Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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 - ACRL de 23-01-2018   Plano de revitalização. Procedimento cautelar.
Havendo meios processuais específicos de reação e controlo do plano de revitalização apresentado, cabendo ainda recurso dos despachos judiciais proferidos no sentido de homologar ou não homologar o plano, não podem os requerentes socorrer-se de procedimento cautelar no intuito de reagir ao plano apresentado porquanto os procedimentos cautelares só são admissíveis quando inexistam outros meios legais de reação (cf. Artigo 362.º, n.º2, do Código de Processo Civil).
Estando o PER, enquanto processo negocial, sujeito a regras de votação específicas (cf. Artigo 17.º -F, n.º 4 e 5) e a um controle material (Artigo 17.º -F, n.º 3 e 7), sendo certo que não finda necessariamente por acordo (cf. Artigo 17.º-G, n.º 1), não pode um dos credores (ainda por cima minoritário como é o caso) arrogar-se – à priori – o direito de obter a aprovação de um plano de revitalização com um clausulado específico quanto ao financiamento da revitalizanda, sucumbindo a instrumentalidade entre o procedimento cautelar requerido e a ação principal (PER).
Proc. 10929/17.1T8LSB-A.L1 7ª Secção
Desembargadores:  Luís Filipe Pires de Sousa - Carla Inês Câmara - -
Sumário elaborado por Susana Leandro
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SUMÁRIO ELABORADO PELO RELATOR:
1. Havendo meios processuais específicos de reação e controlo do plano de revitalização apresentado, cabendo ainda recurso dos despachos judiciais proferidos no sentido de homologar ou não homologar o plano, não podem os requerentes socorrer-se de procedimento cautelar no intuito de reagir ao plano apresentado porquanto os procedimentos cautelares só são admissíveis quando inexistam outros meios legais de reação (cf. Artigo 362º, nº2, do Código de Processo Civil).
II. Estando o PER, enquanto processo negocial, sujeito a regras de votação específicas (cf. Artigo 17º-F, nos. 4 e 5) e a um controle formal e material (Artigo 17º-F, nos. 3 e 7), sendo certo que não finda necessariamente por acordo (cf. Artigo 17º-G, nº1), não pode um dos credores (ainda por cima minoritário como é o caso) arrogar-se - a priori - o direito de obter a aprovação de um plano de revitalização com um clausulado específico quanto ao financiamento da revitalizanda, sucumbindo a instrumentalidade entre o procedimento cautelar requerido e a ação principal (PER).
Proc. N9 10929/17.1T8LSB-A.L1 - Apelação
Recorrentes: PA...e VP…
Recorrida: Caixa …

Acordam os Juízes na 7. Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:
RELATÓRIO
PA...e VP… intentaram procedimento cautelar contra Caixa Económica Montepio Geral, requerendo que, enquanto a presente instância se mantiver, designadamente com a discussão das alterações propostas ao plano de viabilização, a requerida seja impedida de ceder os seus créditos sobre a sociedade recuperanda de modo a não inviabilizar quer os direitos dos credores no ressarcimento dos créditos quer o poder /dever da sociedade recuperanda na sua viabilização.
Alegam que o presente procedimento cautelar é intentado como incidente da presente ação e designadamente da dedução de impugnação da legalidade do plano de viabilização aprovado e da sua falta de fundamentos para homologação judicial.
Fundamentam a sua legitimidade no facto do primeiro ser acionista e legal representante da S..., SGPS, SA, S.A. (credora reclamante no processo especial de revitalização da sociedade L..., S.A.) e o segundo cessionário do crédito da S..., SGPS, SA, S.A. sobre a L..., S.A.
Alegam que a viabilização da L... passaria sempre pelo incremento da atividade da outra sociedade, CS..., SA., de que a L... é detentora de 89,628/prct. do capital.
No entanto, o plano de viabilização entregue nestes autos, propunha a venda a terceiro de toda a participação da L... na Casa da Sorte, ficando o crédito do Montepio garantido e a sociedade a viabilizar sem efetiva fonte de rendimentos. A transmissão da venda do património da L... na CS...seria por 10/prct. do preço do que já tinha sido definido anteriormente para aquisição em mercado livre, com perdão indireto de cerca de 15 milhões de Euros, por parte do Montepio Geral.
Em vez de uma proposta de efetiva recuperação, o plano prevê que só o credor Caixa Económica Montepio Geral seja reembolsado do seu crédito, sendo o crédito da CS...sobre a L..., no montante de 17.334.004,40 €, totalmente perdoado e o crédito da S..., no montante de 103.338,51 €, compensado em parte e perdoado no remanescente.
Significa isto que a sociedade S..., detentora de 100/prct. do capital social da sociedade L... S.A. ficava sem um ativo importante no seu património e a própria sociedade CS...deixava também de ter um crédito no seu ativo para desenvolvimento da sua atividade, a qual era fonte de rendimento indispensável à própria devedora L....
O plano de viabilização é apenas um plano de recuperação do crédito do credor Montepio Geral, não defende a viabilização, quer da Casa da Sorte, quer da L..., nem cumpre as mínimas regras de salvaguarda dos interesses dos credores, dando como extintos todos os créditos que não sejam do Montepio Geral.
O Plano de Recuperação não obedece ao princípio da igualdade dos credores, e não obteve o consentimento dos credores, à revelia dos artigos 202.° e 203.°, a contrario sensu, do CIRE.
Tendo sido requerido no incidente principal a concessão de abertura de novo prazo para apresentação de plano alternativo elaborado pelos credores e pela devedora para posterior votação no âmbito do PER, só é atingível tal desiderato se, enquanto não houver solução final deste processo, e visando o seu êxito, a requerida for impedida de ceder as suas participações sociais na recuperanda.
Em 3.11.2017, foi proferido despacho de indeferimento liminar com a seguinte fundamentação:
«Os procedimentos cautelares são um instrumento processual para proteção de direitos subjetivos ou de outros interesses juridicamente relevantes, representando uma antecipação ou garantia de eficácia relativamente ao resultado de um processo principal e assentam numa análise sumária (summaria cognitio) da situação de facto que permita afirmar a provável existência do direito (fumus boni júris) e o receio justificado de que o mesmo seja seriamente afetado ou inutilizado se não for decretada uma determinada medida cautelar (periculum in mora).
Não são, contudo, aptos à resolução ou composição em definitivo de interesses, antes se destinando a antecipar determinados efeitos das decisões judiciais, a prevenir prejuízos ou a manter determinado statu quo, enquanto tardar a decisão definitiva do conflito. Não efetivam, assim, direitos, mas apenas os asseguram, realizando por conseguinte uma função instrumental face à tutela declarativa.
As providências cautelares visam por isso obter urna composição provisória do litígio, quando ela se mostre necessária para assegurar a utilidade da decisão, a efetividade da tutela jurisdicional, o efeito útil da ação a que se refere o artigo 2°, n° 2 do Código de Processo Civil. Pretende-se com as providências cautelares combater o prejuízo da demora inevitável do processo, a fim de que a sentença se não tome uma decisão meramente platónica - Prof Antunes Varela - Manual do Processo Civil 2.° edição, pág. 23.
O presente procedimento cautelar foi instaurado por apenso a um processo especial de revitalização, regulado no artigo 17.°-A e seguintes do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.
Nos termos do artigo 17.°-A do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas
0 processo especial de revitalização destina-se a permitir ao devedor que, comprovadamente, se encontre em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente, mas que ainda seja suscetível de recuperação, estabelecer negociações com os respetivos credores de modo a concluir com estes, acordo conducente à sua revitalização.
É um processo negociai, tendente à obtenção de um acordo que conduza à revitalização do devedor que decorre, essencialmente, entre o devedor e os seus credores, com intervenção de um administrador judicial provisório nomeado pelo Tribunal.
A intervenção do Tribunal neste processo prende-se, no essencial, com a nomeação inicial do administrador judicial provisório (artigo 17.°-C, n° 3, alínea a), a decisão sobre as impugnações da lista provisória de créditos (artigo 17.°-D, n° 3), e a homologação (ou recusa) do plano de recuperação conducente à revitalização do devedor (artigo 17°-F). Caso seja encerrado o processo negocia/ sem que haja sido aprovado um plano de recuperação ou em caso de recusa de homologação, cabe ainda ao Tribunal declarar a insolvência do devedor que se encontre nessa situação (artigo 17°-G).
As normas que regulam o processo especial de revitalização não preveem a possibilidade de, por apenso a este, serem instauradas quaisquer ações, nem tão pouco que a ele sejam apensadas ações já pendentes. Por outro lado, a instauração de qualquer ação seria incompatível com os trâmites deste processo, face aos apertados prazos concedidos para reclamação de créditos, para a apresentação da lista provisória, para a decisão das impugnações e para a conclusão das negociações.
Acresce que a decisão a proferir no processo especial de revitalização vincula todos os credores, mas esta vinculação está limitada ao objeto do processo, ou seja, aos termos do acordo aprovado e homologado, não podendo, por esta via, ser impostas quaisquer prescrições aos credores que não os imediatamente decorrentes desse plano.
Ademais, o regime do processo especial de revitalização contém mecanismos que permitem aos credores que com ele não concordem deduzir oposição ou, caso entendam que o mesmo viola normas legais imperativas, suscitar tais questões e requerer a sua não homologação.
O que esse regime não admite é que o tribunal intervenha e tome decisões sobre questões e em situações não expressamente previstas.
Do exposto resulta claro que não é admissível a instauração de um procedimento cautelar por apenso a um processo especial de revitalização. Este nunca poderá ser o processo principal de que a providência dependeria, já que o fim deste processo especial esgota-se em si mesmo.
Deste modo, por não ser legalmente admissível, mais não resta do que indeferir liminarmente o presente procedimento cautelar.
Pelo exposto, nos termos do artigo 590., n°1 do Código de Processo Civil, indefere-se liminarmente o presente procedimento cautelar não especificado.»
Não se conformando com a decisão, dela apelou os requerentes, formulando, no final das suas alegações, as seguintes conclusões, que se reproduzem:
«A) Surgem as presentes alegações no âmbito do recurso de apelação de prazo reduzido, interposto da sentença com a referencia 370529697, datada de 03.11.2017, a qual indeferiu liminarmente o presente procedimento cautelar comum com os fundamentos de que:
a) 0 procedimento cautelar não se adequa à intervenção limitada do Tribunal no Processo Especial de Recuperação de Empresas, adiante designado por PER;
b) Qualquer decisão sobre procedimento em PER resultava a intervenção do Tribunal em situações não expressamente previstas,
E com o que os recorrentes se não podem conformar.
B) A sentença recorrida, que indeferiu liminarmente o procedimento cautelar deduzido tem toda a sua base decisória fundamentada numa intervenção do Tribunal tal como a mesma estava estabelecida no CIRE, antes da reforma de alargamento de jurisdicionalização regulada pelo DL 79/2017 de 30 de Junho, em que a intervenção do Tribunal era, na sua essência, uma intervenção lateral de nomeação de Administrador Judicial Provisório, de decisão sobre a impugnação da lista provisória de créditos e de homologação ou recusa do plano de recuperação por mera aplicação das regras vigentes.
C) Porém, com a publicação do referido DL 79/2017 de 30 de Junho, aplicável a todos os processos pendentes por força do art. 60 do mesmo Decreto-lei, foi largamente ampliada e ganhou importância a intervenção judicial e até dos credores desde a apresentação do plano final de recuperação, de acordo com o que é estipulado nos números 2 e 3 do art. 17°-F do CIRE, seguidamente à apresentação do plano em que se abrem diversos prazos sucessivos na sua ocorrência e alternativos na sua fundamentação.
D) Cotejando os números 2 e 3 do art. 17º F do CIRE, verifica-se que nos 5 dias subsequentes à publicação do plano, qualquer credor poderá alegar nos autos o que tiver por conveniente quanto àquele, podendo a empresa, em igual prazo, contraditar a matéria apresentada ou depositar nova versão e independentemente desta situação, foi também criado um novo prazo de 10 dias, no decurso do qual qualquer interessado, e já não só qualquer credor, poderá solicitar a não homologação do plano para os efeitos previstos nos arts. 215º e 216º do CIRE, a que se seguirá, necessariamente, novo prazo de contraditório da recuperanda, sendo nesta fase declarativa que poderá estar em causa a existência de direitos que necessitem de ser acautelados através de providencia cautelar.
E) Dos princípios do procedimento cautelar constantes dos arts. 3629 e 368°, do CPC resulta que, para que o procedimento cautelar em si possa ser colocado e consequentemente proceder, necessário se torna que:
d)Muito provavelmente exista direito tido por ameaçado ou que venha a emergir de decisão a proferir em ação já proposta ou a propor (fumus boni juris)
e)Haja fundado receio que a execução das deliberações antes de proferida a decisão de mérito, calesão grave dificilmente reparável a tal direito (periculum in mora);
f)A providência requerida seja adequada a remover o periculum in mora desde que concretamente verificado e a assegurar efetivamente o direito ameaçado.
F) De acordo com a doutrina e jurisprudência assente, é o periculum in mora o fator distintivo entre o procedimento cautelar sempre dependente, ou como preliminar ou como incidente, de uma ação definitiva e essa própria ação, sendo relativamente à possibilidade de haver atos que possam perturbar ou inviabilizar decisão requerida, que se exige a certeza ou probabilidade muito forte de tal acontecer.
G) É por isso essencial apurar se existe direito que possa ser posto efetivamente em causa com o decurso dos prazos existentes nesta fase declarativa do processo do PER, tal como aqui existe o preenchimento de todos os requisitos do procedimento cautelar.
H) Nos termos do art. 17°-F nº 3 do CIRE, o que os recorrentes deduziram foi efetivamente uma tomada de posição sobre a ilegalidade e ineficácia do plano de Recuperação por o mesmo não cumprir os mínimos critérios legais, tendo-se alegado que o Plano de Recuperação não obedecia ao principio da igualdade dos credores (par conditio creditorium), contendo em si um tratamento mais desfavorável dos credores que se traduz no facto de todos os credores, à exceção do credor bancário, estarem vinculados a perdoar os seus créditos, bem como que se tinha posto em causa a viabilização do plano, com perdão de créditos sem consentimento dos credores que perdoassem os seus créditos, e que não foi obtido à revelia dos arts. 202º e 203º este a contrario sensu do CIRE.
1) E sobre a CS...e o correspondente beneficio da devedora L..., a inexistência de um investidor certo e credível, determinava o seu estrangulamento financeiro, pelo termo da concessão de crédito contra toda a relação acordada anteriormente mediante a prestação de garantias, com a ameaça de insolvência de uma empresa com 87 anos de historia e 100 trabalhadores porquanto:
a) O Montepio Geral, em vez de, com as administrações tradicionais, tentar um efetivo plano de revitalização, pretendia unicamente vender os seus créditos sem importar a quem ou por quanto, dando-os por regularizados.
b) Com a transferência de capital que o Montepio pretende fazer antes das votações do PER, com a respetiva cessão de créditos, já não ter que votar os próprios PER como credor interessado, deixando a devedora sem qualquer apoio financeiro.
c) Liquidar, com a transferência de capital, a sociedade L... pela liquidação do património;
d) Utilizar as garantias e as procurações que tinha, numa situação prévia aos PER, para fazer regularizar o seu crédito de qualquer forma.
J) Esta situação constituia não só a utilização abusiva de mecanismos legais para regularização de um seu crédito, através de PER que forçou a deduzir e que acaba por levar ao estrangulamento das empresas, como também à insegurança da inexistência de réditos da sociedade devedora.
L) É que, o plano de viabilização proposto, se era certo que quer pelas violações legais alegadas, quer por não existir, no plano de viabilização, qualquer salvaguarda atual da sociedade L..., designadamente com a ausência de qualquer financiamento, quer ainda por ter sido preterido o principio da igualdade dos credores, bem como, afastada qualquer hipótese de pagamento dos créditos que não seja do credor bancário, o presente plano de viabilização não estaria em condições de ser homologado, e ainda permitiria poder ser alterado visando uma eficácia e beneficio de todos os credores e uma viabilização da empresa recuperanda.
M) Daqui resulta que existiria o efetivo periculum in mora se a entidade bancária financiadora da recuperanda até ao presente, aproveitasse o período em que decorriam os sucessivos prazos do art. 17º- F nos. 2 e 3 do CIRE, bem como a prolação de sentença definitiva, para ceder os seus créditos a entidade não financiadora, deixando o plano de recuperação sem qualquer viabilidade para ser alterado e conferir à recuperanda a necessária estabilidade de financiamento para o êxito da futura viabilização, pelo que tendo sido requerido no incidente principal a concessão de abertura de novo prazo para apresentação de plano alternativo elaborado pelos credores requerentes e pela devedora para posterior votação no âmbito do PER, só seria atingível tal desiderato se, enquanto não houvesse solução final deste processo, e visando o seu êxito, a recorrida fosse impedida de ceder as suas participações sociais na recuperanda.
N) Face a esta fase declarativa do PER e ao periculum in mora da suscetibilidade da entidade financiadora ceder os seus créditos a novo credor cessionário não bancário, encontravam-se assim preenchidos todos os requisitos previstos na Lei para admissão do procedimento cautelar razão pela qual e em consequência, ao indeferir liminarmente o presente procedimento cautelar comum, violou a sentença recorrida os arts. 17°-A, 17°-B, 17º-D e principalmente o art. 17º-F, 202º e 203º este a contrario sensu, 215° e 216° todos do CIRE, bem como os arts. 30º, 362º, 368° e 413° todos do Código de Processo Civil.
Nestes termos e nos demais de direito deve o presente recurso ser julgado procedente e provado e, por via dele, ser revogada na íntegra a sentença que indeferiu liminarmente o procedimento cautelar e substituída por douto acórdão que admita o mesmo procedimento e ordene o prosseguimento dos seus trâmites como incidente ao pedido deduzido no processo principal de não homologação do plano para os efeitos previstos nos arts. 215º e 216º do CIRE, com o que se fará a costumada JUSTIÇA.»
Apesar de citada para os termos do recurso, a requerida não apresentou contra-alegações.
Neste Tribunal da Relação, foi ordenada a junção de certidão judicial do PER em causa porquanto faltavam peças e requerimentos mencionados nas alegações de recurso.
QUESTÕES A DECIDIR
Nos termos dos Artigos 635º, nº4 e 639º, nº1, do Código de Processo Civil, as conclusões delimitam a esfera de atuação do tribunal ad quem, exercendo um função semelhante à do pedido na petição inicial.' Esta limitação objetiva da atuação do Tribunal da Relação não ocorre em sede da qualificação jurídica dos factos ou relativamente a questões de conhecimento oficioso, desde que o processo contenha os elementos suficientes a tal conhecimento (cf. Artigo 5º, nº3, do Código de Processo Civil). Também não pode este Tribunal conhecer de questões novas que não tenham sido anteriormente apreciadas porquanto, por natureza, os recursos destinam-se apenas a reapreciar decisões proferidas.
Nestes termos, a questão a decidir consiste em aferir se deve persistir o indeferimento liminar do procedimento cautelar.
Corridos que se mostram os vistos, cumpre decidir.
FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
A factualidade relevante para a apreciação do recurso é a que consta do relatório, cujo teor se dá por reproduzido, bem como a seguinte extraída da certidão entretanto junta:
1- Em 4.10.2017, foi junto a versão final do Plano de Recuperação de fls. 147 a 176, cujo teor se dá por reproduzido, nos termos do qual:
Foram reconhecidos créditos vencidos no montante de € 25.656.606,32, sendo: € 8.219.077,89 da Caixa Económica Montepio Geral; € 17.334.004,40 da CS...SA; € 185,53 do ISS, IP e € 103.338,51 da S... - SGPS, SA (fls. 154);
A CS...apresentou PER em maio de 2017;
O crédito da CEMG, no montante de € 8.219.077,88 (capital + juros), encontra-se garantido por: i) penhora sobre 10 ações tituladas ao portador pertencentes à S...,SA, com o valor nominal de € 5.000 cada e representativas de 100/prct. do capital social da devedora, o qual, à data, ascendia a € 50.000; ii) penhora sobre 742.170 ações tituladas ao portador pertencente à devedora, com o valor nominal de € 5 cada e representativas de 74,217/prct. do capital social da CS...- Organização Nogueira da Costa, SA, o qual ascende a € 5.000.000,00 (fls. 161);
A participação de 89,628/prct. do capital social da CS...tem atualmente um valor muito inferior ao valor nominal na medida em que a participada apresentou recentemente a submissão a um PER, verificando-se no seu Balanço que:
• No encerramento de contas de 2016 apresentou um ativo total de € 37.055,258, um passivo total de € 35.378,378, resultando uma situação líquida positiva de €1.676,680;
n A certificação legal de contas apresentou opinião adversa, carecendo as contas do reconhecimento de diversas imparidades;
n Corrigidas as imparidades existentes, o total do ativo reduzir-se-á para aproximadamente €16.405,301, dos quais já não consta o crédito sobre a L... que, no âmbito deste PER, se propõe que seja totalmente perdoado;
. Tem passivos de € 35.378,578;
n Pelo que resultará um capital próprio, corrigido das principais imparidades, negativo de aproximadamente €19 milhões de euros;
Com uma situação líquida negativa conclui-se, portanto, que a referida participação tem atualmente um valor económico reduzido.
Em execução do presente plano, a L... dá em pagamento à CEMG ou a entidade terceira que esta venha a designar a titularidade das ações representativas de 89,628/prct. do capital social da CS...(de que é titular) por vida de dação em cumprimento, sendo 74,217/prct. referente ao capital dado em penhor e o remanescente referente ao restante capital atualmente detido pela L.... Com a aceitação da dação em cumprimento, a CEMG exonera a L... do pagamento do valor remanescente.
Esta solução é tanto mais importante na medida em que poderá criar um contexto favorável à viabilização do PER da Casa da Sorte, nomeadamente pelas perspetivas e capacidade financeira que um novo acionista/investidor poderá aportar ao projeto que carece de injeção de capital.
2. Credor Estado - Segurança Social
O crédito, no montante de € 185,53 (capital + juros), será liquidado até à sentença de homologação do presente plano.
3. Credores comuns - CS...e S... - Entidades especialmente relacionadas
O crédito da Casa da Sorte, no montante de € 17.334.004,40 (capital + juros), será totalmente perdoado.
O crédito da S..., no montante de € 103.338,51 (capital + juros), será compensado, em parte, com o valor de € 75.774,40 do qual a L... é credora perante a S..., sendo perdoado pela S... à L... o valor remanescente de € 27.564,11. ( fls. 162-163).
2- Em 20.10.2017, PA..., por si e na qualidade de legal representante da S..., SGPS, SA, SA e VP..., apresentaram no PER o requerimento de fls. 8 a 145, cujo teor se dá por reproduzido, nos termos do qual requerem a não homologação do plano apresentando, de acordo com os artigos 215º e 216º do CIRE, concluindo assim: a) que o plano apresentado seja considerado nulo e de nenhum efeito com a consequente não homologação desse plano por violação de lei expressa, falta de consentimento dos credores comuns e violação do princípio da igualdade dos credores com as legais consequências; b) que seja concedido a abertura de novo prazo para a apresentação de plano alternativo elaborado pelos credores requerentes e pela devedora para posterior votação no âmbito deste processo. (fls. 99).
3. Em 27.10.2017, a CEMG opôs-se ao requerimento referido em 2, pedindo - que seja indeferido o pedido de não homologação a que se responde.
FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
Nos termos do Art. 362º do Código de Processo Civil, a providência cautelar não especificada tem os seguintes requisitos cumulativos:
a) Possibilidade séria da existência de um direito segundo um juízo de probabilidade ou verosimilhança - Art. 362º, nº1 do Código de Processo Civil;
b) Justo e fundado receio de que outrem lhe calesão grave e de difícil reparação (periculum in mora) segundo um juízo de realidade ou de certeza;
c) Não estar a providência a obter abrangida por qualquer das outras providências cautelares do Código de Processo Civil (Art. 362º, nº3 do Código de Processo Civil);
d) Adequação da providência solicitada para evitar a lesão;
e) Não exceder o prejuízo resultantes da providência o dano que com ela se quer evitar.
O procedimento cautelar tem como pressupostos gerais:
a) A probabilidade séria da existência do direito ou interesse juridicamente tutelado (fumus boni juris), cuja prova basta ser sumária, constituir uma simples justificação ou um juízo de verosimilhança 3, expressões que pretendem significar que, para a prova do direito do requerente, basta uma constatação objetiva da grande probabilidade de que exista;
b) O receio, suficientemente justificado, de lesão grave e dificilmente reparável desse direito ou interesse (periculum in mora). Para a prova deste requisito exige-se um juízo de certeza sobre a sua realidade, ou seja, o requisito do justo receio do prejuízo tem de apresentar-se como evidente e real . 0 receio tem de provir de factos que atestem perigos reais e certos, relevando tudo de uma apreciação ponderada regida por critérios de objetividade e de normalidade.
A gravidade e a difícil reparabilidade da lesão receada apontam para um excesso de risco relativamente àquele que é inerente à pendência de qualquer ação; trata-se de um risco que não seria razoável exigir que fosse suportado pelo titular do direito - LEBRE DE FREITAS, Código de Processo Civil Anotado, II Vol., pg. 6.
Note-se que os requisitos da lesão grave e dificilmente reparável são cumulativos pelo que ficam afastados do círculo de interesses acautelados pelo procedimento comum, ainda que se mostrem irreparáveis ou de difícil reparação, as lesões sem gravidade ou de gravidade reduzida, do mesmo modo que são excluídas as lesões que, apesar de serem graves, sejam facilmente reparáveis - cf. ABRANTES GERALDES, Temas da Reforma do Processo Civil, 2004, III Vol., pp. 101 -102; RITA LYNCE DE FARIA, A Tutela Cautelar Antecipatória no Processo Civil Português, Universidade Católica Editora, 2016, p. 143.
Quanto à característica da gravidade, a mesma reporta-se a uma caraterística quantitativa. «A gravidade da lesão mede-se em função da dimensão dos danos que ela possa provocar. Apenas a lesão que possa vir a desencadear danos de montante considerável deverá ser considerada grave. Sendo os danos de montante reduzido, a lesão não se poderá subsumir neste conceito. / Esta análise da gravidade da lesão, todavia, deverá obedecer a uma ponderação concreta, que tenha em conta a relevância concreta do dano na esfera jurídica do requerente.» - RITA LYNCE DE FARIA, Op. Cit., pp. 144-145.
No que tange à difícil reparação, a mesma pode ser entendida segundo um critério subjetivo que atende às possibilidades concretas do requerido para suportar economicamente uma eventual reparação do direito do requerente. Dir-se-á, nesta conceção, que a lesão é dificilmente reparável sempre que o requerido, em virtude da respetiva situação patrimonial, não possa suportar os encargos de uma indemnização para reparação da lesão, sendo deste modo provável que a lesão que o requerente venha a sofrer fique por ressarcir. Este critério suscita óbvias dificuldades concretas derivadas dos termos em que se deve entender a insuficiência do património do requerido.
Preferível a este critério subjetivo será um critério objetivo que reporta a dificuldade da reparação ao tipo de lesão que a situação de perigo pode vir a provocar na esfera jurídica do requerente. A lesão será dificilmente reparável, ou não, consoante o tipo de reparação que seja suscetível, necessariamente dependente da natureza do direito lesado. Conforme RITA LYNCE DE FARIA, Op. Cit., pp. 155-156, «apenas não são suscetíveis de tutela cautelar aquelas lesões que possam, a posteriori, ser objeto de reconstituição natural. Aqueles prejuízos em que seja possível, através dos instrumentos ressarcitórios existentes, repristinar integralmente o satus quo ante devem considerar-se como não sendo dificilmente reparáveis. Os restantes, quando não permitam o restabelecimento, em grau maior ou menor, da situação anterior ao dano, devem ser considerados dificilmente reparáveis.»
Deste modo, subsumem-se também no conceito de difícil reparação as situações em que a lesão, embora não possa ser objeto de reconstituição natural, pode ser reparada através de sucedâneo pecuniário no valor do dano.
Entendimento diverso seria incompatível com o disposto no n93 do Artigo 368º do Código de Processo Civil, segundo o qual a providência decretada pode ser substituída por caução adequada sempre que a caução oferecida se mostre suficiente para prevenir a lesão ou repará-la integralmente. Este regime só faz sentido na medida em que a caução a prestar pelo requerido possa exercer a mesma função da providência já decretada pois, se assim não fosse, a possibilidade de substituição por caução nunca poderia ter aplicação - RITA FARIA, Op. Cit., pp. 151-152. Em segundo lugar, a lei confere primazia à reconstituição natural, relativamente à indemnização em dinheiro (cf. Artigo 566º, nº1 do Código Civil). Nas palavras de RITA LYNCE DE FARIA, Op. Cit., p. 153, «Se a ação de cognição plena apenas permite ao titular do direito uma solução equivalente - não igual - à que resultaria da não violação do direito, então faz sentido que a providência cautelar possa atuar, garantindo preventivamente ao titular do direito a manutenção do mesmo bem jurídico objeto desse direito.» Em terceiro lugar, desde a Revisão de 1997, o Artigo 2º, nº5 da Constituição dispõe que Para defesa dos direitos, liberdades e garantia pessoais, a lei assegura aos cidadãos procedimentos judiciais caracterizados pela celeridade e prioridade, de modo a obter tutela efetiva e em tempo útil contra ameaças ou violações desses direitos.. Esta norma, apesar de estar fundamentalmente dirigia ao legislador, deve ser tomada em conta pelos tribunais na interpretação e aplicação das normas processuais aplicáveis, v.g., aquando da decisão de decretar uma providência cautelar - cf. JORGE MIRANDA e RUI MEDEIROS, Constituição Portuguesa Anotada, Tomo 1, 2005, Coimbra Editora, p. 203. «O direito a uma tutela jurisdicional efetiva tem de traduzir-se numa eficácia plena da decisão judicial na esfera jurídica do particular. Garantir esse objetivo é a função da tutela cautelar. Admitir uma indemnização por equivalente pecuniário quando a decisão judicial imediata possibilitaria ao autor beneficiar do próprio bem objeto do direito de que é titular seria desrespeitar a garantia de uma tutela judicial efetiva missão das providências cautelares» - RITA FARIA, Op. Cit., p. 154. Em quarto lugar, «Admitir que aquele que é titular de um direito, que se encontra na iminência de sofrer lesão na pendência da ação principal, tenha de aguardar passivamente pela verificação dessa lesão, contentando-se depois com uma indemnização no valor dos danos, é conceder um benefício injustificado ao requerido. Não existe razão para que a lei conceda cobertura a tal injustiça» - Op. Cit., p. 155.
Nestes termos, aqueles direitos cujo conteúdo, por natureza, não é suscetível de avaliação pecuniária, como são os direitos de personalidade, «estarão naturalmente sujeitos a sofrer lesões dificilmente reparáveis. A lesão destes direitos apenas poderá ser economicamente compensada, nunca reparando integralmente os danos, mesmo que sob a forma de um sucedâneo pecuniário, dada a natureza não patrimonial dos bens objeto deste tipo de direitos» - Op. Cit., p. 159.
Sem prejuízo do regime atual da inversão do contencioso (Artigo 369º do Código de Processo Civil), o procedimento cautelar assume - em regra - um caráter instrumental. O carácter instrumental do procedimento cautelar significa que este (...) é um instrumento ao serviço da ação judicial a que se encontra associado, com o propósito de garantir a utilidade da respetiva decisão. Daqui decorre que a ação cautelar não constitui um fim em si mesma. Constitui apenas um meio, um instrumento, que permite alcançar a utilidade da decisão, objeto de outro processo, a que se encontra acoplada. - RITA LYNCE DE FARIA, A função instrumental da tutela cautelar não especificada, Universidade Católica Editora, 2003, pp. 34/35. O procedimento cautelar caracteriza-se pela dupla instrumentalidade teleológica : visa assegurar, por via do seu próprio efeito útil, que outro processo (ação principal) produza o efeito útil para que tende. Daqui decorre que o processo principal depende do processo cautelar no que respeita à sua eficácia.
A instrumentalidade perante a ação principal ocorre quanto:
a) Ao objeto na medida em que o juiz não pode alocar ao requerente uma vantagem excedente dos limites do que, a título principal, lhe poderia ser acordado;
b) À sua utilidade porquanto não se pode retirar, por esvaziamento, utilidade à decisão final ou atacar esta, ou seja, a medida cautelar não pode antecipar a medida final: o tribunal deve decretar a medida sem prejulgar o fundo da questão - RUI PINTO, A questão de mérito na tutela cautelar, Coimbra Editora, 2009, pp. 235-236.
Assim, constitui jurisprudência reiterada que uma providência cautelar nunca pode substituir o efeito jurídico que dimanará da ação principal: terá sempre efeitos provisórios cuja subsistência exige a confirmação daquilo que sumariamente se apure relativamente aos requisitos específicos das providências cautelares. De outro modo, estaria descoberto o sistema de, por esta via, dar imediata e direta realização ao direito substancial e alcançar-se a satisfação desse direito que só através da respetiva ação principal se deve concretizar - cf. Acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa de 26.6.2008, Ana Luísa Geraldes, Proc 5235/2008, de 1.10.2009, Ferreira de Almeida, Proc 83/09, de 2.2.2010, Maria Rosário Barbosa, Proc 1214/09. O efeito útil que o autor (requerente do procedimento) pretende prosseguir não deverá revelar-se autonomamente cumprido por via do procedimento cautelar porque, assim sendo, este desenvolveria uma função substitutiva e não de garantia do processo principal - LUCINDA D. DIAS DA SILVA, Processo Cautelar Comum, Princípio do contraditório e dispensa de audição prévia do requerido, Coimbra Editora, 2009, pg. 135.
Feito este excurso geral, apreciemos o caso sub iudice.
Em termos sumários, está pendente um processo de revitalização da L..., SA, no âmbito do qual foi proposta a versão final do Plano de Recuperação de fls. 147 a 176, acima resumida sob o facto provado sob 1. Os requerentes insurgem-se contra o Plano de Recuperação, imputando-lhe diversos vícios, designadamente: violação do princípio da igualdade dos credores (par conditio creditorum); perdão dos créditos sem consentimento dos credores; violação dos artigos 202º e 203º do CIRE.
Atualmente, o processo de revitalização - na sua fase negocial- encontra-se regulado pelo Artigo 17º-F do CIRE com a seguinte redação:
«1 - Até ao último dia do prazo de negociações a empresa deposita no tribunal a versão final do plano de revitalização, acompanhada de todos os elementos previstos no artigo 195.º, aplicável com as devidas adaptações, sendo de imediato publicada no portal Citius a indicação do depósito.
2 - No prazo de cinco dias subsequente à publicação, qualquer credor pode alegar nos autos o que tiver por conveniente quanto ao plano depositado pela empresa, designadamente circunstâncias suscetíveis de levar à não homologação do mesmo, dispondo a empresa de cinco dias após o termo do primeiro prazo para, querendo, alterar o plano em conformidade, e, nesse caso, depositar a nova versão nos termos previstos no número anterior.'
3 - Findo o prazo previsto no número anterior é publicado no portal Citius anúncio advertindo da junção ou não junção de nova versão do plano, correndo desde a publicação referida o prazo de votação de 10 dias, no decurso do qual qualquer interessado pode solicitar a não homologação do plano, nos termos e para os efeitos previstos nos artigos 215.º e 216º, com as devidas adaptações.
4 - Concluindo-se a votação com a aprovação unânime de plano de recuperação conducente à revitalização da empresa, em que intervenham todos os seus credores, este é de imediato remetido ao processo, para homologação ou recusa do mesmo pelo juiz, acompanhado da documentação que comprova a sua áprovação, atestada pelo administrador judicial provisório nomeado, produzindo tal plano de recuperação, em caso de homologação, de imediato, os seus efeitos.
5 - Sem prejuízo de o juiz poder computar no cálculo das maiorias os créditos que tenham sido impugnados se entender que há probabilidade séria de estes serem reconhecidos, considera-se aprovado o plano de recuperação que:
a) Sendo votado por credores cujos créditos representem, pelo menos, um terço do total dos créditos relacionados com direito de voto, contidos na lista de créditos a que se referem os n.os 3 e 4 do artigo 17.º-D, recolha o voto favorável de mais de dois terços da totalidade dos votos emitidos e mais de metade dos votos emitidos correspondentes a créditos não subordinados, não se considerando como tal as abstenções; ou
b) Recolha o voto favorável de credores cujos créditos representem mais de metade da totalidade dos créditos relacionados com direito de voto, calculados de harmonia com o disposto na alínea anterior, e mais de metade destes votos correspondentes a créditos não subordinados, não se considerando como tal as abstenções.
6 - A votação efetua-se por escrito, aplicando-se-lhe o disposto no artigo 211.º, com as necessárias adaptações, e sendo os votos remetidos ao administrador judicial provisório, que os abre em conjunto com a empresa e elabora um documento com o resultado da votação, que remete de imediato ao tribunal.
7 - O juiz decide se deve homologar o plano de recuperação ou recusar a sua homologação, nos 10 dias seguintes à receção da documentação mencionada nos números anteriores, aplicando, com as necessárias adaptações, as regras previstas no título IX, em especial o disposto nos artigos 194.º a 197.º, no n. º 1 do artigo 198º e nos artigos 200.º a 202.º, 215º e 216º
8 - Caso o juiz não homologue o acordo aplica-se o disposto nos n.os 2 a 4, 6 e 7 do artigo 17.º-G.
9 - Sendo proferida decisão de não homologação, é aplicável ao recurso que venha a ser interposto dessa decisão o disposto no nº 3 do artigo 40º, com as devidas adaptações, caso o parecer do administrador venha a ser de que a empresa se encontra em situação de insolvência.
10 - A decisão de homologação vincula a empresa e os credores, mesmo que não hajam reclamado os seus créditos ou participado nas negociações, relativamente aos créditos constituídos à data em que foi proferida a decisão prevista no n.º 4 do artigo 17.º-C, e é notificada, publicitada e registada pela secretaria do tribunal.
11 - Compete à empresa suportar as custas do processo de homologação.
12 - É aplicável ao plano de recuperação o disposto no n.º1 do artigo 218º
13 - É aplicável o disposto no n.º 6 do artigo seguinte, contando-se o prazo de dois anos da decisão prevista no n.° 7 do presente artigo, exceto se a empresa demonstrar, no respetivo requerimento inicial, que executou integralmente o plano ou que o requerimento de novo processo especial de revitalização é motivado por fatores alheios ao próprio plano e a alteração superveniente é alheia à empresa.»
Deste regime resulta que o juiz do processo controla a regularidade formal e substancial do processo negociai (cf. nos. 3, articulado com os Artigos 215º e 216º do CIRE e nº7, conjugado com os Artigos 194º a 197º, 198º, nº1, 200º a 202º, 215º e 216, todos do CIRE), sendo igualmente facultado às partes que exerçam o contraditório sobre o mérito e legalidade do plano apresentado (cf. nº 2).
Havendo meios processuais específicos de reação e controlo do plano apresentado, como é o caso, cabendo recurso dos despachos judiciais proferidos no sentido de homologar ou não homologar o plano, não podem os requerentes socorrer-se de procedimento cautelar no intuito de reagir ao plano apresentado porquanto os procedimentos cautelares só são admissíveis quando inexistam outros meios legais de reação (cf. Artigo 362º, nº2, do Código de Processo Civil). Em suma, estando o PER sujeito a sucessivas decisões judiciais recorríveis, designadamente de homologação ou não homologação de um eventual plano de revitalização aprovado, a utilização de um procedimento cautelar comum constituiria meio impróprio para sobrestar os efeitos das mesmas (Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 9.11.2017, Maria José Mouro, 1375/04).
Em segundo lugar, admitindo-se a legitimidade processual dos requerentes, os mesmos não têm um direito - a exercer na ação principal de PER - a obter/impor um plano de revitalização no âmbito do qual a CEMG continue a ser a entidade financiadora da L..., SA. Esse é o propósito confesso dos requerentes designadamente expresso nas Conclusões 1), b) e M).
Tratando-se de um processo negociai sujeito a regras de votação específicas (cf. Artigo 17º-F, nos. 4 e 5) bem como sujeito a um controle formal e material (Artigo 17º F, nos. 3 e 7), sendo certo que o PER não finda necessariamente por acordo (cf. Artigo 17º-G, n21), não pode um dos credores (ainda por cima minoritário como é o caso) arrogar-se - a priori - o direito de obter a aprovação de um plano de revitalização com um clausulado específico quanto ao financiamento da revitalizanda. Falece a instrumentalidade entre o procedimento cautelar requerido e a ação principal (PER). Dito de outra forma, mesmo num cenário hipotético em que fosse decretado o procedimento cautelar requerido, daí não decorreria que este fosse útil para assegurar o resultado de uma votação de um plano de revitalização cuja formulação não depende apenas da vontade (minoritária) dos requerentes do procedimento cautelar, inexistindo razões que indiciem a viabilidade de tal pretensão dos requerentes (que a CEMG continue a ser a entidade financiadora da L..., SA.).
Termos em que se conclui que sucumbe o primeiro requisito do procedimento cautelar, qual seja a possibilidade séria da existência de um direito segundo um juízo de probabilidade ou verosimilhança.
DECISÃO
Pelo exposto, acorda-se em julgar improcedente a apelação, confirmando-se a sentença recorrida.
Custas pelos apelantes (Artigo 527º, nº1 e nº2, do Código de Processo Civil).
Lisboa, 23.1.2018
Luis Filipe de Sousa
Carla Cãmara
Higina Castelo
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