Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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    Jurisprudência da Relação Cível
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 - ACRL de 20-12-2017   Marca. Afinidade entre produtos ou serviços. Juízo de confundibilidade. Marca fraca.
1. A marca é um sinal distintivo de produtos e serviços, destinada a diferenciá-los, de outros idênticos ou afins, podendo ser constituída por um sinal ou conjunto de sinais, que se mostrem suscetíveis de representação gráfica, nas espécies possíveis de nominativas, figurativas, mistas, plásticas, formais ou tridimensionais, e sonoras, mas também que tenham capacidade distintiva, ou seja, que sejam aptos, por si só, a individualizar uma determinada espécie de produtos e serviços.
2. A afinidade entre produtos ou serviços afere-se em função do próprio objeto do direito à marca, que é o de distinguir a respetiva origem empresarial.
3. Para haver possibilidade de confusão sobre a origem empresarial dos produtos ou serviços, importa atentar em diversos fatores, nomeadamente a natureza e o tipo de necessidades que os produtos ou serviços visam satisfazer e os circuitos de distribuição desses produtos ou serviços.
4. Na formulação do juízo de confundibilidade entre produtos e/ou serviços, devem ter-se em conta os seguintes princípios ou regras:
- O juízo comparativo deve ser objetivo, apurando-se se existe risco de confusão tomando em conta o consumidor ou utilizador final medianamente atento, sendo certo que geralmente se entende que o consumidor a que há que atender, no juízo a formular sobre a existência ou não de risco de confusão entre marcas, não é um consumidor concreto, mas um consumidor abstrato, não de todo e qualquer produto ou serviço, mas sim daquele a que a marca se destina;
- para a formulação desse juízo, relevam menos dissemelhanças que ofereçam os diversos pormenores isoladamente do que a semelhança que resulta do conjunto dos elementos componentes, devendo ainda tomar-se em conta a interligação entre os produtos e serviços, por um lado, e, por outro, os sinais que os diferenciam.
5. A comparação entre sinais deve fazer-se, essencialmente, através de uma impressão de conjunto, sem dissecação de pormenores, pois o consumidor médio apreende normalmente uma marca como um todo, não procedendo a uma análise das suas diferentes particularidades
6. Marca fraca é o sinal que, apesar de ter um mínimo de capacidade distintiva, seja originária ou subsequente, é constituído quase em exclusivo por elementos de uso comum ou trivial, ou de uso muito vulgarizado.
7. Este tipo de marca é suscetível de registo válido, sendo, no entanto, mais estreito o âmbito de proteção dele decorrente, no confronto com marcas potencialmente confundíveis, devendo, por isso, o juízo sobre a confundibilidade ser menos severo, já que a comparação com outras marcas deve limitar-se à parte que seja original.
8. Uma realidade destituída de capacidade identificadora não pode. Por natureza, servir como marca, pouco importando que as palavras ou as figuras escolhidas sejam ou não fruto da imaginação ou criação do seu titular, ou antes, sejam vocábulos ou desenhos (v.g., letras, números) já conhecidos ou mesmo de uso corrente.
9. O que é necessário é que, na composição da marca, o empresário não se aproprie de sinais (palavras, números, desenhos) que pertençam ao domínio público dos sinais necessários a todos os empresários para o fim de eles apresentarem e oferecerem os seus serviços ou produtos
Proc. 271/17.3YHLSB.L1 7ª Secção
Desembargadores:  José Capacete - Carlos Oliveira - -
Sumário elaborado por Susana Leandro
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TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA
7ª Secção
Processo n° 271/17.3 YHLSB.L1- Recurso de Apelação Tribunal Recorrido:
Tribunal da Propriedade Intelectual - 1° Juízo
Recorrente:
P..., LDA.
Recorrido:
INSTITUTO NACIONAL DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL

SUMÁRIO:
(Elaborado pelo relator e da sua inteira responsabilidade - art. 663°, n° 7, do CPC)
1 A marca é um sinal distintivo de produtos e serviços, destinada a diferenciá-los, de outros idênticos ou afins, podendo ser constituída por um sinal ou conjunto de sinais, que se mostrem suscetíveis de representação gráfica, nas espécies possíveis de nominativas, figurativas, mistas, plásticas, formais ou tridimensionais, e sonoras, mas também que tenham capacidade distintiva, ou seja, que sejam aptos, por si só, a individualizar uma determinada espécie de produtos e serviços.
2 A afinidade entre produtos ou serviços afere-se em função do próprio objeto do direito à marca, que é o de distinguir a respetiva origem empresarial.
3 Para haver possibilidade de confusão sobre a origem empresarial dos produtos ou serviços, importa atentar em diversos fatores, nomeadamente a natureza e o tipo de necessidades que os produtos ou serviços visam satisfazer e os circuitos de distribuição desses produtos ou serviços.
4 . Na formulação do juízo de confundibilidade entre produtos e/ou
serviços, devem ter-se em conta os seguintes princípios ou regras:
O juízo comparativo deve ser objetivo, apurando-se se existe risco de confusão tomando em conta o consumidor ou utilizador final medianamente atento, sendo certo que geralmente se entende que o consumidor a que há que atender, no juízo a formular sobre a existência ou não de risco de confusão entre duas marcas, não é um consumidor concreto, mas um consumidor abstrato, não de todo e qualquer produto ou serviço, mas sim daquele a que a marca se destina;
- para a formulação desse juízo, relevam menos as dissemelhanças que ofereçam os diversos pormenores isoladamente do que a semelhança que resulta do conjunto dos elementos componentes, devendo ainda tomar-se em conta a interligação entre os produtos e serviços, por um lado, e, por outro, os sinais que os diferenciam.
5 . A comparação entre sinais deve fazer-se, essencialmente, através de uma impressão de conjunto, sem dissecação de pormenores, pois o consumidor médio apreende normalmente uma marca como um todo, não procedendo a uma análise das suas diferentes particularidades.
6 . Marca fraca é o sinal que, apesar de ter um mínimo de capacidade distintiva, seja originária ou subsequente, é constituído quase em exclusivo por elementos de uso comum ou trivial, ou de uso muito vulgarizado.
7 Este tipo de marca é suscetível de registo válido, sendo, no entanto, mais estreito o âmbito de proteção dele decorrente, no confronto com marcas potencialmente confundíveis, devendo, por isso, o juízo sobre a confundibilidade ser menos severo, já que a comparação com outras marcas deve limitar-se à parte que seja original.
Uma realidade destituída de capacidade identificadora não pode, por natureza, servir como marca, pouco importando que as palavras ou as figuras escolhidas sejam ou não fruto da imaginação ou criação do seu titular, ou antes, sejam vocábulos ou desenhos (v.g., letras, números) já conhecidos ou mesmo de uso corrente.
9 O que é necessário é que, na composição da marca, o empresário não se aproprie de sinais (palavras, números, desenhos) que pertençam ao domínio público dos sinais necessários a todos os empresários para o fim de eles apresentarem e oferecerem os seus serviços ou produtos

Acordam na 7a Secção do Tribunal da Relação de Lisboa
1 - RELATÓRIO:
P..., LDA. interpôs recurso do despacho de 3 de fevereiro de 2017, do despacho do despacho do Diretor da Direção de Marcas e Patentes do Instituto Nacional da Propriedade Intelectuall, por subdelegação de competências do Conselho Diretivo do mesmo Instituto, que lhe recusou o registo da marca nacional n° 572091
Alegou, em resumo, que requereu ao INPI o registo da referida marca nacional, para assinalar produtos da classe 4ª da Classificação Internacional de Nice, tendo o INPI recusado tal registo, por existir imitação de marca prioritária Pure Energy.
Não existe semelhança tal entre os sinais que não permita a destrinça, desde logo, porque a marca em apreciação é mista, já que a expressão Pura Energia é acompanhada pela figura de uma esfera em forma de G, que lhe confere um cunho único, e a da recorrida é nominativa, por outro lado os serviços e produtos que visam assinalar não são afins.
Concluiu pedindo a revogação do despacho recorrido e a substituição por outro que admita o registo da marca nacional n.° 572091.
Por sentença de 22 de setembro de 2017, o 1° Juízo do Tribunal da Propriedade Intelectual julgou tal recurso improcedente e, consequentemente, manteve o despacho recorrido que não concedeu o registo da marca nacional n.°572091

Inconformada com tal decisão, dela veio a recorrente apelar para este Tribunal da Relação, concluindo assim a alegação de recurso:
1. Vem o presente recurso interposto da douta sentença de fls. proferida pela Meritíssima Juiz do 12 Juízo do Tribunal da Propriedade Intelectual que decidiu pela improcedência da Impugnação Judicial interposta pela Recorrente, contra despacho de recusa do INPI, melhor identificado nos autos.
2. Fundamentou a Recorrente, a sua pretensão, com base nas evidentes diferenças gráficas, fonéticas e linguísticas das marcas em crise, verificando-se que a marca registanda Pura energia, é acompanhada pela figura de uma esfera, em forma da letra G, porém representando a letra P, com preenchimento e em perspectiva, virada para a esquerda, o que lhe confere um cunho único e distintivo.
3. Falhou o Tribunal a quo no seu entendimento expresso na alínea c) do ponto III, não se apresentando condizente com o que efectivamente resulta do despacho emanado do INPI, datado de 03/02/2017, na sua página terceira, e que ora se transcreve para cabal esclarecimento: (...) ressalta, em nosso entender, uma forte semelhança gráfica, fonética e concetual, desde logo por o sinal registando praticamente reproduzir na íntegra a marca prioritariamente registada, uma vez que se trata de uma tradução para língua portuguesa, da mesma, conforme supra demonstrado.
4. Resulta claro que a tradução para língua inglesa e a tradução para língua portuguesa não se apresentam como a mesma coisa, levando a que as nuances fonéticas, gramaticais e etimológicas influenciem o conteúdo do que se pretende transmitir, podendo em certos casos, assumir aspectos e ideias, amplamente distintas
5. Tinha o Tribunal a quo a obrigação de perante a possibilidade de confusão perante dois vocábulos distintos obrigava a que a justificação se fundasse em critérios objectivos e não simplesmente com recurso a uma conclusão reduzida a uma frase, sem que existisse o cuidado de análise e estudo sobre as diferentes fonias e a forma como são percepcionadas pelas comunidades e mercados em que se inserem.
6. Além que, sabe o consumidor distinguir as duas realidades fonéticas e linguísticas, percebendo que a lógica empírica indicará que a empresa PURAENERGIA é uma marca portuguesa e que opera no país onde se encontra domiciliada, ou seja, em território nacional.
7. Cingiu-se o Tribunal a quo na sua decisão, a um critério fechado e pouco esclarecido do que será o consumidor médio, remetendo-o a uma incapacidade de saber distinguir entre uma marca nacional e uma marca estrangeira.
8. A Recorrente apenas opera no mercado nacional, e é esse mercado que deve ser levado em conta, ou seja, ser analisado enquanto universo de percepção para o consumidor português, sendo de afastar a uma tradução literal, de algo que objectivamente não o é.
9. A denominação PURA representa a Recorrente no comércio português, sendo facilmente identificável e reconduzível à sua actividade, que tem vindo a desenvolver desde o ano de 2001, ou seja, 5 anos antes de a empresa titular da marca obstativa ainda sequer existir.
10. É facilmente percepcionável que um consumidor colocado perante os amplamente distintos sinais/nomes consiga fazer a diferenciação sem recorrer a um exame atento ou confronto de tal forma complexo que impeça de alcançar as diferenças.
11. Assim, não existe qualquer similitude gráfica e fonética, não existe qualquer similitude nos produtos que utilizam para alcançar a sua finalidade (energias não renováveis e renováveis).
12. Pelo que, é do entendimento da Recorrente, que em momento algum se encontra preenchido o conceito de imitação constante do artigo 245.°, n.0 1, al. c) do CPI, no que respeita aos elementos fonéticos e linguísticos.
13. Acresce que a nível gráfico, é por demais evidente que a diferença entre as marcas se apresenta como considerável e objectivamente distinta para que nem sequer exista confusão.
14. A gritante diferença gráfica apresenta-se como bastante para que um consumidor médio consiga analisar a mesma e reconduzir ao trabalho desenvolvido pela Recorrente no mercado nacional.
15. São essas mesmas diferenças que levam a que o consumidor médio consiga esclarecidamente distinguir entre as duas marcas, e fazer a sua distinção esclarecida sobre os produtos oferecidos pela Recorrente, sem nunca os cruzar com os oferecidos pela Recorrida.
16. A distinção fonética é ultrapassada, e até complementada pela separação gráfica, olhando para o universo de cliente que cada uma das empresas atinge e realiza a sua função.
17. Acresce que, apesar de se incluírem na 4.á Classe da Classificação de Nice, tal não significa que a inserção ou não dentro da mesma categoria seja factor decisivo, e que outro terá que ser o critério para se apurar se determinados produtos ou serviços são idênticos ou afins.
18. Não existe qualquer indicação da empresa detentora do sinal registado, ter actividade aberta em Portugal ou exercer qualquer tipo de comércio dentro do território nacional, operando apenas num espaço circunscrito e que não terá influência para o consumidor comum em Portugal, que desconhece a sua existência.
19. Sendo os requisitos do artigo 245.2 do CPI cumulativos, basta a falta de verificação de um deles para que não seja preenchido o conceito de imitação ou de usurpação, enquanto fundamento de recusa do registo de marca nos termos do artigo 2392 do mesmo código.
20. A manutenção da presente decisão do Tribunal a quo, irá pôr em causa a própria existência da Recorrente, sendo até superiores ao benefício que se pretende retirar da decisão de recusa definitiva proferida pelo INPI e consequente interesse que essa decisão visa proteger, sendo por isso violadora até do princípio da proporcionalidade.
NESTES TERMOS, e nos demais de direito, e sempre com o mui douto suprimento de V. Exas., deverá ser concedido provimento ao presente recurso de apelação, devendo a douta sentença recorrida ser revogada nos termos supra expostos, e substituída por outra que julgue a impugnação judicial procedente, reconhecendo a marca nacional da
Recorrente, válida e conforme os normativos legais de registo.

2 - ÂMBITO DO RECURSO:
Nos termos dos arts. 635°, n° 4 e 639°, n° 1, do CPC, é pelas conclusões da recorrente que se define o objeto e se delimita o âmbito do presente recurso, sem prejuízo das questões de que este tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objeto do recurso.
Assim, perante as conclusões da alegação da apelante, neste recurso importa decidir se existe confusão entre as marcas constituídas pelos seguintes sinais:
Sinal Registando Sinal Registado
Pura energia
PURE ENERGY
3 - FUNDAMENTAÇÃO:
3.1 - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO:
São os seguintes os factos provados com relevo para a decisão do presente recurso:
3.1.1 - Em 24/10/2016, a recorrente apresentou o pedido de registo da
Pura energia marca n° 572091, com o seguinte sinal, energia destinada a assinalar na classe 4ª da Classificação Internacional de Nice Energia elétrica a partir de fontes de energia não renováveis; energia elétrica a partir de fontes de energia renováveis.
3.1.2 - Na sequência da apresentação, pela recorrente, do pedido de Pura energia registo da marca n° 572091, com o seguinte sinal, Pura energia no dia 2 de fevereiro de 2017 pelos Serviços Técnicos da Direção de Marcas e Patentes do Departamento de Marcas, Desenhos e Modelos do INPI, foi elaborada a proposta de decisão cuja cópia se encontra a fls. 33-34, da qual consta, além do mais, o seguinte:
«Motivos Relativos de Recusa
A marca é um sinal distintivo do comércio que se destina a identificar e a diferenciar os produtos ou os serviços oferecidos no mercado, distinguindo aqueles que pertencem a uma determinada empresa dos de outras empresas, ao mesmo tempo que permite ao consumidor reportá-los à sua verdadeira origem empresarial.
Assim, para que esteja apta a cumprir uma função distintiva, uma marca não poderá representar uma imitação de outra marca prioritariamente registada, nos termos da alínea a) do n° 1 artigo 239° do Código da Propriedade Industrial (CPI).
E, de acordo com o disposto no artigo 245° do CPI, um sinal representa uma imitação de marca prioritariamente registada quando, cumulativamente:
• se destine assinalar produtos e/ou produtos ou serviços idênticos ou de afinidade face aos produtos e/ou serviços relativamente aos quais a marca prioritária se encontra protegida;
• apresente tal semelhança gráfica, figurativa, fonética ou outra, que o consumidor facilmente as possa confundir (ou que apenas as possa distinguir após um atento exame confrontativo) ou, senão, pelo menos associar a uma mesma origem empresarial.
Ao proceder ao estudo do presente pedido de registo, e depois de efetuadas pesquisas de anterioridade, verifica-se a existência de um direito anterior: a marca da união europeia n° 006839401 PURE ENERGY, da titularidade de Pure Energy Centre Ltd.
Assim, os sinais em confronto são:
Sinal Registando Sinal Registado

Pura
energia

PURE ENERGY
Em consequência verifica-se que:
• A marca da união europeia n° 006839401 PURE ENERGY - tendo sido apresentada em 16.04.2008 e registada em 16.04.2012 - goza de prioridade relativamente ao presente pedido de registo;
• Por outro lado, entre os produtos que se pretende identificar com a marca em estudo (classe 04.ª: ENERGIA ELÉTRICA A PARTIR DE FONTES DE ENERGIA NÃO RENOVÁVEIS; ENERGIA ELÉTRICA A PARTIR DE FONTES DE ENERGIA RENOVÁVEIS) e os produtos relativamente aos quais a marca prioritária se encontra registada - entre outros, classe 04.a: HIDROGÉNIO COMO COMBUSTÍVEL PARA USO DOMÉSTICO E COMERCIAL; COMBUSTÍVEL DE HIDROGÉNIO PARA AQUECIMENTO; COMBUSTÍVEL DE HIDROGÉNIO PARA MEIOS DE TRANSPORTE; EM ESPECIAL PARA VEÍCULOS TAIS COMO AUTOMÓVEIS E BARCOS; COMBUSTÍVEL DE HIDROGÉNIO PRODUZIDO COM RECURSO A FONTES DE ENERGIA RENOVÁVEIS TAIS COMO A ENERGIA EÓUCA OU A ENERGIA SOLAR. -, estabelece-se, em nosso entender, um elo de afinidade, na medida em que entre os produtos em apreço, por terem natureza semelhante, pode haver coincidência nos circuitos de distribuição, nos métodos de utilização e no público consumidor, além disso são produtos com carácter complementar;
• Por último, do confronto entre o sinal requerido - PURAENERGIA - e a marca prioritariamente registada - PURE ENERGY -, ressalta, em nosso entender, uma forte semelhança gráfica, fonética e concetual, desde logo por o sinal registando praticamente reproduzir na íntegra a marca prioritariamente registada, uma vez que se trata de uma tradução, para língua portuguesa, da mesma, conforme supra demonstrado.
Um consumidor médio quando confrontado com o sinal registando poderá ser induzido em erro de associação, crendo que aquele é uma derivação da marca registada, ou poderá ser induzido em erro de confusão, pois quando adquire os produtos pode não ter presente os sinais para fazer uma análise comparativa no momento podendo, assim, confundi-los entre si.
Face ao exposto, cremos que a coexistência dos sinais em confronto dificilmente permitirá a sua destrinça por parte de um consumidor médio, podendo suscitar a indução em erro quanto à proveniência empresarial dos produtos em causa.
Proposta de decisão
Em face do exposto, propõe-se o indeferimento provisório do presente pedido de registo, nos termos do n° 5 do artigo 237° do Código da Propriedade Industrial, com os fundamentos acima indicados.
Na sequência desta decisão, pode o requerente:
a) Alterar/adicionar elementos ao sinal ou alterar as classes (Ato a requerer: Alteração de sinal/produtos/serviços - será promovida uma nova publicação do pedido);
b) Restringir os produtos/serviços (Ato a requerer: Pedido de retificação);
c) Pronunciar-se sobre os motivos de recusa, apresentando argumentos que os contrariem (Ato a requerer: Resposta à Recusa Provisória);
d) Apresentar declaração de consentimento do titular do sinal obstativo (Ato a requerer: Declaração de consentimento);
e) A prática de qualquer um destes atos deve ser efetuada junto deste Instituto (online em www.inpi.pt ou em papel, através de Formulário próprio) no prazo de um mês, nos termos do n° 6 do artigo 237°, sob pena de a recusa se tornar definitiva.
No caso de não manter o interesse neste sinal, pode o requerente formular um novo pedido junto do INPI (online em www.inpi.pt ou em papel, através de Formulário próprio), apresentando, para o efeito, um sinal diferente, que desencadeará um novo processo de registo»;
3.1.3 - Tal proposta de decisão mereceu a concordância da Diretora da Direção de Marcas e Patentes do Departamento de Marcas, Desenhos e Modelos do INPI, que no dia 3 de fevereiro de 2017, proferiu o seguinte despacho: «Concordo. Notifique-se»;
3.1.4 - Na sequência de resposta da recorrente, no dia 21 de abril de 2017, pelos Serviços Técnicos da Direção de Marcas e Patentes do Departamento de Marcas, Desenhos e Modelos do INPI, foi elaborada a proposta de decisão cuja cópia se encontra a fls. 35-37, da qual consta, além do mais, o seguinte:
«Depois de efetuadas pesquisas de anterioridade, verifica-se a existência de um reito anterior: a marca da união europeia n° 006830401 PURE ENERGY, da titularidade de Pure Enegy Centre Ltd.
Em consequência, verifica-se que:
A marca da união europeia n° 006839401 PURE ENERGY - tendo sido apresentada em 16.04.2008 e registada em 16.04.2012 - goza de prioridade relativamente ao presente pedido de registo;
Por outro lado, entre os produtos que se pretende identificar com a marca em estudo (classe 04.a: ENERGIA ELÉTRICA A PARTIR DE FONTES DE ENERGIA NÃO RENOVÁVEIS; ENERGIA ELÉTRICA A PARTIR DE FONTES DE ENERGIA RENOVÁVEIS) e os produtos relativamente aos quais a marca prioritária se encontra registada - entre outros, classe 04.a: HIDROGÉNIO COMO COMBUSTÍVEL PARA USO DOMÉSTICO E COMERCIAL; COMBUSTÍVEL DE HIDROGÉNIO PARA
AQUECIMENTO; COMBUSTÍVEL DE HIDROGÉNIO PARA MEIOS DE TRANSPORTE, EM ESPECIAL PARA VEÍCULOS TAIS COMO AUTOMÓVEIS E BARCOS; COMBUSTÍVEL DE HIDROGÉNIO PRODUZIDO COM RECURSO A FONTES DE ENERGIA RENOVÁVEIS TAIS COMO A ENERGIA EÓLICA OU A ENERGIA SOLAR. -, estabelece-se, em nosso entender, um elo de afinidade, na medida em que entre os produtos em apreço, por terem natureza semelhante, pode haver coincidência nos circuitos de distribuição, nos métodos de utilização e no público consumidor, além disso são produtos com carácter complementar;
Por último, do confronto entre o sinal requerido - PURAENERGIA - e a marca prioritariamente registada - PURE ENERGY -, ressalta, em nosso entender, uma forte semelhança gráfica, fonética e concetual, desde logo por o sinal registando praticamente reproduzir na íntegra a marca prioritariamente registada, uma vez que se trata de uma tradução, para língua portuguesa, da mesma, conforme supra demonstrado.
Um consumidor médio quando confrontado com o sinal registando poderá ser induzido em erro de associação, crendo que aquele é uma derivação da marca registada, ou poderá ser induzido em erro de confusão, pois quando adquire os produtos pode não ter presente os sinais para fazer uma análise comparativa no momento podendo, assim, confundi-los entre si.
Face ao exposto, cremos que a coexistência dos sinais em confronto dificilmente permitirá a sua destrinça por parte de um consumidor médio, podendo suscitar a indução em erro quanto à proveniência empresarial dos produtos em causa.
Relativamente à comparação dos produtos e serviços:
No que respeita, à afinidade esta pode existir entre produtos destinados a satisfazer necessidades diferentes mas que, na organização económica, industrial ou comercial, costumem aparecer associados.
Considerando que a legislação aplicável não descreve o conceito de afinidade entre produtos, a jurisprudência e a doutrina têm vindo a determinar alguns critérios para verificação desta conexão. Desta forma, para aferir da afinidade entre produtos é necessário, entre outros critérios, determinar se os mesmos são concorrenciais, têm a mesma utilidade e fim, ou se são complementares, acessórios ou substituíveis.
A ideia de afinidade está assim ligada à ideia de proximidade, e no caso em apreço, atendendo à natureza dos produtos designados pela marca registanda e pelas marcas prioritariamente registadas, são por só evidentes a sua identidade e afinidade, dada a sua mesma natureza, utilidade, e destino.
Relativamente à comparação dos sinais:
Conforme preconizado pelo Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, em 8 de Maio de 2003 (Relator Juiz Conselheiro Ferreira de Sousa) no caso de marcas mistas, isto é, compostas simultaneamente por elementos figurativos e nominativos, a experiência demonstra que o elemento nominativo é, em regra, o mais importante para a apreciação do risco de confusão.
Este elemento prevalecente vem sendo entendido como sendo o elemento nominativo, uma vez que o consumidor referir-se-á à marca pelo seu nome e não propriamente descrevendo o seu elemento figurativo (cfr. a Decisão do TPICE, datada de 18 de Fevereiro de 2002, processo T-10103, Jean.-Pierre Koubi contra IHMI).
Pura energia
Assim, do confronto entre o sinal misto requerido energia „ requerido, cujos elementos nominativo são PURAENERGIA e a marca verbal PURE ENERGY', prioritariamente registada, ressalta, em nosso entender, uma forte semelhança gráfica, fonética e concetual, desde logo por o sinal registando praticamente reproduzir na íntegra a marca prioritariamente registada, uma vez que se trata de uma tradução, para língua portuguesa, da mesma, conforme supra demonstrado, pelo que dificilmente permitirá a sua destrinça por parte do consumidor médio, podendo suscitar a indução em erro relativamente, à proveniência empresarial dos produtos julgando, por exemplo, que esta marca identifica uma linha mais especifica ou outra variante da marca anterior, ou que algum tipo de relação existe entre as respetivas entidades.
Proposta de decisão
Em face do exposto, propõe-se que a anterior decisão de recusa provisória se converta em definitiva, nos termos do n° 9 do artigo 237° do CPI, e, nessa medida, que o presente pedido de registo seja recusado com os fundamentos acima indicados»;
3.1.4 - Tal proposta de decisão mereceu a concordância da Diretora da Direção de Marcas e Patentes do Departamento de Marcas, Desenhos e Modelos do INPI, que no dia 24 de abril de 2007, proferiu o seguinte despacho:
Concordo. Notifique-se»;
3.1.5 - A marca da UE n° 006839401 Pure Energy foi apresentada a registo em 16/04/2008 e registada em 16/04/2012, a favor de Pure Energy Centre Ltd, e destinando-se a assinalar:
Na classe 4a da Classificação Internacional de Nice: «Hydrogen as a fuel
for domesticcommercial purposes; hydrogen fuel for heating; hydrogen fuel for transport, especially vehicles such as carsboats; hydrogen fuel produced using renewable energy sources, such as wind energysolar energy».
Na classe 41a da Classificação Internacional de Nice: «Education and
providing of training in fields of energy self-sufficiency, distributed energy generation, hydrogen production, especially from renewable energy sources,hydrogen powered vehicles; organizationconducting of educationalinformational seminars in the field of energy self- sufficiency, distributed energy generation, hydrogen production, especially from renewable energy sources,hydrogen powered vehicles».
Na classe 42a da Classificação Internacional de Nice: «Na 42 Scientificand technological servicesresearchdesign relating thereto; industrial analysisresearch services; each of the above especially in relation to renewable energy systems, distributed energy generationhydrogen production systems, especially hydrogen production from renewable energy sources such as wind energy,hydrogen powered vehicles; energy consultancy servi ces, especially consultancy in relation to renewable energy, distributed energy generation, hydrogen production, especially hydrogen production from renewable energy sources»

3.2 - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO:
3.2.1 - Dispõe o art. 1° do Código da Propriedade Industrial, que «a
propriedade industrial desempenha a função de garantir a lealdade da concorrência, pela atribuição de direitos privativos sobre os diversos processos técnicos de produção e desenvolvimento da riqueza».
Um desses direitos privativos é a marca, entendida como «o sinal
adequado a distinguir os produtos ou serviços de um dado empresário em face dos serviços e produtos dos demais, ou, por outras palavras, o sinal destinado a individualizar produtos ou mercadorias, ou serviços, e a permitir a sua diferenciação de outros da mesma espécie».
O n° 1 do art. 222°, do CPI dá-nos a noção de marca, ao estatuir que «a marca pode ser constituída por um sinal ou conjunto de sinais suscetíveis de representação gráfica, nomeadamente palavras, incluindo nomes de pessoas, desenhos, letras, números, sons, a forma do produto ou da respetiva embalagem, desde que sejam adequados a distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas», acrescentando o n° 2 que «a marca pode, igualmente, ser constituída por frases publicitárias para os produtos ou serviços a que respeitem, desde que possuam carácter distintivo, independentemente da protecção que lhe seja reconhecida pelos direitos de autor».
Nos termos do art. 223°, n° 1, al. a), do CPI, «não satisfazem as condições do artigo anterior (...) as marcas desprovidas de qualquer carácter distintivo».
A marca é, pois, um sinal distintivo de produtos e serviços, destinada a diferenciá-los, de outros idênticos ou afins, podendo ser constituída por um sinal ou conjunto de sinais, que se mostrem suscetíveis de representação gráfica, nas espécies possíveis de nominativas, figurativas0, mistas
plásticas, formais ou tridimensionais, e sonoras, mas também que tenham capacidade distintiva, ou seja, que sejam aptos, por si só, a individualizar uma determinada espécie de produtos e serviços.
A marca tem, pois, essencialmente, uma função distintiva, não obstante poder, complementarmente, desempenhar uma função de garantia da qualidade dos produtos e serviços (função derivada) e uma função de publicidade (função complementar).
No dizer de PEDRO SousA E SILVA, «a função essencial da marca e a de indicar a proveniência dos produtos ou serviços (...) para que o consumidor possa orientar a sua escolha, quando confrontado com uma pluralidade de opções. A marca proporciona-lhe, assim, um referencial unívoco para a aquisição de bens e serviços, a que atribui determinadas qualidades ou características, provenientes de uma dada organização empresarial (...) considerando-se que têm uma única origem todos os produtos que hajam sido fabricados sob o controlo comum de uma mesma entidade, ainda que no âmbito de um grupo de empresas ou ao abrigo de contratos e licença».
Nisto consiste a função distintiva e indicativa da marca.
Para cabal desempenho da sua função é essencial que seja garantida a exclusividade do uso da marca, razão pela qual se tornou objeto de propriedade industrial, constituída através do respetivo registo, nacional, comunitário ou internacional.
No caso concreto, a marca tem proteção comunitária, pelo que importa trazer à colação o Regulamento (CE) n° 207/2009 do Conselho, datado de 26 de Fevereiro de 2009, sobre a marca comunitária.
Dispõe o art. 1° do Regulamento:
1. São designadas «marcas comunitárias» as marcas de produtos ou serviços registadas nas condições e de acordo com as regras previstas no presente regulamento.
2. A marca comunitária tem carácter unitário. A marca comunitária produz os mesmos efeitos em toda a Comunidade: só pode ser registada, transferida, ser objecto de renúncia, de decisão de extinção de direitos do titular ou de anulação, e o seu uso só pode ser proibido, para toda a Comunidade. Este princípio é aplicável salvo disposição em contrário do presente regulamento.
Nos termos do n° 1 do art. 16°, n° 1 (artigo que tem por epígrafe
«Equiparação da marca comunitária à marca nacional», «a marca comunitária enquanto objeto de propriedade é considerada na sua totalidade e para o conjunto do território da Comunidade como uma marca nacional registada no Estado-Membro em que, de acordo com o registo de marcas comunitárias:
a) O titular tenha a sua sede ou domicílio na data considerada;
b) Se a alínea a) não for aplicável, o titular tenha um estabelecimento na data considerada».
Como é sabido, na composição das marcas vigora o princípio da liberdade, limitado, porém, por duas ordens de razões:
- uma, respeitante aos sinais em si mesmo considerados e à suscetibilidade que tenham de constituir uma marca (limites intrínsecos);
- outra, atinente respeito aos sinais confrontados com situações anteriores, caso de existência de marcas anteriormente registadas para produtos ou serviços afins (limites extrínsecos).
O n° 1 do art. 9° do Regulamento («Direito conferido pela marca comunitária») dispõe assim, nas suas ais. a) a c):
1. A marca comunitária confere ao seu titular um direito exclusivo. 0 titular fica habilitado a proibir um terceiro de utilizar, sem o seu consentimento, na vida comercial:
a) Um sinal idêntico à marca comunitária para produtos ou serviços idênticos àqueles para os quais esta foi registada;
b) Um sinal que, pela sua identidade ou semelhança com a marca comunitária e pela identidade ou semelhança dos produtos ou serviços abrangidos pela marca comunitária e pelo sinal, provoque o risco de confusão no espírito do público; o risco de confusão compreende o risco de associação entre o sinal e a marca;
c) Um sinal idêntico ou similar à marca comunitária, para produtos ou serviços que não sejam similares àqueles para os quais a marca comunitária foi registada, sempre que esta goze de prestígio na Comunidade e que o uso do sinal sem justo motivo tire partido indevido do carácter distintivo ou do prestígio da marca comunitária ou lhe caprejuízo.
O n° 1 do art. 224° do CPI estatui, por sua vez, que «o registo confere ao
seu titular o direito de propriedade e do exclusivo da marca para os produtos e serviços a que esta se destina».
Assim, o registo da marca apenas é concedido no caso de se mostrarem verificados determinados requisitos:
a) uns, de natureza formal, e que são os mencionados nos arts. 25° e 26° do Regulamento, e 24°, 233° e 234°, do CPI;
b) outros, de natureza substancial de proteção, os quais, por sua vez, se podem classificar em:
- absolutos, destinados a garantir que o sinal registando é apto a desempenhar a sua função distintiva e indicativa para uma determinada categoria de produtos ou serviços, a eles se reportando o art. 238° do CPI, ao impor diversas proibições absolutas ao registo de marca; e
- relativos, destinados à salvaguarda dos direitos de terceiros anteriormente constituídos, a eles se reportando o art. 239° do CPI, ao estabelecer proibições relativas ao registo da marca.
Assim sendo, deve ser recusado o registo da marca que reproduza ou imite, no todo ou em parte, marca anteriormente registada por outrem para produtos ou serviços idênticos ou afins, que possa induzir em erro ou confusão o consumidor ou que compreenda o risco de associação com a marca registada (art. 239°, n° 1, ai. a), do CPI).
Este preceito deve ser conjugado com o art. 245° do CPI, cujo n° 1 dispõe assim:
«1 - A marca registada considera-se imitada ou usurpada por outra, no todo ou em parte, quando, cumulativamente:
a) A marca registada tiver prioridade;
b) Sejam ambas destinadas a assinalar produtos ou serviços idênticos ou afins;
c) Tenham tal semelhança gráfica, figurativa, fonética ou outra que induza facilmente o consumidor em erro ou confusão, ou que compreenda um risco de associação com marca anteriormente registada, de forma que o consumidor não as possa distinguir senão depois de exame atento ou confronto».
No que respeita ao primeiro requisito, é questão isenta de dúvidas que a marca da UE n° 006839401 Pure Energy, apresentada a registo em 16/04/2008 e registada em 16/04/2012, a favor de Pure Energy Centre Ltd, beneficia de prioridade relativamente à marca registanda.
As «coisas» complicam-se é relativamente aos requisitos a que aludem as transcritas ais. b) e c) do n° 1 do art. 245° do CPI.
No que respeita ao requisito previsto na ai. b), importa anda atentar no n° 2 do mesmo artigo.
Assim, dispõe o n° 2 do art. 245° do CPI:
«Para os efeitos da alínea b) do n.º 1:
a) Produtos e serviços que estejam inseridos na mesma classe da classificação de Nice podem não ser considerados afins;
b) Produtos e serviços que não estejam inseridos na mesma classe da classificação de Nice podem ser considerados afins».
Segundo Carlos Olavo, «é necessário que os sinais distintivos em causa
se reportem aos mesmos produtos ou serviços, ou a produtos ou serviços afins; é o chamado princípio da especialidade das marcas», acrescentando que «a afinidade entre produtos ou serviços afere-se em face do próprio objecto do direito à marca, que é o de distinguir a respectiva origem empresarial. Para que haja possibilidade de confusão sobre a origem empresarial dos produtos ou serviços, há que ter em atenção diversos factores, nomeadamente a natureza e o tipo de necessidades que os produtos ou serviços visam satisfazer e os circuitos de distribuição desses produtos ou serviços. Desta sorte, a doutrina tem considerado que o público atribuirá a mesma origem a produtos ou serviços de natureza e utilidade próxima e que sejam habitualmente distribuídos através dos mesmos circuitos. No juízo sobre a afinidade de produtos e serviços é irrelevante o número do reportório em que estejam inscritos ou a classe da tabela em que se integra».
Segundo Luís CouTo GONÇALVES, analisando o requisito da afinidade de produtos ou serviços afirma que «do que se trata não é de distinguir económica ou, sequer, de um modo juridicamente abrangente produtos ou serviços, mas, apenas, o de distinguir produtos e serviços no âmbito do direito de marcas.
Para além do critério da finalidade e utilidade dos produtos e serviços a doutrina refere ainda o critério da natureza (estrutura e características) dos produtos e serviços e o critério dos circuitos e hábitos de distribuição dos produtos e serviços. O grau de importância de cada um destes critérios é difícil de estabelecer aprioristicamente. É óbvio que quando todos os critérios puderem concorrer num caso concreto o conceito de afinidade sai claramente reforçado. O facto de os produtos ou serviços confrontados se destinarem à mesma finalidade e à satisfação da mesma utilidade, terem a mesma natureza e serem distribuídos, vendidos ou prestados através dos mesmos circuitos de comercialização, de modo simultâneo, indicia, com maior margem de segurança, a existência de afinidade. Nos casos em que não concorram, simultaneamente, todos os factores de apreciação de afinidade haverá que ponderar cuidadosamente o peso relativo de cada um e não perder de vista o risco de confusão quanto à origem dos produtos e serviços marcados de forma igual ou semelhante. Há casos em que o risco de afinidade aumenta. Referimo-nos aos casos em que possa mediar uma relação de substituição, complementaridade, acessoriedade ou derivação entre os produtos ou serviços ou, mesmo, entre produtos e serviços»
Nos termos do art. 258° do CPI, «o registo da marca confere ao seu titular o direito de impedir terceiros, sem o seu consentimento, de usar, no exercício de actividades económicas, qualquer sinal igual, ou semelhante, em produtos ou serviços idênticos ou afins daqueles para os quais a marca foi registada, e que, em consequência da semelhança entre os sinais e da afinidade dos produtos ou serviços, possa causar um risco de confusão, ou associação, no espírito do consumidor».
Conforme decidido no Ac. do STJ de 28.09.2010, Proc. n° 235/05.TYLSB.LI.S1 (Cons. HELDER ROQUE), in www.dgsi.pt «do carácter exclusivo do direito à marca emergem, assim, duas consequências, contempladas pelo artigo 258°, do CPI, sendo a primeira a de que o seu titular se pode opor à sua utilização por terceiros, sem o seu consentimento, e a segunda a de que um terceiro não pode utilizar, no exercício de actividades económicas, o sinal que constitua a marca de outrem, de modo a lesar o correspondente direito, confundível com marca registada para produtos ou serviços idênticos ou afins, sob pena de se constituir na autoria de um acto ilícito».
Ainda no mesmo acórdão, pode ler-se que «a imitação entre uma marca e uma denominação só existe quando a imitada e a imitante digam respeito ao mesmo produto ou serviço ou a produtos ou serviços semelhantes, ou afins, por imperativo do estipulado pelos artigos 189°, n° 1, m) e 193°, n° 1, do CPI, sendo certo, outrossim, que este último normativo não se basta com uma qualquer afinidade, porquanto exige que a mesma seja manifesta, isto é, clara, ostensiva, patente e indiscutível, sendo necessário que a apreciação de uma eventual imitação se faça, menos pelas dissemelhanças que ofereçam os seus diversos pormenores, considerados, isolada e separadamente, do que pelas semelhanças do conjunto dos elementos que a constituem, por forma a afastar-se, terminantemente, a ideia de que só há imitação quando as semelhanças sejam tão marcadas, ou antes as dissemelhanças tão ténues que se torne necessário o confronto ou o exame atento para que as marcas se distingam.
Na apreciação das semelhanças existentes entre duas ou mais firmas, com vista a poder concluir-se pela confusão ou indução em erro, há que atender aos elementos preponderantes ou significantes, nominativos, figurativos ou emblemáticos, que integram o conjunto da sua composição, ou seja, aqueles elementos que, usualmente, o público mais conserva na memória, quer pela abreviatura ou expressão os tornar mais acessíveis a ser retidos, quer por, mais facilmente, serem pronunciados ou reproduzidos, desde que, só por si, sejam bastantes».
No caso concreto, temos que a marca registanda é destinada a assinalar na classe 4a da Classificação Internacional de Nice «Energia elétrica a partir de fontes de energia não renováveis; energia elétrica a partir de fontes de energia renováveis».
A marca da UE n° 006839401 Pure Energy, aqui prioritária destina-se destinando-se a assinalar, igualmente na classe 4a da Classificação Internacional de Nice, «Hidrogénio como combustível para fins domésticos e comerciais; hidrogénio combustível para aquecimento; combustível de hidrogénio para o transporte, especialmente os veículos, como carros e barcos; combustível de hidrogénio produzido utilizando fontes de energia renováveis, tais como a energia eólica ou energia solar».
Na decisão do INPI afirma-se que se estabelece aqui «um elo de afinidade, na medida em que entre os produtos em apreço, por terem natureza semelhante, pode haver coincidência nos circuitos de distribuição, nos métodos de utilização e no público consumidor, além disso são produtos com carácter complementar».
Na sentença recorrida exarou-se o seguinte:
«Em relação ao segundo requisito, o mesmo é decorrência do princípio da especialidade que vigora em sede de tutela do uso exclusivo da marca registada prioritária: o seu titular só goza do direito a esse uso exclusivo em
relação aos produtos e serviços para os quais aquela foi registada (produtos e serviços idênticos) ou quanto a produtos e serviços afins.
Lançando mão do critério orientador consagrado no artigo 245.°, n° 2 do CPI, podemos dizer que, para efeitos do preenchimento do conceito de afinidade a que se refere a alínea b) do n° 1 do mencionado artigo, produtos e serviços que respeitem à mesma divisão ou grupo classificativo podem não ser considerados afins, assim como produtos e serviços que não estejam inseridos na mesma divisão ou grupo classificativo podem ser considerados afins.
Neste contexto, é de realçar não só o facto de os produtos ou serviços serem concorrentes no mercado tendo a mesma utilidade e fim, como também a necessidade de encontrar a afinidade entre produtos e serviços à luz da finalidade essencial da marca - a finalidade distintiva (Luís M. Couto Gonçalves, Manual de Direito Industrial, Propriedade Industrial e Concorrência Desleal, 3a ed. rev. e aum., Almedina, 2012, p. 232).
Dado que a lei não define o que deva entender-se por similaridade ou manifesta «afinidade» entre produtos, para os efeitos da noção de imitação de marcas, a jurisprudência tem suprido esta omissão apelando a vários critérios, a saber:
1.° O critério da relação de afinidade económica: «Na falta de um conceito legal de «afinidade», esse critério económico é o que melhor se depara, assente na natureza substituível dos produtos em confronto que lhes cria a oportunidade de procura conjunta, imprimindo-lhes, através duma utilização para o mesmo fim, uma relação de aproximação dentro do mercado em que circulam que precisamente os torna afins, facilitando a aquisição de um em vez de outros, já que indiferentemente possibilitam a satisfação dos mesmo consumidores» - cfr. Ac. TRLisboa de 19.07.68, Boletim da Propriedade Industrial, no 4/69, p.570;
2.° O critério dos destinos e aplicações idênticos: Não definindo a lei o conteúdo da afinidade, terá esta de ser apreciada, em todos os casos, tendo como base os destinos e aplicações idênticos, isto é, a mesma utilidade e afinidade dos produtos, considerando-se afins os produtos quando estes são concorrentes no mercado, quando têm a mesma utilidade e fins - cfr. acs. STJ de 12.3.91, in B.M.J n° 405, p. 492; de 3.04.70, in BMJ n° 196, p. 265 e de 13.02.97 in BMJ n° 284, p. 238.
3.° O critério da concorrência entre os produtos no mercado - cfr. Ac. TRLisboa de 26.05.71, in BMJ 207, 225.
Para LUÍS COUTO GONÇALVES, in Direito de Marcas cit., p. 133, a jurisprudência tem sido praticamente unânime em realçar o facto de os produtos ou serviços serem concorrentes no mercado, tendo a mesma utilidade e fim, com o esclarecimento de que aquilo de que se trata, não é de encontrar a afinidade entre produtos e serviços, entre si, isoladamente, e sem um fim em vista, mas, antes, a de encontrar a afinidade entre produtos e serviços marcados, isto é, não desligados da finalidade essencial da marca, que é a finalidade distintiva».
«Para além deste critério, a doutrina refere ainda o critério da natureza (estrutura) dos produtos e o critério dos circuitos e hábitos de distribuição dos produtos e serviços» - idem ibidem.
«Na comparação entre duas marcas ou entre urna marca e outro sinal distintivo prioritário, a identidade ou afinidade dos sinais deve em primeiro lugar aferir-se em função dos produtos ou serviços a que se destinam, sendo necessário que estes se situem no mesmo mercado relevante, de modo a permitir urna relação de concorrência entre os agentes económicos que os oferecem ao público. Ou seja, exige-se que entre os produtos ou serviços se
verifique o que se costuma designar por elasticidade cruzada da procura (Ac. da RL, de 2/07/2013, proc. 451.06.7TYLSB.L1-7, em www.dgsi.pt)».
«Concretizando, a marca da recorrente assinala produtos da classe 4a, os quais se prendem com energias. Os produtos assinalados pela marca obstativa, tanto na classe 4a corno nas classes 41a e 42a também visam assinalar diversos tipos de energias para diversos usos».
«Encontra-se, pois, preenchido o requisito a que alude o art. 245°,1, b), do C. Prop.».
Consideramos assistir razão ao tribunal a quo!
Na verdade, face a todos os argumentos expendidos, existe afinidade entre os produtos e/ou serviços que constituem o universo da marca registanda e os que constituem o universo da marca prioritária; ou seja, há um grau de semelhança e proximidade entre os produtos e/ou serviços supra enumerados, suscetível de permitir uma procura conjunta, para satisfação de idênticas necessidades dos consumidores deste tipo de bens e/ou serviços.
Por outras palavras, ainda, entre os bens e/ou serviços de compreendidos numa e noutra marca pode mediar uma relação de substituição, complementaridade, acessoriedade ou derivação.
Está, pois, verificado o requisito da afinidade a que alude o art. 245°, n° 1, ai. b), do CPI!
E quanto ao requisito previsto na al. c), ou seja, quanto ao critério da confundibilidade das marcas em confronto?
A lei não elenca, nem lhe competia elencar, os casos de semelhança entre marcas, limitando-se a indicar os critérios para a determinar, cabendo ao intérprete e aplicador da lei, designadamente à jurisprudência, a tarefa de decidir, caso a caso e à luz desses critérios, sobre a sua verificação e consequente relevância para efeitos de recusa de registo.
Tanto na doutrina, como na jurisprudência, desde há muito se firmaram, no âmbito desta específica atividade hermenêutica, os seguintes princípios ou regras:
- o juízo comparativo deve ser objetivo, apurando-se se existe risco de confusão tomando em conta o consumidor ou utilizador final medianamente atento, sendo certo que geralmente se entende que o consumidor a que há que atender, no juízo a formular sobre a existência ou não de risco de confusão entre duas marcas, não é um consumidor concreto, mas um consumidor abstrato, não de todo e qualquer produto ou serviço, mas sim daquele a que a marca se destina. O critério de confundibilidade a ter em conta será, portanto, colocado na perspetiva do consumidor médio dos produtos ou serviços em questão, tomando em conta o estrato ou estratos populacionais a que primordialmente são destinados.
- para a formulação desse juízo, tal como vimos ser exarado no citado Ac. do STJ de 28.09.2010, relevam menos as dissemelhanças que ofereçam os diversos pormenores isoladamente do que a semelhança que resulta do conjunto dos elementos componentes, devendo ainda tomar-se em conta a interligação entre os produtos e serviços, por um lado, e, por outro, os sinais que os diferenciam. A comparação entre duas marcas deve ser feita tendo em conta que o comprador, quando compra um produto marcado com um sinal semelhante a outro que já conhecia, não tem simultaneamente as marcas sob os olhos para as comparar. Compra o produto por se ter convencido de que a marca que o assinala é aquela que retinha na memória. Por isso, também o Juiz não deve colocar uma das marcas ao lado da outra para proceder a um exame simultâneo das duas; o que deve fazer é examiná-las sucessivamente, de maneira a perguntar-se se a impressão deixada pela primeira é semelhante à da segunda, colocando-se em posição semelhante à do consumidor, que, por não ter as duas marcas ao mesmo tempo diante dos olhos, não pode fazer um exame comparativo, tendo de decidir com o auxílio da sua memória.
Como afirma PEDRO SOUSA BRITO, «a regra de ouro da comparação entre sinais é que esta deve fazer-se através de uma impressão de conjunto, sem dissecação de pormenores, como sublinha a jurisprudência comunitária, ao declarar que o consumidor médio apreende normalmente uma marca como um todo e não procede a uma análise das suas diferentes particularidades».
No Ac. do STJ de 18.03.2003, Proc. n° 03A545 (Cons. PONCE DE LEÃO), in www.dgsi.pt, decidiu-se que «o consumidor quando compra determinado produto marcado com um sinal semelhante a outro, que já conhecia, não tem à vista (em regra) as duas marcas, para fazer delas um exame comparativo. Compra o produto por se ter convencido, pela marca que o assinala, que é aquele que retinha na memória».
Por assim ser, é por intuição sintética e não por dissecação analítica que deve proceder-se à comparação das marcas, já que o que importa ter em conta é a impressão global, de conjunto, própria do público consumidor, que, desvalorizando pormenores, se concentra nos elementos fundamentais dotados de maior eficácia distintiva.
Ou seja: A imitação deve ser apreciada pela semelhança que resulta do conjunto dos elementos que constituem a marca, e não pelas diferenças que poderiam resultar dos diversos pormenores considerados isolados e separadamente».
No Ac. do STJ de 26.04.2001, Proc. n° 721/01 (Cons. OLIVEIRA BARROS), in http://www.colectaneadejurisprudencia.com, «em causa o princípio da
novidade da marca, destinado a proteger a sua função individualizadora, e, designadamente, de identificação da proveniência do produto ou serviço, a apreciação da confundibilidade assenta em dois princípios fundamentais, a saber:
a) - deve fundar-se num exame rápido, e, por isso, sintético, da marca, no seu todo (mais ou menos complexo);
b) - deve ser feita com referência à impressão geral suscitada no consumidor médio dos produtos ou serviços em questão, ao qual será raro mostrar-se possível proceder a um exame comparativo.
Menos pertinente, pois, para este efeito, uma indagação analítica das particularidades que no caso ocorram, importa ter em conta a impressão global, sintética, de conjunto, própria do público consumidor, que, desvalorizando pormenores, se concentra no(s) elementos(s) fundamental(is) 'a, dotado(s) de maior eficácia distintiva.
De reter é, por fim, que a comparação que define a semelhança é a que tem em conta um sinal e a memória que se possa ter doutro».
O risco de confusão abrange também o risco de associação, o que significa que existe risco de confusão não só quando os consumidores podem ser induzidos a tomar uma marca por outra e, consequentemente, um produto por outro (acreditando erroneamente tratar-se da mesma marca e do mesmo produto), mas também quando, distinguindo embora os sinais, ligam um ao outro e, em consequência, um produto ao outro, acreditando erradamente tratar-se de marcas e produtos pertencentes a sujeitos com relações de coligação ou licença, ou de marcas comunicando análogas qualidades dos produtos.
No caso destes autos:
- a marca comunitária anteriormente registada é, como se constata, meramente nominativa: PURE ENERGY ;
- a marca nacional registanda é mista, ou seja, composta simultaneamente por elementos figurativos e nominativos: Pura energia
A parte gráfica do sinal da marca registanda, limita-se a uma figura esférica muito simples em forma da letra G, com preenchimento em perspetiva, virada para a esquerda, logo, sem impacto no sinal, pelo que a circunstância de uma das marcas em confronto ser nominativa e a outra mista acaba por não assumir relevância diferenciadora.
No plano nominativo ou verbal, temos que ambas as marcas têm exatamente o mesmo significado, só que a marca registanda aparece escrita em língua portuguesa, enquanto a marca prioritária surge escrita em língua inglesa; no entanto, o seu significado conceituai é idêntico.
A reprodução sonora, essa é igualmente semelhante, apesar de pronunciadas em línguas diferentes.
No entanto, importa ter presente o seguinte: «pure energy» significa, em português, «enegia pura», ou «pura energia», o que significa que a marca prioritária é composta por palavras ou expressões de uso corrente.
Na verdade, as pessoas usam a expressão «pura energia» ou «energia pura», nos mais variados contextos do dia-a-dia.
Logo, dada a extrema frequência do seu uso, afigura-se insusceptível, por natureza, de apropriação por um único agente económico, precisamente por se tratar de uma marca extremamente «fraca».
Marcas fracas são, no dizer de PEDRO SOUSA E SILVA, «aqueles sinais que, embora apresentando um mínimo de capacidade distintiva, são constituídos quase exclusivamente por elementos de uso comum ou trivial, ou contêm símbolos (cabeça de boi para carnes ou folhas para produtos agrícolas) ou prefixos e sufixos (EURO, SUN, TEX, GAL) de uso muito vulgarizado». Este tipo de marcas, esclarece, «é susceptível de registo válido e
do benefício da consequente protecção, posto que se trate de um sinal minimamente dotado de eficácia distintiva (originária ou subsequente».
Porém, acrescenta, «o carácter de marca fraca implica que seja mais estreito o seu âmbito de protecção, no confronto com marcas potencialmente confundíveis».
Nestas situações, «constitui entendimento generalizado que o juízo sobre a confundibilidade deverá ser menos severo, já que a comparação com outras marcas deverá limitar-se à parte que seja original».
Assim sendo, o simples facto de, no caso sub judice:
- a marca registanda ser mista, e não apenas verbal ou nominativa, como é a marca prioritária;
- a marca prioritária surgir redigida em língua inglesa e a registanda em língua portuguesa,
é, afinal, suficiente para afastar o risco de confusão ou associação.
É que os sinais, para serem marcas, hão-de, afinal, como já se enfatizou, ser «adequados a distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas» (cit. 222°, n° 1, do CPI).
A marca, reitera-se esta ideia, deve, por definição e no cumprimento da sua função própria, ter capacidade distintiva o que significa que deve ser apta, por si mesma, a individualizar uma espécie de produtos e serviços.
Uma realidade destituída de capacidade identificadora não pode, por natureza, servir como marca, pouco importando que as palavras ou as figuras escolhidas sejam ou não fruto da imaginação ou criação do seu titular, ou antes, sejam vocábulos ou desenhos (v.g., letras, números) já conhecidos ou mesmo de uso corrente27.
O que é necessário é que, na composição da marca, o empresário não se aproprie de sinais (palavras, números, desenhos) que pertençam ao domínio público dos sinais necessários a todos os empresários (artífices, agricultores, vitivicultores, etc.) para o fim de eles apresentarem e oferecerem os seus serviços ou produtos28.
Tais sinais podem ser indispensáveis a todos os que operam no mercado económico por duas ordens de razões:
a) o sinal pode constituir a própria designação do produto (v.g., quanto à espécie, ao destino), em termos de, deste jeito, mais não estarmos do que em face de uma marca genérica, banal, necessária;
b) o sinal pode consistir num termo que indique as qualidades essenciais do produto ou do serviço e bem assim a sua composição, o destino, a quantidade.
Estamos, em tal caso, perante uma marca descritiva.
O legislador curou de enumerar, nas alíneas b), c), d) e e) do n° 1 do art. 223° do C.P.I. de 2003, as situações mais frequentes em que o sinal carece de capacidade distintiva.
Ora, precisamente, um dos limites intrínsecos ao princípio da liberdade na composição da marca é o instituído na alínea c) do n° 1 do cit. art. 223°: por falta de capacidade distintiva, não podem ser marcas «os sinais constituídos,
exclusivamente, por indicações que possam servir no comércio para designar a espécie, a qualidade, a quantidade, o destino, o valor, a proveniência geográfica, a época ou meio de produção do produto ou da prestação do serviço, ou outras características dos mesmos», ou se outra forma dizendo, «não são marcas os sinais (exclusivamente) específicos, descritivos e genéricos».
Específicos, afirma COUTINHO DE ABREU, são os signos que designam ou denotam a «espécie dos produtos - nomes comuns dos produtos ou figuras que os exprimem», por exemplo, a palavra ovo ou o retrato de um ovo não podem ser marcas de ovos.
Os sinais descritivos referem-se diretamente a características ou propriedades dos produtos; referem-se, por exemplo, à qualidade (Pura Lã para vestuário, desenho de cinco estrelas para azeite), à quantidade (1 Kg para pedaços de presunto, 1 Litro para vinho), ao destino (Pechincha), à época de produção do produto ou da prestação do serviço (A toda a hora, para os serviços de uma clínica), à proveniência geográfica (Coimbra para louças fabricadas nesta cidade). Os signos genéricos designam um género ou categoria de produtos onde se incluem os produtos (espécie) que se pretende marcar com um desses sinais (v.g. Refresco para laranjadas).
Todos estes sinais sem capacidade distintiva são irregistáveis como marcas quando, repita-se, apenas eles estejam em causa, quando se pretenda registar marcas exclusivamente compostas por tais sinais; já não assim, porém, quando eles sejam tão-só um dos elementos (ao lado de outros com capacidade distintiva) das marcas.
Na verdade, «uma marca pode ser distintiva se não for exclusivamente descritiva, ou seja, se, não sendo composta por elementos descritivos e não descritivos, a combinação oferecer um conjunto distintivo e, ainda, se não for directamente descritiva, ou seja, se só se limitar a sugerir ou evocar por forma inabitual e invulgar uma característica do produto ou serviço designando-se, nesta última hipótese, por marca sugestiva, expressiva ou significativa».
Com efeito, «as marcas sugestivas, que tanto podem sugerir o nome do produto ou serviço como as respectivas características, são marcas perfeitamente válidas embora o regime de protecção seja mais ténue, especialmente no tocante ao juízo de confundibilidade».
Efectivamente, enquanto, «no caso das marcas fortes - assim designadas porque não apresentam referência conceituai ao produto ou ao serviço que distinguem ou não fazem parte do património semântico comum (marcas arbitrárias e de fantasia, respectivamente) - só uma diferença tipo poderá afastar o juízo de imitação», já «no caso das marcas débeis - compostas por meras alterações morfológicas do nome do produto ou serviço (marcas expressivas) ou, ainda, por expressões ou figuras integrantes da linguagem ou património comum - uma pequena variação poderá ser suficiente para que o juízo de confusão seja afastado».
Isto porque «é, na verdade, útil, sob o ponto de vista comercial, que a marca possa, por si mesma, sugerir ou deixar adivinhar o objecto assinalado».
«Mas é igualmente necessário acautelar o princípio da igualdade entre os concorrentes».
Ora, segundo se nos afigura, é o que se passa com as marcas «pure energy», por um lado, e «pura energia» ou «energia pura», por outro.
Tais palavras ou expressões podem integrar qualquer marca mas esta não pode ser concedida em exclusivo a quem quer que seja, já que ninguém pode ficar com o seu monopólio sob pena de se desvirtuarem as regras da concorrência.
Tratando-se, portanto, duma marca débil ou fraca, constituída por uma expressão integrante da linguagem ou património comum, diversamente do que ocorreria se se tratasse duma marca forte (em que apenas uma diferença relevante poderia afastar o juízo de imitação), uma simples alteração morfológica do nome do produto/serviço ou a mera adição dum elemento figurativo minimamente expressivo pode ser bastante para afastar o juízo de confusão.
É, quanto a nós, o caso dos autos.

4 - DECISÃO:
Por todo o exposto, acordam os juízes desta 7a Secção do Tribunal da Relação de Lisboa, em julgar a apelação procedente, em consequência do que:
4.1 - revogam a sentença recorrida e, consequentemente, o despacho da Diretora da Direção de Marcas e Patentes do Departamento de Marcas, Desenhos e Modelos do Instituto Nacional da Propriedade Industrial que, no dia 21 de abril de 2017, recusou o registo da marca nacional n° 572091 Pura energia
4.2 - decidem conceder totalmente o registo à referida marca nacional n° 572091 Pura energia
Sem custas.
Cumpra-se o disposto no art. 35°, n° 3, do Código da Propriedade Industrial.
Lisboa, 20 de dezembro de 2017
(José Capacete)
(Carlos Oliveira)
(Maria Amélia Ribeiro)
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