05/06, conjugado com o n° 1 do art. 1° e art. 3° da Portaria n° 983/2007 de 27/08, e punido pelo art. 554°, n° 2, al. b), do CT.
C) - O arguido, ora impugnante, foi notificado, para os efeitos dos arts. 28° e 29° da Lei n° 107/2009 de 14/09, por ofício cuja cópia consta de fls. 21 dos autos e que aqui se dá por integralmente reproduzida, datado de 14/10/2016.
D) - O arguido, ora impugnante, apresentou resposta escrita, nos termos expressos a fls. 27 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
E) - Em 16/11/2016, foi elaborada a proposta de decisão de fls. 37 a 46 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzida.
F) - Por despacho da Diretora da Autoridade para as Condições de Trabalho, datado de 16/11/2016, foi proferida a decisão impugnada, a qual consta de fls. 36 dos autos e que aqui se dá por integralmente reproduzida, que aplicou ao arguido, ora impugnante, uma coima no montante de € 306,00.
G) - O arguido, ora impugnante, foi notificado da decisão, referida em F), por oficio cuja cópia consta de fls. 35 dos autos e que aqui se dá por integralmente reproduzida, datado de 22/11/2016.
F) - O arguido, ora impugnante, na data da fiscalização (21/10/2014), conduzia a viatura (…), na qualidade de empresário em nome individual, não estando subordinado a vínculo laboral com qualquer entidade, e, desde 01/03/2012, encontra-se na situação de reformado por velhice ao abrigo do regime geral, sem descontar para a segurança social como trabalhador por conta de outrem.

O DIREITO:
Aqui chegados cumpre analisar a questão que enunciámos em segundo lugar: A legislação citada sobre o uso de livrete individual de condução não é aplicável ao setor táxi?
A questão só é relevante na medida em que se imputa ao Arguido, ora Recrte., a comissão de uma contraordenação p.p. pelo Art° 7° do DL 117/2012 de 5/06 e 555°/3 do CT.
Dispõe-se no Art° 7°/1 do DL 117/2012, no que para o caso releva, que o condutor independente não sujeito ao aparelho de controlo previsto no Regulamento (CEE) n.° 3821/85, de 20 de dezembro de 1985, alterado pelo Regulamento (CE) n.° 561/2006, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de março de 2006, ou previsto no AETR, deve registar os tempos de trabalho e os intervalos de descanso.
A forma do registo acima referida é estabelecida por portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas laboral e dos transportes (n° 2 do Art° 7°)
Defendeu-se na sentença recorrida que esta Portaria é a que tornou o n° 983/2007 de 27/08, portaria essa que, segundo o sue próprio articulado, regulamentou as condições de publicidade dos horários de trabalho do pessoal afeto à exploração de veículos automóveis propriedade de empresas de transportes ou privativos de outras entidades sujeitas às disposições do Código do Trabalho, aplicando-se ainda a trabalhadores afetos à exploração de veículos automóveis não sujeitos ao aparelho de controlo no domínio dos transportes rodoviários.
Em causa nos autos está a ausência de livrete individual de controlo, livrete este que o Art° 3° da Portaria dispôs ser necessário ao registo do tempo de trabalho efetuado pelos trabalhadores referidos no n° 1, ou seja, aqueles cujas condições acima mencionámos.
A conclusão pela prática da contraordenação passa, pois, pela prova dos factos que integram o tipo legal contraordenacional, a saber, ser o condutor, por um lado, condutor independente não sujeito a aparelho de controlo e, por outro, não ter registado os tempos de trabalho e intervalos pelo modo legalmente estabelecido.
Isto importará concluir pela regulamentação do n° 1 do Art° 7° da Lei 117/2012 de 5/06 através da Portaria 983/2007 de 27/08, o que permitirá, por sua vez, concluir pela necessidade de livrete individual de controlo, mas também, e previamente, que possamos concluir acerca de alguma omissão a este respeito por parte do condutor.
Ora, compulsado o acervo fático, de relevante para o caso temos apenas o ponto F (o segundo) de acordo com o qual o arguido, ora impugnante, na data da fiscalização (21/10/2014), conduzia a viatura (…), na qualidade de empresário em nome individual, não estando subordinado a vínculo laboral com qualquer entidade, e, desde 01/03/2012, encontra-se na situação de reformado por velhice ao abrigo do regime geral, sem descontar para a segurança social como trabalhador por conta de outrem.
Corno é bom de ver daqui não emerge qualquer violação ao disposto no Art° 7°/ 1.
É certo que se lhe imputou conduzir, na qualidade de gerente, o veículo ligeiro de passageiros, de sua propriedade, sem que registasse a sua atividade no Livro Individual de Controlo.
Mas, não só esta imputação não vem a merecer resposta de provado ou não provado, como ainda o único facto cuja prova se obteve e que poderá relevar na apreciação da questão submetida a juízo é contraditório com quanto lhe era imputado. Aqui (em sede de impugnação judicial) diz-se que o Arguido conduzia na qualidade de empresário em nome individual; ali (vide decisão administrativa e participação) na qualidade de gerente.
Segundo o disposto no Art° 51°/1 da Lei 107/2009 de 14/09, em princípio a segunda instância apenas conhece da matéria de direito. Porém, mesmo nestes casos, o recurso pode ter como fundamentos, desde que o vício resulte do texto da decisão recorrida, a insuficiência para a decisão da matéria de facto provada (Art° 4100/2 do CPP), podendo a decisão de recurso anular a decisão do tribunal recorrido e devolver-lhe o processo (Art° 51 °/2-b) da Lei 107/2009 de 14/09).
Em causa nos presentes autos está uma contraordenação por violação do disposto no mencionado Art° 7°/1-a), por referência Portaria 983/2007 de 27/08.
Segundo aquele Art° 7°/1-a) ao condutor independente não sujeito ao aparelho de controlo é imposta a obrigação de registar os tempos de trabalho e os intervalos de descanso, constituindo a violação desta obrigação contraordenação (n° 3).
Ora, não parece que possa imputar-se a prática de uma contraordenação fundada neste dispositivo legal sem que do acervo fático resulte claramente o que é que o arguido, empresário individual ou gerente (?) deixou de fazer. E, mais ainda, urge que de tal acervo resultem elementos que permitam enquadrá-lo na categoria de condutor independente não sujeito a aparelho de controlo.
Só a partir do preenchimento de tais elementos objetivos do tipo se poderá avançar na discussão trazida a recurso, a saber, se a Portaria, na parte em que prevê a necessidade de uso do livrete individual de controlo, é ou não aplicável ao setor táxi.
Em face do exposto, consideramos insuficiente a matéria de facto provada e, nessa medida, não sendo possível decidir a causa, determina-se o reenvio do processo para novo julgamento relativamente aos concretos elementos de facto acima assinalados



Em conformidade com o exposto, acorda-se em:
a) Aceitar o recurso com vista à melhoria da aplicação do direito e
b) Anular a decisão e reenviar o processo para novo julgamento, conforme sobredito.
Notifique.
Elabora-se o seguinte sumário:
1 - Em presença do disposto no Art° 49°/2 da Lei 107/2009 de 14/09, deve, com fundamento na manifesta necessidade de melhoria da aplicação do direito, aceitar-se o recurso de uma decisão judicial que manteve uma coima de 306,00€ se, estando em causa a aplicabilidade de uma portaria, a decisão da autoridade administrativa consigna, de forma contraditória, a respetiva aplicabilidade e a não aplicabilidade, o Tribunal pressupõe que a mesma é aplicável e, da aplicabilidade da dita portaria podem resultar consequências para uma generalidade de trabalhadores, visto que, nestas circunstâncias, se impõe a clarificação do direito vigente.
2 - O tipo legal contraordenacional previsto no Art° 7° da Lei 117/2012 de 5/06 pressupõe a prova da condução por condutor independente não sujeito a aparelho de controlo em violação de alguma das alíneas do seu número um.
Lisboa, 10-01-2018
MANUELA BENTO FIALHO
Sérgio Almeida
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