Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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 - ACRL de 20-12-2017   Sinal idêntico ou parecido. Denominação de origem ou de indicação geográfica.
I - Não basta que se prove a mera utilização de sinal idêntico ou parecido com uma denominação de origem ou uma indicação geográfica para recusar o respetivo registo;
II – O uso de denominação de origem ou de indicação geográfica com prestígio em Portugal, ou na Comunidade Europeia, para produtos sem identidade ou afinidade apenas é proibido quando procure, sem justo motivo, tirar partido indevido do carácter distintivo ou do prestígio da denominação de origem ou da indicação geográfica anteriormente registada, ou possa prejudicá-las;
III- Destinando-se a marca da apelante “OPORTOCAR” a assinalar a classe 12.º da classificação de Nice, “Automóveis “, sem qualquer afinidade com os produtos vinícolas e agrícolas assinalados pela denominação de origem (DO) de prestígio registada peio apelado, “PORTO”, deve deferir-se o registo da mesma, uma vez que não se apura que esta retire partido indevido do carácter distintivo ou do prestígio dessa denominação de origem ou que possa afetá-la.
Proc. 336/16.9YHLSB.L1 7ª Secção
Desembargadores:  Conceição Saavedra - Cristina Coelho - -
Sumário elaborado por Susana Leandro
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TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA 7a Secção (Cível)
Proc. n°. 336/16.9YHLSB.L 1
Apelante: V..., Lda
Apelado: I..., I.P.

Acordam os Juízes na 7.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa.
I- Relatório:
I..., I.P., interpôs recurso da decisão proferida pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) que, apesar da reclamação por si apresentada, deferiu o pedido de registo da marca nacional n° ..., O..., destinada a assinalar produtos da classe 12.ª da classificação de Nice, Automóveis, produtos/serviços, a favor da requerente V..., Lda, com sede na Rua da Fábrica do Bairro da Areosa, n° 23, P..., pedindo que se revogue o despacho recorrido e se reco registo daquela marca.
Alega, para tanto e em síntese, que a referida marca imita a palavra O... que constitui uma denominação de origem protegida e legalmente reconhecida como uma DO de prestígio, carecendo, além do mais, de caráter distintivo. Sustenta que a recusa do registo se justifica porque o seu uso, independentemente da afinidade dos produtos, procura, sem motivo justificado, tirar partido indevido ou mesmo prejudicar a referida denominação de origem ou indicação geográfica já registadas, dando lugar à sua banalização. Conclui, assim, que o despacho do 1NPI que concedeu o registo à requerida viola o disposto nos arts. 238, n° 1, b), 239, n° 1, c), e 312 do Código da Propriedade Industrial (doravante, C.P.I.), bem como o art. 5, n° 1, do DL n° 212/2004, de 23.8, o art. 2, n° 5, do DL n° 173/2009, de 3.8, e art. 103, n° 2, do Regulamento EU 1308/2013.
Foi cumprido o disposto nos arts. 43 e 44 do C.P.I..
A requerente, uma vez citada, veio defender que a palavra O... não é suficiente para caracterizar a marca da recorrente, não resultando qualquer confusão entre a marca registada e a denominação de origem do recorrente, tanto mais que há centenas de registos concedidos pelo INPI onde constam os vocábulos P... e O.... Afirma que não há concorrência desleal e conclui pela improcedência do recurso.
Em 8.3.2017, foi proferida sentença nos seguintes termos: (...),julgo o presente recluso procedente e revogo o despacho de 2.09.2016 da Directora da Direcção de Marcas e Patentes do Instituto Nacional da Propriedade Industrial, que deferiu o registo da marca nacional n.° ... O... (sinal verbal), pedido em 4.10.2015 pela sociedade V..., Lda, para assinalar automóveis. Custas pela recorrida (art. 527. 0, n.°1 do Código de Processo Civil).
Valor da causa - e 30.000, 01 (art. 306. 0, n.°2 do Código de Processo Civil). (...).
Inconformada, recorreu a requerente V..., Lda, da sentença, culminando as alegações por si apresentadas com as seguintes conclusões que se transcrevem:
1. A 04 de Outubro de 2015, a ora Apelante apresentou junto do INPI pedido de registo da marca verbal O..., à qual foi atribuído o n.° ..., para a classe 12 da Classificação de Nice, para o seguinte produto: Automóveis.
II. Ao pedido de registo da marca nacional O..., deduziu oposição o I..., I.P.
III. O INPI, após exame, veio a proferir despacho, a 21 de Março de 2016, onde decidiu que Da análise ao sinal registando - não consideramos que esta expressão destinando-se a assinalar na classe 12° a automóveis , promova a violação do disposto na alínea c) do 11° 1 do artigo 239° do CPI nem tao pouco que este signo fira o prestígio, por via da diluição ou hanalização, alcançada pela Denominação de Origem P..., ou ainda que usufrua ilegitimamente do mesmo.
IV. Pode ainda ler-se no mesmo despacho: E acrescendo o facto de existirem já marcas registadas com as expressões P… para produtos manifestamente afins, e todas elas coexistirem pacificamente no mercado com os direitos da Reclamante. Na sequência do supra enunciado, julgamos que, in casu, não se encontram preenchidos os requisitos das alíneas a) e c) do n° 1 do artigo 239° do CPI, nem existe a possibilidade de serem praticados actos de concorrência desleal, independentemente da intenção do Requerente. Nestes termos, julgamos a reclamação improcedente.
V. No mesmo despacho, foi a Apelante notificada da recusa provisória do pedido de registo, porquanto, depois de efectuadas pesquisas de anterioridade, o INPI apurou a existência de um outro direito prioritário, a marca nacional n° 438728 P...CAR.
VI. Em face desse despacho de recusa provisória, foi apresentada junto do INPI uma decla ração de consentimento a 10 de Maio de 2016.
VII. A 02 de Setembro de 2016, veio então o INPI a proferir despacho de concessão do pedido de revisto da marca O….
VIII. Inconformado, o ora Apelado intentou junto do Tribunal da Propriedade Intelectual (doravante somente TPI) recurso do despacho que concedeu o registo à marca da Apelante.
IX. A 08 de Março de 2017 foi proferida sentença, sob a referência n° 294768. Na perspectiva da Apelante, e sempre com o devido respeito, o Tribunal a quo andou mal na apreciação da situação e informações constantes dos autos, o que levou a uma decisão incorrecta cuja parte do segmento decisório com a qual não se concorda ora se transcreve:
Nos termos do disposto no art. 238. 0, n. °1 al. b) do Código da Propriedade Industrial, o registo de uma marca é recusado quando esta seja constituída por sinais desprovidos de qualquer carácter distintivo. O que, adiantando, diremos que é o caso da marca O... para assinalar o único produto a que se destina, automóveis. E por isso o seu registo devia ter sido recusado, nos termos do disposto no art. 238.° n. al. b) do CPI. .
Mas também nos termos da al. c) do n.°1 do art. 239.° por referência ao 312.° n.°4 ambos do CPI, por reproduzir o sinal que constitui a denominação de origem P..., de reconhecido prestígio nacional e internacional, e poder com isso prejudicá-la. (...) É o risco de esta banalização do P... (D.O.) acontecer, de que se dilua a sua excepcional força distintiva, e consequentemente o seu prestígio (pelo enfraquecimento do sinal, decorrente do seu uso indiscriminado por qualquer empresa para assinalar qualquer produto), que se pretende evitar. Através da recusa do registo de marcas que usem a D.O. com prestígio em Portugal para produtos mesmo sem identidade ou afinidade, sempre que esse uso possa prejudicá-las. É o que resulta do disposto no art. 312.° n.°4 e 239.° n.°1, al. c) do Código da Propriedade Industrial. E é o que sucede, in casu, com a marca O.... .
VEJAMOS ENTÃO:
DO CARÁCTER DISTINTIVO DA MARCA O...:
X. O carácter distintivo implica a verificação da aptidão do sinal para distinguir os diferentes produtos no âmbito de um exame concreto que os tenha por objecto.
XI. O carácter distintivo de uma marca deve ser sempre apreciado com referência aos produtos ou aos serviços para os quais foi requerido o registo dessa marca,
XII. independentemente do nível de criatividade ou de imaginação linguística ou artística por parte do titular da marca.
XIII. É por isso por demais evidente que a marca O... possui carácter distintivo, porquanto permite claramente identificar os produtos em causa da classe 12 - Automóveis, na acepção da classificação de Nice, corno provenientes da sua empresa e, por conseguinte, distingui-los dos de outras empresas,
XIV. estando apto a cumprir uma função distintiva, aos olhos dos consumidores médios, dos produtos e serviços comercializados.
XV. O consumidor, quando confrontado com a marca O... e com a marca (por exemplo) O... SOUND (marca nacional registada 448526), sabe que no caso dá marca da Recorrente vai adquirir carros e não músicas afigurando-se evidente a eficácia distintiva do produto comercializado.
XVI. A entender-se de forma diferente, inviabilizar-se-iam centenas de registos de marcas, porquanto, a originalidade exigida seria incomportável.
DA INEXISTÊNCIA DE RISCO DE CONFUSÃO E BANALIZAÇÃO DA D.O. P…:
XVII. Existem centenas de registos que foram concedidos pelo INPI onde constam quer o vocábulo
P... quer O..., sendo certo que muitos deles foram inclusivamente concedidos para,
assinalar o produto vinho.
XVIII. Conforme o próprio despacho do INPI menciona: E, acrescendo o facto de existirem já marcas registadas com as expressões P... para produtos manifestamente afins, e todas elas coexistirem pacificamente no mercado com os direitos da Recorrente .
XIX. Vejamos, a título meramente exemplificativo, os seguintes:
- MARCA NACIONAL 525029 B...
- MARCA NACIONAL 547690 B...
- MARCA NACIONAL 492451 C...
- MARCA NACIONAL 513539 F...
- MARCA NACIONAL 482545 I O...
- MARCA NACIONAL 556555 O...
- MARCA NACIONAL 510442 O...
- MARCA NACIONAL 515403 O...
- LOGOTIPO 25984 O... L&A
- MARCA NACIONAL 530445 O...
- MARCA NACIONAL 448526 O...
- MARCA NACIONAL 478341 O...
- MARCA NACIONAL 442349 V O...
- MARCA NACIONAL 534551 À M…
- MARCA NACIONAL 508123 A N…
- MARCA NACIONAL 522684 A…
- MARCA NACIONAL 392437 A…
- MARCA NACIONAL 388187 A…
- MARCA NACIONAL 510911 C…
- MARCA NACIONAL 354774 C…
- MARCA NACIONAL 490149 C…
- MARCA NACIONAL 443932 E…
- MARCA NACIONAL 479849 F…
- MARCA NACIONAL 460315 F…
- MARCA NACIONAL 311404 F…
- MARCA NACIONAL 539215 H…
- LOGOTIPO 25991 I …
- MARCA NACIONAL 565077 F...
- MARCA NACIONAL 563458 I...
- MARCA NACIONAL 565473 O…
- MARCA NACIONAL 562043 O...
- MARCA NACIONAL 561675 O...
- MARCA NACIONAL 560728 O...
XX. Além disso, falar de um direito de exclusivo sobre a palavra P... quando existem centenas de registos concedidos (dos quais destacámos muito poucos exemplos), seria violar o princípio da igualdade, constitucionalmente consagrado, tratando de forma diferente o que é igual.
XXI. Face ao exposto parece-nos obvio que a utilização da marca O... não irá de todo contribuir para o risco de banalização e diluição da DO P....
XXII. Muito bem andou o Instituto Nacional da Propriedade Industrial ao decidir como decidiu, considerando que, muito embora a DO P... seja uma DO de prestigio devemos ter presente que não pode esse prestigio aconselhar a recusa de todos os sinais distintivos do comércio que possuam na sua composição o vocábulo P..., não só porque este vocábulo tem significados diversos na linguística, mas ainda porque, não esquecendo o n° 4 do artigo 312° do CPI, deverá ficar demonstrado que o uso desse signo, procure sem justo motivo, tirar partido indevido do carácter, distintivo ou do prestigio da denominação de origem protegida. .
XXIII. O INPI concedeu o registo não por não considerar que inexiste qualquer afinidade entre o produto a que se destina a DO do Apelado e a marca registada da Apelante, mas antes, porque assinalou - e bem - que não considerantos que esta expressão - O... - destinando-se a assinalar na classe 12°a automóveis, promova a violação do disposto na alínea c) do n° 1 do artigo 239° do CPI nem tao pouco que este signo fira o prestigio, por via da sua diluição ou banalização. alcançada pela Denominação de Origem P.... Ou ainda, que usufrua ilegitimamente do mesmo. .
XXIV. Não se pode querer levar a protecção a um extremo tal, do qual resulte que todas as palavras derivadas da palavra P... - como é o caso de O... - sejam insusceptíveis de registo. ASSIM:
XXV. O artigo 312° n° 4 do CPI, com vista a conceder uma protecção adicional às denominações de origem e indicações geográficas com prestigio em Portugal e na Comunidade Europeia, veio proibir o respectivo uso para produtos sem identidade ou afinidade sempre que o uso das mesmas procures sem justo motivo, tirar partido indevido do caracter distintivo ou do prestigio da denominação de origem ou indicação geográfica anteriormente registada, ou possa prejudica-las,
XXVI. o que não é, manifestamente, o caso dos presentes autos dado que existe uma clara diferença nas actividades exercidas pelo Apelado e pela Apelante, com a consequente distinção entre os produtos e serviços que ambas comercializam no mercado, o que afasta desde logo a aplicação do preceito legal sub judice, porquanto lhe falta o preenchimento de um requisito essencial - tirar partido indevido do carácter distintivo da DO.
XXVII. Assim, admitindo, em tese, que a DO do Apelado beneficia da sobredita protecção adicional - por se tratar de DO de prestígio - seria sempre necessário dar como assentes factos donde se pudesse concluir a vontade da Apelante vir a tirar partido indevido do prestígio da DO, o que não se verifica, in casu
XXVIII. A este propósito veja-se o douto Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 13 de Março de 2012, proferido no âmbito do processo n° 112/10.2TYLSB.L1-7 (disponível em www.dgsi.pt), onde se pode ler: Mesmo aceitando a qualificação da marca VISA como uma marca de prestígio - o que acarreta a atribuição de uma protecção adicional, extensiva inclusive a produtos que não são idênticos, nem afins - não existe fundamento sério e real para conjectural a susceptibilidade de concorrência desleal a ser praticada pela nacional INTERVISA . Para isso, falta o essencial: a verdadeira confrandibilidnde junto do consumidor médio, idónea a parasitar o seu prestígio e 0 sua distintividade. .
XXIX. No mesmo sentido veja-se o douto Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 29 de Maio de 2014, proferido no âmbito do processo n° 1222/06.TVLSB.Ll-6 (disponível em www.dgsi.pt), onde se pode ler: De todo o modo, apesar de a DO P... ser uma denominação de origem de prestígio, não se existem nos autos elementos que permita concluir que a marca da Apelada possa retirar partido indevido do carácter distintivo da DO P..., enquanto vinho de mesa da Etitrernaadura, por si também com caracter distintivo uue não se confunde corra um vinho licoro$o,. tal como a expressão ...P...s se não confunde com P... . .
XXX. No âmbito do mesmo processo, foi o Supremo Tribunal de Justiça chamado a pronunciar-se, tendo sido proferido Acórdão que confirmou o Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa.
XXXI. Entende, e a nosso ver muito bem, o Supremo Tribunal de Justiça (Acórdão de 29 de Janeiro de 2015, proferido no âmbito do processo n° 1222/06.TVLSB.Ll.S1, disponível em www.dgsi.pt) que: Ora, tendo em conta que o termo «P...» se refere ao vinho produzido exclusivamente a partir da Região Demarcada do Douro, cujo titular do registo é o I...,
IP, não existe o risco de confusão do ponto de vista gráfico nem fonético com o termo «Adega Dois
P...s» para um normal consumidor, uma vez que este termo se refere à freguesia da sede da çitular do registo, a Adega Cooperativa de Dois P...s, CRL, que produz vinhos tintos, brancos,, rosés e licores. .
XXXII. Ainda na senda do mesmo Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça acabado de citar, importa assinalar o seguinte: Argui o recorrente I... IP no sentido de que, ex vi Dec. Lei n. ° 173/2009, de 3/08 e do art.° 312. ° do CPI, a utilização da palavra P... está reservada, exclusivamente, aos vinhos com direito a esta Denominação de Origem, independentemente de haver qualquer risco de confusão do consumidor. A falta de rigor desta afirmação assim protagonizada é manifestamente infundada. Na verdade, o que resulta do estatuído no n.º 4 do art. ° 2.° do Decreto-Lei n.º 173/2009, de 3 de Agosto (Douro) é que é proibida a utilização, por qualquer meio, de nomes, marcas, termas, expressões ou símbolos, ou, qualquer indicacão ou sugestão falsa ou falaciosa, que selam susceptíveis de confundir o consumidor quanto à proveniência, natureza ou qualidades essenciais dos produtos, bem como de qualquer sinal que constitua reprodução, imitação ou evocação das DO ou IG da RDD; e o que se depreende do que está descrito no art.° 312. do CPI é que a tutela dos direitos conferidos ao registo se circunscreve às denominações de origem, exatamente nos termos em que tais designações estão assim registadas - o registo das denominações de origens ou das indicações geográficas confere o direito de impedir a utilização, por terceiros, mi designação ou na apresentação de um produto, de qualquer meio que indique, ou sugira, que o produto em questão é originário de unta região geográfica diferente do verdadeiro lugar de origem Or.' 1, alínea a). .
XXXIII. Pois bem, se a marca em causa no Acórdão acabado de citar - Adega Dois P...s - (marca nacional n° 376561) não é susceptível de criar confusão nos consumidores, e trata-se de uma marca registada para assinalar o produto vinho, muito menos será a marca registanda O..., para assinalar automóveis!
XXXIV. Conforme se pode também ler na anotação ao sobredito artigo 312° do CPI a aplicação desta norma exige uma cuidadosa ponderação, havendo, neste âmbito, que sopesar todas as circunstancias do caso concreto, sem perder de vista que os sinais que compõem as denominações de origem e as indicações geográficas consistem normalmente em nomes de localidades, de regiões e até de países, referencias que em muitos casos são empregues na actividade económica, nos mais diversos sectores, sem que tal implique qualquer lesão para o prestigio daquelas (CPI Anotado - 2' edição revista e actualizada, página 375 - Almedina),
EM CONSEQUÊNCIA:
DA INEXISTÊNCIA DE CONCORRÊNCIA DESLEAL:
XXXV. Em face de todo o quadro fáctico que vem sendo exposto, nem a Apelante pretende fazer concorrência desleal, nem, muito menos, se vislumbra tal possibilidade.
XXXVI. A confundibilidade das marcas como símbolo só é pertinente na proporção em que o consumidor passe a adquirir um produto de terceiro pensando que é do titular, ou pelo menos induzido pela memória genérica da marca deste.
XXXVII. A marca que a Apelante pretende registar está perfeitamente apta a cumprir com eficiência a função essencial de distinguir os produtos ou serviços de uma empresa do de outras empresas (art. 222° n° 1 do CPI).
XXXVIII. Acresce que a Apelante nunca visou sequer imitar o Apelado.
XXXIX. Razão pela qual inexiste concorrência desleal.
SEM PRESCINDIR E POR MERO DEVER DE PATROCÍNIO:
XL. Dispõe o n° 1 do artigo 245° do Código da Propriedade Industrial (Aprovado pelo DL 36/2003, de 05 de Março, na sua mais recente versão dada pela Lei 46/2011, de 24 de Junho) que A marca registada considera-se imitada ou usurpada por outra, no todo ou em parte, quando, cumula ivanrente: a) A marca registada tiver prioridade; b) Sejam ambas destinadas a assinalar produtos ou serviços idênticos ou afins; c) Tenham tal semelhança gráfica, figurativa, fonética ou outra que induza facilmente o consumidor em erro ou confusão, ou que compreenda um risco de associação com marca anteriormente registada, de forma que o consumidor não as possa distinguir senão depois de exame atento ou confronto.
XLI. Quanto à prioridade do registo DO do Apelado é indiscutível a existência da mesma.
XLII. No entanto, tal raciocínio já não se aplica quando analisamos a invocada imitação, com fundamento nos pressupostos das alíneas B9 e c) do n° 1 do artigo 245° do CPI.
DA INEXISTÊNCIA DE IDENTIDADE OU AFINIDADE DOS PRODUTOS E SERVIÇOS:
XLIII. Conforme já referido, a marca da Apelante destina-se a assinalar produtos/serviços da classe 12 Automóveis.
XLIV. Já a DO do Apelado, de acordo com o próprio preâmbulo do DL 173/2009, de 03 de Agosto de 2009, visa proteger as denominações P... e Douro , nomeadamente a garantia da qualidade e da genuinidade dos produtos com essas denominações de origem, a idoneidade da certificação do produto final, operação complexa que não se reduz à análise fisico-química e organoléptica, pois inclui, igualmente, a verificação e o controlo da apresentação do produto, a sua rotulagem e as suas menções, bem como o acondicionamento (..), sendo assim efectivamente assegurada a qualidade e a genuinidade dos vinhos do P... e do Douro .
XLV. Resulta pois do referido diploma que a utilização da palavra P... está reservada, exclusivamente, aos vinhos com direito a esta DO, sendo imperativo proibir o uso da mesma relativamente a vinhos oriundos de outras regiões.
XLVI. Esse direito privativo impõe por isso que sejam recusados os pedidos de registo de marcas com a palavra P... quando destinadas a vinhos sem direito à DO.
XLVII. Portanto, a DO do Apelado roi atribuída para assinalar produtos vínicos, decorrentes da prossecução das suas próprias atribuições, isto é, a regulamentação, control1 promoção e defesa do produto do vinho do P....
XLVIII. Fora do âmbito dos produtos vínicos para que está registada a DO, o Apelado não tem qualquer legitimidade para reclamar um direito de utilização exclusiva da palavra P... , ou O... , o que aliás, é contrário à própria definição que o CPI nos dá de denominação de origem no seu artigo 305° n° 1, onde se pode ler: 1 - Entende-se por denominação de origem o nome de uma região, de um local determinado ou, em casos excepcionais, de um país que serve para designar ou identificar um produto: a) Originário dessa região, desse local determinado ou desse país; b) Cuja qualidade ou características se devem, essencial ou exclusivamente, ao meio geográfico, incluindo os factores naturais e humanos, e cuja produção, transformação e elaboração ocorrem na área geográfica delimitada. .
XLIX. Sem necessidade de delongas, é por demais evidente que estamos na presença de produtos/serviços absolutamente distintos e de origem também ela diferente: vinhos VS automóveis.
DA INEXISTÊNCIA DE RISCO DE CONFUSÃO:
L. É igualmente evidente que não há qualquer risco de confusão!
LI. Para se aferir se dois sinais distintivos são confundíveis entre si, e em consequência, que exista a possibilidade de induzir o consumidor em erro, tem de se proceder a uma comparação gráfica, figurativa e fonética.
LII. In casu, é sobretudo na (inexistência de) semelhança fonética que a tese do Recorrente cai por terra.
LIII. Se analisarmos a marca registanda e a DO, do posto de vista fonético, chegamos desde logo a essa conclusão:
P...
O...
LIV. Em primeiro lugar, a marca registanda não contém a palavra P... mas antes O... .
LV. Ora, a palavra O... não é, só por si, suficiente para caracterizar a marca da Recorrida pois
forma um conjunto homogéneo com a palavra que se segue (Car) e que visa precisamente identificar
a própria actividade comercial exercida.
LVI. Dispõe a alínea c) do n.° 1 do artigo 245.° do CPI, que a marca se considera imitada quando tenham tal semelhança gráfica, figurativa fonética ou outra que induza facilmente o consumidor em erro ou confusão, ou que compreenda um risco de associação com marca anteriormente registada, de forma que o consumidor não as possa distinguir senão depois de exame atento ou confronto. .
LVII. Conforme é amplamente reconhecido na doutrina e na jurisprudência, é necessário que entre os sinais em confronto exista uma semelhança qualificada, uma vez que (...) nem sempre que existem semelhanças há a imitação. Esta pressupõe condições especiais nessas semelhanças, condições que se caracterizam afinal pelo perigo de confusão (In Revista de Legislação e Jurisprudência, Ano 93°, n° 3/67, Prof. Gabriel Pinto Coelho).
LVIII. De acordo com a concepção de Bédarride, largamente acolhida pela doutrina e a jurisprudência, segundo a qual a questão da imitação deve ser apreciada pela semelhança que resulta do conjunto dos elementos que constituem a marca e não pelas dissemelhanças que poderiam oferecer os diversos pormenores, considerados isolados e separadamente .
LIX. Deste modo, se a semelhança de conjunto, entre a marca anterior protegida e a mais recente, sem consideração dos pormenores diferenciadores, gerar a possibilidade de confusão, pela fácil indução em erro do consumidor, haverá imitação da primeira pela segunda.
LX. E que consumidor será este? Entende-se geralmente que não é um consumidor concreto, mas um consumidor abstracto, não de todo e qualquer produto ou serviço, mas sim daquele a que a marca se destina.
LXI. Assim, o critério de confundibilidade a ter em conta será, portanto, colocado na perspectiva do consumidor médio dos produtos ou serviços em questão, tomando em conta o estrato ou estratos populacionais a que primordialmente são destinados.
LXII. Deve assim ter-se em linha de conta, sobretudo, o consumidor médio menos atento ou conhecedor da matéria e não o perito especializado, sendo certo que haverá imitação sempre que o consumidor médio possa facilmente confundi-las tendo-as presentes.
LXIII. Os consumidores não investigam, em regra, a existência ou a inexistência de imitação, sendo certo que ligam o produto que lhes agrada a certa marca de que conservam uma ideia mais ou menos precisa, como elemento determinante das suas escolhas de produtos ou serviços no mercado global.
LXIV. No caso sub judice, claramente não estamos sequer perante o mesmo tipo de consumidor que se confronte ao mesmo tempo com os produtos/serviços em questão (consumidor de vinho do P... VS adquirente de automóveis), pelo que, é inegável a inexistência deste risco.
LXV. Pelo exposto, concluímos inexistir, mesmo para o consumidor mais desatento, possibilidade de confusão entre a DO do Apelado (que assinala vinhos do P...) e a marca da Apelante (que visa assinalar comércio de automóveis).
ACRESCE QUE,
LXVI. a palavra P... , trata-se de uma denominação que serve há já largas centenas de anos, para designar a proveniência geográfica de alguns produtos e serviços, sendo por isso uma denominação genérica, pelo que, nos termos do disposto nas alíneas c) e d) do n° 1 e n° 2 do artigo 223° do CPI, não nade conferir qualquer direito de exclusivo ao seu titular.
AQUI CHEGADOS,
LXVII. porque a lei - art. 245.° do CPI - exige a verificação cumulativa dos três aludidos requisitos, não basta, para que uma marca se considere imitada, que se encontre preenchido apenas o requisito da prioridade.
Pede a revogação da sentença proferida, mantendo-se a decisão do INPI que concedeu a marca nacional n° ..., O....
Em contra-alegações, o apelado sustenta o acerto do julgado.
O recurso foi admitido como apelação, com subida nos próprios autos e efeito meramente devolutivo. Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

II- Fundamentos de Facto:
A decisão da la instância fixou como provada a seguinte factualidade:
1) Por despacho de 2.09.2016 da Directora da Direcção de marcas e patentes do Instituto Nacional da Propriedade Industrial foi deferido o registo da marca nacional n.° ... O... (sinal verbal), pedido em 4.10.2015 pela sociedade V..., Lda, com sede no P...;
2) A referida marca é destinada a assinalar, na classe 12 da classificação internacional de Nice, automóveis;
3) O I..., IP é titular do registo da denominação de origem P... (sinal verbal), registada no INPI sob o n°4, desde 2.11.1972, para produtos vinícolas definidos no art.° 1.° do Decreto n.° 7934 de 10 de Dezembro de 1921;
4) Bem como do seu registo internacional no World Intellectual Property Organization, sob o n° 682, para vinho generoso produzido na região do Douro, delimitada pelo art. 2.° do Decreto n.° 7934 de 10 de Dezembro de 1921;
5) E ainda no registo comunitário de denominações de origem, nos termos do Regulamento (EU) n.° 1308/2013, de 17 de Dezembro de 2013, do Parlamento e do Conselho de 17 de Dezembro de 2013.

III- Fundamentos de Direito:
Como é sabido, são as conclusões que delimitam o âmbito do recurso. Por outro lado, não deve o tribunal de recurso conhecer de questões que não tenham sido suscitadas no tribunal recorrido e de que, por isso, este não cuidou nem tinha que cuidar, a não ser que sejam de conhecimento oficioso. De acordo com as conclusões acima transcritas em causa está apreciar:
- se a marca O... tem caráter distintivo e se há risco de confusão com a DO P... ou banalização da referida DO;
- se há concorrência desleal.
Na sentença concluiu-se, em síntese, pela procedência do recurso interposto pelo I..., I.P., e revogou-se a decisão do INPI que deferiu o registo da marca nacional n° ..., O..., destinada a assinalar produtos da classe 12 da classificação de Nice, Automóveis, a favor da sociedade requerente V..., Lda, entendendo-se, por um lado, que o sinal O... não tem caráter distintivo, devendo ser recusado nos termos do art. 238, n° 1, al. b), do C.P.I., e, por outro, que o mesmo reproduz o sinal que constitui a denominação de origem P..., de reconhecido prestígio nacional e internacional, podendo com isso prejudicá-la, pelo que deve ser recusado por força dos arts. 312, n° 4, e 239, n° 1, al. c), do mesmo C.P.I..
Vejamos.
De acordo com o art. 1 ° do C.P.I., a propriedade industrial visa assegurar a lealdade da concorrência, mediante a atribuição de direitos privativos sobre diversos processos técnicos de produção e desenvolvimento da riqueza. No geral, visa-se a proteção legal de direitos sobre as criações ou inovações industriais e os sinais distintivos do comércio.
Do lado dos sinais distintivos temos a marca, a recompensa, o logótipo, a denominação de origem e a indicação geográfica.
No quadro da organização económica, a marca surge pela necessidade de diferenciação da origem dos produtos ou serviços oferecidos ao consumidor.
A função da marca é, por isso, essencialmente distintiva. Encontra-se ainda indiretamente associada à função de garantia de qualidade, não lhe cabendo ainda assim, sob o ponto de vista jurídico, essa função autónoma.
Desse modo, A marca pode ser constituída por um sinal ou conjunto de sinais susceptíveis de representação gráfica, nomeadamente palavras, incluindo nomes de pessoas, desenhos, letras, números, sons, a forma do produto ou da respectiva embalagem, desde que sejam adequados a distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas. (art. 222, n° 1, do C.P.I.). Já o logótipo - que depois do DL n° 143/2008, de 25.7, operou a agregação de três anteriores modalidades de direitos da propriedade industrial (nomes, insígnias de estabelecimento e logótipos) - pretende distinguir e identificar a entidade que preste serviços ou comercialize produtos (cfr. art. 304-A, n° 2, do C.P.I.). O logótipo pode ser constituído por um sinal ou conjunto de sinais suscetíveis de representação gráfica, nomeadamente por elementos nominativos, figurativos ou por uma combinação de ambos (cfr. art. 304-A, n° 1, do C.P.I.).
Como dissemos, encontram-se ainda protegidas as denominações de origem e as indicações geográficas, sinais distintivos do comércio definidos no art. 305 do C.P.I., os quais, visando a garantia de qualidade e de indicação da proveniência geográfica com determinadas características associadas, divergem na intensidade da ligação exigida entre as qualidades e características dos produtos e o meio geográfico de que provêm .
Assim, entende-se por denominação de origem o nome de uma região, de um local determinado ou, em casos excepcionais, de um país que serve para designar ou identificar um produto:
a) Originário dessa região, desse local determinado ou desse país;
b) Cuja qualidade ou características se devem, essencial ou exclusivamente, ao meio geográfico, incluindo os factores naturais e humanos, e cuja produção, transformação e elaboração ocorrem na área geográfica delimitada. (art. 305, n° 1).
São igualmente consideradas denominações de origem certas denominações tradicionais, geográficas ou não, que designem um produto originário de uma região, ou local determinado, e que satisfaçam as condições previstas na alínea b) do número anterior. (art. 305, n° 2).
Em qualquer caso, quer as denominações de origem quer as indicações geográficas, quando registadas, constituem propriedade comum dos residentes ou estabelecidos na localidade, região ou território, de modo efectivo e sério e podem ser usadas indistintamente por aqueles que, na respectiva área, exploram qualquer ramo de produção característica, quando autorizados pelo titular do registo (art. 305, n° 4).
De acordo, ainda, com o disposto no art. 312 do C.P.I., o registo das denominações de origem ou das indicações geográficas confere o direito de impedir a respetiva utilização por terceiros de modo a prevenir falsas referências quanto à origem, qualidades e características dos produtos, bem como a defender tais sinais distintivos e a sua reputação.
Assim, tal registo permite, nomeadamente, que se impeça a utilização, por terceiros, na designação ou na apresentação de um produto, de qualquer meio que indique, ou sugira, que o produto em questão é originário de uma região geográfica diferente do verdadeiro lugar de origem (art. 312, n° 1, al. a)), sendo ainda proibido o uso de denominação de origem ou de indicação geográfica com prestígio em Portugal, ou na Comunidade Europeia, para produtos sem identidade ou afinidade sempre que o uso das mesmas procure, sem justo motivo, tirar partido indevido do carácter distintivo ou do prestígio da denominação de origem ou da indicação geográfica anteriormente registada, ou possa prejudicá-las (art. 312, n° 4).
Nos termos do art. 317, n° 1, do C.P.I., constitui concorrência desleal todo o acto de concorrência contrário às normas e usos honestos de qualquer ramo de actividade económica , no que se incluem os actos susceptíveis de criar confusão com a empresa, o estabelecimento, os produtos ou os serviços dos concorrentes, qualquer que seja o meio empregue (al. e)), as invocações ou referências não autorizadas feitas com o fim de beneficiar do crédito ou da reputação de um nome, estabelecimento ou marca alheios (al. c)), ou as `falsas descrições ou indicações sobre a natureza, qualidade ou utilidade dos produtos ou serviços, bem como as falsas indicações de proveniência, de localidade, região ou território, de fábrica, oficina, propriedade ou estabelecimento, seja qual for o modo adoptado (al. e)).
Deve, por outro lado, salientar-se que de acordo com o DL n° 212/2004, de 23.8, que, designadamente, veio estabelecer a organização institucional do sector vitivinícola e disciplinar o reconhecimento e proteção das respetivas denominações de origem (DO) e indicações geográficas (IG), a DO ou a IG só podem ser utilizadas em produtos do sector vitivinícola que respeitem e cumpram determinadas regras, sendo proibida a sua utilização, direta ou indireta, em produtos vitivinícolas que não observem os necessários requisitos, nomeadamente em rótulos, etiquetas, documentos ou publicidade, mesmo quando a verdadeira origem do produto seja indicada ou que as palavras constitutivas daquelas designações sejam traduzidas ou acompanhadas por termos como «género», «tipo», «qualidade», «método», «imitação», «estilo» ou outros análogos , ou a utilização, por qualquer meio, de nomes, marcas, termos, expressões ou símbolos, ou qualquer indicação ou sugestão falsa ou falaciosa, que sejam susceptíveis de confundir o consumidor quanto à proveniência, natureza ou qualidades essenciais dos produtos , proibições que se aplicam também a produtos não vitivinícolas quando a utilização procure, sem justo motivo, tirar partido indevido do carácter distintivo ou do prestígio de que goze uma DO ou IG vitivinícola ou possa prejudicá-las (art. 5, n°s 1 a 4, do referido DL n° 212/2004).
Por sua vez, o DL n° 173/2009, de 3.8, aprovou o estatuto das denominações de origem e indicação geográfica da Região Demarcada do Douro, a denominação de origem (DO) P..., incluindo as designações vinho do P..., vin de P..., Port wine, Port, e seus equivalentes em outras línguas, e Douro, bem como a indicação geográfica (IG) Duriense, as quais só podem ser utilizadas nos vinhos e produtos vínicos produzidos na Região Demarcada do Douro (RDD), que a tradição firmou com esse nome e que satisfaçam o disposto no respetivo estatuto e demais legislação aplicável.
Além disso, o registo de uma marca é recusado quando esta seja constituída por sinais desprovidos de qualquer carácter distintivo (art. 238, n° 1, al. b), do C.P.I.) e ainda quando a) A reprodução ou imitação, no todo ou em parte, de marca anteriormente registada por outrem para produtos ou serviços idênticos ou afins, que possa induzir em erro ou confusão o consumidor ou que compreenda o risco de associação com a marca registada; b) A reprodução ou imitação, no todo ou em parte, de logótipo anteriormente registado por outrem para distinguir uma entidade cuja actividade seja idêntica ou afim aos produtos ou serviços a que a marca se destina, se for susceptível de induzir o consumidor em erro ou confusão; c) A infracção de outros direitos de propriedade industrial. d) (...); e) O reconhecimento de que o requerente pretende fazer concorrência desleal ou de que esta é possível independentemente da sua intenção. (art. 239, n° 1, do C.P.I.).
Revertendo para o caso em análise, concordamos com o parecer do INPI quando afirma que o vocábulo P... tem diversos significados na linguística, cumprindo ainda relembrar que a proteção de que goza o aqui apelado, I..., I.P., quanto ao referido sinal, denominação de origem P..., é para produtos vinícolas e agrícolas (pontos 3, 4 e 5 supra da matéria assente).
Por conseguinte, destinando-se a marca registanda a assinalar a classe 12.ª da classificação de Nice, Automóveis, nenhuma dúvida há de que estamos perante produtos sem qualquer afinidade em que á registo só pode ser recusado se a referida denominação de origem, com inegável prestígio em Portugal e na Comunidade Europeia, for usada para, sem justo motivo, tirar partido indevido do carácter distintivo ou do prestígio dessa denominação de origem antes registada, ou puder prejudicá-la (art. 312, n° 4, do C.P.I.).
A propósito dos direitos conferidos pelo registo das denominações de origem ou das indicações geográficas, diz-se em anotação ao art. 312 do Código da Propriedade Industrial Anotado que vimos citando(4): (...) para que o n° 4° do artigo 312° seja aplicável não basta que se apure a utilização de sinal idêntico ou parecido com uma denominação de origem ou uma indicação geográfica, sendo exigível que o usuário «procure tirar partido indevido do carácter distintivo ou do prestígio» da mesma (por exemplo, se houver risco de o consumidor atribuir aos produtos as qualidades, origem ou características dos protegidos), «ou possa prejudica-los» (nomeadamente, através da diluição da singularidade e do valor da denominação de origem ou da indicação geográfica que o uso de sinal igual ou semelhante em produtos diferentes também pode acarretar). (..).
E logo a seguir realça-se, com particular interesse para o caso aqui em análise, conforme se assinalou
no parecer do INPI: A aplicação desta norma exige uma cuidada ponderação, havendo, neste âmbito, que sopesar todas as circunstâncias do caso concreto, sem perder de vista que os sinais que compõem as denominações de origem e as indicações geográficas consistem normalmente em nomes de localidades, de regiões e até de países, referências que em muitos casos são empregues na actividade económica,_ nos mais diversos sectores, sem que tal implique qualquer lesão para oprestigio daquelas.
A título de exemplo, parece indiscutível que a denominação de origem «Vinho do P...» alcançou prestígio, sendo, porém, em função do acima exposto, duvidoso que possa automaticamente obstar a todo e qualquer registo de sarais distintivos do comércio que incluam a expressão «Porto», cidade em que muitas pessoas físicas e colectivas disponibilizam os seus produtos e serviços. (...).
Ora, identificando a palavra P... ou O... (numa versão estrangeirada) como uma localidade (para além de outros significados linguísticos), estaríamos perante um elemento genérico que, entrando na composição de uma marca, não pode ser considerado de uso exclusivo do requerente, salvo quando, na prática comercial, o sinal tiver adquirido eficácia distintiva (cfr. art. 223, n° 1, als. a), c) e d), e n° 2, do C.P.I.).
Ou seja, também nessa perspetiva, não se afigura que qualquer dos intervenientes possa apropriar-se do elemento genérico P... ou O... visando este indicar a proveniência geográfica dos produtos.
Quanto à própria distintividade do sinal O..., conjugam-se duas palavras O... e Car, em que se identifica a atividade económica prosseguida (automóveis), que em nada contende com o I..., I.P., e a DO por si titulada, permitindo a cabal diferenciação dos produtos da apelante relativamente a outras empresas que ofereçam produtos diversos.
Veja-se, aliás, que para além das múltiplas marcas registadas que usam na sua composição a palavra P... ou O..., a marca ora impugnada foi, numa fase inicial, provisoriamente indeferida atento o anterior registo da marca nacional n° …, P...CAR, circunstância que veio a ser ultrapassada face à apresentação do consentimento prestado pelo titular do direito prioritário, nos termos do art. 243 do C.P.I..
Em suma, afigura-se-nos que o sinal O... apresenta suficiente natureza distintiva, designadamente, no confronto com os produtos protegidos com a denominação de origem do apelado, não sendo possível, face à mui diversa natureza destes, qualquer risco de confusão e/ou associação por parte do consumidor.
Não pode, por isso, recusar-se o registo da marca nos termos do art. 238, n° 1, al. b), do C.P.I., como foi sentenciado.
Do mesmo modo, nada nos autos nos permite concluir que a apelante possa, sem motivo justificado, tirar partido indevido do carácter distintivo ou do prestígio da denominação de origem do apelado ou que possa prejudicá-la, independentemente de qualquer intenção (art. 312, n° 4, do C.P.I.). Isto é, nenhuma prova se fez de que o uso do sinal O... tire partido do carácter distintivo ou do prestígio da DO do apelado para produtos vinícolas ou agrícolas em geral, e que o afete, por qualquer forma.
Precisamente porque estão em causa produtos de natureza inteiramente diferente apenas comumente referidos à cidade do P..., num universo de muitas marcas e sinais que integram na sua designação as palavras P... e O..., sem comprovada lesão do prestígio da referida denominação de origem. É o próprio apelado quem afirma, nas suas contra-alegações, que: Quando uma denominação de origem de prestígio consista, como é frequente, no nome de uma região ou cidade, essa palavra pode livremente entrar na composição de outros sinais distintivos, desde que seja usada como simples referência geográfica, e não haja risco de confusão ou de aproveitamento parasitário. (conclusão J) da resposta ao recurso).
Ora, não há qualquer possibilidade de confusão junto do consumidor médio, que facilmente distingue os produtos da apelante e os protegidos pela DO P... do apelado, sem o menor risco de aproveitamento parasitário ou da verificação, entre as respetivas entidades titulares, de situações geradoras de fenómenos de concorrência desleal. Repete-se, apesar da DO P... corresponder a uma denominação de origem de prestígio, nenhuma demonstração se fez no caso de que a marca da apelante possa retirar partido indevido do carácter distintivo dessa DO apelado.
Por conseguinte, não se vislumbra que, no contexto, o sinal O... promova a violação do disposto nas als. c) e e) do n° 1 do art. 239 do C.P.I., ou contribua para a banalização da denominação de origem do apelado constituindo lesão para o seu prestígio.
Finalmente, não estando aqui em análise o conceito de imitação ou de usurpação de marcas previsto no art. 245 do C.P.I., posto que apenas se debate o alegado aproveitamento ilegítimo ou prejuízo de uma denominação de origem por parte da marca da apelante, razão bastante não se antolha para revogar o despacho do INPI de 2.9.2016 que deferiu o registo da marca nacional n.° ... O... pedido pela apelante, como se decidiu em 1a instância.
Procede, assim, a apelação.

IV- Decisão:
Termos em que e face do exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar procedente a apelação e, revogando, em consequência, a sentença proferida, determinar a concessão à ora apelante do registo da marca nacional n.° ... O... (sinal verbal), destinada a assinalar a classe 12a da classificação internacional de Nice, Automóveis, subsistindo assim o despacho de 2.9.2016 doINPI.
Custas pelo apelado.
Notifique.

Lisboa, 20-12-2017
Maria da Conceição Saavedra
Cristina Coelho
Luís Filipe Pires de Sousa

Sumário do Acordão (da exclusiva responsabilidade da relatora - art. 663, n° 7, do C.P.C.)

I- Não basta que se prove a mera utilização de sinal idêntico ou parecido com uma
denominação de origem ou uma indicação geográfica para recusar o respetivo registo;
II- O uso de denominação de origem ou de indicação geográfica com prestígio em Portugal, ou na Comunidade Europeia, para produtos sem identidade ou afinidade apenas é proibido quando procure, sem justo motivo, tirar partido indevido do carácter distintivo ou do prestígio da denominação de origem ou da indicação geográfica anteriormente registada, ou possa prejudicá-las;
III- Destinando-se a marca da apelante O... a assinalar a classe 12a da classificação de Nice, Automóveis , sem qualquer afinidade com os produtos vinícolas e agrícolas assinalados pela denominação de origem (DO) de prestígio registada pelo apelado, P..., deve deferir-se o registo da mesma, uma vez que não se apura que esta retire partido indevido do carácter distintivo ou do prestígio dessa denominação de origem ou que possa afetá-la.
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