Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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    Jurisprudência da Relação Laboral
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Processo   Sec.                     Ver todos
 - ACRL de 19-04-2017   Contrato de trabalho. Requisitos.
Beneficiando um enfermeiro comunicador, que procede ao atendimento dos utentes, praticando actos de triagem, aconselhamento e encaminhamento, da presunção a que se refere o art. 12ºdo CT, por os factos concretizarem três dos índices de laboralidade previstos nesse preceito legal, mas logrando a Ré ilidir tal presunção, demonstrando ao tribunal que entre si e aquele não existia vínculo de subordinação jurídica, cumpre concluir que o contrato que vigorava entre o referido enfermeiro e a Ré não era um contrato de trabalho.
Proc. 2982/14.6TTLSB.L1 4ª Secção
Desembargadores:  Paula de Jesus Santos - Claudino Seara Paixão - -
Sumário elaborado por Isabel Lima
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Processo 2982/14.6TTLSB.L2
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa
I- Relatório
0 Ministério Público veio, ao abrigo do disposto nos artigos 26º nº1 al.i) e 186º K) do Código de Processo do Trabalho, instaurar acção de reconhecimento da existência de contrato de trabalho, contra L..., S.A, pedindo seja declarada a nulidade do contrato de prestação de serviços celebrado entre a Ré e E... e que seja reconhecida a existência de um contrato de trabalho entre eles.
Invoca, em resumo, o seguinte:
- E... presta a sua actividade de enfermeiro comunicador a favor da Ré, desempenhando funções de triagem, atendimento e encaminhamento de utentes, em local pertencente à Ré, utilizando equipamentos e instrumentos de trabalho pertencentes à Ré, atendendo chamadas para avaliação e encaminhamento de utentes, dando esclarecimento de dúvidas relacionadas com a saúde e encaminhamento para outras linhas de saúde, observando horas de início e termo da prestação, determinadas pela Ré através de uma escala de serviço mensal, acessível pela internet; existe o controlo dos tempos de trabalho prestados pelo trabalhador, e existem tempos de interrupção do trabalho para refeições, os quais são determinados pelo Supervisor;.o trabalhador é submetido a avaliações mensais e recebe o salário no dia 18 de cada mês;
- o referido E... iniciou a sua actividade para a Ré em 1-11-2010, mediante a subscrição de um contrato denominado de prestação de serviços, auferindo um salário de 8,75€ por hora;
- com a celebração do contrato de prestação de serviços, a Ré pretendeu iludir as disposições aplicáveis aos contratos de trabalho, com a intenção de prejudicar o trabalhador nos seus direitos legais.
Citada, a Ré contestou defendendo que a relação contratual entre as partes é de prestação de serviços e suscitou a inconstitucionalidade das normas que disciplinam a acção de reconhecimento da existência de contrato de trabalho.
O Ministério Público respondeu à contestação, pugnando pela constitucionalidade das normas em causa.

Foi proferida decisão que julgou .(...) inconstitucional e não aplicou as normas constantes dos art. 26º nº1 i) e 6, 186º k a 186º R do C.P.Trabalho, por violação dos princípios do Estado de Direito democrático, na sua vertente do princípio da segurança jurídica e do princípio da confiança, da Liberdade de Escolha do Género de Trabalho, e da Igualdade de Escolha do Género de Trabalho, e da Igualdade;
2) julgar verificada a excepção dilatória inominada consistente na inconstitucionalidade da acção de reconhecimento de existência de contrato de trabalho;
3) e, consequentemente, absolver-se a Ré da instância e declarar a extinção da presente instância.

O Ministério Público interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, que proferiu decisão a não julgar inconstitucionais as normas constantes dos art. 26º nº1 i) e nº6, 186º K a 186º R do CPT, e determinou a reforma da decisão de acordo com o juízo de não inconstitucionalidade.

Na sequência de notificação do tribunal a quo, a Ré informou que está pendente acção declarativa com processo comum, em que é Autor E... e Rés a ora Ré, a Caixa Seguros e Saúde, SGPS, SA e a Caixa Geral de Depósitos.
Alega que, nessa acção, E... invoca ter sido trabalhador subordinado da Ré entre 1 de Novembro de 2010 e 30 de Abril de 2014, e pede a condenação desta a pagar-lhe determinadas quantias a título de créditos laborais.
Tal acção deu entrada em juízo em 22-07-2014 sendo a Ré citada em 22 de Setembro desse ano, razão pela qual quando em 1 de Setembro de 2014 apresentou a sua contestação nos presentes autos, não tinha conhecimento da mesma, não invocando qualquer excepção. Alega ainda que naquela acção foi determinada a suspensão da instância em virtude do conhecimento oficioso da presente acção especial de reconhecimento de contrato de trabalho.

Foram ouvidas as partes, e foi proferida decisão que declarou verificada a excepção dilatória insuprível da falta de interesse processual (interesse em agir) do Autor Ministério Público e, consequentemente, absolveu a Ré L..., SA da instância e declarou a extinção da presente instância.

O Ministério Público interpôs recurso, que este tribunal julgou procedente, revogando a decisão recorrida e determinando, em consequência, o prosseguimento dos autos.

E... apresentou articulado próprio, pedindo seja reconhecida e declarada a existência de um contrato de trabalho entre si e a Ré, com a antiguidade reportada a 1 de Novembro de 2010.

A Ré exerceu o direito ao contraditório, pugnando pela improcedência da acção.

Foi realizado julgamento com observância do legal formalismo, no âmbito do qual as partes alcançaram acordo parcial sobre a matéria factual.

Foi proferida sentença que julgou improcedente a acção, absolvendo a Ré do pedido formulado pelo Autor.

Inconformado, o Ministério Público interpôs recurso, concluindo nas suas alegações que
1 - A douta decisão recorrida, julgou improcedente a acção especial para reconhecimento de contrato de trabalho interposta pelo Ministério Público contra a L…
SA, pedindo que fosse declarada a existência de um contrato de trabalho entre a Ré e o trabalhador E....
11 - Considerou o MMo Juiz a quo que a relação jurídica que existiu em a empregadora e o trabalhador não deve ser qualificada e reconhecida como laboral, antes como um contrato atípico e inominado ainda que no campo da prestação de uma actividade e, consequentemente absolveu-se a Ré empregadora do pedido formulado pelo Autor.
111- Discordamos de tal decisão, desde logo porque não se compreende motivo de, entre duas qualificações de contrato (de trabalho subordinado e contrato autónomo) e ainda do facto de o legislador ter consagrado uma presunção de laboralidade, com base na matéria que resultou provada, o Mmo Juiz a quo ter optado pela verificação de um contrato atípico, inominado, pois que mesmo admitindo que tal asserção é digna de reflexão, consideramos que no caso em apreço, tendo em conta o conceito teleológico de trabalho subordinado, importa atentar que segundo o método tipológico aceite há muito na doutrina e jurisprudência, há critérios que não têm de estar sempre presentes para a qualificação de um contrato como subordinado.
IV - No caso em apreço, o objecto social da Ré e a categoria, formação e funções desempenhadas pela maioria dos seus assalariados - enfermeiros - demonstra-nos que a contrapartida remuneratória variável, a realização do trabalho segundo uma escala de turnos e a possibilidade de troca de turnos entre os enfermeiros, o contrato escrito celebrado, denominado de prestação de serviços que as partes subscreveram e o facto de não haver exclusividade, contrariamente ao entendimento do Mmo Juiz a quo, não são motivos bastantes para afastar a qualificação do contrato como de trabalho subordinado.
V- Pois que no concreto enquadramento que se segue, não assumem primordial importância, antes se poderá concluir que assumem pouca expressão no contexto em que o mesmo foi executado, o que em nosso entender demandaria outro juízo interpretativo do disposto no art.º 11.º do Código do Trabalho.
VI - A Ré Empregadora L... SA é uma sociedade comercial anónima cujo objecto consiste na concepção, projecto, instalação, financiamento, exploração e transferência para o Estado Português do Centro de Atendimento do serviço Nacional de Saúde, nos termos previstos no Contrato de Prestação de Serviços aprovado por Despacho de 27 de Fevereiro, do Ministro da Saúde.
VII - Em 25 de Maio de 2006, a Ré/empregadora L... SA, celebrou com o Estado Português, através do Ministério da Saúde, contrato de prestação de serviços em regime de parceria público-privada, cuja cópia consta de fls 128 a 144 dos autos e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
VIII - Com vista à concepção, projecto, instalação, financiamento e exploração do Centro de Atendimento do Serviço Nacional de Saúde (Linha de Saúde 24) - Centro de Atendimento do SNS. Esta linha de Saúde 24, proporciona serviços de triagem, aconselhamento e encaminhamento em situação de doença via telefone, através do n.° 808242424 ou serviço on line (em www.saúde24.pt) bem como aconselhamento terapêutico para esclarecimento de questões e apoio em matérias relacionadas com medicação, assistência em saúde pública e informação geral de saúde e funciona todos os dias (365 dias por ano) e 24horas por dia.
IX - A Ré empregadora L... SA, passou a explorar o Centro de Atendimento do Serviço Nacional de Saúde, implementando uma linha de atendimento telefónico denominada Linha Saúde 24 a cuja exploração se dedicava e se destina a todos os utentes do Serviço Nacional de Saúde.
X - Aqueles serviços são prestados por via telefónica, executados num único espaço físico (um no Porto e outro em Lisboa) tendo cada um dos centros, um director designado pela Ré empregadora e contrata enfermeiros que prestam serviços nesses espaços físicos, dotados de logística necessária para o efeito, nomeadamente de plataforma de atendimento multicanal e de computador central, o qual guarda informação confidencial e sensível, nomeadamente dados pessoais e de saúde dos
utentes do Serviço Nacional de Saúde.
XI - Para o efeito a Ré contrata enfermeiros, sendo que os enfermeiros comunicadores prestam os seus serviços em regime de turno.
XII - Na data de 1 de Novembro de 2010,a Ré empregadora, na qualidade de primeiro contraente, e o trabalhador E..., na qualidade de segundo contraente, subscreveram o escrito particular denominado CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇO, cuja cópia consta delis 105 a 108 dos autos.
XIII - Na sequência do escrito particular referido em 8.º o Trabalhador passou a exercer funções para Ré L... SA, incumbindo-lhe proceder ao atendimento das chamadas efectuadas para a Linha de Saúde 24, procedendo à triagem, aconselhamento e encaminhamento dos utentes de acordo com as situações concretas que lhe eram expostas telefonicamente e ainda lhe incumbia prestar aconselhamento terapêutico para esclarecimento de questões dos utentes e apoio em matérias relacionadas com medicação, assistência, em saúde pública e informação geral de saúde público.
XIV- Os serviços do trabalhador eram prestados nas instalações da Ré/Empregadora, isto é no centro de atendimento telefónico situado na Avenida das Forças Armadas, 125-1. C, em Lisboa,
XV- Com recurso a ferramenta informática de protocolo cujos direitos de exploração pertenciam à Ré, utilizando material da Ré/empregadora nomeadamente terminal informático, monitor, teclado, rato, cadeira, mesa, linha telefónica e auscultadores com microfone.
XVI - Auferindo o trabalhador a quantia de €8,75 por cada hora de serviço, variando o valor do pagamento em função do número de horas/turnos que realizava, sendo que o valor hora era acrescido de 25/prct. relativamente a horas de serviço prestadas entre as 20h00 e a s 24h00 e de 50/prct. entre as 24h00 e as 8h00, sendo denominadas horas de qualidade.
XVII - Certo é que resultou também provado que a Ré permitia que os enfermeiros efectuassem trocas de turnos e o trabalhador efectuou muitas trocas com os colegas e substituiu e fez-se substituir, sendo que noutras ocasiões não compareceu para prestar funções nem se fez substituir. Não obstante, atente-se que as trocas, por imposição da Ré, não podiam conduzir à realização pelo mesmo enfermeiro de dois turnos consecutivos cfr. art. ° 53.º e só podiam realizar-se entre enfermeiros que prestassem funções na Ré empregadora cfr. 52.º.
XVIII - Contudo para apreciação desta questão, importa atentar que o trabalhador tipo da Ré, é justamente o enfermeiro e a Ré naturalmente tinha interesse em enfermeiros com experiência, o que se deduz das especificas funções cometidas a estes (triagem e encaminhamento dos utentes).
Muitos dos enfermeiros trabalhavam noutras instituições, sendo necessário para assegurar o serviço uma compatibilização e harmonização de horários com vista a que fosse assegurada a realização do maior número de turnos (cfr. matéria provada em 56.º).
Não devia pois dar-se o realce e repercussão na qualificação do contrato como o fez o Mmo Juiz a quo, já que tal sistema não pode ser apreciado isoladamente mas dentro do objectivo prosseguido pela Ré de rentabilizar o seu trabalho com enfermeiros experientes com vista à satisfação dos interesse que visa satisfazer - regulares e constantes, diga-se já que se trata da Linha de Saúde 24.
Acresce que a Ré sujeitava todos os enfermeiros à mesma formação, a todos controlava através de um supervisor, que esclarecia e tirava dúvidas, autorizando as pausas no momento julgado adequado pelo supervisor ou responsável de turno e a todos impunha o mesmo modo de trabalhar, com recurso a algoritmos.
Por conseguinte, no descrito quadro, para efeitos de qualificação do vínculo contratual, afigura-se desvalorizada esta característica de sistema de trocas, antes se afigurando um circunstancialismo pouco expressivo, sem realce, melhor dizendo, o sistema de trocas não permite afastar a qualificação do contrato como de trabalho.
XIX - Por conseguinte, no descrito quadro há que concluir que o facto de o trabalhador poder trocar os turnos que lhe eram previamente determinados pela Ré, em nada ofende a característica intuitu personae do contrato de trabalho, uma vez que o regime de trocas de turnos tinha como único escopo permitir à Ré assegurar o regular funcionamento dos seus serviços e a rentabilização o organização do serviço, sendo certo que essas trocas apenas podiam contemplar trabalhadores que estivessem integrados na sua estrutura organizativa e em moldes por si previamente regulados.
XX - Como se afiguram de pouco realce (no descrito quadro) as características enunciadas na douta sentença para afastar a qualificação como contrato de trabalho, no que concerne a: - avaliação que não foi valorizada pelo Mmo Juiz a quo por não ter repercussão na carreira ou ao nível disciplinar (o que contraria a matéria provada em art. °157.º que deu como provado que uma avaliação menos boa é geradora de um plano de recuperação e maior acompanhamento do enfermeiro).
- 35 dias de ausência, que por não dependerem da prévia aprovação da empregadora não se compatibilizam com contrato de trabalho (não obstante os enfermeiros não se podiam ausentar no Natal nem no fim de ano).
- às faltas ao turnos porque apenas tinham consequência ao nível da retribuição (no entanto, não podiam geram a realização pelo mesmo enfermeiro de dois turnos consecutivos para além de que devia ser comunicada com antecedência de forma a permitir elaboração da escala de turnos em conformidade com a falta e tinham repercussão no escalão já que verificando-se mais de três ausências num trimestre, no trimestre seguinte, o enfermeiro era pago pelo valor hora correspondente ao 1.º escalão - cfr. art.º 60.º).
- ao registo de tempos de trabalho que em seu entender apenas servia para permitir determinar as horas a remunerar (não obstante ficava registada a assiduidade e a comparência aos turnos).
- o contrato subscrito pelas partes cujos termos não foram da autoria do trabalhador já que o mesmo lhe foi apresentado pela Ré (sendo certo que a forma como foi executado o contrato contraria os termos do contrato escrito e é justamente a vontade que resulta do modo como o contrato foi concretamente executado que traduz a vontade real das partes).
- o não se verificar exclusividade por o trabalhador ter outro emprego no hospital de Cascais (sendo que nada impede que o trabalhador subordinado tenha mais do que um contrato de trabalho subordinado, com diferentes empregadores).
- a retribuição ser variável - em função do número de horas realizado (que não é um indício decisivo para a qualificação de contrato subordinado sobretudo no caso em apreço em que o trabalhador recebia de forma regular e constante posto que o número de turnos que assumia, variasse mensalmente)..
XXI - A matéria dada como provada demonstra a prova inequívoca dos factos consubstanciadores da presunção a que alude o art.º 12.º do Código do Trabalho, que estatui o seguinte:
Presume-se a existência de um contrato de trabalho quando na relação entre a pessoa que presta uma actividade ou outras de que dela beneficiam, se verifiquem algumas das seguintes características: a) A actividade seja realizada em local pertencente ao seu beneficiário ou por ele determinado. b) Os equipamentos e instrumentos de trabalho utilizados pertençam ao beneficiário da actividade. c) O prestador da actividade observe horas de início e de termo da prestação, determinadas pelo beneficiário da mesma. d) Seja paga, com determinada periodicidade, uma quantia certa ao prestador da actividade como contrapartida da mesma . e) O prestador da actividade desempenhe funções de direcção ou chefia na estrutura orgânica da empresa.
XXII - Pois que resultou provado que:
a) - o trabalhador E... prestava a sua actividade de enfermeiro comunicador para Ré, actividade essa completamente absorvida pelos interesses e objecto social da Ré, que dela beneficiava - cfr. Art.º 7.º, 99.º, 100.º, 8.º, ,9.º. 113.-°, 44.º 48. °, 49.º, .
b) -Em local pertencente à Ré - cfr. art.ºs 5.º, 24.º,10.º.
c) - Observando as horas de início e termo da prestação, impostas pela Ré, segundo o regime de turnos efectuados de Dezembro de 2010 a Abril de 2014 - cfr. 128.º , 158.º, 44.º, 45.º, 47.º, 48.º, 49.º, 50.º.
d) - Utilizando os equipamentos e instrumentos de trabalho pertença da Ré. - cfr. Artºs 24.-°, 25.º, 26.º, 27.º, 11.º, 12.º.
e) - Auferindo como contrapartida remuneratória quantia apurada em função de um valor/hora, fixada pela Ré e do tempo de trabalho- cfr. Art.º 63.º, 64.º, 13.º, 14.º, 15.º, 65.º, 67.º.
XXIII - Para além da verificação dos elementos consubstanciadores da presunção que a Ré não logrou ilidir pois que nada resultou provado no sentido da autonomia do trabalhador, antes todos os indícios são caracterizadores de passividade por parte do trabalhador no que concerne à gestão do trabalho, resultaram provadas ainda características da existência de contrato de trabalho com recurso aos elementos consignados no art.º 11.º do Código do Trabalho, atento o modo como empregador e trabalhador se comportavam e relacionavam no desenvolvimento e na execução do contrato, a saber:
a)- O trabalhador E... estava completamente integrado na estrutura administrativa e organizativa da Ré cuja maioria dos assalariados tinha a categoria de enfermeiro, inclusivamente os supervisores -cfr. Artºs 1.º, 17.º, 18.º, 3.º, 4.º, 5.º, 7.º, 99.º, 100.º, 8.º, 9.º, 113.º, 22.º, 23.º, 25.º, 26.º, 27.º, 10.º, 11.º, 12.º, 104.º, 105.º, 106.º, 108.º, 109.º, 110.º, 92.º, 111.º, 112.º, 44.º, 45.º, 47º9, 48.º, 49.º, 50.º, 63.º, 15.º, 67.º.
b) - Foi-lhe dada pela Ré formação profissional inicial e contínua, que aliás era proporcionada e imposta pela Ré a todos os enfermeiros comunicadores - cfr. art. ° 40.º, 41.º, 114.º, 42.º, 43.º.
c) - O trabalhador E..., como os seus colegas, trabalhava submetido ao controle do enfermeiro supervisor na realização das suas funções, períodos de pausa, esclarecimentos e dúvidas - cfr. art.ºs 78.º, 79.º, 160.º, 170.º, 161.°, 163.°, 169.º.
d) - O trabalhador estava sujeito a avaliação imposta e delineado pela Ré, com repercussão na retribuição e sujeito a um plano de recuperação - cfr. art.ºs 8.º, 58.º, 59.°, 150.º, 152.º, 153.º, 60.º 61.º, 156.º, 157.º, 78.°, 79.º, 170.º, 160.º, 161.°, 163.°, 169,º, 170.º,
e) - A sua prestação era determinada e conformada pela Ré, que elaborava as escalas, emitia orientações e directrizes, sendo monitorizado o seu desempenho no que se refere à qualidade do atendimento prestado aos utentes e tempo médio em que o atendimento era efectuado, devendo observar os tempos de pausa em conformidade com o estipulado pela Ré e o sistema imposto pela Ré, de algoritmos e critérios de atendimento impostos por esta - cfr. art.ºs 8.º, 48.º, 50.º, 58.º, 59.º, 150.º, 152.º, 153.º, 157.º , 80.º, 81.º, 82.º, 164.º, 165.º, 166.º, 84.º, 85.º, 87.º, 88.º, 89.º, 90.º,172.º, 173.º, 174.º.
f) - A sua prestação tinha carácter regular e duradouro já que trabalhou para a Ré desde 1 de Novembro de 2010 até Maio de 2004- cfr. art.ºs .
g) - Tinha direito a gozar um período de ausência de 35 dias, que era o concedido pela Ré a todos os trabalhadores, posto que por imposição da Ré não podiam ser gozados no período de Natal e na passagem do ano cfr 104.º, 105.º.
h) Os dias em que faltasse deviam ser comunicados até ao momento da elaboração da escala mensal correspondente ao mês a que respeitava o período em causa e no caso de ter mais do que três ausências num trimestre, tal tinha repercussão na retribuição já que seria pago pelo 1.º escalão (art. ° 60.º) - cfr. art.ºs 106.º, 107.°, 92.º,
XXIV - Estas características são clara e fortemente indiciadoras de subordinação jurídica já que dúvidas não há que a empregadora assume uma posição de supremacia atentos os poderes que detém, de conformar, controlar, supervisionar e avaliar o trabalho em causa, prestado pelo trabalhador E... nas instalações da Ré, de forma continuada e duradoura, com recurso aos meios disponibilizados por esta, contra o recebimento de contrapartida remuneratória regular apurada em função do valor/hora fixado pela Ré e do tempo de trabalho, posto que varie em função do número de horas realizadas.
XXV - Sendo que o trabalhador, conforme decorre da factualidade provada em 8.2, não teve qualquer intervenção na denominação do documento que subscreveram, denominado contrato de prestação de serviços, já que a Ré o elaborou e o apresentou ao trabalhador que se limitou a aderir- cfr. art.º 93.º da matéria dada como provada, razão por que se terá de concluir que no caso em apreço a real vontade das partes é a que corresponde à forma como o contrato foi executado.
XXVI - Termos em que se deve concluir que a relação contratual que vinculou o trabalhador E... à Ré L... SA com a antiguidade reportada a 1 de Novembro de 2010 consubstancia um verdadeiro contrato de trabalho subordinado, tal como definido no art.º 11.º do Código do Trabalho.
XXVII - E a douta sentença, ao declarar improcedente a acção proposta pelo Ministério Público, antes concluindo pela qualificação de um contrato atípico, violou por erro de interpretação e aplicação do direito o disposto no art.º11,º do Código do Trabalho.
XXVIII - Pelo que deve ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência ser a sentença revogada e substituída por outra que declare que a relação contratual que vinculou o trabalhador E... e a Ré L... SA, com a antiguidade reportada a 1 de Novembro de 2010 consubstancia um contrato de trabalho subordinado.
Mas Vossas excelências farão como sempre a Habitual Justiça.
A Ré contra-alegou, concluindo pela improcedência do recurso.

Os autos foram aos vistos aos Exmos Desembargadores Adjuntos.
Cumpre apreciar e decidir

II - Objecto
A única questão a decidir, de acordo com as conclusões de recurso apresentadas pelo recorrente, consiste em saber se entre E... e a Ré vigora um contrato de trabalho.
III - Fundamentação
São os seguintes os factos considerados provados pela primeira instância
1) A Ré/Empregadora é uma sociedade comercial anónima cujo objecto consiste na concepção, projecto, instalação, financiamento, exploração e transferência para o Estado Português do Centro de Atendimento do Serviço Nacional de Saúde, nos termos previstos no Contrato de Prestação de Serviços aprovado por Despacho de 27 de Fevereiro de 2006, do Ministro da Saúde.
2) Como resulta do respectivo objecto, a Ré/Empregadora procedeu à concepção, projecto e instalação do Centro de Atendimento do Serviço Nacional de Saúde.
3) Implementando uma linha de atendimento telefónico denominada Linha Saúde 24 a cuja exploração se dedicava.
4) A Linha Saúde 24 proporciona serviços de triagem, aconselhamento e encaminhamento em situação de doença via telefone, através do número 808 24 24 24 ou serviço on line (em www.saude24.pt), bem como aconselhamento terapêutico para esclarecimento de questões e apoio em matérias relacionadas com medicação, assistência em saúde pública e informação geral de saúde, e funciona todos os dias (365 dias por ano) e 24 horas por dia.
5) No sentido de dar resposta aos contactos telefónicos dos utentes, a Ré/Empregadora detém dois espaços físicos de centro de atendimento, um em Lisboa e outro no Porto.
6) Tendo cada um dos centros um director designado pela Ré/Empregadora.
7) E contrata enfermeiros que prestam serviços nesses espaços físicos.
8) Na data de 01 de Novembro de 2010, a Ré/Empregadora, na qualidade de «primeiro contraente», e o Trabalhador E..., na qualidade de «segundo contraente», subscreveram o escrito particular denominado «CONTRATO DE PRESTAÇÃO SERVIÇOS».
9) Na sequência da subscrição do escrito particular referido em 8), o Trabalhador passou exercer funções para a Ré/Empregadora, incumbindo-lhe proceder ao atendimento das chamadas efectuadas para a Linha Saúde 24, procedendo à triagem, aconselhamento e encaminhamento dos utentes de acordo com as situações concretas que lhe eram expostas telefonicamente.
10) Os serviços do Trabalhador eram prestados em instalações da Ré/Empregadora, isto é, no centro de atendimento telefónico situado na Av. das Forças Armadas, 125 - 12 C, em Lisboa.
11) Com recurso a uma ferramenta informática de protocolo cujos direitos de exploração pertenciam à Ré/Empregadora.
12) Utilizando material da Ré/Empregadora, nomeadamente, terminal informático, monitor, teclado, rato, cadeira, mesa, linha telefónica e auscultadores com microfone. 13) 0 Trabalhador recebia 8,75 € por cada hora de serviço, conforme consta do contrato assinado pelo Trabalhador.
14) 0 valor hora era acrescido de 25/prct. relativamente a horas de serviço prestadas entre as 20 e as 24 horas e de 50/prct. entre as 24 e as 8 horas, sendo denominadas horas de qualidade.
15) Em fim-de-semana ou feriado acresciam 25/prct. para serviço prestado entre as 81-100 e as 20H00, 50/prct. entre as 20H00 e as 24H00 e 100/prct. entre as 24H00 e as 81-100, sendo denominadas horas de qualidade.
16) Em 25 de Maio de 2006, a Ré/Empregadora celebrou com o Estado Português, através do Ministério da Saúde, contrato de prestação de serviços em regime de parceria público-privada.
17) Com vista à concepção, projecto, instalação, financiamento e exploração do Centro de Atendimento do Serviço Nacional de Saúde (Linha de Saúde 24) - Centro de Atendimento do SNS.
18) Ao abrigo do contrato referido em 16), a Ré/Empregadora passou a explorar o Centro de Atendimento do SNS.
19) No qual são prestados serviços de triagem, aconselhamento e encaminhamento, de assistência em saúde pública e de informação geral de saúde.
20) Este Centro de Atendimento foi instalado com o objectivo de ampliar e melhorar a acessibilidade dos cidadãos aos serviços de saúde, racionalizar a utilização dos recursos do serviço nacional de saúde, encaminhando os utentes para as instituições mais adequadas e esclarecendo-os em questões de saúde por via telefónica.
21) 0 Centro de Atendimento do SNS presta serviço de interesse público.
22) E destina-se a todos os utentes do Serviço Nacional de Saúde.
23) Aqueles serviços são prestados por via telefónica.
24) Tais serviços são executados num único espaço físico (um no Porto e outro em Lisboa).
25) Dotado da logística necessária para o efeito, nomeadamente de plataforma de atendimento multicanal e de computador central.
26) Esse computador central guarda informação confidencial e sensível, nomeadamente dados pessoais e de saúde dos utentes do Serviço Nacional de Saúde.
27) Estes equipamentos possuem as características técnicas necessárias para garantir a uniformidade e qualidade do serviço aos utilizadores da Linha Saúde 24, a saber (i) integração num sistema informático de armazenamento de dados, com especificações e programas de elevada dimensão, performance e complexidade e (ii) integração funcional de sistemas de comunicação (telefone, Thin Clients e headsets).
28) Para execução dos referidos serviços, os equipamentos referidos em 12) não são atribuídos pela Ré/Empregadora ao Trabalhador para uso exclusivo deste.
29) As secretárias aí existentes são utilizadas por quem, a cada momento, se encontre a executar os serviços em causa.
30) Pelo que nenhum dos prestadores dispõe de lugar pré-definido para a prestação daqueles serviços.
31) Em cada secretária encontra-se instalado computador, teclado e rato, ligados ao computador central por um Thin Client.
32) Os quais são utilizados indistintamente pelos prestadores que, em cada momento, se encontrem a prestar serviços nas instalações da Ré/Empregadora.
33) Apenas o auricular é atribuído especificamente a cada prestador de serviços.
34) 0 que sucede por razões de higiene e saúde.
35) 0 referido em 16) ocorreu após concurso público internacional obrigatório, no qual a Ré/Empregadora obteve vencimento.
36) A instalação do Centro de Atendimento (um no Porto e outro em Lisboa, ao qual se deslocava a Trabalhador) é uma iniciativa do Ministério da Saúde, visando ampliar e melhorar a acessibilidade dos cidadãos aos seus serviços, racionalizar a utilização dos recursos do Serviço Nacional de Saúde, encaminhando-os para as instituições mais adequadas e esclarecendo-os em questões de saúde, através de um número de telefone referido em 4), fax, um endereço de correio electrónico, e também através de um endereço de internet referido em 4).
37) O Centro de Atendimento S24 é gerido pela Ré/Empregadora tendo que atingir objectivos, contratados com o Estado Português, no atendimento de chamadas telefónicas dos cidadãos que precisem de apoio em problemas de saúde que tenham.
38) No serviço que a Ré/Empregadora presta está sempre em causa, como objectivo principal, a saúde e a vida dos cidadãos.
39) Com vista a operar com o equipamento existente no Centro de Atendimento, designadamente com programa informático complexo utilizado na triagem, aconselhamento e encaminhamento dos utentes, denominado CAS (Clinical Assessment Solutions), e de cumprir os critérios de atendimento, a Ré/Empregadora, proporcionou e assegurou ao Trabalhador a formação inicial, destinada a transmitir toda a informação necessária e adequada para o efeito.
40) A qual teve lugar logo a seguir à da subscrição do escrito particular referido em 8), 41) Formação essa que era dividida em duas componentes: a primeira em sala de formação, durante um período de 12 dias úteis; a segunda a observar o atendimento de chamadas feito por enfermeiros que já estivessem em funções ou a proceder a esse atendimento com o apoio desses enfermeiros, durante um período de 5 turnos distribuídos por dias diferentes.
42) O Trabalhador, por indicação da Ré/Empregadora, recebia formação em sala (designada como formação de reciclagem), sempre que havia necessidade de correcção de qualquer procedimento implementado ou a introdução de alterações de melhoria no protocolo de atendimento, nomeadamente quando eram emanadas pela Direcção Geral de Saúde directrizes ou orientações de cumprimento obrigatório para a Ré/Empregadora, por força do contrato que celebrou com o Estado Português.
43) A formação referida em 42) era considerada como tempo de serviço para efeitos de pagamento das horas de serviço.
44) No centro de Atendimento de Lisboa existiam turnos de 6/8 ou 9 horas.
45) Os turnos eram das 7H00 às 15H00, das 8H00 às 16H00, das 9H00 às 15H00, das 16H00 às 22H00, das 18H00 às 24H00, das 20H00 às 2H00 ou das 23H00 às 81-100.
46) No âmbito do contrato referido em 16), a Ré/Empregadora obriga-se a cumprir determinados níveis de serviço.
47) Por forma a assegurar o funcionamento adequado do Centro de Atendimento do SNS, a Ré/Empregadora estima mensalmente as suas necessidades para o mês seguinte.
48) Tendo em conta o fluxo previsível de chamadas telefónicas, que varia consoante a época do ano e as horas e dias da semana.
49) Com base nessa estimativa, a Ré/Empregadora define o nível de serviço que deve ser assegurado em cada período (diário, semanal e mensal), através da presença de determinado número de profissionais.
50) Essas escalas são disponibilizadas na intranet em meados do mês anterior àquele a que respeitam, de forma que os enfermeiros conheçam, com pelo menos 15 dias de antecedência, os períodos para que estão escalados.
51) Aquando da subscrição do escrito particular referido em 8), a Ré/Empregadora comunicou ao Trabalhador, tal como comunicava a todos os enfermeiros, que os enfermeiros podem trocar entre si os turnos que em concreto lhe haviam sido atribuídos pela Ré/Empregadora.
52) E mais comunica as referidas trocas só podem realizar relativamente a enfermeiros que prestem funções na Ré/Empregadora.
53) E que não podem conduzir à realização pelo mesmo enfermeiro de dois turnos consecutivos.
54) Tais trocas são acordadas entre os enfermeiros.
55) No decurso da sua relação contratual com a Ré/Empregadora, o Trabalhador efectuou trocas com colegas.
56) A Ré/Empregadora fazia a comunicação referida em 51) a todos os enfermeiros porque a existência de trocas era a forma de assegurar que os mesmos podiam realizar o maior número possível de turnos que lhe eram atribuídos tendo em consideração que aquela tinha conhecimento que, pelo menos, parte dos enfermeiros trabalhava noutras instituições.
57) A Ré/Empregadora instituiu um sistema de avaliação do serviço por si prestado pelos enfermeiros que monitorizava o desempenho de cada um deles no que se refere à qualidade do atendimento prestado aos utentes e tempo médio em que o atendimento era efectuado.
58) Na avaliação, a Ré/Empregadora analisava um conjunto de 3 chamadas por mês atendidas pelo Trabalhador seleccionadas aleatoriamente de entre todas as chamadas do período a que respeitava.
59) A avaliação trimestral incidia sobre a qualidade do atendimento, bem como sobre o tempo médio de atendimento por chamada, sendo atribuída pela Ré/Empregadora uma avaliação que variava entre 0/prct. e 100/prct..
60) O sistema de avaliação referido em 57), 58) e 59) pode determinar o valor hora pago aos enfermeiros de acordo com 6 escalões, sendo o valor hora no 1.º escalão € 8,75, no 2.º escalão € 9,19, no 3.º escalão € 9,71, no 4.º escalão € 10,33, 5.º escalão € 11,03 e no 6.º escalão € 11,81.
61) Traduzem-se num incremento do valor hora pago em conformidade com os escalões referidos em 60), aplicável no trimestre seguinte ao da avaliação em causa.
62) Sendo que, em caso algum, o enfermeiro pode auferir valor inferior a € 8,75 (1ºEscalão) e que corresponde ao valor inicialmente acordado com todos os enfermeiros,
63) A Ré/Empregadora pagava ao Trabalhador por cada hora de serviço que esta prestava.
64) Variando o valor do pagamento em função do número de horas/turnos que aquela realizava.
65) O Trabalhador auferiu da Ré/Empregadora, que lhos pagou após aquele lhe ter emitido os respectivos recibos, os seguintes valores: - em de 2014: € 392,55 em Maio, € 789,23 em Abril, € 615,17 em Março, € 658,44 em Fevereiro, e € 614,80 em Janeiro; - em 2013: € 678,13 em Dezembro, € 1.023,75 em Setembro, € 953,75 em Agosto, € 1.187,52 em Julho, € 764,97 em Junho, € 681,12 em Maio, € 984,31 em Abril, € 818,23 em Março e € 1.251,21 em Fevereiro, e € 948,94 em Janeiro; - em 2012: € 1.116,98 em Dezembro, € 1.351,61 em Novembro, € 1.614,05 em Outubro, € 1.199,63 em Setembro, € 840,00 em Agosto, € 1.247,53 em Julho, € 1.203,53 em Maio, € 1.048,27 em Abril, € 1.055,43 em Março, € 1.358,28 em Fevereiro e € 894,69 em Janeiro; - em 2011: € 1.306,77 em Dezembro, € 1.214,68 em Novembro, € 924,33 em Outubro, € 747,73 em Setembro, € 799,73 em Agosto, e € 1.019,09 em Julho.
69) Se a emissão do recibo electrónico for efectuada após o referido dia 13, o pagamento devido é processado apenas no dia 5 do mês seguinte.
66) 0 Trabalhador emitia e entregava à Ré/Empregadora recibo titulando as importâncias recebidas, do tipo fiscalmente definido para o rendimento de trabalho independente (vulgarmente designado recibo electrónico).
67) A Ré/Empregadora processa o pagamento devido aos enfermeiros em duas datas distintas, consoante o momento em que estes emitam o correspondente recibo electrónico.
68) Se a emissão do recibo electrónico for efectuada até ao dia 13 do mês seguinte ao da prestação do serviço, o pagamento é processado até ao dia 18 do mesmo mês.
69) Se a emissão do recibo electrónico for efectuada após o referido dia 13, o pagamento devido é processado apenas no dia 5 do mês seguinte.
70) A Ré/Empregadora nunca inscreveu o Trabalhador na Segurança Social como trabalhador da Ré/Empregadora.
71) Desde a data em que o Trabalhador começou a prestar serviços para a Ré/Empregadora (em 01.11.2010) nunca recebeu subsídio de férias nem subsídio de Natal.
72) Entre o Trabalhador e Ré/Empregadora não foi acordado que aquele prestava serviços a esta em regime de exclusividade, nem essa exclusividade foi condição essencial para a contratação.
73) Para além de que tal situação de exclusividade não se verificou ao longo da relação contratual mantida com a Ré/Empregadora.
74) Durante a qual o Trabalhador exerceu actividade profissional no HPP Hospital de Cascais Dr. J....
75) Os serviços contratados pela Ré/Empregadora ao Trabalhador não constituem a ocupação profissional exclusiva.
76) Quando subscreveu o escrito particular referido em 8), o Trabalhador já trabalhava no HPP Hospital de Cascais Dr. J... onde cumpria 40 horas semanais, horário este que cumpria através de turnos.
77) O Trabalhador não estava abrangido pela apólice de seguro de acidentes de trabalho contratada pela Ré/Empregadora.
78) Entre as 08h00 e as 24h00, por cada turno de enfermeiros estava presente um enfermeiro supervisor.
79) No período compreendido entre as 24h00 e as 08h00, por cada turno de enfermeiros não está presente qualquer enfermeiro supervisor.
80) Nos turnos com a duração de 8 horas e 9 horas, o Trabalhador tinha direito a intervalo de 1 hora que poderia gozar numa única pausa ou em duas pausas de 30 minutos cada uma.
81) Nos turnos de 6 horas, a Trabalhador tinha direito a pausa de 30 minutos.
82) As pausas referidas em 80) e 81) eram consideradas períodos de trabalho para efeitos de pagamento.
83) O Centro de Atendimento de Lisboa era composto por 9 ilhas, cada uma com 6 postos de atendimento, sendo utilizado por cerca de 200 enfermeiros comunicadores.
84) No Centro de Atendimento em Lisboa, os cerca de 200 enfermeiros comunicadores, que fazem o atendimento das chamadas telefónicas que são efectuadas pelos utentes (fazendo a triagem e avaliação dos sintomas), utilizam para o efeito uma ferramenta informática, que é o designado algoritmo clínico, ferramenta esta que, mediante a introdução da indicação dos vários sintomas que o utente informa, fornece uma disposição final.
85) Esses algoritmos clínicos, com origem no sistema de saúde britânico, constituem ferramenta informática que harmoniza e uniformiza um conjunto de regras, protocolos e procedimentos, instituídos por entidades nacionais e estrangeiras, para a actividade de enfermagem.
86) E são previamente aprovados pela Direcção Geral de Saúde.
87) O manuseamento do algoritmo implica conhecimentos específicos de profissional de saúde, nomeadamente de enfermeiro.
88) Compete ao enfermeiro comunicador escolher o algoritmo - de entre cerca de 200 algoritmos existentes - adequado a cada situação concreta, tendo em conta os sintomas relatados pelo utente.
89) Cada algoritmo contempla diversas questões que auxiliam o enfermeiro na triagem telefónica.
90) Os enfermeiros comunicadores podem alterar a disposição final fornecida pelo algoritmo, subindo ou descendo os cuidados de saúde sugeridos pelo mesmo, tendo em conta a sua avaliação da situação do utente.
91) Nos casos em que se apercebam logo de início que se tratam de urgência INEM, os enfermeiros comunicadores não percorrerem algoritmos clínicos, encaminhando directa e imediatamente o utente para o INEM.
92) Verificando-se mais de três ausências num trimestre, no trimestre seguinte, o enfermeiro é pago pelo valor hora correspondente ao 12 escalão referido em 60).
93) A Ré/Empregadora elaborou o escrito particular referido em 8) e apresentou-o ao Trabalhador.
94) Durante o tempo em que prestou funções para a Ré/Empregadora, o Trabalhador efectuou centenas de trocas com colegas e substituiu, ou fez-se substituir, por estes nesse exercício de funções em diversas ocasiões.
95) E, noutros casos, o Trabalhador não compareceu para prestar funções, nem se fez substituir.
96) Durante o tempo em que prestou funções para a Ré/Empregadora, o Trabalhador nunca se arrogou trabalhador desta, nem reclamou a existência de vínculo de trabalho subordinado ou as consequências daí decorrentes.
97) 0 Trabalhador só conseguiu compatibilizar, durante o tempo em que prestou funções para a Ré/Empregadora, a actividade profissional referida em 74) e 76), com as funções prestadas à Ré/Empregadora, uma vez que fez trocas referidas em 94) e também fez trocas no HPP Hospital de Cascais Dr. J....
98) No escrito particular denominado «CONTRATO DE PRESTAÇAO SERVIÇOS» e referido em 8), está consignado: «... Considerando que: 1. A Primeira Contraente assegura o funcionamento do Centro de Atendimento do Serviço Nacional de Saúde, através da Linha de Saúde 24. 2. A Linha de Saúde 24 presta cuidados aos respectivos utentes em situações de doença, mediante triagem, aconselhamento e encaminhamento para assistência e tratamento nas unidades do Serviço Nacional de Saúde, estando, portanto, sujeita aos normativos que regem a prestação de cuidados de saúde e tecnicamente organizada em função das exigências técnico-científicas e deontológicas do exercício das profissões de saúde. 3. 0 Segundo Contraente é enfermeiro e pretende prestar serviço na Linha de Saúde 24 sem sujeição à autoridade e à específica organização da Primeira Contraente, enquanto pessoa colectiva, mas tendo exclusivamente, em conta o fim essencial da protecção dos valores da saúde e da vida dos utentes da Linha de Saúde 24, o Direito da Saúde e as regras técnicas, científicas e deontológicas da enfermagem. 4. 0 exercício, em regime liberal da actividade do Segundo Contraente, nas referidas condições, é adequado ao exercício da enfermagem e à satisfação das necessidades da Linha de Saúde 24. Entre os referidos contraentes é convencionado e reciprocamente aceite o presente contrato de prestação de serviço, que se rege pelo disposto na lei e segundo as condições dos precedentes considerandos e das cláusulas seguintes: Cláusula Primeira 1. 0 Segundo Contraente compromete-se a prestar a sua actividade profissional de enfermagem, na Linha de Saúde 24, praticando actos de triagem, aconselhamento e encaminhamento dos utentes. 2. 0 Segundo Contraente prestará o serviço no local de funcionamento da Linha de Saúde 24, na Av. Das Forças Armadas, n° 125, 19 C, em Lisboa. Cláusula Segunda. 1. 0 Segundo Contraente compromete-se a cooperar com a Primeira Contraente, no sentido de, durante os primeiros 30 dias de vigência deste contrato, adquirir o cabal conhecimento dos equipamentos informáticos da Linha de Saúde 24, com os quais terá de operar para os fins da prestação de serviço. 2. A Primeira Contraente obriga-se a assegurar a adequada transmissão ao Segundo Contraente do conhecimento referido no número 1 desta cláusula. 3. Durante o período de transmissão de conhecimento previsto nesta cláusula, a Primeira Contraente pagará ao Segundo Contraente o valor/hora de 5 (cinco) euros, crédito que, na sua totalidade, se vencerá no final do primeiro ano de duração contratual. Cláusula Terceira 1. 0 Segundo Contraente deverá, de seis em seis meses, informar o responsável do Linha de Saúde 24 da sua possibilidade de prestar serviço por referência aos concretos modelos temporais de funcionamento da Linha de Saúde 24, e compromete-se à prestação de serviço nos tempos do modelo do sua opção que aquele responsável, em cada semestre, lhe adjudicar. Cláusula Quarta Cabe à Primeira Contraente assegurar as condições, designadamente, técnicas, organizativas e humanas, necessárias à boa prática dos actos profissionais do Segundo Contraente. Cláusula Quinta Pela execução dos actos profissionais a que o Segundo Contraente se obriga a Primeira Contraente pagar-lhe-á o valor de 8,75 (oito euros e setenta e cinco cêntimos) por cada hora de serviço efectivamente prestado. Cláusula Sexta O presente contrato tem a duração de um ano, com início no dia 18 de Julho de 2011 e termo no dia 17 de Julho de 2012, sem prejuízo da sua eventual renovação, nos termos que as partes vierem a acordar, por escrito, entre si. Cláusula Sétima Qualquer das partes poderá pôr termo ao presente contrato, sem justa causa, devendo para tanto avisar a outra parte com uma antecedência mínima de 30 dias... ».
99) Para assegurar a exploração dos referidos Centros de Atendimento no que concerne ao atendimento telefónico dos utentes, a Ré/Empregadora contrata os profissionais habilitados referidos em 7).
100) Sendo que os enfermeiros comunicadores prestam os seus serviços em regime de turno.
101) Por razões ligadas à complexidade do sistema informático utilizado e à necessidade de garantia de segurança e confidencialidade dos dados, não é possível a utilização pelos enfermeiros comunicadores de equipamentos próprios, designadamente informáticos, para a prestação do serviço à Ré/Empregadora.
102) Nem é viável o fornecimento disperso ou individual, por parte da Ré/Empregadora a cada enfermeiro comunicador, do equipamento necessário para a execução dos serviços em causa, atenta a sua complexidade, dimensão, elevado custo e, bem assim, a necessidade de garantir a segurança e confidencial idade dos dados guardados.
103) Pelo que os serviços têm que ser prestados nas instalações da Ré/Empregadora referidas em 5), e com recurso a equipamentos pertencentes a esta.
104) Aquando da subscrição do escrito particular referido em 8), a Ré/Empregadora comunicou ao Trabalhador, tal como comunicava a todos os enfermeiros comunicadores, que lhe concedida um período de 35 dias de ausência por ano, seguido ou interpolado.
105) E que esses dias podiam ser gozados em qualquer altura do ano, com excepção das últimas semanas de cada ano e que correspondiam ao período de Natal e da passagem de ano.
106) Devendo o Trabalhador comunicar tal período à Ré/Empregadora até ao momento da elaboração de escala mensal correspondente ao mês a que respeitava o período em causa.
107) 0 que o Trabalhador fazia através do preenchimento de impresso disponibilizado pela própria Ré/Empregadora e entregue ao gestor de turnos.
108) 0 qual introduzia o período indicado pelo Trabalhador no sistema para que não lhe fossem atribuídos turnos nesse período.
109) As escalas referidas em 50) são mensais e são geradas automaticamente pelo sistema informático.
110) 0 qual conjuga os referidos períodos de ausência comunicados com as necessidades de serviço referidas em 47) a 49).
111) A elaboração de escalas de serviço é fundamental na medida em que, funcionando a Linha Saúde 24 durante os dias e as horas referidas em 4), terá que se prever o número de enfermeiros necessário para assegurar o seu funcionamento permanente.
112) 0 Trabalhador comunicou à Ré/Empregadora os seguintes períodos de ausência: em 2011, 3 dias em Maio, 12 dias em Agosto, e 11 dias em Outubro, embora, neste último mês, só tenha utilizado efectivamente 5 dias; em 2013, 29 dias de Outubro; e em 2014, 14 dias em Abril.
113) Para além do referido em 9), ao Trabalhador incumbia também prestar aconselhamento terapêutico para esclarecimento de questões dos utentes e apoio em matérias relacionadas com medicação, assistência em saúde pública e informação geral de saúde.
114) Na formação em sala referida em 41), os formadores eram os supervisores da Ré/Empregadora e, para além dos conhecimentos referidos em 39), também continha transmissão de conhecimentos de natureza não clínica e não informática relacionados métodos de interacção com o utente por via telefónica.
115) Os enfermeiros que intervinham na formação em ambiente de atendimento e referidos em 41), eram designados pela Ré/Empregadora e avaliavam o grau de percepção e aplicação em cenário real de atendimento dos conhecimentos anteriormente adquiridos em formação em sala, considerando os itens utilização do sistema CAS, Comunicação, Caracterização da queixa, Percurso do Algoritmo, Procedimento não clínicos, Procedimentos clínicos, Cuidados em casa e Outro tipo de chamadas.
116) Sendo posteriormente entregues à Ré/Empregadora duas fichas com o resultado do processo de formação e avaliação.
117) As trocas referidas em 51) a 56) podiam consistir em trocas directas de turnos atribuídos nas escalas mensais, como podiam consistir em substituições com a entrega de um turno atribuído sem dar ou receber qualquer turno em troca.
118) 0 referido em 53) ocorre porque a Ré/Empregadora entende que o desgaste decorrente da realização de dois turnos seguidos poderia colocar em causa a qualidade do serviço prestado ao utente.
119) As trocas/substituições ocorrem sem qualquer intervenção da Ré/Empregadora, não carecendo de autorização desta ou da apresentação de qualquer justificação para o efeito.
120) A Ré/Empregadora solicita que as trocas/substituições previamente acordadas sejam registadas pelos enfermeiros comunicadores em impresso próprio fornecido pela Ré/Empregadora.
121) Sendo que tal pedido visa assegurar a possibilidade de actualizar as escalas em conformidade com as alterações acordadas entre os enfermeiros comunicadores.
122) 0 que é feito diariamente pelo gestor de turno.
123) Só sendo recusadas as trocas/substituições que conduziam à realização de dois turnos seguidos.
124) Tal actualização das escalas é fundamental para que os enfermeiros comunicadores, quando pretendem realizar trocas, possam saber com quem o poderão fazer, pois se consultassem a escala inicial (sem as trocas entretanto efectuadas) a mesma não teria certamente qualquer aderência à realidade.
125) As trocas/substituições de turnos entre os enfermeiros comunicadores são frequentes, sendo realizadas em número superior a 1000 por mês.
126) Sucedendo frequentemente que o enfermeiro comunicador que comparece nas instalações da Ré/Empregadora para assegurar determinado serviço é distinto daquele a quem o mesmo estava atribuído e sem que previamente tenha havido o registo referido em 120).
127) Situação a que a Ré/Empregadora não se opõe porque lhe interessa garantir o normal funcionamento da Linha Saúde 24, assegurando o nível de serviço a que se encontra obrigada por força do contrato referido em 16).
128) Durante o tempo em que o Trabalhador prestou funções para a Ré/Empregadora, esta atribuiu-lhe inicialmente os seguintes turnos e, em consequência das trocas referidas em 94), aquele realizou os seguintes turnos: - em Dezembro de 2010, 9 atribuídos, 14 realizados; - em Janeiro de 2011, 11 atribuídos, 11 realizados; - em Fevereiro de 2011, 10 atribuídos, 10 realizados; - em Março de 2011, 12 atribuídos, 12 realizados; - em Abril de 2011, 12 atribuídos, 14 realizados; - em Maio de 2011, 10 atribuídos, 13 realizados; - em Junho de 2011, 11 atribuídos, 15 realizados; - em Julho de 2011, 10 atribuídos, 10 realizados; - em Agosto de 2011, 6 atribuídos, 10 realizados; - em Setembro de 2011, 8 atribuídos, 14 realizados; - em Outubro de 2011, 6 atribuídos, 16 realizados; - em Novembro de 2011, 11 atribuídos, 19 realizados; - em Dezembro de 2011, 9 atribuídos, 13 realizados; - em Janeiro de 2012, 10 atribuídos, 22 realizados; - em Fevereiro de 2012, 9 atribuídos, 15 realizados; - em Março de 2012, 9 atribuídos, 17 realizados; - em Abril de 2012, 10 atribuídos, 20 realizados; - em Maio de 2012, 10 atribuídos, 19 realizados; - em Junho de 2012, 8 atribuídos, 6 realizados; - em Julho de 2012, 11 atribuídos, 12 realizados; - em Agosto de 2012, 10 atribuídos, 19 realizados; - em Setembro de 2012, 11 atribuídos, 23 realizados; - em Outubro de 2012, 10 atribuídos, 20 realizados; - em Novembro de 2012, 9 atribuídos, 17 realizados; - em Dezembro de 2012, 10 atribuídos, 16 realizados; - em Janeiro de 2013, 12 atribuídos, 19 realizados; - em Fevereiro de 2013, 10 atribuídos, 14 realizados; - em Março de 2013, 11 atribuídos, 15 realizados; - em Abril de 2013, 10 atribuídos, 12 realizados; - em Maio de 2013, 9 atribuídos, 12 realizados; - em Junho de 2013, 11 atribuídos, 14 realizados; - em Julho de 2013, 12 atribuídos, 14 realizados; - em Agosto de 2013, 12 atribuídos, 14 realizados; - em Setembro de 2013, 12 atribuídos, 10 realizados; - em Outubro de 2013, 1 atribuídos, 1 realizados; - em Novembro de 2013, 10 atribuídos, 10
realizados; - em Dezembro de 2013, 8 atribuídos, 9 realizados; - em Janeiro de 2014, 11 atribuídos, 9 realizados; - em Fevereiro de 2014, 0 atribuídos, 10 realizados; - em Março de 2014, 12 atribuídos, 12 realizados; - e em Abril de 2014, 8 atribuídos, 6 realizados.
129) Os turnos a que não compareceu referidos em 95) foram 2 em Janeiro de 2011, 1 em Fevereiro de 2011, 2 em Março de 2011, 1 em Abril de 2011, 1 em Dezembro de 2011, 1 em Março de 2012, 2 em Junho de 2012, 1 em Julho de 2012, 1 em Dezembro de 2013, 2 em Janeiro de 2014, 1 em Fevereiro, e 2 em Abril de 2014.
130) 0 Trabalhador não podia proceder a trocas/substituições relativamente a turnos que estavam atribuídos a um responsável de turno.
131) Os enfermeiros comunicadores não se encontram obrigados a justificar as suas ausências relativamente aos turnos que lhe estavam atribuídos e que não realizam, nem a apresentar documento comprovativo do motivo das mesmas.
132) A Ré/Empregadora solicita aos enfermeiros que, numa situação em que não possam assegurar o turno que lhes estava atribuído e não tenham conseguido nenhum outro enfermeiro para o fazer, que a avisem para que esta possa colmatar a sua ausência, solicitando a outro enfermeiro que realize aquele turno.
133) Nas escalas finais de turno, a Ré/Empregadora distingue as referidas ausências, assinalando umas a cor-de-laranja e outras a vermelho sendo que, para o efeito, releva o facto da Ré/Empregadora ter conhecimento ou não ter conhecimento do motivo da ausência respectivamente.
134) Apesar da referida distinção, a consequência das ausências traduz-se no não pagamento das horas de serviço do turno em causa.
135) Em Janeiro de 2014, a Ré/Empregadora pretendeu que o Trabalhador subscrevesse um escrito particular que alterava o conteúdo do escrito particular referido em 8) apenas no que respeita ao valor hora, por forma a que o mesmo passasse de € 8,75 para € 7,00.
136) 0 Trabalhador recusou subscrever essa alteração.
137) A Ré/Empregadora apresentou a todos os enfermeiros comunicadores um proposta igual à referida em 135).
138) Na sequência dessa recusa, em Março e Abril de 2014, a Ré/Empregadora apenas permitiu que o Trabalhador fizesse trocas/substituições com enfermeiros comunicadores que não tinham aceite a referida proposta, os quais perfaziam cerca de 15 a 20 pessoas.
139) E a partir do mês de Maio de 2014, a Ré/Empregadora deixou de incluir o Trabalhador nas escalas de turnos por si organizadas, não lhe atribuindo qualquer turno a partir daí.
140) O que fez com que o Trabalhador deixasse de exercer funções para a Ré/Empregadora.
141) A pretensão da Ré/Empregadora referida em 135) e a apresentação da proposta referida em 137) ocorreu porque o novo contrato para a exploração da Linha de Saúde 24 a partir de 2014 previa redução do valor a pagar pelo Estado Português.
142) E a Ré/empregadora entendeu ter necessidade de reduzir todo o tipo de custos associados à sua actividade, incluindo o custo o valor/hora pago a todos os enfermeiros comunicadores.
143) A limitação referida em 138) ocorreu porque a Ré/empregadora quis controlar os custos, evitando que os enfermeiros comunicadores que continuavam a receber € 8,75 pudessem fazer turnos dos enfermeiros comunicadores que aceitaram passar a receber € 7, 00.
144) 0 Trabalhador não requereu - nem lhe foi concedida - autorização para cumular o exercício de funções públicas no HPP Hospital de Cascais Dr. J... com vínculo de trabalho subordinado na Ré/Empregadora, em cumprimento do disposto nos artigos 282 e 292 da Lei n212-A/2008, de 2 de Fevereiro.
145) Nos períodos festivos do Natal e da passagem do ano, a Ré/Empregadora solicitava ao Trabalhador, e a todos os enfermeiros comunicadores, que indicasse a sua disponibilidade para realizar um turno designado como crítico e dois turnos designados como não críticos, sendo os primeiros os correspondentes às noites de Natal e passagem do ano e os segundos correspondentes ao dia 24 de Dezembro até às 20H00, dia 25, dia 31 de Dezembro até às 23H00 e dia 1 de Janeiro.
146) A Ré/Empregadora não impedia o Trabalhador de, em consequência de trocas/substituições, vir realizar turnos em dias que previamente tinha comunicado àquela como sendo períodos de ausência referidos em 104).
147) Por força do contrato referido em 1), a Ré/Empregadora obrigou-se a estabelecer um sistema de monitorização e de avaliação de desempenho dos níveis e qualidade do serviço por si prestado.
148) Para acompanhar o cumprimento destas obrigações, a Ré/Empregadora avalia regularmente os níveis e qualidade do serviço prestado ao utente e instituiu o sistema de avaliação referido em 57).
149) Este sistema de avaliação englobava a avaliação referida em 58) e a avaliação trimestral referida em 59).
150) Sendo que a avaliação era efectuada por um enfermeiro supervisor e incidia sobre critérios pré-definidos pela Ré/Empregadora.
152) Sendo que aquele enfermeiro supervisor tecia considerações sobre o desempenho do Trabalhador, bem como de qualquer enfermeiro comunicador, no âmbito das chamadas seleccionadas, dando indicações sobre o cumprimento ou não cumprimento daqueles critérios e dando instruções destinadas a corrigir aspectos que a Ré/Empregadora considerasse não estarem de acordo com os procedimentos implementadas e/ou a melhorar o respectivo desempenho.
153) A cada chamada referida em 58) era atribuída uma percentagem de 0/prct. a 100/prct. correspondendo essa percentagem à avaliação atribuída pela Ré/Empregadora ao Trabalhador.
154) No âmbito do contrato referido em 1), a forma de cálculo da retribuição devida pelo Estado Português à Ré/Empregadora depende de vários factores, entre os quais o tempo de atendimento das chamadas e a qualidade desse atendimento.
155) Sendo a Ré/Empregadora penalizada em caso de incumprimento daqueles parâmetros.
156) Os escalões referidos em 60) correspondem à aplicação pela 1@Ré de um sistema de incentivos/prémios com o objectivo de incentivar a melhoria contínua do serviço prestado ao utente, premiando os enfermeiros que obtém melhores resultados.
157) Quando um enfermeiro obtém um resultado da avaliação com o tempo de atendimento superior a 20 minutos e qualidade do serviço inferior a 50/prct., a 1ªRé sugere-lhe a realização de um plano de recuperação, no âmbito do qual, durante um trimestre, um enfermeiro supervisor passa a ouvir mais chamadas mensais, sugerindo-lhe estratégias e procedimentos com vista a diminuir o tempo de atendimento e a aumentar a qualidade de serviço.
158) 0 sistema informático (CAS) regista as entradas e saídas do serviço do enfermeiro comunicador, e todas as pausas por ele realizadas.
159) É a partir do registo referido em 158) que a Ré/Empregadora apura o número de horas de serviço prestadas por cada enfermeiro comunicador para efeitos de determinação do valor devido ao mesmo.
160) 0 enfermeiro supervisor referido em 78) dirige a actividade do Centro de Atendimento por forma a garantir que o serviço é prestado aos utentes com a maior qualidade possível e dentro das exigências contratualizadas com o Estado Português. 161) Apoiando os enfermeiros comunicadores no caso de estes se lhe dirigissem para trocar impressões ou pedir algum esclarecimento.
162) Mas cabendo sempre ao enfermeiro a última decisão relativamente ao encaminhamento do utente.
163) 0 enfermeiro supervisor fazia um registo das ocorrências relativas a falhas do sistema informático e outros equipamentos e a ausências e atrasos de enfermeiros comunicadores.
164) Dependendo da quantidade de chamadas recebidas, cada enfermeiro comunicador poderia ainda ser autorizado a gozar de pausa adicional de 10 minutos, o que era decidido pelo enfermeiro supervisor.
165) 0 momento concreto de realização da pausa por cada enfermeiro comunicador era indicado pelo enfermeiro supervisor.
166) Não podendo o enfermeiro comunicador interromper o atendimento sem dar prévio conhecimento ao enfermeiro supervisor.
167) Se os enfermeiros comunicadores realizarem pausas de períodos superiores aos referidos em 80), 81) e 164) esse tempo não é contabilizado para efeitos de pagamento.
168) Por vezes, o enfermeiro supervisor alerta os enfermeiros comunicadores de que o tempo de pausa se encontra ultrapassado.
169) Durante os turnos, o enfermeiro supervisor dava, ocasionalmente, indicações aos enfermeiros relativamente à manutenção de asseio do posto de atendimento e a não se dever comer e/ou utilizar telemóvel nesse posto.
170) No período referido em 79) a Ré/Empregadora designava como responsável de turno um enfermeiro comunicador entre aqueles que se encontrassem no atendimento telefónico e que, por possuir mais experiência, pudesse realizar as funções referidas em 160) a 165).
171) Apesar do referido em 89), cada enfermeiro comunicador tem de utilizar o seu conhecimento técnico para explorar e interpretar as queixas do utente e, dessa forma, percorrer o algoritmo, podendo colocar as questões que entenda pertinentes face à situação relatada.
172) As etapas da chamada e os seus tempos de duração eram previamente definidas pela Ré/Empregadora.
173) Devendo o enfermeiro comunicador cumprir as indicações de interacção com o utente que anteriormente foram definidas pela Ré/Empregadora no que se refere ao modo de tratamento do próprio utente e aos métodos utilizados para encaminhamento de acordo com o quadro clínico que era descrito.
174) O enfermeiro comunicador altera a disposição final por sua iniciativa mas deve justificar por escrito essa alteração.
175) A utilização dos algoritmos para a prestação do serviço de triagem, atendimento e aconselhamento dos utentes na Linha de Saúde 24 é imposta pelo contrato referido em 1).
176) Com o referido em 172) a 174) a Ré/Empregadora tinha em vista garantir a uniformização e qualidade dos cuidados de saúde prestados aos utentes dentro das exigências contratualizadas com o Estado Português.
177) A Ré/Empregadora nunca exerceu poder disciplinar sobre o Trabalhador.
IV - Apreciação do Recurso
A questão a apreciar e decidir nos presentes autos consiste em determinar se o Tribunal a quo errou o julgamento ao não reconhecer a existência de um contrato de trabalho entre E... Fernandes e a Ré.
A sentença recorrida, após exaustiva fundamentação, concluiu que sem necessidade de outras considerações, deverá improceder a pretensão do Autor, secundada pelo Trabalhador/Interveniente, no sentido da relação jurídica que existiu entre a Ré/Empregadora e o Trabalhador/Interveniente ser qualificada e reconhecida como sendo de natureza laboral.
Concordamos com esta conclusão.
Como se sabe, nem sempre é fácil distinguir entre o contrato de trabalho e o contrato de prestação de serviços, dado que não estamos em presença de negócios formais, antes consensuais, o que propicia uma grande variabilidade de situações concretas, pelo que a determinação da sua existência e dos respectivos contornos deve ser aferida pelo comportamento das partes, pela análise da situação de facto.
Nos termos do art. 11º do CT e 1152º do C. Civil, Contrato de trabalho é aquele pelo qual uma pessoa se obriga, mediante retribuição, a prestar a sua actividade a outra ou outras pessoas, no âmbito de organização e sob a autoridade destas.. (sic)
O contrato de prestação de serviço é aquele em que uma das partes se obriga a proporcionar à outra certo resultado do seu trabalho intelectual ou manual, com ou sem retribuição (cfr. art. 1154º C.Civil).
A norma do art. 11º corresponde ao artigo 10º do CT de 2003, mas o legislador introduziu-lhe duas alterações. A primeira consistiu em referir que o trabalhador é uma pessoa singular e a segunda reporta-se à subordinação jurídica que deixa de ser referenciada à autoridade e direcção do empregador e introduz um novo elemento no âmbito de organização.
Sobre a noção de contrato de trabalho pronuncia-se João Leal Amado': Destarte, ontem, como hoje, analisando a noção legal de contrato de trabalho concluímos que o mesmo é constituído, essencialmente, por três elementos: a prestação de trabalho, a retribuição e, last but not least, a subordinação jurídica.
E quanto à subordinação jurídica, refere o mesmo autor 2i ela decorre do facto de o trabalhador se comprometer a prestar a sua actividade «sob a autoridade e direcção» da entidade empregadora (ou, de acordo com a nova fórmula legal, «no âmbito de organização e sob autoridade desta), sendo usual dizer-se que é neste elemento que reside o principal critério de qualificação do contrato de trabalho - e de distinção deste face a contratos vizinhos.
Em suma, podemos assentar que também no Código do Trabalho de 2009 é a existência de subordinação jurídica, a qual se traduz na sujeição do trabalhador às ordens, autoridade e instruções do empregador, que continua a diferenciar o contrato de trabalho de outras figuras afins, nomeadamente do contrato de prestação de serviços.
Como afirma o acórdão do STJ de 05-03-2013 : A subordinação jurídica traduz-se assim, na prerrogativa dum dos contraentes de poder dar ordens e instruções quanto ao modo, tempo e lugar da actividade e na obrigação, por parte do trabalhador, de as ter de cumprir, o que implica uma posição de supremacia do credor da prestação de trabalho e a correlativa posição de sujeição do trabalhador, cuja conduta pessoal, na execução do contrato, está necessariamente dependente das ordens, regras ou orientações ditadas pelo empregador, dentro dos limites do contrato e das normas que o regem.
E ainda, reflectindo acerca do principal elemento distintivo de ambos os contratos, Não estamos pois em presença de um devedor que organiza o seu programa de prestação, mas sim de um devedor cuja prestação é organizada pelo respectivo credor.
A cargo da entidade patronal está o poder determinativo da prestação de trabalho, ou seja, o poder de dar um destino concreto à força de trabalho que o trabalhador põe à sua disposição, quer atribuindo uma função geral ao trabalhador na empresa, quer determinando-lhe singulares operações executivas (sic. Estes poderes de autoridade e direcção do empregador podem apresentar-se como meros elementos potenciais; a verificação da sua existência traduz-se num juízo de possibilidade e não de realidade.
Ora, como é sabido, é ao trabalhador que, por regra, cabe fazer a prova dos elementos constitutivos do contrato de trabalho (art.342º n° 1 do Código Civil).
Ciente de que essa prova por vezes se torna difícil de fazer, para obviar a tal dificuldade o legislador criou a denominada presunção de laboralidade, ou seja, perante a prova de determinados indícios, a lei presume a existência do contrato de trabalho. E nessa linha, determina o artigo 12º do CT/2009:
1- Presume-se a existência de contrato de trabalho quando, na relação entre a pessoa que presta uma actividade e outra ou outras que dela beneficiam, se verifiquem algumas das seguintes características:
a)A actividade seja realizada em local pertencente ao seu beneficiário ou por ele determinado,
b) Os equipamentos e instrumentos de trabalho utilizados pertençam ao beneficiário da actividade;
c) 0 prestador de actividade observe horas de início e de termo da prestação, determinadas pelo beneficiário da mesma,
d) Seja paga, com determinada periodicidade, uma quantia certa ao prestador de actividade, como contrapartida da mesma;
e) 0 prestador de actividade desempenhe funções de direcção ou chefia na estrutura orgânica da empresa.
2-(..)
3-(..)
4-(..)„
A propósito deste artigo escreve João Leal Amado, A lei selecciona um determinado conjunto de elementos indiciários, considerando que a verificação de alguns deles (dois?) bastará para a inferência da subordinação jurídica. Assim sendo, a tarefa probatória do prestador de actividade resulta consideravelmente facilitada. Doravante, provando o prestador que, in casu, se verificam algumas daquelas características, a lei presume que haverá um contrato de trabalho, cabendo à contraparte fazer prova em contrário.
(...) Tratando-se de uma presunção juris tantum (art. 350º do C. Civil), nada impede o beneficiário da actividade de ilidir essa presunção, demonstrando que, o despeito de se verificarem aquelas circunstâncias, as partes não celebraram qualquer contrato de trabalho.
(...) De certa forma, esta presunção representa uma simplificação do método indiciário tradicional, visto que, como ponto de partida, ela dispensa o intérprete de proceder a uma valoração global de todas as características pertinentes para a formulação de um juízo conclusivo sobre a subordinação.
Na jurisprudência, veja-se o sumário do recente acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 13.02.2015
I - O n° 1 do artº 12º do CT/2009 elenca os índices de subordinação que, verificando-se, fazem presumir a existência de um contrato de trabalho.
II - Como resulta do teor do seu corpo, é condição suficiente para operar a presunção da laboralidade a verificação de duas das características afirmadas nessa norma.
III - Essa presunção é, porém, ilidível, admitindo prova em contrário, nos termos do arte 350º, nº 2 do C. Civil.
IV - No contrato de trabalho é a actividade do trabalhador que é adquirida pelo outro contratante que a organiza e dirige com vista à obtenção de um resultado para além do contrato. Ao invés, na prestação de serviço o que a outra parte adquire é o resultado de uma actividade.
Assim, face ao que ficou exposto e considerando a redacção do artigo 12º do CT/2009 que refere se verifiquem algumas das seguintes circunstâncias entendemos também que basta a verificação de duas das circunstâncias ali referidas para que o trabalhador beneficie da presunção de laboralidade, com a consequente inversão do ónus da prova.
Ora, quem tem a seu favor uma presunção legal escusa de provar o facto a que ela conduz e apenas tem de provar o facto que lhe serve de base, cabendo à parte contrária ilidir a presunção legal mediante prova em contrário, salvo se a lei o proibir (art. 3502 do Código Civil).
De facto, no presente caso, E... beneficia da presunção a que se refere o art. 12º do CT, dado que a actividade por si realizada ao serviço da Ré era-o nas instalações desta (cfr. pontos 24. e 103. dos factos provados), os equipamentos e instrumentos de trabalho utilizados pertenciam à Ré (cfr. pontos 25., 28., 29., 31., 32., 31, 101. dos factos provados) e o interveniente prestava a sua actividade com observância de horas de início e termo da prestação, através de uma escala de serviço mensal, elaborada pela Ré, acessível via intranet (cfr. pontos 45. e 50. dos factos provados), pese embora fosse o interveniente escolher os turnos em que prestava serviço, daí a irrelevância deste facto presuntivo, como veremos infra. Ou seja, estão verificados três dos indícios a que se refere o art. 12º, os previstos nas alíneas a), b) e c), capazes de accionar a presunção da existência de contrato de trabalho. Relativamente à alínea e) - Seja paga, com determinada periodicidade, uma quantia certa ao prestador de actividade, como contrapartida da mesma - que o Ministério Público defende estar provada, na verdade, o interveniente não recebia uma quantia certa da Ré, antes uma quantia variável em função das horas que trabalhava.
No entanto, a presunção é ilidível e, na realidade, a Ré logrou ilidi-la, demonstrando ao tribunal que entre si e E... não existia qualquer vínculo de subordinação jurídica.
Vejamos
É certo que o interveniente prestava a sua actividade nas instalações da Ré e fazia uso dos instrumentos desta. No entanto, isso acontecia atenta a natureza e forma de execução dos serviços contratados pela Ré ao interveniente, que têm de ser executados num único espaço físico, dotado da logística necessária para o efeito, nomeadamente de uma plataforma de atendimento multicanal e de computador central, que guarda informação confidencial e sensível, nomeadamente dados pessoais e de saúde dos utentes do Serviço Nacional de Saúde. Portanto, por razões relacionadas com a complexidade do sistema informático utilizado e necessidade de garantia de segurança e confidencialidade dos dados, não é possível a utilização pelos enfermeiros comunicadores de equipamentos próprios, designadamente informáticos, para a prestação do serviço que lhes foi contratado pela empregadora, pois estes possuem as características técnicas necessárias para garantir a uniformidade e qualidade do serviço aos utilizadores da Linha Saúde 24, a saber (i)
integração num sistema informático de armazenamento de dados, com especificações e programas de elevada dimensão, performance e complexidade e (ii) integração funcional de sistemas de comunicação (telefone, Thin Clients e headsets).
Nesta medida, estes indícios não assumem a relevância que o Ministério Público pretende porquanto não constituem verdadeiros indícios de subordinação jurídica, podendo estar presentes também nos contratos de prestação de serviços.
É verdade, por outro lado, que o interveniente prestava a sua actividade com observância de horas de início e termo da prestação, sendo os turnos de 6, 8 ou 9 horas, através de uma escala de serviço mensal, elaborada pela Ré, acessível via intranet. Por cada turno de enfermeiros estava presente um enfermeiro supervisor, a quem incumbia determinar os períodos de intervalo e esclarecer dúvidas que lhe eram colocadas pelos colegas. Nos turnos com a duração de 8 horas e 9 horas, o interveniente tinha direito a intervalo de 1 hora, que poderia gozar numa única pausa ou em duas pausas de 30 minutos cada uma. Nos turnos de 6 horas, o Interveniente tinha direito a pausa de 30 minutos. Dependendo do fluxo global de chamadas, o trabalhador poderia ainda ser autorizado pelo supervisor a gozar de pausa adicional de 10 minutos. Por vezes, o supervisor prevenia os enfermeiros logo que o período de pausa estava decorrido, tanto mais que os intervalos eram considerados períodos de trabalho para efeitos de remuneração.
Estamos aqui perante uma verdadeiro índice de laboralidade que, no entanto se esbate quando verificamos que o interveniente podia ajustar trocas de turnos com colegas, sendo embora essas trocas condicionadas ao cumprimento de regras estabelecidas pela Ré, ou seja, aquele apenas podia ajustar trocas de turno com enfermeiros que já prestassem funções à empregadora nas mesmas condições em que ele as prestava (e em Março e Abril de 2014, a Ré passou a autorizar o trabalhador a efectuar trocas apenas com os enfermeiros que não celebraram o aditamento ao contrato para diminuição da remuneração hora). Esta condicionante das trocas resulta certamente das especificidades das funções desempenhadas pelo interveniente que, como resulta da matéria de facto, exigiam uma formação inicial para operar com o sistema informático da Ré e o cumprimento dos critérios de atendimento por esta definidos, pelo que não nos parece que tais factos se apresentem como elementos definidores da existência do contrato de trabalho, sendo também aplicáveis à prestação de serviços. Por outro lado, o facto de os enfermeiros não poderem realizar dois turnos consecutivos ocorre porque a Ré entende que o desgaste decorrente da realização de dois turnos seguidos poderia colocar em causa a qualidade do serviço prestado ao utente.
Mais significativo, por revelar uma autonomia na execução da prestação, bem distinta do que acontece no âmbito de um contrato de trabalho, que é um contrato intuitu personae, é o facto de as trocas com colegas ou a sua substituição por colegas não carecer de autorização da empregadora ou da apresentação de qualquer justificação para o efeito (embora devessem ser registadas), situação que aliás acontecia efectivamente, porquanto o interveniente efectuava frequentemente trocas com colegas e, bem assim, substituía ou fazia-se substituir por estes na prestação dos serviços à Ré, sendo que, noutros casos, não comparecia para prestar o serviço, nem se fazia substituir. Acresce que efectuava frequentemente número de turnos não coincidentes com os inicialmente atribuídos pela empregadora, sucedendo amiúde que o enfermeiro que comparecia nas instalações da empregadora para assegurar determinado serviço era distinto daquele a quem o mesmo estava adjudicado, sem que a Ré tenha sido previamente informada dessa alteração. Portanto, a conformação da prestação a um determinado plano horário, como acontece no contrato de trabalho, aqui não se verificava.
Os enfermeiros comunicadores, incluindo o interveniente, não se encontram obrigados a justificar as suas ausências, nem a apresentar documento comprovativo das mesmas, destinando-se o registo feito pela Ré à percepção por esta do número de horas de serviço prestadas por cada um dos enfermeiros comunicadores para efeitos de apuramento do valor devido aos mesmos a título de remuneração, e não ao exercício do poder de fiscalização e disciplinar da Ré.
Resultou também provado que o atendimento das chamadas dos utentes era efectuado de acordo com um algoritmo pré-definido, devendo o trabalhador cumprir as indicações de interacção com o utente que a empregadora definia, nomeadamente no que se refere à estrutura da chamada, ao modo de tratamento do próprio utente e aos métodos utilizados para encaminhamento de acordo com o quadro clínico que era descrito, indicações essas que o trabalhador apreendeu durante o processo de formação.
0 interveniente beneficiou de formação profissional proporcionada pela Ré, inicial, com vista a operar com o equipamento existente no Centro de Atendimento, e contínua, nos termos dos pontos 41. e 42. da matéria de facto, a qual encontra a sua razão de ser no pretendido desiderato de alcançar a maior qualidade possível e dentro das exigências contratualizadas com o Estado Português. Daí que, tal como referido na sentença, atenta a forma como ocorram na vivência da relação jurídica em apreço (cfr. factos provados nº5. 29 a 43,84 a 91, 171 a 176), configuram elementos sem peso essencial e fundamental para serem decisivos na qualificação jurídica em causa como sendo de trabalho.
Acresce que, durante os respectivos turnos, o trabalhador estava sujeito a um conjunto de regras estabelecidas pela empregadora, nomeadamente, relativas à alimentação e utilização de telemóveis, bem como as relativas às pausas adicionais, contabilizando aquela as pausas, para efeitos de pagamento.
Trata-se de um aparente índice de subordinação jurídica, no entanto, o mesmo reflecte, por um lado, uma exigência de qualidade, a que não são alheias as obrigações assumidas pela Ré perante o Estado, que justificam a monitorização/avaliação de três chamadas mensais, e, por outro, a necessidade de apuramento do número de horas em que o interveniente prestou serviço, para efeitos do seu pagamento. Note-se que o supervisor estava presente apenas em parte do dia (cfr.pontos 78 e 79), e, como assinala a sentença, a intervenção do enfermeiro supervisor /prct.u do responsável de turno junto dos enfermeiros comunicadores, embora pareça a instituição de uma hierarquia, nos moldes em que efectivamente ficou provado consistir efectivamente, está longe de traduzir um concreto regime de ordens e instruções e de obediência às mesmas (cfr. factos provados n9s. 78, 79 e 160 a 170 e cfr. factos não provados f), j) e p)];. Note-se, aliás que resultou não provado que f) Em caso de impossibilidade de comparência ao turno atribuído pela escala mensal, o Trabalhador deveria justificar perante o Director do Centro de Atendimento ou perante o Supervisor o motivo da ausência., j) O Supervisor, por vezes, contacta o Trabalhador, telefonicamente, caso esteja previsto na escala e não se tenha apresentado., p) Para além do referido em 168), o enfermeiro supervisor ordenava aos enfermeiros comunicadores para que regressassem ao posto de atendimento.
A Ré implementou um sistema de avaliação dos trabalhadores, é certo, mas esse sistema de avaliação apenas se repercutia, para além da qualidade do serviço, seu objectivo primordial e assumido com o Estado Português, no valor hora da retribuição, e quanto ao plano de recuperação, tal como referido na sentença, não estão demonstradas as suas consequências, a não ser, mais uma vez, no âmbito da qualidade do serviço. Assim, sufragamos o referido na sentença no sentido de que tal se afasta das características e consequências típicas do sistema de avaliação criado pelo empregador no âmbito de um regime de subordinação jurídica, as quais se situam necessariamente ao nível da progressão da carreira e muitas vezes ao nível do poder disciplinar, o que nada aqui se verifica (...)
O interveniente não exercia funções na Ré em regime de exclusividade, não recebia subsídio de férias e de Natal e a Ré não o inscreveu na Segurança Social, o que, não constituindo índices determinantes, apontam para a exclusão da laboralidade do vínculo, excluindo uma certa ideia de dependência económica.
O interveniente, apesar de poder gozar um período de ausência de 35 dias, fazia-o se assim o entendesse, não lhe sendo esse direito atribuído pela Ré como irrenunciável, resultando não provado que dependesse de autorização desta para o seu gozo.
Assim, não obstante terem resultado provadas as características a que aludem as alíneas a), b) e c) do n° 1 do artigo 12º do CT/2009 que fazem operar a presunção de laboralidade, o certo é que, conforme refere a sentença recorrida, a Ré ilidiu tal presunção, daí que não se possa concluir no sentido de que entre o enfermeiro E... e a Ré se estabeleceu um vínculo de natureza laboral.
Improcede, pois, o recurso, mantendo-se a sentença recorrida.
V - Decisão
Em face do exposto, acordam os Juízes deste Tribunal e Secção em julgar improcedente o recurso interposto pelo Ministério Público, confirmando a douta sentença recorrida.
Sem custas por delas estar isento o Ministério Púbico (al.a) do n° 1 do art. 4º do Regulamento das Custas Processuais.
Registe.
Notifique,
Lisboa,
(Paula de Jesus Jorge dos Santos)
(Claudino Seara Paixão)
(Maria João Romba)

Sumário
Beneficiando um enfermeiro comunicador, que procede ao atendimento dos utentes, praticando actos de triagem, aconselhamento e encaminhamento, da presunção a que se refere o art. 12ºdo CT, por os factos concretizarem três dos índices de laboralidade previstos nesse preceito legal, mas logrando a Ré ilidir tal presunção, demonstrando ao tribunal que entre si e aquele não existia vínculo de subordinação jurídica, cumpre concluir que o contrato que vigorava entre o referido enfermeiro e a Ré não era um contrato de trabalho.
A relatora
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