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 - ACRL de 25-01-2018   Regulação das Responsabilidades Parentais. Critério orientador.
O critério orientador da decisão relativa ao exercício das responsabilidades parentais é o interesse da criança. Portanto, o que importa é assegurar a solução que melhor favoreça um equilibrado e são desenvolvimento da criança e não a solução que mais agrade a um ou aos dois progenitores. E, obviamente, para se aferir o modelo que melhor favoreça o bom desenvolvimento da criança não pode deixar de se tomar em conta as características concretas de ambos os pais e da própria criança, endógenas e exógenas, não perdendo de vista o relacionamento e a capacidade de diálogo que os progenitores apesar de separados, conseguem manter.
A menor tem treze anos de idade e necessita de estabilidade e de uma rotina diária com regras simples e bem definidas de forma a permitir um crescimento harmonioso. Para isso, muito contribui o montante mensal que o pai deve pagar a título de prestação de alimentos. A menor vive com a mãe que suporta sozinha todas as despesas com a educação e sustento da menor, tendo ambos (mãe e pai) igualdade de situação económica.
Proc. 7368/15.2T8LRS-B.L1 8ª Secção
Desembargadores:  Ilídio Martins - Teresa Prazeres Pais - -
Sumário elaborado por Susana Leandro
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Proc.° n° 7368115.2T8LRS-B.L1
Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa
1 - RELATÓRIO
Nos autos de Regulação do Exercício das Responsabilidades Parentais relativos à menor C..., nascida a 29.04.2004, em que é requerente C... e requerido L..., a mãe alegou que apenas ganha o ordenado mínimo nacional, como funcionária de limpeza do Hospital dos Capuchos, e que o mesmo é insuficiente para assegurar o sustento da sua família (filhos). O requerido não contribui para as despesas com a educação da menor e sabe que a requerente tem grande dificuldade em fazer face a todas as despesas da sua filha menor, o que só consegue graças ao auxílio dos seus familiares mais próximos. Mais alegou que, atenta a situação financeira da requerente extremamente débil, devida ao seu parco rendimento mensal e aos encargos diários suportados com as despesas referentes à sua habitação e ao sustento da sua filha menor, urge a fixação, com a máxima urgência, e ainda que a título provisório, de uma prestação de alimentos, a favor da menor C..., em valor não inferior a €150,00, acrescida de metade das despesas de educação de saúde.
Na Conferência de Pais a que se refere o artigo 35° da Lei n° 141/2015, de 8 de Setembro (RGPTC) e que teve lugar no dia 28 de Março de 2017, não foi possível a obtenção de um acordo que permitisse solucionar o objecto desta acção, subsistindo divergências entre os pais no que respeita ao montante da pensão alimentícia para a C....
Nessa conferência foi proferida DECISÃO que fixou um regime provisório, designadamente a título de pensão de alimentos à menor, nos seguintes termos:
1- Considerando o disposto no artigo 38°, alínea b) do RGPTC, decide-se suspender neste momento a conferência e remeter as Partes para audição técnica especializada, devendo oficiar-se à Unidade Tutelar Cível da Segurança Social para que inicie as diligências entendidas por convenientes, enviando para melhor compreensão da situação concreta cópias das peças processuais de fls. 2 a 5, 16-17 e do presente auto de conferência.
2- Sem embargo dos escassos elementos existentes no processo até à data decide-se para já, provisoriamente, no interesse da C... o seguinte:


a) A C... fica confiada à guarda e cuidados de sua mãe com quem residirá, competindo em comum aos pais da Menor o exercício das responsabilidades parentais no que respeita às questões de particular importância para a vida da C....
b) O pai da C... terá a filha na sua companhia aos sábados, devendo recolher a mesma em casa da mãe entre as 10:00H e as 10:30M e entrega-la no mesmo local entre as 21:00 e 21:30 desse dia.
c) O pai da C... pagará a título de pensão alimentícia para o sustento da filha a quantia mensal de € 175,00, até ao dia 8 de cada mês e por meio de transferência bancária para a conta que seja movimentada pela mãe da C....
Não se conformando com tal decisão, dela recorreu o requerido, tendo formulado as seguintes
CONCLUSÕES:
A- O requerido não concorda com o valor que foi fixado na alínea c) do n.° 2 do despacho proferido pelo tribunal a quo, a título de pensão de alimentos, em virtude da quantia fixada exceder a sua capacidade económica.
B- O despacho que fixou provisoriamente as responsabilidades parentais, no tocante à pensão de alimentos, limitou-se a enunciar o seguinte: O pai da C... pagará a título de pensão alimentícia para o sustento da filha a quantia mensal de 175,00€, atá ao dia 8 de cada mês e por meio de transferência bancária para a conta que seja movimentada pela mãe da C....
C- No referido despacho não se indica qualquer juízo justificativo para a aplicação de tal valor a título de pensão de alimentos, o que determina que o despacho proferido seja nulo por falta de fundamentação, nos termos do preceituado nos artigos 154°, n.° 1 e 2 e 615°, n.° 1, alínea b) do CPC.
D- De acordo com o preceituado nos artigos supra citados, o julgador deve fundamentar tanto no plano fáctico, como no plano jurídico, a decisão provisória por si proferida.
E- Não o fazendo, como sucede no presente caso, tal determina que o despacho proferido deverá ser declarado nulo por força do disposto no artigo 615°, n.° 1, alínea b) do CPC.
F- O despacho proferido carece, em absoluto, de fundamentação, pelo que violou o disposto nos artigos 154°, n.° 1 e 2 e 615°, n.° 1, alínea b) do CPC.
G- A fundamentação das decisões dos tribunais, que não sejam de mero expediente, tem imposição constitucional (Artigo 205° n° 1, da Constituição da República Portuguesa), tal é a importância que a lei lhe concede, como garantia integrante do próprio conceito de Estado de direito democrático, enquanto instrumento de ponderação e legitimação da própria decisão judicial e de garantia do direito ao recurso.
H- Acresce que o requerido aufere mensalmente apenas o valor correspondente ao salário mínimo nacional - € 557,00.
I- Tendo que suportar todos os meses o pagamento da quantia de € 200,00 para pagar metade do valor da renda de casa onde habita com a sua actual companheira M....
J- Para além da renda da casa o requerido tem ainda que suportar as despesas com a sua alimentação, vestuário, água, luz, gás e outras despesas domésticas.
K- 0 requerido em função da sua capacidade económica apenas pode pagar a título de pensão de alimentos a quantia de € 75,00.
L- A medida de alimentos de uma criança depende das necessidades do alimentando e das possibilidades do alimentante, devendo estas últimas ser aferidas pelas suas receitas e despesas, sem deixar de salvaguardar o seu direito a uma subsistência com um mínimo de dignidade.
M-Sendo que o tribunal, mesmo nos processos de jurisdição voluntária, como são os processos tutelares cíveis, não se pode limitar a decidir a questão fixando o montante dos alimentos, sem fundamentar devidamente a sua decisão.
N- Cabe sempre ao tribunal apurar, ainda que de forma sumária, os factos tidos por indispensáveis à decisão a proferir.
O- Na falta de outros elementos, que não seja o valor da pensão pedida pela requerente e o valor que o requerido se diz em condições de pagar, deve o tribunal fixar a prestação em causa, a título provisório, de acordo com o valor indicado pelo obrigado quando este permita garantir-lhe uma subsistência com um mínimo de dignidade e, ao mesmo tempo, salvaguardar as necessidades da menor, tendo em conta o indiciado nível socioeconómico dos pais e a circunstância da mãe também estar obrigada a prestar alimentos à filha.
Termina, pedindo que seja revogada a decisão que fixou o regime provisório sobre as responsabilidades parentais relativamente à C..., no que toca à fixação de alimentos, proferida na conferência de pais efectuada no dia 28 de Março de 2017.
O Ministério Público contra-alegou, pugnando pela confirmação da decisão recorrida. Dispensados os vistos, cumpre decidir.
II -FUNDAMENTAÇÃO
A) Fundamentação de facto
A matéria de facto relevante é que resulta do relatório que antecede.
B) Fundamentação de direito
As questões colocadas e que este tribunal deve decidir, nos termos dos artigos 663° n° 2, 608° n° 2, 635° n° 4 e 639° n°s 1 e 2 do novo Código de Processo Civil, são as seguintes:
- Nulidade do despacho;
- A questão de direito.
NULIDADE DO DESPACHO
Argumenta o apelante que o despacho é nulo por falta de fundamentação, nos termos do preceituado nos artigos 154° n° 1 e 2 e 615° n° 1 alínea b) do CPC.
Cumpre decidir.
Dispõe o artigo 615° n° 1 alínea b) do Código de Processo Civil que a sentença é nula quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão.
No caso dos autos, como consta do Auto de Conferência de Pais de 28.03.2017, estamos perante a aplicação do disposto no artigo 38° da Lei n° 141/2015, de 8 de Setembro, que aprovou o Regime Geral do Processo Tutelar Cível (RGPTC).
Não tendo os pais chegado a acordo o juiz decidiu provisoriamente sobre o pedido em função dos elementos já obtidos e remeteu as partes para a audição técnica especializada a que refere a alínea b) do artigo 38°.
Aquela decisão provisória teve por base os escassos elementos existentes no processd' e teve em conta o interesse da C...'.
Por outro lado, estamos no âmbito dos processos em que vigoram os princípios orientadores da simplicidade instrutória e a oralidade, a consensualização e a audição e participação da criança - artigo 4° n° 1 alíneas a), b) e c) da Lei 141/2015.
Estes processos tutelares cíveis são urgentes (art° 13°) e têm a natureza de jurisdição voluntária (art° 12°).
0 artigo 987° do Código de Processo Civil, a propósito do critério de julgamento nos processos de jurisdição voluntária, preceitua que nas providências a tomar, o tribunal não está sujeito a critérios de legalidade estrita, devendo antes adoptar em cada caso a solução que julgue mais conveniente e oportuna.
É ainda aplicável, com as necessárias adaptações, o disposto no artigo 607°, ex vi dos artigos 295° e 986° n° 1. Todavia, neste tipo de decisões provisórias, como se deixou dito, o juiz não está vinculado aos critérios de estrita legalidade prevista naquele artigo 607° sob pena de comprometer a finalidade da diligência e comprometer a natureza urgente do processo.
Terminando, para concluir, diremos que a decisão provisória em causa não é nula e, por isso, não viola o disposto no artigo 615° n° 1 alínea b) do Código de Processo Civil.
A QUESTÃO DE DIREITO
No regime provisório foi fixado que o ora apelante, pai da C..., pagará a título de pensão alimentícia para o sustento da filha a quantia mensal de € 175,00, até ao dia 8 de cada mês e por meio de transferência bancária para a conta que seja movimentada pela mãe da C....
Entende o apelante que, em função da sua capacidade económica, apenas pode pagar a título de pensão de alimentos a quantia de € 75,00 mensais.
Cumpre decidir.
Preceitua o n° 1 do artigo 2007° do Código Civil que enquanto se não fixarem definitivamente os alimentos, pode o tribunal, a requerimento do alimentando, ou oficiosamente se este for menor, conceder alimentos provisórios, que serão taxados segundo o seu prudente arbítrio.
A requerente alega que alega que ganha apenas o ordenado mínimo nacional, como funcionária de limpeza do Hospital dos Capuchos, e que o mesmo é insuficiente para assegurar o sustento da sua família (filhos), sendo auxiliada pelos seus familiares mais próximos, Mais alega que o requerido não contribui para as despesas com a educação da menor.
O requerente alegou na apelação que aufere mensalmente apenas o valor correspondente ao salário mínimo nacional (€ 557,00), tendo de suportar todos os meses o pagamento da quantia de € 200,00 para pagar metade do valor da renda de casa onde habita com a sua actual companheira M.... Para além da renda da casa o requerido tem ainda que suportar as despesas inerentes à sua alimentação, vestuário, água, luz, gás e outras despesas domésticas.
O critério orientador da decisão relativa ao exercício das responsabilidades parentais é o interesse da criança. Portanto, o que importa é encontrar a solução que melhor favoreça um equilibrado e são desenvolvimento da criança e não a solução que mais agrade a um ou aos dois progenitores. E, obviamente, para se aferir o modelo que melhor favoreça o bom desenvolvimento da criança não pode deixar de se tomar em conta as características concretas de ambos os pais e da própria criança, endógenas e exógenas, não perdendo de vista o relacionamento e a capacidade de diálogo que os progenitores apesar de separados, conseguem manter.
A C... tem, nesta data, treze anos de idade e parece-nos evidente que necessita de estabilidade e de uma rotina diária com regras simples e bem definidas de forma a permitir um crescimento harmonioso. Para isso, muito contribui o montante mensal que o pai deve pagar a título de prestação de alimentos. A menor vive com a mãe que suporta sozinha todas as despesas com a educação e sustento da menor (no dia 29.04.2018 fará 14 anos), tendo ambos (mãe e pai) igualdade de situação económica.
Assim, ponderando os factos, que são escassos, entendemos que a primeira instância decidiu com acerto e razoabilidade no tocante à fixação do regime provisório a título de pensão alimentícia.
III - DECISÃO
Atento o exposto, julga-se improcedente a apelação, confirmando-se a sentença recorrida. Custas pelo apelante.
Lisboa,
Ilídio Sacarrão Martins
Teresa Prazeres Pais
Isoleta de Almeida Costa
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